Os testes da escala de trabalho 4x3 e as barragens de minérios na Amazônia
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🔸 “Gente, eu estou aqui revoltado com essa escala 6 por 1. Eu tô querendo saber quando é que nós, da classe trabalhadora, iremos fazer uma revolução neste país relacionada à escala 6x1. É uma escravidão moderna.” As falas de Rick Azevedo num vídeo do TikTok em 2023 mudariam sua vida e teriam impacto em todo o país. A postagem do então caixa de farmácia viralizou e deu início ao movimento Vida Além do Trabalho (VAT), em defesa do fim da escala de seis dias de trabalho para apenas um de folga. A revista piauí perfila Azevedo, que se tornou vereador do Rio de Janeiro e símbolo do movimento pela redução da jornada exaustiva no Brasil. O movimento liderado por ele ganhou força com o apoio da deputada Erika Hilton (PSOL-SP), que apresentou em 2024 uma proposta de emenda constitucional para mudar o artigo 7º da Constituição e permitir a jornada 4x3.
🔸 Em áudio: em agosto do ano passado, 19 empresas do Brasil testaram o modelo 4 por 3 durante seis meses. Os resultados da pesquisa, feita em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, mostraram que os funcionários trabalharam mais e melhor: o engajamento nas tarefas subiu 60% e a capacidade de criar soluções subiu 80%. Os dados estão no “Bom Dia, Fim do Mundo”, podcast da Agência Pública, com Giovana Girardi, Marina Amaral e Ricardo Terto. Eles lembram ainda que a redução do número de dias trabalhados na semana leva à diminuição do consumo de energia e pode ser uma estratégia relevante diante da intensificação do calor extremo em meio às mudanças climáticas.
🔸 A propósito: as decisões do Supremo Tribunal Federal sobre “pejotização” tornam a CLT opcional para empregadores. É o que afirma Cássio Casagrande, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT). Em entrevista à Repórter Brasil, ele alerta que a posição do ministro Gilmar Mendes – que nos últimos dois anos têm anulado o reconhecimento do vínculo empregatício em casos de pejotização – desregula o mercado, desestimula a formalização e ameaça a Previdência, além de impedir o acesso de trabalhadores à Justiça. Casagrande critica o Supremo por “legislar” ao ampliar a terceirização além do que previa a reforma trabalhista de 2017. Segundo ele, nove dos 11 ministros da Corte já têm decidido monocraticamente a favor da pejotização, o que pode se confirmar em plenário e resultar no que ele classifica como uma “catástrofe fiscal, social e trabalhista”.
🔸 Apenas três mulheres e 130 homens. Esta é a composição da nova diretoria da Fiesp, a Federação da Indústria do Estado de São Paulo. Liderada por Paulo Skaf, a chapa deve presidir a organização no mandato de 2026 a 2029. O Reset destaca que o segmento industrial tem uma proporção menor de mulheres, quando comparado à média da força de trabalho nacional: 25% versus 43%, segundo o IBGE. “Estamos falando de segmentos em que homens são maioria, mas onde também há mulheres. Quando há apenas um perfil tomando decisões que afetam pessoas de vários perfis, o risco de as decisões serem indiferentes é grande, sem conexão com a base”, diz Renata Moraes, fundadora de uma consultoria de diversidade. Já a Fiesp afirma ter um Conselho Superior Feminino com programas de mentoria, mas ações com orçamento próprio são exceção no setor.
📮 Outras histórias
Sacerdotisa mais velha em atividade em Aracaju, Mãe Marizete Silva Lessa, a Oyá Matamba, completa 95 anos em 13 de maio. Há mais de quatro décadas, ela comanda o terreiro Abassá São Jorge, que herdou da tia, Nanã Manadeuí, uma das maiores referências do candomblé sergipano. “Minha herança é meu candomblé”, afirma Mãe Marizete. A Mangue narra a trajetória da sacerdotisa, que testemunhou as perseguições do Estado Novo contra o povo de axé no território sergipano. “Era cavalaria na porta dos terreiros. O povo era obrigado a ir andando pra delegacia com os barros e as pedras na cabeça. Não podia tocar, a gente fazia as coisas batendo palma e baixinho. A gente sofria demais”, lembra. A memória afiada e a fala firme marcam sua liderança no terreiro: “Eu sou danada, eu sou de Oyá, comigo só Deus. Aqui quem faz tudo sou eu. Quem faz filho de santo, quem faz reza, tudo aqui sou eu”.
