As tensões do novo governo e a torcida organizada de mulheres no Ceará
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🔸 “O que vivemos nesses anos que se passaram foi um completo desrespeito com o patrimônio ambiental brasileiro. Povos indígenas e quilombolas sofreram a invasão de suas terras e territórios. Nossas unidades de conservação foram atacadas por pessoas que se sentiam autorizadas pelo mais alto escalão do governo. Boiadas se passaram no lugar onde deveriam apenas passar políticas de proteção ambiental.” Havia fila ontem no Palácio do Planalto para ouvir o discurso de Marina Silva, que tomou posse como ministra do Meio Ambiente. O Sul21 repassa os principais anúncios feitos por ela na cerimônia, como a restauração da Secretaria Nacional de Mudança Climática e a criação de um conselho de mesmo tema, a ser comandado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
🔸 A propósito do meio ambiente: o Fundo Amazônia foi reativado por decreto na segunda-feira. Mas só isso não basta. Para que o Brasil possa receber os aportes de Alemanha e Noruega,o governo Lula terá de negociar juridicamente com o BNDES. Isso porque, como explica O Eco, contratos de projetos importantes financiados pelos recursos internacionais – de combate ao fogo e fiscalização ambiental, por exemplo – perderam vigência e não foram renovados na administração de Jair Bolsonaro (PL). Especialista ouvido pela reportagem afirma que a avaliação dos projetos pelo fundo costuma ser lenta e que, por isso, a saída mais rápida seria tentar um aditivo nos contratos existentes. Resta saber se há previsão legal para seguir esse caminho.
🔸 Numa semana marcada por cerimônias e discursos dos novos ministros, surgem as primeiras divergências. A crítica à Reforma da Previdência feita por Carlos Lupi em sua posse como ministro da Previdência Social bateu mal em Rui Costa, da Casa Civil. Lupi classificou como “antirreforma” o texto aprovado no governo Bolsonaro e defendeu a criação de uma comissão para discutir mudanças. Costa rebateu ontem, como mostra a CartaCapital. Afirmou que não há qualquer proposta para alterar reformas, seja ela previdenciária ou outra.
🔸 As divergências estarão na mesa na primeira reunião ministerial, marcada para amanhã. Segundo o Metrópoles, o próprio ministro Rui Costa disse que o encontro servirá para unificar as ideias do primeiro escalão do governo. Simone Tebet, à frente do Planejamento, disse que a reunião deixará claro o posicionamento de Lula: “O foco é o plano de governo do presidente. (...) E assim que começar a andar a administração, todas essas coisas vão ser acomodadas”.
🔸 As primeiras tensões internas do novo governo foram expostas não só pela discordância entre Rui Costa e Carlos Lupi, mas também pelo vínculo da ministra do Turismo, Daniela Carneiro, com milicianos. O podcast Durma com Essa, do Nexo, lembra ainda que Marina Silva, no Meio Ambiente, terá de lidar com Carlos Fávaro, na Agricultura, relator no Senado de um projeto de lei apelidado por ambientalistas de PL da Grilagem.
🔸 “A ideia de que o governo vai ser mais à esquerda, no espectro político, é completamente equivocada. Lula vai buscar puxar para o centro o Parlamento, que está à direita, e buscar pacificar a sociedade que votou nessa direita mais radicalizada. Vai precisar de muito equilíbrio.” O analista político Antonio Augusto de Queiroz, que há quatro décadas acompanha as relações entre Congresso e Palácio do Planalto, afirma que a tendência é que o governo seja social-democrata, mais de centro. Em entrevista ao Congresso em Foco, ele também defende que, embora existam 204 opositores na Casa, o cenário hostil poderá ser “facilmente revertido”. Para ele, o pragmatismo dos partidos tende a “abafar a direita mais barulhenta e radical”.
📮 Outras histórias
Enquanto as taxas de vacinação desabam pelo país, uma cidade na Paraíba foge à regra: o município de Cuité de Mamanguape quase dobrou a cobertura global das vacinas de rotina em menos de um ano, passando de 32% em 2021 para 59% em 2022. O aumento é resultado do Projeto pela Reconquista das Altas Coberturas Vacinais, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que contemplou 25 municípios da Paraíba, e da iniciativa do governo estadual em expandir para os 223 municípios do estado. O Paraíba Feminina detalha o projeto que pode servir de modelo para o novo governo.
