A violência policial contra pessoas negras e o Museu da Sanfona no Piauí
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🔸 A polícia matou apenas pessoas negras em 447 cidades do país ao longo de 2023, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). A maioria dos municípios se concentra na Bahia, estado cuja população é formada sobretudo por pretos e pardos. A Alma Preta detalha a letalidade policial dentro da população negra e lembra que, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o risco relativo de um negro morrer em uma intervenção policial é 3,8 vezes maior que o de um branco. Depois do Nordeste, o Sudeste é a região que concentra mais cidades onde a polícia só matou negros. “Não é um problema exclusivo das polícias, o racismo é um problema social. A letalidade policial também não é um problema exclusivo da polícia. É um problema que diz respeito aos governos estaduais e que diz respeito também à tratativa que é dada com relação a esses casos de mortes pelo Ministério Público e estaduais”, afirma Dennis Pacheco, pesquisador do FSBP.
🔸 O Ministério Público de São Paulo (MP-SP) recebeu uma representação contra o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o secretário da Segurança Pública Guilherme Derrite. O deputado estadual Simão Pedro Chiovetti (PT) protocolou o pedido para que os dois sejam investigados por prevaricação e improbidade administrativa, informa a Ponte. No texto, o parlamentar cita uma série de casos recentes de violência policial, como a cena desta semana em que um soldado lança um homem de uma ponte e a morte do estudante de medicina Marco Aurélio Cardenas Acosta, 22 anos, baleado à queima-roupa por um policial militar. As bancadas do PT e do PSOL na Assembleia Legislativa de São Paulo também prometem reagir e preparam um pedido de impeachment contra Guilherme Derrite.
🔸 Se é fácil traçar o passado escravocrata de políticos brasileiros, o inverso não é verdadeiro: é difícil encontrar nomes na atual legislatura que descendem de escravizados. No projeto “Escravizadores”, a Agência Pública analisou também a genealogia de políticos que se declaram pretos ou pardos. Ao todo, 21 dos 81 senadores e nove dos 27 governadores se classificam nessas categorias – nenhum deles sabe sobre os seus antepassados mais antigos. A reportagem lembra que o primeiro político preto e com discurso racial afirmativo no país foi Manoel da Motta Monteiro Lopes, eleito deputado federal em 1909. Em tempo: embora negros sejam 56% da população brasileira, a sub-representação na política persiste. Em 2022, apenas 32% dos candidatos negros foram eleitos.
🔸 Depois de mais de um ano e meio e de cinco prazos adiados, o PL que regula a IA no Brasil foi aprovado ontem na comissão responsável pela pauta no Senado. Agora, o texto vai à votação no plenário da Casa, marcada para a próxima terça-feira. O Aos Fatos explica que o projeto de lei aprovado preserva a proposta original de regulação baseada em riscos, mas poupa os algoritmos das plataformas digitais das obrigações de transparência. No texto final, o relator Eduardo Gomes (PL-TO) incorporou um artigo que garante que a regulação de “aspectos associados à circulação de conteúdo online” só pode ser feita por meio de legislação específica. Apesar do intenso lobby do setor privado, o PL manteve a previsão de remuneração de criadores de conteúdo que tenham suas obras usadas para o treinamento de sistemas de IA.
📮 Outras histórias
No Complexo da Maré, há um “ateliê de moda com ‘m’ maiúsculo”. É como Betto Gomes, estilista, gosta de se referir ao espaço de criatividade e costura que criou na Vila do João, uma das comunidades que compõem a Maré, na zona norte do Rio de Janeiro. A equipe do ateliê é feita só por mulheres. Com Betto, elas criaram a coleção “Maré de Encantos”, cuja base é o resgate de memórias das favelas do complexo. O Maré de Notícias narra a trajetória do estilista que, para a nova coleção, usou tecidos normalmente descartados por grandes fábricas têxteis. No ateliê, todas as roupas são pensadas em conjunto com as mulheres da equipe. “Trabalhamos em muitas fábricas, mas aqui foi uma novidade. É muito diferente você trabalhar com a criatividade, e não só produzir sem parar. A gente coloca a roupa no manequim e vai olhando se precisa de um toque a mais. Quando vê o brilho nos olhos dele [Betto], a gente sabe que deu certo”, conta Lusineide, uma das costureiras do ateliê.
📌 Investigação
Por R$ 800 mil e um poço doado, a Coca-Cola deixou cerca de 800 famílias sem água na região entre Brumadinho e Itabirito, em Minas Gerais. Desde que instalou uma fábrica em 2015, a empresa tem esgotado a água do Cauê, principal aquífero da Serra da Moeda. O caso foi levado pelas comunidades rurais ao Ministério Público do estado logo nos primeiros meses de seca daquele ano. O Joio e O Trigo revela o efeito da multinacional na região, agravado pela falta de estudos de impacto ambiental adequados, fruto da omissão de órgãos ambientais. Embora um acordo entre a Coca-Cola e o Ministério Público tenha sido firmado, o problema da falta de água nas comunidades não foi solucionado.
🍂 Meio ambiente
“Mais do que o aumento da temperatura média global, as mudanças climáticas possuem um impacto considerável em eventos extremos. Dados observados mostram que os acumulados de chuva estão reduzindo em várias partes do Nordeste e há um aumento da frequência e intensidade das chuvas sobre a região Sul”, afirma Fernanda Vasconcellos, professora do Departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Em entrevista à Ambiental Media, a pesquisadora explica as previsões para o próximo verão no país e os impactos das mudanças climáticas. “Os modelos climáticos indicam maior probabilidade de ocorrência de temperaturas acima da faixa normal em grande parte do país.”
📙 Cultura
A sanfona de oito baixos, que teria pertencido a Januário José dos Santos, o Mestre Januário, pai do cantor e compositor Luiz Gonzaga, é a principal atração do Museu da Sanfona, em Dom Inocêncio (PI). O espaço foi inaugurado em janeiro e faz parte do Complexo da Sanfona, que inclui uma casa de shows, um restaurante e o monumento que até este ano era a “maior sanfona do mundo”. Segundo o Meus Sertões, o museu abriga diversas sanfonas, fotos, discos de vinil, objetos (chapéus, sandálias, rádios) e uma sala de vídeo, onde é apresentado um documentário sobre a sanfona e os músicos de Dom Inocêncio e região. Ao menos 20 sanfoneiros são homenageados nas exposições.
🎧 Podcast
“Só existem as pessoas atípicas porque o mundo está construído para o funcionamento de pessoas típicas”, afirma a jornalista Carol Pires. No “Estranho Familiar”, produção da Trovão Mídia, ela compartilha o processo e a solidão de se descobrir uma mãe de criança atípica – sua Eva é uma menina autista de 5 anos. A repórter também descreve como suas relações familiares mais profundas são femininas – entre a mãe e as irmãs mais novas – e como a força das amizades femininas é um ato político.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Combinando técnicas de micropigmentação, tatuagem e desenho realista, a micropigmentadora Shiscleide Bruna Alves Teixeira, conhecida como Xis Teixeira, redesenha as aréolas dos seios de mulheres que precisaram retirar as mamas para tratamento de câncer. O objetivo do método é recuperar a autoestima dessas pacientes. A Agência Mural resgata a história da profissional, que sempre sonhou em fazer trabalho social e deixar um legado. O procedimento dura até cinco horas, e ela não aceita pagamento: “Eu não consigo colocar um valor para uma paciente que passou por um câncer e venceu. Se ela realiza o tratamento pelo SUS de forma gratuita, nada mais justo que finalize comigo gratuitamente também”.