Os pontos do PL da Devastação e as cidades campeãs em royalties de petróleo
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🔸 O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirma que não negociou com a oposição a inclusão de pautas como a anistia aos presos do 8 de janeiro e o fim do foro privilegiado em troca do fim da ocupação do plenário. O motim bolsonarista na Casa Legislativa, em reação à prisão domiciliar de Jair Bolsonaro (PL), durou 30 horas. O Canal MyNews explica que Motta rebateu informação divulgada por Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) de que teria feito um acordo para dar fim ao ato. “O presidente da Câmara não negocia as suas prerrogativas, nem com a oposição, nem com o governo, nem com absolutamente ninguém”, disse Motta a jornalistas. Em entrevista ao Metrópoles, ele afirmou ainda que está em análise a possibilidade de punir deputados que tumultuaram a retomada dos trabalhos legislativos. Imagens do plenário devem embasar a análise. Entre as medidas possíveis está a suspensão de mandato. “Atitudes que não colaboram para o bom funcionamento da Casa precisam ser coibidas”, afirmou Motta.
🔸 Com o fim do motim, o Senado aprovou o PL 2.692/2025, que isenta do Imposto de Renda quem ganha até dois salários mínimos. A votação era urgente, já que a Medida Provisória sobre o tema perderia a validade na segunda-feira. Já a proposta que isenta do imposto quem ganha até R$ 5 mil está pronta para ser votada na Câmara nas próximas semanas. O Congresso em Foco informa que a oposição diz ter reunido 41 assinaturas para pedir o impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, mas o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), já descartou votar a destituição.
🔸 Termina hoje o prazo para o presidente Lula vetar ou sancionar o PL da Devastação, como ficou conhecido o Projeto de Lei 2159/2021, que altera o processo de licenciamento ambiental no país. Aprovado pelo Congresso a pedido de setores do agronegócio e da mineração, o texto é criticado por ambientalistas e pelo Ministério Público Federal, que recomendam vetos a mais de 30 trechos. Segundo a Repórter Brasil, o ponto mais controverso é a ampliação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC) – uma autodeclaração, sem análise técnica prévia – para empreendimentos de médio impacto. Seria o caso, por exemplo, da barragem da Vale em Brumadinho, cujo rompimento causou 272 mortes em 2019. Lula deve vetar esse ponto, mas é improvável que rejeite o texto inteiro. “Minha expectativa é que o presidente vete os artigos que consideramos inconstitucionais e também os que representam grandes retrocessos ambientais”, diz o deputado federal Nilto Tatto (PT-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista.
🔸 A propósito: além do retrocesso ambiental, o projeto compromete a imagem do Brasil às vésperas da COP30, a Conferência do Clima das Nações Unidas, marcada para novembro em Belém. Em coluna na CartaCapital, o jornalista Daniel Camargos lista dez motivos para que Lula vete integralmente o PL da Devastação. Preocupa não só a licença por autodeclaração, mas também a criação da Licença Ambiental Especial (LAE), que acelera o processo de licenciamento de grandes obras em apenas uma fase e em até 12 meses – um atalho que favorece interesses políticos, especialmente em projetos de alto impacto como a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Há ainda o enfraquecimento de órgãos ambientais como Ibama, ICMBio e Funai, permitindo que estados tenham a palavra final em disputas, algo que expõe o licenciamento a pressões políticas locais. O PL ainda torna mais vulneráveis territórios indígenas e quilombolas não homologados.
🔸 Em tempo: há ao menos 46 projetos no Congresso que representam retrocessos ambientais. É o que mostra a Agenda Legislativa 2025, lançada pelo Observatório do Clima nesta semana. O Colabora detalha o documento elaborado a partir da análise de quase cem proposições – cinco delas consideradas urgentes, como a PEC do Marco Temporal, os projetos que anistiam a grilagem e a proposta que privatiza os terrenos de marinha. O trabalho mostra que, depois de ter aprovado o PL da Devastação, o Congresso segue ampliando ataques à legislação ambiental em áreas como regularização fundiária, proteção de biomas, direitos de comunidades tradicionais e regras de licenciamento. “Esses projetos favorecem o desmatamento em áreas especialmente protegidas, como as APPs e a Mata Atlântica, o bioma que abriga mais de 70% da população brasileira e é um dos mais devastados do país. Esses retrocessos podem agravar tragédias climáticas, potencializar a crise hídrica e levar a enorme perda de biodiversidade”, aponta Malu Ribeiro, diretora de políticas públicas da Fundação SOS Mata Atlântica.
📮 Outras histórias
O nascimento de uma rolinha-do-planalto em Foz do Iguaçu se tornou um marco histórico para a conservação da fauna brasileira: é o primeiro filhote da espécie – endêmica do Cerrado e criticamente ameaçada – que nasceu sob cuidados humanos. O 100fronteiras conta que o pássaro, nascido no Parque das Aves, em Foz do Iguaçu, é fruto do trabalho científico da equipe técnica da instituição, em parceria com a organização Save Brasil. “Ver esse filhote abrir os olhos aqui no Parque das Aves nos enche de esperança. Mostra que é possível fazer a diferença quando se atua com ciência, sensibilidade e compromisso com a vida”, diz Paloma Bosso, diretora-técnica do parque. O filhote de rolinha-do-planalto nasceu da reprodução de um casal mantido sob cuidados desde 2023. Atualmente, existem apenas 15 indivíduos da espécie conhecidos na natureza.
