A violência nas favelas em debate no STF e os agrotóxicos no Maranhão
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🔸 O ministro Edson Fachin reconheceu que há uma violação sistemática e massiva de direitos humanos no Rio de Janeiro. Ele é relator da ADPF das Favelas, ação movida pelo PSB que segue na Corte desde 2019. O plenário deve estabelecer novos procedimentos para o uso de força das policiais nas comunidades do estado. Para Fachin, as favelas não podem ser tratadas como “zonas francas de crime”. A CartaCapital lista as medidas propostas pelo magistrado, como a obrigatoriedade de que os mandados sejam cumpridos durante o dia, a oferta de ambulâncias em operações policiais e a instalação de câmeras nas viaturas e nas fardas dos agentes de segurança. O próximo a votar é o ministro Flávio Dino.
🔸 “As políticas definidas na ADPF precisam ser colocadas em prática para que a população negra e favelada do Estado do Rio de Janeiro não seja vítima de atrocidades, como as que presenciamos diariamente”, escreve Tainá de Paula, em artigo na Alma Preta. Vereadora do Rio de Janeiro, ela ressalta que a ADPF restringiu a realização de operações policiais nas comunidades cariocas durante a pandemia de Covid-19. A decisão, porém, não foi cumprida pelo Estado – “e o resultado foi a maior chacina da história do Rio de Janeiro, com o assassinato de 28 pessoas na favela do Jacarezinho, zona norte carioca”. “O fim do julgamento pelo STF é de relevância social e o quanto antes for finalizado, mais benéfico para as populações periféricas”, afirma.
🔸 Falando em STF: “Nós convivemos, com resignação e naturalidade, com a obsessão negativa por parte de alguns, em relação ao Supremo e ao Judiciário em geral. Como disse, faz parte da democracia”, disse o ministro Luís Roberto Barroso ontem, na primeira sessão em plenário do ano no Supremo Tribunal Federal (STF). O Jota explica que a fala foi uma resposta a críticas sobre gastos da Corte – no sábado, o novo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) disse que falta transparência dos Poderes sobre os gastos públicos.
🔸 Várias ruas e bairros do Grande Recife estão debaixo d’água desde a manhã de ontem. Um homem morreu eletrocutado em meio ao alagamento numa rua central da capital pernambucana. A Marco Zero lembra que, desde janeiro, todo o estado de Pernambuco ficou acima da média histórica de chuvas e, somente nos primeiros dias de fevereiro, a região metropolitana de Recife e as regiões da Mata Norte e Sul registraram chuvas próximas ou acima da média histórica. Moradores de periferias vêm denunciando o descaso da prefeitura. “Isso é recorrente, todo ano a mesma coisa, a gente reclama, denuncia, mas não tem jeito”, diz Evandra Dantas da Silva, moradora do Jiquiá, bairro próximo ao rio Beberibe.
🔸 No interior de São Paulo, Santa Bárbara D’Oeste enfrenta o pior alagamento da história do município. Em sete dias, a Defesa Civil registrou mais de 400 mm de chuva – e a previsão indica mais 390 mm até domingo, segundo o Metrópoles. Diversos bairros estão submersos e, como a chuva invadiu as cabines de energia elétrica da estação de tratamento de água, o abastecimento à população precisou ser paralisado.
🔸 A propósito: na capital, apenas nos dois primeiros dias do mês, choveu 165 mm, o 65% do esperado para o mês inteiro. A intensidade da chuva atinge milhares de famílias periféricas. O Jardim Pantanal, na zona leste da cidade, está entre os principais afetados. O prefeito Ricardo Nunes (MDB) e o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) ainda estudam como responder ao problema, e a Periferia em Movimento apresenta uma lista de grupos e organizações que estão arrecadando doações para as pessoas atingidas.
📮 Outras histórias
No centro de Porto Alegre, chegava a 61ºC a temperatura do piso de concreto do Parque Harmonia, no início da semana, segundo o Instituto Gaúcho de Estudos Ambientais (InGá). Em gramados sombreados por árvores ao redor do parque, os termômetros registravam 31ºC. O professor Paulo Brack, coordenador do InGá, explica ao Sul21 que a troca da vegetação por cimento no piso do Harmonia somada ao aquecimento global criou uma “ilha de calor” no centro da capital gaúcha. A concessionária do parque deveria repor a diversidade anterior de espécies, como figueiras, salgueiros, ingazeiros, entre outras árvores. “Para nossa surpresa, plantaram na área central somente uma espécie, o ipê-roxo, já comum na cidade”, lamenta.
