Os votos que tornaram Bolsonaro réu e os 20 anos da lei dos transgênicos
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Obrigada e boa leitura!
🔸 O Supremo Tribunal Federal (STF) tornou réus Jair Bolsonaro (PL) e sete de seus aliados. A Primeira Turma da Corte foi unânime ontem ao decidir que o grupo deve responder por tentativa de golpe de Estado. A Agência Pública revela os bastidores da primeira etapa do julgamento histórico. Na segunda-feira, primeiro dia de sessão, Bolsonaro compareceu ao Supremo, para a surpresa de aliados e ministros. Sentou-se perto de familiares de vítimas da ditadura militar: Hildegard Angel, filha da estilista Zuzu Angel, e Ivo Herzog, filho do jornalista Vladimir Herzog. “O clima ficou bastante tenso com a presença de Bolsonaro”, disse Ivo. Parlamentares bolsonaristas também causaram tumulto no primeiro dia. Ontem, porém, nem os deputados nem o ex-presidente compareceram à sessão. Bolsonaro acompanhou o voto dos ministros do gabinete de seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Já seus advogados que estavam na Corte saíram às pressas do plenário que fica no terceiro andar, desceram de escada e, numa rápida declaração à imprensa, criticaram a suposta falta de acesso às provas.
🔸 Apesar da decisão unânime, os votos dos ministros revelaram nuances e divergências. Alexandre de Moraes, relator do caso, sustentou que Bolsonaro liderou a trama, manuseou minutas golpistas e insuflou apoiadores a desacreditar o sistema eleitoral. Exibiu imagens dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 e ironizou a narrativa de que foi um “passeio”. O Jota mostra como votou cada magistrado. Cármen Lúcia e Flávio Dino acompanharam Moraes. Luiz Fux e Cristiano Zanin também votaram a favor da denúncia, mas demonstraram desconforto com a dosimetria das penas aplicadas nos julgamentos dos atos de 8 de janeiro de 2023. Fux divergiu ainda sobre a tipificação dos crimes, defendendo que golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito são um único crime, e não dois. Zanin foi mais breve e afirmou haver indícios suficientes para a abertura de uma ação penal.
🔸 A postura de Fux, aliás, sinaliza possíveis divergências no julgamento da ação penal. Além do desconforto com as penas nos casos do 8 de janeiro, segundo a CartaCapital, ele demonstrou ceticismo sobre a validade da delação de Mauro Cid, dizendo que avaliará sua legalidade no momento oportuno. Se, futuramente, Fux divergir dos demais ministros na condenação de Bolsonaro, isso pode ter efeitos práticos, já que uma condenação unânime impede a defesa de apresentar embargos infringentes. A pena máxima combinada pelos cinco crimes atribuídos a Bolsonaro pode chegar a 43 anos de prisão, mas, por ser réu primário, ele tende a receber punição menor, caso condenado.
🔸 Horas depois de se tornar réu, Bolsonaro voltou a disseminar desinformação em discurso à imprensa no Congresso. Disse que as urnas eletrônicas não são auditáveis, omitiu que seu partido também teve conteúdos de campanha retirados do ar pelo Tribunal Superior Eleitoral e mentiu que não foram encontradas armas com os golpistas do 8 de janeiro. O Aos Fatos detalha e desmonta as informações falsas propagadas pelo réu. Em tempo: as urnas são auditáveis; seu partido, o PL, foi multado por litigância de má-fé; granada, coquetéis molotov e barras de ferro foram apreendidos nos atos antidemocráticos.
🔸 A propósito: Bolsonaro é o primeiro ex-presidente a responder por uma tentativa de golpe de Estado, mas não é o primeiro ex-chefe do Executivo do Brasil a se tornar réu no Supremo. O primeiro deles foi Fernando Collor de Mello. O “Durma com Essa”, podcast do Nexo, resgata a denúncia contra ele em 2015, já no âmbito da Operação Lava Jato. Não, Collor não se tornou réu no STF pelo processo de impeachment que o afastou do cargo. Quem também se tornou réu no STF foi o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em julho de 2016, e Michel Temer, em março de 2019.
📮 Outras histórias
Uma enchente de lama invadiu casas de cerca de 80 famílias na divisa entre Recife e Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco. Elas são vítimas de uma tragédia socioambiental causada pelo embarreiramento de um trecho do rio Tejipió por conta do alargamento de um viaduto e da construção de uma ciclofaixa na BR-232. A Marco Zero explica que as obras bloquearam o fluxo do rio, provocando transbordamento com as chuvas de fevereiro. Os moradores espalharam cartazes de protesto nos portões das casas. Escreveram frases como “Mais de 50 anos que moro aqui, o barro tá entupindo o rio” e “Somos seres humanos, merecemos respeito”. As prefeituras dos municípios divergem sobre a responsabilidade. “Foi uma cheia grande, parecia um tsunami. Deixou a rua cheia de lama, derrubou muro, derrubou portão”, conta José Luiz da Silva, 70 anos. As obras, ao custo de R$ 157 milhões, deveriam ter sido concluídas em março.
