Os robôs da Meta que simulam crianças e o acesso à educação infantil
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🔸 A Câmara dos Deputados aprovou ontem a urgência do Projeto de Lei 2.628/2022, que trata da proteção de crianças e adolescentes em ambientes virtuais. A proposta prevê a criação de um “ECA digital”, em referência ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). O Terra conta que a base do governo na Câmara apoia o projeto, enquanto Marcel Van Hattem, líder do Novo, afirmou que a oposição será contrária ao texto, sob a alegação de que ele avança sobre as liberdades do cidadão. “É algo imoral que a gente não consiga fazer uma legislação que minimamente proíba, que pedófilos, que pessoas ganhem dinheiro com isso”, disse Lindbergh Farias, líder do PT na Casa. A proposta, sob relatoria do deputado Jadyel Alencar (Republicanos-PI), estabelece que plataformas acessadas por crianças e adolescentes têm o dever de evitar que estes usuários sejam expostos a conteúdo nocivo, como abuso sexual, pornografia, violência física e incentivo ao vício, com publicidades de jogos de azar, bebidas alcoólicas e cigarros.
🔸 A Advocacia-Geral da União (AGU) notificou a Meta para retirar do ar e impedir a criação de chatbots com características infantis e erotizadas disponíveis no Meta AI Studio. A medida foi motivada por testes feitos pelo Núcleo que identificaram conversas de teor erótico com inteligências artificiais que simulavam ser crianças. O Mobile Time explica que o pedido do órgão vem também na sequência do vazamento de documentos internos da Meta, revelados pela Reuters, que mostraram que a empresa admitia que seus assistentes de IA poderiam manter diálogos românticos ou sensuais com crianças, além de gerar conteúdos racistas ou informações médicas falsas.
🔸 A propósito: “Um adolescente de 13 anos tem o dever de ser o único responsável por tudo aquilo que vê sem qualquer moderação da plataforma?”, questiona Viviane Ceolin Dallasta Del Grossi, defensora pública federal e pesquisadora sobre os impactos do ambiente digital e da IA na vida de crianças e adolescentes. Especialistas ouvidos pelo Núcleo alertam que as regras da IA da Meta não protegem esse grupo, já que os termos de uso e a política da empresa transferem a responsabilidade aos usuários, sem garantir um ambiente seguro. Outro problema é a privacidade: os termos permitem compartilhamento de dados com terceiros sem clareza de uso, o que especialistas consideram uma violação da Lei Geral de Proteção de Dados e de uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). “É injusto e perverso colocar essa responsabilidade apenas no colo das famílias”, completa a defensora pública.
🔸 Falando em IA… “Sem confiança entre humanos, a IA refletirá nossos piores instintos.” A afirmação é do filósofo e historiador Yuval Noah Harari, que participou ontem de evento em São Paulo. Autor de best-sellers como “Sapiens” e “Homo Deus”, ele define a IA como “inteligência alienígena”, regida por lógicas que escapam ao raciocínio humano, e, ao mesmo tempo, “filha da humanidade”. A Fast Company Brasil detalha os conceitos apresentados por Harari e lembra que, segundo ele, o desafio das próximas décadas não é apenas tecnológico, mas ético e coletivo: “A IA é o filho da humanidade, e somos uma família disfuncional”, resume o filósofo.
🔸 Criador do termo BRIC, Jim O’Neil afirma que os ataques tarifários de Donald Trump podem acabar incentivando os países do bloco de mercados emergentes a agir de forma mais coordenada. Em entrevista ao Jota, o ex-economista chefe do Goldman Sachs diz que já esperava a política de tarifas de Trump, mas se surpreendeu com a escala aplicada a atacar países como o Brasil. O’Neil vê uma oportunidade para o bloco: negociar mais em moedas locais. “Se a própria China e a Índia, dentro do BRICS, realmente usassem isso como uma oportunidade para tentar fazer mais comércio com menos tarifas entre si, funcionaria, porque esses dois países são grandes e ainda estão crescendo bastante. Isso também funcionaria como um incentivo para outros países ocidentais e países em desenvolvimento se concentrarem em fazer mais comércio com eles e se interessarem menos pelos EUA”, explica.
📮 Outras histórias
Do Complexo do Alemão aos palcos internacionais, os irmãos Gabriel e Natanael Paixão construíram uma história na música clássica. Os dois eram crianças quando começaram a se apresentar na Estação Palmeiras do teleférico do complexo de favelas, na zona norte do Rio de Janeiro. Foi ideia do pai que os dois tocassem ali, para aproveitar o fluxo de turistas e ajudar com as despesas de casa. O Voz das Comunidades narra a trajetória dos irmãos Paixão, parceiros de longa data do jornal comunitário. Aos 23 anos, Gabriel é violinista da Orquestra Sinfônica Jovem do Rio, enquanto Natanael, 25 anos, estuda na França. Ele, aliás, defende o investimento em jovens talentos da comunidade: “Quem diria que eu, uma criança do Alemão como qualquer outra, iria direto na França? Hoje, falo francês e toco viola clássica de arco”.
