Um mês da emergência Yanomami e o roubo de bens culturais no Brasil
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🔸 Dois dias antes dos temporais no litoral norte de São Paulo, os governos federal e estadual, e também a Prefeitura de São Sebastião, foram alertados sobre o risco de desastre. A maioria dos habitantes da região, porém, afirma que não recebeu a informação das autoridades. São 50 as mortes confirmadas e cerca de 4 mil desabrigados que tiveram suas casas soterradas pelos deslizamentos de terra. O Nexo explica o que o governo estadual fez desde o alerta do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). A saber: enviou mensagens via SMS aos 34 mil moradores cadastrados no sistema da Defesa Civil de São Paulo. A região tem cerca de 288 mil habitantes. A reportagem também traça a relação da tragédia com as mudanças climáticas e os riscos na Serra do Mar.
🔸 O governo federal promete repassar R$ 120 milhões para ações na região que sofre as consequências do desastre, informa a CartaCapital. Segundo o ministro da Integração e Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, R$ 60 milhões já foram empregados e, a partir dos planos de ajuda humanitária e de reconstrução, outros R$ 60 milhões devem ser destinados ao litoral norte paulista. Em análise no Jota, Fábio Zambeli avalia que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem reforçando sua defesa do gasto social em meio à tragédia. O petista defendeu a flexibilização do teto de gastos e ligou a PEC da Transição, que permite quase R$ 200 bilhões de despesas extras em 2023, à dotação mínima para enfrentar calamidades. Ocorre que, em casos extremos como o do litoral norte de SP, é possível remover obstáculos jurídicos para redirecionar recursos, por exemplo, via medida provisória.
🔸 Garimpeiros atacaram ontem à noite uma base federal na terra indígena Yanomami, em Roraima. Armados, os criminosos atiraram contra agentes do Ibama que abordaram uma de suas embarcações. Na troca de tiros, um garimpeiro foi ferido e detido pela Polícia Federal. Segundo o Portal Terra, os bandidos desciam o rio Uraricoera em “voadeiras” carregadas de cassiterita, minério roubado da terra indígena. O objetivo da base instalada há duas semanas é justamente impedir a entrada de barcos com suprimentos e equipamentos para garimpo no território Yanomami.
🔸 “Continua, sim, tendo mortos. Hoje nós trouxemos quatro corpos de indígenas que morreram ontem no Hospital Geral. A crise não acabou, não. A saúde nem chegou ainda, não chegou assistência às comunidades. Estão impedidos [profissionais de saúde] de fazer missões porque tem muitos garimpeiros em muitas áreas ainda.” Pouco mais de um mês desde que o governo declarou emergência sanitária na terra Yanomami, Junior Hekurari, presidente do Conselho de Saúde Indígena, relata que a crise humanitária está longe de uma solução. A Agência Pública conversa com lideranças, mostra que faltam medicamentos e profissionais, além de atendimento em áreas às quais o governo nem sequer teve acesso. Há comunidades “fechadas”, como descreve Dario Kopenawa, pela presença de garimpeiros. Neste caso, existem populações sem atendimento há cerca de 30 anos.
🔸 Em imagens de satélite: a área do garimpo é ainda maior e causou três vezes mais destruição do que se supunha, segundo o novo monitor da mineração na Amazônia, o Amazon Mining Watch (AMW), desenvolvido pelo Pulitzer Center em parceria com a Earthrise Media, e revelado com exclusividade pela Repórter Brasil. A ferramenta identificou a destruição de 1.226 hectares de floresta amazônica na terra Yanomami. Já o Deter (Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real) registrou 418 hectares desmatados pelo garimpo. As imagens mostram do alto as crateras abertas pelos garimpeiros e como o cenário se transformou desde o avanço da mineração ilegal.
📮 Outras histórias
Uma iniciativa de redução de danos virou caso de polícia no Carnaval de Pernambuco. Fundada em 2019 para realizar campanhas nas ruas, eventos, formações e pesquisas sobre o uso problemático de drogas, a Escola Livre de Redução de Danos criou a ação “Fique Suave na Folia”, com uma casa no Centro Histórico de Olinda justamente para acolher pessoas nos dias da folia. O espaço, que contava com área para descanso, além de distribuição gratuita de água e kits de prevenção, foi alvo de uma denúncia e fechado na segunda-feira. O Marco Zero mostra como funciona a política de redução de danos e traz ainda uma entrevista sobre o tema com Luciana Espíndola, assistente social do Centro de Prevenção Tratamento e Reabilitação de Alcoolismo e do Hospital das Clínicas da UFPE.
Uma suástica na porta do elevador e cartazes em defesa do movimento negro rasgados. As moradoras da Casa da Estudante Universitária de Curitiba (CEUC), ligada à Universidade Federal do Paraná (UFPR), relatam que não é a primeira vez que o espaço é atacado. Keu Araújo, primeira pessoa negra a ocupar a presidência da CEUC, explica que, como não há câmeras, é difícil identificar a autoria do crime. O Plural ouve universitárias e trata sobre a investigação do caso. “Antes da pandemia, uma menina trans negra saiu da casa porque não aguentou. Ela era perseguida pelos corredores. A gente se sente muito coagida e silenciada”, conta a estudante de Administração, Nayra Fátima de Quadros, 19 anos.
