As respostas de Bolsonaro no STF e o colapso ambiental nas ilhas de Belém
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🔸 No segundo dia de interrogatórios no STF, Jair Bolsonaro (PL) negou ter recebido, lido ou editado a minuta golpista, mas admitiu que discutiu a possibilidade de uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO) com os comandantes das Forças Armadas. Réu por cinco crimes, entre eles golpe de Estado e organização criminosa armada, Bolsonaro afirmou que nunca articulou um golpe e classificou a ideia como “abominável”. A CartaCapital detalha o depoimento do ex-presidente no Supremo Tribunal Federal, interrogado por Alexandre de Moraes. Bolsonaro também negou ter pressionado o então ministro da Defesa, Paulo Sérgio, para que ele incluísse em um relatório a alegação de que seria possível fraudar as urnas eletrônicas. O ex-capitão ainda admitiu não ter tomado medidas para desmontar os acampamentos golpistas e culpou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela permanência dos manifestantes após sua saída do governo.
🔸 A presença de Luiz Fux no interrogatório agradou os bolsonaristas. Ele foi o único ministro da 1ª Turma do STF a acompanhar os depoimentos. Moraes havia convidado todos os demais, mas eles enviaram juízes auxiliares. O Jota conta que Bolsonaro chegou a citá-lo positivamente durante seu interrogatório. Sua defesa vê em Fux uma figura “mais imparcial” e com trajetória menos ligada diretamente ao caso. A simpatia bolsonarista por Fux cresceu depois que ele questionou as penas de 8 de janeiro e propôs redução no caso da ré que pichou a estátua da Justiça. E, para o ex-presidente, qualquer fissura na unanimidade do STF pode significar fôlego jurídico em um cenário de provável condenação.
🔸 Em tempo: Bolsonaro fez diversas afirmações falsas ou distorcidas sobre o sistema eleitoral e os ataques de 8 de janeiro. Ele ainda afirmou, de forma enganosa, que foi multado apenas por questionar o resultado das eleições. Na realidade, a multa se deveu à litigância de má-fé do PL, que pediu a anulação de votos sem apresentar provas. Também distorceu decisões do Tribunal Superior Eleitoral ao afirmar que a Corte permitiu que ele fosse chamado de “genocida” – o termo foi proibido e vídeos foram removidos por ordem judicial. O Aos Fatos lista e checa as mentiras do ex-presidente ao responder acusações de fraude e golpismo no STF.
🔸 O STF já ouviu os oito réus do chamado “núcleo crucial” da tentativa de golpe. Mauro Cid, por exemplo, confirmou que Bolsonaro leu e alterou a minuta do golpe, mantendo apenas Alexandre de Moraes como alvo de prisão. Já Almir Garnier negou oferecer tropas da Marinha para o golpe, apesar de relatos de que teria aderido. O Nexo mostra quem disse o quê nos interrogatórios feitos nesta semana. General da reserva, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, decidiu ficar em silêncio e respondeu apenas às perguntas de sua defesa. O último a ser interrogado, Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa e vice na chapa de Bolsonaro em 2022, participou por vídeo. Negou financiar acampamentos ou tentar coagir chefes militares, embora Mauro Cid tenha dito que ele entregou dinheiro para um plano de assassinato de Lula, Geraldo Alckmin e Alexandre de Moraes.
🔸 Em 2021, Bolsonaro afirmou que enxergava apenas três futuros possíveis para si: “estar preso, ser morto ou a vitória”. Agora, a “profecia” do ex-presidente já não se sustenta: a vitória não veio, a morte é improvável e a prisão se torna cada vez mais real, escreve Rafael Mafei, em artigo na revista piauí. O professor de Direito na USP e na ESPM analisa os caminhos possíveis para Jair Bolsonaro diante do avanço das ações penais contra ele no STF. “A tripartição entre prisão, morte ou vitória já não dá conta das especulações. (...) Resta, portanto, a prisão. Ou a fuga. Esta foi a opção escolhida pela deputada federal licenciada Carla Zambelli (PL-SP), seguindo uma já estabelecida tradição entre os bolsonaristas investigados na Justiça (Allan dos Santos e Oswaldo Eustáquio foram os pioneiros)”, afirma Mafei. Outra possibilidade seria a prisão domiciliar, aos moldes do que houve com Fernando Collor, que se entregou à polícia no final de abril, depois de ser condenado a oito anos de prisão. Bolsonaro poderia tentar o mesmo caminho, com base nas sequelas da facada e sua idade. Mas isso exigiria que Bolsonaro deixasse de agir politicamente – algo que, até agora, ele resistiu a fazer.
📮 Outras histórias
“Eu me aproximei e vi a onça atrás da moita. Ela rosnou. Só fiz rumar a panela e saí em disparada”, conta Jadiel, um menino franzino de 11 anos. Por “rumar a panela”, entenda-se lançar o objeto na direção do alvo. Nos últimos meses, nas comunidades do município de Itaguaçu da Bahia, a 500 km de Salvador, os ataques de onças às criações de animais se tornaram frequentes. O Meus Sertões explica que a presença da espécie se intensificou com o avanço do desmatamento causado pelo projeto de irrigação da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco e Parnaíba (Codevasf), órgão vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR). Com o habitat destruído, onças como a suçuarana invadem áreas povoadas, e pequenos criadores relatam perdas significativas de cabras, ovelhas e bezerros. Gilberto Caetano da Silva, 45 anos, já perdeu 50 cabeças de bodes: “A tendência é haver mais devastação nos municípios de Xique-Xique e Itaguaçu da Bahia antes do final da obra. Já foram liberadas mais licenças para desmatamentos. Vão acabar com tudo até à beira do rio. Assim, as onças invadirão as casas”.
