O risco do policialismo nas eleições e a censura a artistas no Brasil
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🔸 Machismo na Wikipedia. “As mulheres não serão melhores que os homens”, dizia o início do verbete “Dia Internacional da Mulher” na maior enciclopédia virtual do mundo. A frase, classificada como vandalismo como são as inserções mal intencionadas na plataforma, ficou no ar por alguns minutos até ser removida por um editor voluntário. O Aos Fatos revela que os ataques a verbetes ligados a questões de gênero, embora mais frequentes no mês de março, acontecem o ano todo. Nos últimos cinco anos, aliás, a reportagem identificou 106 episódios de vandalismo em nove dos dez principais verbetes em português sobre gênero. Em 80% dos casos, o conteúdo inserido é machista, misógino ou transfóbico.
🔸 Misoginia na IA. Quando se pede ao Copilot, serviço inteligência artificial da Microsoft, para criar uma imagem de pessoas cuidando de idosos, o que se vê são mulheres. Quando o pedido é para desenhar alguém em cargo de liderança, a ferramenta sugere… homens. Além do Copilot, a Lupa testou os serviços da Adobe (Firefly) e o Midjourney, o único pago entre os três incluídos no experimento. O campeão de estereótipos de gênero é o serviço da Microsoft (58%), seguido pelo Midjourney (47%) e Firefly (11%). Como todos se baseiam em conjuntos de dados históricos, refletem o sexismo e racismo estrutural. O Midjourney, por exemplo, retratou pessoas negras em apenas um dos 76 desenhos gerados nos testes.
🔸 Policialismo nas eleições. Em 2020, profissionais de segurança pública conseguiram 50 prefeituras e 809 cadeiras em câmaras municipais. A tendência deve se repetir no pleito de 2024. É motivo de preocupação, como afirma ao Congresso em Foco a socióloga e jurista Carolina Ricardo, diretora do Instituto Sou da Paz. Para ela, o maior perigo diz respeito ao conflito de interesses, “quando se usa o trabalho como policial muito mais para fins eleitorais do que para a segurança pública”. O resultado é a desprofissionalização das forças de segurança em favor de interesses políticos pessoais, além de um risco para a democracia. “Quando se tem uma ingerência política nessas forças, a primeira coisa que se perde é o caráter democrático do monopólio do uso da força. Ele passa a servir a discursos autoritários”, completa.
🔸 Falando em eleições: qual é o tamanho de Lula e Bolsonaro nas eleições municipais? Os eleitores mostram uma preferência apertada quando se trata do alinhamento político de prefeitos e vereadores, segundo pesquisa Atlas. A CartaCapital detalha o levantamento e mostra que 39,1% dos entrevistados dizem preferir candidatos que se digam alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e 37,8% preferem candidatos alinhados ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Apenas 23% dos eleitores afirmam não ter preferência por uma aliança política, seja com Lula, seja com Bolsonaro.
🔸 Em meio à vacinação contra a dengue, o governo federal vai monitorar o conteúdo antivacina nas redes sociais em tempo real. Documentos obtidos pelo Núcleo via Lei de Acesso à Informação (LAI) apontam que serão monitorados YouTube, Telegram, Instagram, Facebook, Google, Twitter/X e WhatsApp. Em parceria com Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), o trabalho vai custar R$ 12,1 milhões. Entre as nove metas estabelecidas, estão a elaboração de relatórios sobre conteúdos antivaxx nas redes e estudos sobre “debate digital e hesitação vacinal” que possam orientar políticas públicas.
📮 Outras histórias
A laje é o playground da favela. Assim o Fala Roça define a área da casa que, há muitas gerações, é o espaço de lazer das famílias nas comunidades. “Eu costumo fazer festa aqui [na laje], de São João, Carnaval, a gente junta os amigos e faz a farra até o amanhecer”, conta Maria José Nascimento, conhecida como Fia, de 57 anos e moradora da Dioneia, na Rocinha, favela na zona sul do Rio de Janeiro. A laje também é lugar de memórias: “Aprendi a soltar pipa com meu pai, tive poucos momentos com ele e esse foi um dos momentos que ficou gravado”, diz Carlos Oliveira, de 27 anos, que hoje usa a laje para tomar sol e reunir a família na piscina nos dias mais quentes. Há ainda as lajes que abrigam importantes projetos sociais e que são referências na comunidade.