📌 Investigação
Festa da colheita em área embargada. Os ex-ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e da Agricultura, Tereza Cristina, foram até a Terra Indígena (TI) Utiariti, município de Campo Novo dos Parecis, no Mato Grosso, para uma festa com indígenas pela colheita de soja, no dia 13 de fevereiro de 2019. O problema, como informa O Joio e O Trigo, é que toda a comemoração era ilegal. Em maio de 2018, cinco áreas das terras indígenas das etnias Pareci, Manoki e Nambikwara haviam sido embargadas. Os proprietários foram multados por desmatamento sem licenciamento ambiental, por plantio de soja transgênica e por arrendamento de terras para não indígenas. A reportagem, primeira da série “O Feroz e o Encantado” sobre o avanço do agronegócio nas TIs, lembra que o governador do estado, Mauro Mendes, e o então diretor de Proteção Ambiental (Dipro) do Ibama, major Olivaldi Azevedo, também estavam presentes e que uma servidora enviou um ofício ao órgão alertando sobre a situação da área dias antes do evento.
🍂 Meio ambiente
No governo do estado desde 2007, o PT na Bahia está longe de proteger o meio ambiente. De acordo com comunidades tradicionais e ambientalistas, os antecessores do atual governador Jerônimo Rodrigues deram exemplo de má gestão ambiental, com o avanço da destruição do Cerrado e da Mata Atlântica. O Eco revela que fazendeiros se apossam de territórios tradicionais, causam pânico, fraudam documentos e conseguem outorgas de uso de água com o governo baiano. Diante do silêncio de Jerônimo Rodrigues sobre o tema, a sociedade civil tem cobrado um maior alinhamento do petista com a política ambiental promovida pelo governo federal.
O petróleo “sujo” dificilmente vai sumir do mercado. O relatório da consultoria Wood Mackenzie aponta que o petróleo de “alta qualidade” – aquele com menor teor de emissão de carbono e custos menores – é escasso no mundo, dificultando a transição energética. A agência epbr detalha as informações do documento e mostra que o Brasil continua atraindo petroleiras multinacionais. Pressionadas por acionistas e pela sociedade para descarbonizar seus negócios, elas justificam os investimentos no pré-sal por produzir barris menos poluentes.
📙 Cultura
O Brasil está entre os países com maior número de bens culturais roubados e com baixa taxa de recuperação. Entre esculturas sacras do século 17, mapas antigos e telas de Picasso, Monet e Portinari, o país tem cerca de 1900 itens do patrimônio cultural perdidos, segundo o Banco de Dados de Bens Culturais Procurados do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O Nonada retrata o funcionamento das engrenagens do tráfico de bens culturais e traz o estudo publicado pelo Conselho Internacional de Museus (Icom), o primeiro do Brasil a listar itens em perigo.
Comunidades de samba das quebradas vão muito além do Carnaval e atuam o ano todo em seus territórios como espaços de referência cultural para os moradores das periferias de São Paulo. O Desenrola e Não Me Enrola reúne três dessas iniciativas: a Associação Filhos do Zaire, do bairro Jardim Matarazzo, na zona leste; o Bloco do Beco, do bairro do Jardim Ibirapuera, na zona sul; e o Samba do Congo, da Brasilândia, na zona norte. “Hoje atuamos em diversas frentes e trabalhamos todos os dias para construir um espaço de educação integrada, enxergando a cultura como potência transformadora”, afirma Sabrina Lana, integrante do Bloco do Beco.
🎧 Podcast
Como a diversidade pode se desenvolver no jornalismo independente? Esta questão norteia o novo episódio do podcast #diversifica, produção do Portal dos Jornalistas e da Rádio Guarda-Chuva. A apresentadora Luana Ibelli conversa com a jornalista Joana Suarez, fundadora da Redação Virtual, uma rede de conexão entre repórteres freelancers no Brasil, para abordar a equidade e a inclusão. “A primeira vantagem que vi nesse mercado era de poder chegar a pessoas que estavam em vários lugares do país e com perfis diversos de raça, gênero, sexualidade e também de regionalidade. Não tem como se dizer um jornalismo independente reproduzindo padrões da mídia tradicional”, diz.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
A onda de médicos e nutricionistas influencers extrapola os limites da ética profissional. De dicas de dieta a lives sobre alimentação contra câncer ou problemas de pele, o Instagram se tornou uma espécie de catálogo médico. Há aqueles cujo nome do perfil aparece até no carimbo de receituário. Segundo o Núcleo, embora sejam muito populares, publicações comparando os resultados de um processo de emagrecimento ou de um tratamento estético, conhecidos como “antes e depois”, são vetadas pelos Conselho Federal de Medicina e pelo Conselho Federal de Nutrição.