📌 Investigação
Apesar de terem recebido R$ 150 bilhões em royalties e participações do petróleo entre 1999 e 2024, cidades do Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo seguem com baixos indicadores de saúde, educação e saneamento. A Agência Pública analisou 15 municípios com maior repasse per capita, a partir de dados das plataformas InfoRoyalties, da Universidade Candido Mendes (UCAM) e dados da plataforma FGV Municípios. A maioria das cidades fluminenses, como Campos dos Goytacazes e Presidente Kennedy, concentra mais de 25% da população abaixo da linha da pobreza. Os recursos, embora volumosos, foram pouco aplicados em projetos estruturantes, e a dependência do petróleo se mantém. “A gente tem observado que municípios que não recebem royalties e participações especiais têm um desempenho melhor na saúde e na educação do que os municípios que recebem. Há um impacto econômico, mas não há um impacto social”, afirma a pesquisadora Lia Hasenclever, da UCAM.
🍂 Meio ambiente
O Brasil tem grande potencial para a cabotagem – transporte de cargas por navios entre portos de um mesmo país – a começar pela extensão de costa navegável: são 8 mil quilômetros. O transporte marítimo, além de reduzir custos logísticos e aumentar a eficiência no setor de cargas, pode diminuir o impacto ambiental, sobretudo quando comparado ao modal rodoviário. A Envolverde destaca que a cabotagem, impulsionada pelo programa federal BR do Mar, é vista como estratégica para o desenvolvimento sustentável do país, ao interligar regiões de forma mais limpa e econômica. Para o consultor e engenheiro naval Maurício Almeida, “a cabotagem representa uma solução inteligente para a matriz logística brasileira, especialmente em tempos em que o custo ambiental das operações se tornou tão relevante quanto o custo financeiro”. O avanço do setor depende de investimentos em infraestrutura portuária e de marcos regulatórios que incentivem a competitividade.
📙 Cultura
Transformando a dor em música clássica, Carlos Eduardo Prazeres fundou a Orquestra Maré do Amanhã depois da perda de seu pai, em 1999. Desde então, o projeto, que teve início no Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, já impactou cerca de quatro mil jovens de favelas da cidade, oferecendo formação musical e oportunidades no Brasil e no exterior. Agora, a orquestra anuncia um plano de expansão e um foco renovado no vínculo com os alunos de favela. “Ouvi no ano passado de uma menina algo que me tocou profundamente: ‘Quando a gente sai da Maré e vai para a Europa, leva com a gente 140 mil moradores que passam a acreditar que é possível’”, conta Prazeres ao Voz das Comunidades. Com o apoio de leis de incentivo e de empresas parceiras, o projeto oferece bolsas que chegam a até R$ 5 mil para os alunos que também atuam como orientadores.
🎧 Podcast
Quando se perdeu na praia, ainda criança, Gisela Lima foi salva pelo assobio do pai. Havia procurado em vão o guarda-sol da família e ainda hoje se lembra quando ouviu o som que o pai fazia com a boca. “Quando eu olho para essa memória, eu sabia que eu era muito pequena, porque só via pernas. E as pernas eram muito longas, então eu era muito pequena, mesmo. Comecei a ficar muito aflita. E aí eu ouvi o assobio dele. O assobio dele é muito específico”, lembra Gisela, que narra a história para Natália Silva, no primeiro ato do “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo. Mais tarde, já no mestrado, Gisela telefonou de um orelhão para o pai pedindo que ele levasse até a USP um trabalho que ela havia esquecido. Não especificou o prédio – e, outra vez, eles se encontraram pelo assobio paterno. No segundo ato, o programa mostra os esforços de Gustavo Mayrink para resgatar a memória do pai.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Com base na ancestralidade e no espírito coletivo, o “Jogo do Bem-viver: Aprendendo com Mulheres Negras” ensina crianças que, a partir do sonho, é possível construir realidades de bem-estar e justiça social. Criado por Agnis Freitas – pedagoga, pesquisadora de relações étnico-raciais e responsável pela Oguês Educação –, a brincadeira educativa apresenta ao público infantil temas como: coletividade, justiça e protagonismo feminino negro. O Nós, Mulheres da Periferia conta que o jogo usa cartas com missões inspiradas em figuras como Sueli Carneiro, Conceição Evaristo e Erika Hilton. O projeto foi lançado em 25 de julho, Dia da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. “O bem-viver na perspectiva das mulheres negras é essa percepção de coletividade, o entendimento de que para estar vivo, você precisa do todo. E o jogo traz isso, para superar o desafio, você precisa do grupo. O grupo precisa estar junto para conquistar o bem-viver”, afirma Agnis.