A violência sexual contra meninas indígenas e o Pão de Açúcar menor
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🔸 Quase um terço da população brasileira vive algum tipo de insegurança alimentar. São 70,3 milhões de pessoas, das quais mais de 21 milhões não têm o que comer todos os dias. Com dados do período de 2020 a 2022, um relatório de agências da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado ontem confirma o aumento acentuado da fome no Brasil já apontado em levantamentos recentes. A crise econômica, o fim de políticas sociais e de acesso à alimentação, a partir de 2016, e a pandemia estão entre as causas, explica o Nexo. A fome voltou a subir a partir dos anos Temer, pouco depois de, em 2014, o Brasil ter saído do chamado Mapa da Fome da ONU.
🔸 Mais de 27 mil pessoas estão desalojadas por causa das chuvas no Nordeste. A situação é mais grave em Alagoas, que concentra 25,3 mil desabrigados em 32 cidades, e em Pernambuco, onde 2 mil moradores estão fora de suas casas nas 15 cidades onde foi declarado estado de emergência no estado. A Agência Tatu destaca que todos os municípios pernambucanos afetados estão próximos da divisa com Alagoas, na região da zona da mata sul. Em Santana do Mundaú (AL), o rio Mundaú, cujo nível de água médio é de 2,3 metros, superou os 7 metros na semana passada. É a segunda vez, nos últimos dez anos, que o rio ultrapassa a marca de 6 metros. “Depois da enchente de 2010 a gente ficou naquela expectativa de que acontecesse a cada 10 anos, mas estamos vendo que provavelmente será todo ano. Assim que o nível do rio começou a subir, tiramos tudo por precaução. Voltaremos com todos os móveis só depois do período chuvoso. Por enquanto, é só uma mesa com notebook”, conta Kallyne Sabino, que tem uma agência de turismo na cidade.
🔸 O governo Bolsonaro ignorou suspeitas de violência sexual contra meninas indígenas. Pelo menos três crianças, com idade entre 9 e 12 anos, do povo Jamamadi que vivem em Lábrea, no sul do Amazonas, receberam diagnóstico do vírus HPV, um indício de que podem ter sofrido violência sexual. Reportagem d’O Joio e O Trigo, em parceria com a Repórter Brasil e o Le Monde Diplomatique Brasil, obteve laudos médicos e documentos sobre os casos. Um relatório de 2019 foi endereçado ao coordenador local da Funai, Luiz Fernandes de Oliveira Neto, que comandou a sede regional entre 2014 e janeiro de 2020. Ele afirma que deu seguimento à denúncia, mas diz que o caso não foi adiante por causa do “desmonte sistemático da Funai e dos aparelhos do sistema de justiça e assistência social, além de ausência histórica do Estado, agravada profundamente após 2016”.
🔸 Acusado de violência sexual pela ex-esposa e em meio às denúncias contra seus aliados, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tenta na Justiça censura prévia às informações sobre os casos. O deputado processa a Agência Pública, que revelou as denúncias de Jullyene Lins, com quem foi casado. Pediu – e não conseguiu – que a reportagem fosse derrubada das plataformas digitais. O parlamentar ainda solicitou uma indenização de R$ 100 mil e pede que tanto a Pública quanto Jullyene Lins não falem mais sobre este assunto, o que é censura prévia. Lira também pediu na Justiça de Brasília que sejam removidos do YouTube programas do “ICL Notícias” que tratam de denúncias de corrupção envolvendo seu ex-assessor parlamentar na compra de kits de robótica, informa a CartaCapital.
📮 Outras histórias
Pistoleiros ameaçam pequenos criadores de animais e agricultores em Correntina, no oeste baiano, há pelo menos dez meses. São frequentes as tentativas de homicídio, as ameaças e a destruição de patrimônio dos moradores da região. O Meus Sertões conta que nesta semana, enfim, policiais civis realizaram uma operação e prenderam suspeitos de praticar os crimes contra os fecheiros. Em menos de 48 horas, no entanto, eles foram soltos. A reportagem detalha a ação da polícia, que, numa das buscas, encontrou 11 armas curtas e longas, incluindo um rifle semiautomático com capacidade de disparar dez tiros em menos de dois segundos.
📌 Investigação
Desde fevereiro de 2021, a SV Apoio Logístico tem um único dono, Antonio Garcia. Como sócio-administrador da empresa, o nome de Garcia assina um total de R$ 39 milhões em contratos com o governo do Rio Grande do Sul e com a Prefeitura de Porto Alegre. O Matinal revela que, na prática, Garcia atua como office boy da SV, o que ele mesmo confirmou por telefone, não participa do dia a dia de sua administração e tem residência na periferia de Viamão, município da Região Metropolitana de Porto Alegre. A reportagem ainda teve acesso à investigação da Polícia Federal que indica que os verdadeiros donos da empresa são o pastor evangélico e ex-vereador de Butiá (RS), Carlos Serba Varreira, e o advogado e ex-assessor da Assembleia Legislativa do RS, Renato Walter, que estariam usando laranjas para fechar contratos públicos milionários.