📌 Investigação
Banco público do estado de Sergipe, o Banese vai esconder por pelo menos 20 anos os detalhes do contrato firmado com um consórcio de empresas responsável por gerir os serviços da Lotese, uma loteria local. Lançada em maio, a plataforma começou oferecendo cassinos virtuais, com 600 tipos de jogos nas modalidades de cota fixa (jogos online), prognóstico numérico (quando o apostador tenta acertar os números que serão sorteados) e instantâneos (conhecidos como “raspadinhas”). A Mangue conta que os pedidos de Lei de Acesso à Informação (LAI) sobre os contratos relacionados à Lotese foram negados. O banco alegou “sigilo comercial” sem indicar o grau de confidencialidade e o prazo da restrição. Apesar dos contratos administrativos serem, como regra, públicos, e o sigilo, uma exceção, o Banese vai manter as informações na sombra pelo menos até o fim do contrato com as empresas – ou seja, os detalhes de uma operação pública que movimentará milhões de reais e destinará parte dessa arrecadação aos cofres do Estado só poderá ser descoberta em duas décadas.
🍂 Meio ambiente
“Quem é preto, pobre e marginalizado não pode continuar sendo colocado na esteira para morrer primeiro. É preciso cobrar dos governadores respostas que não sejam só emergenciais, mas obrigatórias diante do avanço climático”, afirma a pesquisadora, ativista e ambientalista Thaynah Gutierrez sobre a necessidade de luta por justiça ambiental. O Desenrola e Não Me Enrola ouviu especialistas e lideranças que defendem a adaptação climática com as pessoas e os territórios como prioridades. “Se nos reconectarmos com as tecnologias naturais, talvez o mundo tenha a possibilidade de se regenerar e de se reconstituir. Esperançar é um verbo que deve ser conjugado por todos, mas precisamos buscar a semeadura dentro das nossas palavras e dentro das nossas ações”, diz Cristiane Takuá, ativista, educadora e pesquisadora indígena da etnia Maxakali.
📙 Cultura
Em vídeo: o Axé Ilê Obá foi o primeiro terreiro reconhecido como patrimônio pelo estado de São Paulo. Localizado no Jabaquara, distrito da zona sul de São Paulo conhecido por ter sido um quilombo, o espaço completa agora 75 anos de fundação e 35 de reconhecimento pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico. A Agência Mural resgata a história de resistência e ancestralidade do terreiro. “A importância do tombamento foi principalmente para a questão imaterial, cultural e histórica do rito e da tradição, mas também material, não só arquitetonicamente: todos os fundamentos e elementos da casa são tombadas, como as casas, espaços sagrados e quartos de orixás. Isso nos garante tanto a existência e manutenção do culto quanto o poder da resistência”, afirma Mãe Paula de Iansã, Ialorixá do Axé Ilê Obá há 11 anos e sobrinha neta do Pai Caio de Xangô, fundador da Casa. Atualmente, o local recebe cerca de 400 pessoas por mês em festividades, cultos aos orixás e consultas de búzios.
🎧 Podcast
“Precisamos deixar o estigma de que algumas pessoas são adequadas para uma área do conhecimento. A matemática é ensinada de uma maneira que não estimula a pensar de uma forma criativa e apenas como um conjunto de regras. Isso não ajuda a entender que a matemática tem um potencial de modelagem e aplicação nas coisas do mundo real”, afirma o estatístico Hugo Carvalho, professor e pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). No “Diálogos com a Inteligência”, produção do Canal Meio, ele debate a percepção da matemática e da estatística como áreas difíceis e desconstrói o conceito de “ciências exatas”.
👩🏽🏫 Educação
A desigualdade de acesso à educação infantil aumentou entre famílias de alta e baixa renda nos últimos anos. A diferença entre os 20% mais ricos e mais pobres era de 22% em 2016 e subiu para 29,4% em 2024. Os dados são do estudo “Panorama do Acesso à Educação Infantil no Brasil”, realizado pela organização Todos pela Educação, com base nas informações da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios Contínua (Pnad-C). O Porvir destaca ainda que o país não conseguiu alcançar as metas do atual Plano Nacional de Educação (PNE), em vigência até o fim deste ano. O objetivo era que 50% das crianças de 0 a 3 anos estivessem em creches, e o número foi de 41,2% em 2024. Já na pré-escola, a meta era de que 100% das crianças de 4 a 5 anos estivessem estudando, e o percentual atingido foi de 94,6%