📌 Investigação
Entre 2013 e 2022, o uso de agrotóxicos pelo agronegócio cresceu 191,5% no Maranhão. O estado foi o quarto na Amazônia Legal que mais adquiriu pesticidas no período e o segundo maior consumidor no Nordeste em 10 anos, mostra levantamento da InfoAmazonia, em parceria com o Portal Assobiar. Para aplicar os pesticidas, os fazendeiros recorrem à pulverização aérea, como no município de Açailândia, onde a soja representa 64,98% de toda a produção local. As famílias que vivem da agricultura no assentamento Novo Oriente, na região, relatam estar cercadas pelos agrotóxicos, com uma frequência de cada vez maior pulverização por drones. “Dormimos com veneno, acordamos com veneno, comemos com veneno. O veneno está na nossa água, no ar, em tudo”, afirma Adriana Oliveira, moradora da comunidade.
🍂 Meio ambiente
Sancionada em dezembro, a lei que cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões para regular o mercado de carbono no país prevê que no mínimo 5% dos recursos devem ser destinados a povos indígenas e tradicionais. Mas ainda não existem definições sobre como vai funcionar o modelo. O Joio e O Trigo lembra que o mercado de carbono tem um histórico de violações aos direitos às comunidades e destaca a necessidade de salvaguardas socioambientais. Entre elas, está a consulta prévia, livre e informada para a implementação dos projetos, além da garantia de segurança jurídica para a emissão desses créditos de carbono.
📙 Cultura
“A gente sai pra fazer nossa arte sem saber se vai ser linchada por algum ‘cidadão de bem’, mesmo que não esteja cometendo crime contra patrimônio público nem privado”, afirma a grafiteira Rosie, pioneira da cena feminina do grafite em Manaus (AM) desde 2003. A legislação brasileira reconhece a manifestação como oficial no país e determina que não é crime, desde que autorizada pelo proprietário do bem privado ou pelo órgão responsável pelo bem público. Apesar disso, os artistas continuam enfrentando perseguição, censura e violência policial. Segundo o Nonada, a própria Prefeitura de Manaus, por exemplo, publicou em suas redes sociais um pedido à população para denunciar a prática de grafite nas ruas, além de equipará-las erroneamente à pixação.
🎧 Podcast
Conceitos biológicos de raça que não se sustentam na ciência ajudaram a moldar o racismo na sociedade e serviram de base para a escravização de pessoas negras ao longo de séculos. A “Rádio Escafandro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, mergulha nesses conceitos para mostrar como uma ideia sem fundamento na biologia desenhou toda a história do Brasil e foi pilar estrutural de muitas esferas de poder. O Projeto Escravizadores, da Agência Pública, ilustra como essa construção se perpetua ainda hoje na genealogia dos que estão à frente dos centros de decisão do país: ao menos 33 políticos que foram presidentes, governadores e senadores desde a redemocratização teriam antepassados escravocratas.
✊🏽 Direitos humanos
“O doutor não queria atender o Basílio porque ele era indígena. Falou que ele tinha tuberculose, mas não nos explicou direito. Ele faleceu às 8h da manhã, mas só fomos informados pela assistente social às 22h. É muito triste, porque ele veio buscar uma vida melhor e acabou perdendo a vida”, relata Avilio Cardona Alvarez, primo de Basílio Cardona. Indígena do povo Warao e refugiado da Venezuela no Pará, Basílio morreu de tuberculose por descaso de profissionais de saúde. O Intercept Brasil revela que, por causa de discriminação e de barreiras linguísticas, essa população tem dificuldades para acessar atendimento médico adequado. O resultado é a alta incidência de doenças respiratórias e mortes entre a etnia no país. Segundo Avilio, a comunidade tem cerca de 700 imigrantes Warao. Só em 2024, oito morreram de pneumonia e tuberculose.