🍂 Meio ambiente
O morro do Pão de Açúcar, no Rio de Janeiro, está 50 m³ menor. Este foi o volume de rochas que foi escavado do cume, sem autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), para a instalação de quatro linhas de tirolesa pela Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar, que administra o bondinho. Segundo a revista piauí, por se tratar de um bem tombado, foi aberta uma investigação do Ministério Público Federal – que ordenou a interrupção imediata da obra no início de junho por meio de decisão liminar. Enquanto o caso da tirolesa caminha na Justiça Federal, a Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar tenta um segundo projeto de expansão do complexo turístico. Na prática, isso significa um acréscimo de 6.310 m2 de área construída, somando as ampliações no Pão de Açúcar, no Morro da Urca e na Praia Vermelha.
Conhecida como Serra da Chapadinha, a porção sul da Chapada Diamantina, na Bahia, ainda é uma área desprotegida e está na mira da mineração, além de vulnerável à grilagem e ao desmatamento. Com mais de 14 mil hectares com autorização de pesquisa mineral na região, de acordo com dados abertos da Agência Nacional de Mineração, o maior número de pedidos se refere ao minério de ferro. O Eco detalha que os moradores acenderam o alerta e entraram em uma corrida contra o tempo. A mobilização popular resultou em uma proposta do deputado estadual Hilton Coelho (PSOL) enviada ao governador Jerônimo Rodrigues (PT) no final de maio para transformar a Serra da Chapadinha em uma unidade de conservação.
📙 Cultura
Os impactos da mineração estão presentes em mostra inédita no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP. Intitulada de “Solastalgia”, a obra do cineasta, artista visual e pesquisador em novas mídias, Lucas Bambozzi, reflete sobre os efeitos da atividade mineradora no Brasil, por meio de videoinstalações. A Escotilha explica que o conceito central da exposição – solastalgia – trata do estresse mental e existencial provocado por mudanças ambientais abruptas. O trabalho de Bambozzi traz paisagens e montanhas corroídas pelas mineradoras no Quadrilátero Ferrífero, região centro-sul de Minas Gerais, e ficará em exibição até o dia 1º de outubro.
“Entre um show e outro, trabalhei entregando panfletos, por exemplo, porque eu tinha que cuidar da minha filha.” Claudia Mendes dos Santos, a Mc Cacau, faz parte da primeira geração de cantoras do funk e é considerada a primeira mulher da cena. O Nós, Mulheres da Periferia narra a trajetória da artista, que começou a cantar em 1992, aos 18 anos, em um concurso de rap em Duque de Caxias (RJ). Ao vencer a disputa, ela passou a cantar em bailes até que, em 1994, foi lançada pela Furacão 2000, produtora e gravadora carioca que, na década de 1990, foi essencial para a divulgação do ritmo no país. “Eu continuo trabalhando. O funk relíquia está fazendo muitos crias e muitos shows. Todo mundo quer voltar lá atrás e trazer aquele funk gostoso, mais família, que todo mundo pode escutar – mas eu gosto de todos, quero me divertir e ser feliz”, afirma.
🎧 Podcast
A invisibilidade de mulheres no grafite é uma realidade que atravessa gerações, como relatam a grafiteira e educadora Nene Surreal e artista visual e grafiteira Carolina Itzá. O “Cena Rápida”, produção do Desenrola e Não Me Enrola, reflete sobre como o apagamento de mulheres em diversas áreas faz parte do ciclo de violências e desigualdades. “Tenho 56 anos, hoje era para olhar para o lado e ter outras mulheres pretas também grafiteiras que estavam lá comigo, mas infelizmente não conseguiram chegar até aqui. Isso é muito doloroso. E ainda hoje eu tenho que arrombar portas para estar”, diz Nene Surreal.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Primeira vereadora travesti de Niterói (RJ), Benny Briolly (PSOL) também é a única mulher negra na atual legislatura da Câmara de Vereadores da cidade. Em entrevista à Lupa, Briolly relata que a desinformação é “uma das maiores ferramentas para trabalhar a marginalização, para trabalhar a opressão, para trabalhar a descredibilidade social e política de travestis e transexuais”. Em 2021, primeiro ano de mandato, a vereadora foi obrigada a sair do Brasil por segurança. Atualmente, ela é escoltada pela Polícia Militar, por determinação da Justiça do Rio de Janeiro. Briolly lembra que entre as ameaças que recebia, o nome de Marielle Franco era frequentemente citado: “Diziam que iam me matar como mataram a Marielle, que tinham o endereço da minha casa”.