📌 Investigação
Sonho de Carlos Drummond de Andrade, o Arquivo-Museu de Literatura Brasileira (AMLB), vinculado à Fundação Casa de Rui Barbosa, completou 50 anos em dezembro passado em meio a uma crise sem precedentes na instituição. Desde 2019, a casa, que abriga documentos e manuscritos de autores como Vinicius de Moraes, Clarice Lispector, Pedro Nava, Lúcio Cardoso e o próprio Drummond, vinha sendo presidida por Letícia Dornelles, indicada pelo pastor e deputado Marcos Feliciano (PL-SP). A revista Quatro Cinco Um revela os motivos que jogaram o órgão em um espiral de instabilidade, com a exoneração de especialistas dos cargos de chefia, aposentadorias em massa e até um projeto para extingui-la.
🍂 Meio ambiente
Pela primeira vez, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados sobre cor e raça de produtores agropecuários e extrativistas brasileiros. Autodeclarados pretos e pardos são 54,4% dos proprietários de estabelecimentos de agricultura familiar do país, mas são os que têm menos terras – quase 70% das propriedades de produtores negros têm uma área de menos de 0,1 hectare, enquanto 79% das de pessoas brancas têm 10 mil hectares de área ou mais. A Alma Preta lembra que a ineficiência de políticas públicas de crédito e de regularização fundiária deixa agricultores negros em situação de vulnerabilidade.
Planta nativa do Brasil, o jaborandi é a única fonte natural de pilocarpina, substância utilizada no tratamento de doenças oculares como o glaucoma. Embora seja cultivada pela indústria farmacêutica, as folhas do jaborandi de ambiente natural apresentam um teor três vezes maior da substância. É o que revela a pesquisa do Instituto Tecnológico Vale e da Universidade Federal Rural da Amazônia que coletou amostras de 82 plantas na Floresta Nacional de Carajás, no Pará, analisou os níveis de pilocarpina e as condições de solo. A Agência Bori apresenta as conclusões do estudo sobre a planta, que está ameaçada de extinção.
📙 Cultura
Artistas visuais, escritores e pesquisadores do Brasil foram influenciados pela obra de bell hooks, cuja morte completou um ano em dezembro. Nascida nos Estados Unidos, hooks foi uma das maiores teóricas do feminismo negro e trouxe uma nova perspectiva sobre a construção de afetos. O Nonada reúne histórias de pessoas que tiveram seus trabalhos impactados pelo conhecimento da obra dela, como Alan Ribeiro, professor da Universidade Federal do Oeste do Pará, que pesquisou masculinidades negras. “Intelectuais como bell hooks e Patricia Collins me ajudaram a compreender como a macheza e a pobreza se relacionam com o racismo”, conta.
Importante liderança religiosa de matriz africana, Mãe Hilda Jitolu completaria 100 anos amanhã. Para comemorar o centenário da matriarca baiana, que contribuiu para a valorização da cultura afro-brasileira, o Instituto da Mulher Negra Mãe Hilda Jitolu vai lançar um selo comemorativo, criado pelo artista plástico Wilton Bernardo, para homenageá-la, com transmissão ao vivo. O Portal Todos Negros do Mundo narra como o instituto trabalha para promover o legado de Mãe Hilda Jitolu.
🎧 Podcast
O último episódio da temporada Leia África, do podcast Põe na Estante, produção da Rádio Guarda-Chuva, pousa no livro “O caminho de casa”, de Yaa Gyasi, escritora nascida em Gana, porção ocidental do continente. A história gira ao redor de duas irmãs que não se conhecem: uma é entregue para o casamento com um colonizador inglês, e a outra é sequestrada, escravizada e levada aos Estados Unidos. Ao longo do episódio, a jornalista e apresentadora do podcast Gabriela Mayer, a historiadora Bruna Barbosa e o editor Marcelo Nardeli mergulham na narrativa em pontos como ramificações familiares, construção de identidade, liberdade e direito de existir.
🏃🏾♂️ Esportes
De 1941 a 1983, as mulheres eram proibidas de jogar futebol com base em uma lei que vetava a prática de “esportes considerados masculinos ou incompatíveis com as condições de sua natureza”. Esse histórico contribuiu para o estereótipo masculinizado do público de futebol até os dias de hoje, em que torcedoras ainda enfrentam machismo até das próprias direções dos clubes. É o caso do Torcedoras Raiz, torcida organizada feminina do Ceará, como conta o Marco Zero. “Eles não buscam nenhum tipo de contato ou interlocução que aproxime a torcida feminina do clube, sempre há um distanciamento. É difícil até mesmo construir uma relação com os jogadores. O Ceará não sabe trabalhar com a torcida feminina, que é a primeira do estado”, relata Bruna Alves, conselheira da organização.