📌 Investigação
Entre 2006 e 2020, as vendas de fórmulas infantis comuns cresceram 7,5 vezes no Brasil, alcançando R$ 2,3 bilhões ao ano. A indústria driblou a Lei nº 11.265, de 2006, que proibiu a publicidade de fórmulas que substituem o leite humano na alimentação de bebês de até seis meses e criou restrições no caso de produtos voltados a bebês maiores. Segundo O Joio e O Trigo, as empresas investiram em mercadorias enquadrados de forma mais leve, como fórmulas especializadas, compostos lácteos e produtos para crianças mais velhas, além de desenvolver um marketing cada vez mais sofisticado e cooptar profissionais de saúde, como pediatras, para a desnormalização da amamentação.
🍂 Meio ambiente
Com apenas 13.063 habitantes, Cotegipe, no oeste baiano, foi a líder em área total desmatada no Cerrado em janeiro de 2024. Antes disso, o município nem sequer aparecia entre os dez maiores desmatadores. A Eco Nordeste explica que Cotegipe está localizada na região do Matopiba – Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia –, e os dados podem significar uma abertura de novas áreas para a produção de commodities. “É um município sem tanta tradição de altos níveis de desmatamento e de agricultura comparado a outros da região, acabamos suspeitando de um indicativo de expansão do agronegócio para novas áreas”, afirma Fernanda Ribeiro, coordenadora do Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado (SAD Cerrado).
📙 Cultura
Da “Queermuseu” a “O Avesso da Pele”, foram mapeados pelo menos cem casos de censura direta a artistas nos últimos anos pelo Observatório da Censura à Arte. Já o Mapa da Censura do Movimento Brasileiro pela Liberdade de Expressão Artística (Mobile) registrou centenas de casos de perseguição judicial ou administrativa a artistas pelo poder público. O Nonada reúne alguns desses episódios, incluindo o cancelamento de um show do cantor Johnny Hooker em Niterói (RJ), após uma campanha de fake news. Herança do bolsonarismo, nos últimos meses, o movimento contra artistas ocorre mais em nível estadual e municipal. “Devemos estar muito atentos, alertas, e mobilizar forças para garantir o direito de artistas e das artistas se manifestarem, independente de quem são os governos”, afirma Denise Dora, advogada e co-idealizadora do Mobile.
🎧 Podcast
A música também é uma forma de criar conexão com os territórios. A cantora, compositora e atriz Martinha Soares e a cantora, compositora e jornalista Fabiana Cozza são as convidadas do “Manda Notícias”, produção da Pauta Periférica. As artistas mergulham nas relações entre arte e territorialidade, mostrando como o processo artístico é capaz de registrar memórias e histórias ao mesmo tempo individuais e coletivas. Cozza reflete principalmente sobre a transformação da Vila Madalena, na zona oeste de São Paulo, do tempo da sua infância, e sua conexão com a zona sul da capital paulista, região de efervescência da cultura periférica.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Em 2022, 49% da produção científica brasileira teve pelo menos uma mulher entre os autores, enquanto, em 2002, o percentual era de 38%. É o que revela o relatório “Em direção à equidade de gênero na pesquisa no Brasil”, produzido pela Agência Bori, em parceria com a editora Elsevier. A participação feminina no país está atrás apenas de Argentina e Portugal – 52% dos trabalhos produzidos em ambos foram de mulheres. O documento, porém, mostra que conforme a carreira avança, a tendência é de diminuição da presença feminina. De 2018 a 2022, por exemplo, as mulheres com até cinco anos de carreira foram autoras ou coautoras em mais da metade (51%) das publicações. Entre pesquisadores com mais de 21 anos de carreira, o número cai para 36%.