📌 Investigação
Das 371 barragens de mineração na Amazônia, 171 (ou 46%) estão em estado de emergência – com falhas físicas, como corrosão, erosão e desgaste de materiais – ou classificadas como risco médio ou alto de atingir comunidades e causar danos em caso de rompimento. A partir de dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), a InfoAmazonia analisou os empreendimentos minerários na região. Em caso de rompimento, os rejeitos podem se espalhar por uma área de 590 km² – o equivalente a mais de duas cidades de Porto Alegre (RS). A lama tóxica atingiria cidades como Barcarena (PA), Almeirim (PA), Parauapebas (PA) e Pedra Branca do Amapari (AP), além de 345 km² de floresta e três comunidades quilombolas, onde vivem mais de 400 famílias. O Pará é o estado com maior risco de impacto, com 409,48 km² na mira dos rejeitos – uma área equivalente a 40% da capital Belém.
🍂 Meio ambiente
“Entre 2020 e 2025, foi o epicentro da crise climática no Rio Grande do Sul, com secas extremas em pelo menos alguma localidade do estado. Calculamos uma perda de aproximadamente R$ 20 milhões apenas para a agricultura familiar”, afirma o engenheiro agrônomo Adrik Richter, da Federação dos Trabalhadores da Agricultura no Rio Grande do Sul. O Colabora explica que o estado tem vivido eventos extremos, entre temporais e enchentes históricas, como a de 2024, mas também com secas recordes. “A tendência das chuvas daqui pra frente é que elas sejam muito mal distribuídas. Vamos ter chuvas intensas em curtos espaços de tempo. Isso favorece esses eventos de inundação, escancara os problemas de drenagem urbana que afetam a mobilidade, afeta também a agricultura também, porque chove muito e em curtos espaços de tempo depois são vários dias sem eventos de precipitação. Essa é a tendência: essa irregularidade”, ressalta a meteorologista Eliana Klering.
📙 Cultura
O mestre ceramista Joel Galdino é o último filho vivo de Mestre Galdino, um dos mais importantes ceramistas do Brasil. Seu pai faleceu em 1996 e deixou a Joel as técnicas de um estilo único de arte popular típico de Caruaru, no Agreste Pernambucano. O Nonada conta que a importância histórica do Mestre Galdino não se traduziu em garantias financeiras para o filho que guarda seu legado. Atualmente, Joel não tem nenhuma obra do pai e vive em condições de vulnerabilidade social. Apesar de o barro significar memória, sustento e resistência para o ceramista, as condições lhe obrigam a vender as obras por valores ínfimos. “Já fiz 10 Mané Pãozeiros e tive que vender a R$ 10 cada, por necessidade. Depois soube que foram revendidos por R$ 300 numa galeria em Recife. Fico desgostoso, mas precisava do dinheiro. Aqui no Alto do Moura, o povo sabe o valor. Mas se aproveita. Porque sabe que eu passo necessidade”, afirma.
🎧 Podcast
Há um ano as águas do rio Guaíba ultrapassaram a marca de cinco metros, número nunca visto em cem anos de registros históricos – incluindo a enchente de 1941– e submergiu Porto Alegre. O primeiro episódio do “Fim do Futuro”, produção do Matinal, em parceria com o Vós Social, destrincha o início do evento extremo histórico no Rio Grande do Sul, explicando os fatores socioambientais que o desencadearam, como a produção de massas de ar quentes devido ao desmatamento em proporções continentais no Brasil. Foi esse fluxo que já circulava pelo país que colidiu com a massa de ar fria que veio do sul do continente, causando as chuvas. Diferente de 1941, a capital gaúcha tinha, em 2024, um sistema contra cheias, com manutenção negligenciada, que deveria conter o Guaíba até os seis metros, mas não funcionou. A consequência foi um desastre sem precedentes.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Sob o ideal de que homens “encontrem sua melhor versão”, o grupo Legendários, tem ganhado popularidade nas redes sociais devido à adesão de políticos e influenciadores ao reforçar papéis de gênero conservadores. Em coluna na revista AzMina, Maria Paula Monteiro analisa como o grupo usa a “reabilitação” de homens por meio de um discurso misógino. “O Legendários promete reconciliar casais e restaurar o caráter masculino, seguindo a ideia de que é preciso ‘valorizar’ a esposa que ‘edifica o lar’. Ou seja: existe um respeito que é conquistado a partir do comportamento das mulheres, se for adequado aos papéis tradicionais de gênero, segundo os homens. O movimento acredita que é preciso recuperar os moldes dos casamentos dos anos 1950”, explica a jornalista e pesquisadora.