📌 Investigação
Ao contrário do que a Petrobras alega, o Brasil não precisará importar petróleo em dez anos se não descobrir novas reservas na Foz do Amazonas. Se o país seguir as metas que estabeleceu de transição energética para contribuir com a redução de 75% das emissões de gases do efeito estufa do planeta, o petróleo brasileiro duraria pelo menos até 2039 com as reservas provadas e, até 2042, considerando as totais – que inclui prováveis e possíveis. A InfoAmazonia revela os cenários de consumo do combustível. No pior deles, o de crescimento contínuo do consumo e da exportação, o esgotamento pode ocorrer até antes do que a diretora de Exploração e Produção da Petrobras, Sylvia Anjos, afirmou: por volta de 2032 e 2033. A projeção desconsidera, no entanto, o Acordo de Paris e o Net Zero, além de não considerar o possível incremento na produção nacional com a expansão das reservas provadas nos blocos de petróleo.
🍂 Meio ambiente
Com mais de 21 milhões de lares em algum grau de insegurança alimentar e a contaminação do solo, da água, dos alimentos, dos animais e seres humanos pela combinação de transgênicos com o uso de agrotóxicos, a realidade é diferente das promessas feitas para a aprovação da lei dos transgênicos em 2005. Na época, empresas como a Bayer e a Syngenta afirmavam que os organismos geneticamente modificados aumentariam a produção de alimentos, criariam plantas mais resistentes e contribuiriam para superar o quadro brasileiro de fome. No Le Monde Diplomatique Brasil, as pesquisadoras Jaqueline Andrade, Giovanna Menezes e Lizely Borges analisam os 20 anos da legislação e lembram seu impacto para a biodiversidade. “Enquanto as variedades tradicionais, como o milho crioulo, exibem uma rica diversidade de cores, tamanhos e adaptações a diferentes climas e solos – podendo ser vermelhos, verdes, amarelos, roxos e assim por diante –, as sementes transgênicas de milho se resumem àquela espiga amarela que temos como imaginário.”
📙 Cultura
“A leitura abre nossos olhos para vários assuntos. Fomenta reflexões profundas e aumenta nosso encantamento pelo mundo e pela existência”, afirma Vanessa Mota, criadora do Clube de Leitura Maceió, que desde o fim da pandemia promove um espaço de troca, escuta e incentivo à leitura integral das obras. O Eufêmea conta como mulheres à frente de grupos de leitura buscam democratizar o acesso aos livros e à escrita. No clube de Vanessa, a seleção dos títulos leva em conta recomendações da crítica especializada e premiações literárias, mas também obras disponíveis em formatos digitais ou audiolivros, permitindo que mais participantes acompanhem as leituras. Em 2024, a iniciativa passou a ter um olhar mais voltado para a autoria feminina. “Neste ano, nosso clube vai ganhar uma cara mais autoral, incentivando as mulheres a escrever e produzir suas próprias obras.”
🎧 Podcast
Elementos das culinárias regionais, como o óleo de palma e o açaí, são devorados por cardápios gourmetizados. O “Prato Cheio”, produção d’O Joio e O Trigo, mergulha na existência do conceito de “gentrificação alimentar”, um cenário em que a apropriação exclui as pessoas mais pobres – geralmente que produzem e que sempre valorizaram e consumiram um determinado alimento – para a recreação das elites. Quando gentrificados, os ingredientes e cultivos também perdem suas identidades para que se tornem mais agradáveis aos novos consumidores, com mudanças em cor, cheiro, sabor e textura.
👩🏽💻 Tecnologia
Diante da mudança de padrão de buscas na internet do “modelo Google” – uso de palavras-chave para encontrar links potencialmente úteis – para o “modelo ChatGPT” – busca semântica com pedido feito em linguagem natural e resposta textual seguidas de links para fontes –, o pesquisador Rafael Cardoso Sampaio, da Universidade Federal do Paraná, testou sete ferramentas de inteligência artificial para identificar como são selecionadas as fontes e a qualidade do relatório final. No Conversation Brasil, ele analisa os resultados do teste e explica como esses sistemas podem transformar as revisões bibliográficas na pesquisa acadêmica: “Houve exageros quanto à capacidade dessas novas ferramentas em entregar pesquisas de nível doutoral, já que frequentemente apresentam textos com pouca contextualização, atualizações insuficientes e uso inadequado de fontes, sendo avaliado em teste similar como inadequado mesmo para a pesquisa de notícias”.