📌 Investigação
O X pagou uma indenização por danos morais de mais de R$ 500 mil ao advogado Rafael Batista, que trabalhou durante dois anos e meio na empresa no Brasil (à época, Twitter). Ele deixou o posto de conselheiro legal sênior em janeiro de 2022, meses antes da compra da rede social por Elon Musk. A Agência Pública obteve documentos do processo trabalhista de Batista contra o X, em que alega que seus emails foram vazados de modo “potencialmente proposital” para “colocar em xeque a atuação do Judiciário brasileiro”. O vazamento ocorreu durante o Twitter Files Brazil, uma ação coordenada que envolveu Musk e membros da extrema direita do Brasil e dos Estados Unidos para atacar o STF e tentar descredibilizar o ministro Alexandre de Moraes. Foram publicados 24 emails de Batista que comprovariam que Moraes e “outros funcionários do governo” ameaçaram “processar criminalmente o advogado do Twitter” – o que era mentira.
🍂 Meio ambiente
“O que levou cinco anos para crescer, a gente perdeu em um verão só. E o pior é que pode acontecer de novo este ano”, afirma Valdiney Teles, turismólogo e morador do Quilombo Guajará Miri, no município de Acará, próximo a Belém (PA). O açaí representa cerca de 70% da comunidade quilombola, mas a onda de calor e as queimadas de 2024 destruíram mais da metade de seus açaizais. Segundo a Amazônia Latitude, além da escassez de açaí, o desaparecimento dos camarões, antes abundantes nos igarapés, também preocupa os moradores da região. A população local atribui o problema ao turismo predatório da Ilha do Combu, ponto turístico da elite da capital paraense, com restaurantes flutuantes e marinas privadas, além de lanchas e motos aquáticas que circulam pelas nascentes dos igarapés em alta velocidade. “Os rios e igarapés são nossas fontes de sustento. Hoje, nós estamos encontrando limo nos rios, algo que não acontecia anos atrás", conta o produtor rural e pescador Joelson Cunha.
📙 Cultura
Por meio de intervenções artísticas e protestos, o coletivo Cholitas da Babilônia, formado por mulheres andinas em São Paulo, combate a xenofobia e luta pelos direitos dos imigrantes latinoamericanos. A Periferia em Movimento conta que o grupo denuncia sobretudo o uso de imagens de sofrimento dessa população em condição análoga à escravidão nas fábricas por artistas brancos. “Cadê o nome dessas pessoas? Quem são elas? Elas queriam ser fotografadas? Eu sei o que é estar ali. Elas estão com medo de trabalhar nesse lugar!”, afirmou Natali Mamani, indígena aymara nascida em La Paz, na Bolívia, durante protesto contra a exposição “Oficina do Suor”, de Sérgio Carvalho, auditor fiscal e fotógrafo há mais de 30 anos. Além dos questionamentos, as Cholitas buscam manter vivas suas tradições culturais e atuam no autoacolhimento entre povos andinos.
🎧 Podcast
“Os desastres climáticos afetam mais as mulheres do que os homens. As questões de violência online, toda a questão das plataformas digitais, também afetam mais mulheres e crianças. As guerras são feitas por homens, mas quem sofre principalmente os impactos são as mulheres. Embora sofremos tudo isso a mais, tem algo em comum: estamos sempre subrepresentadas nos espaços de poder e de decisão”, afirma a embaixadora Vanessa Dolce de Faria, que ocupa um cargo criado no terceiro mandato de Lula (PT), o de Alta Representante para Temas de Gênero do Ministério das Relações Exteriores. No “Fio da Meada”, produção da Rádio Novelo, ela revisita sua trajetória na diplomacia e explica sua função dentro do Itamaraty – fazer com que gênero seja um tema debatido em todas as áreas da política externa brasileira.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Mais da metade dos 10,1 milhões de negócios fundados e chefiados por mulheres no país são de mães. Não por acaso: a maioria das mulheres que têm filhos são demitidas em até dois anos após o retorno da licença maternidade. Segundo uma pesquisa da Rede da Mulher Empreendedora, em parceria com o Instituto Locomotiva, 77% das mulheres começaram a empreender depois da maternidade. Apesar da presença expressiva do empreendedorismo feminino, um levantamento do Serasa mostrou que 68% delas já tiveram um pedido de crédito negado. O Nós, Mulheres da Periferia ouviu empreendedoras periféricas sobre como iniciaram seus negócios e de onde tiraram dinheiro para isso. “Nunca fiz empréstimo nem financiamento no banco. Comecei com o que eu tinha e fui reinvestindo o dinheiro em produtos. De acordo com a demanda, fui comprando o que precisava, sempre à vista”, conta a massoterapeuta Erinalda Conceição Silva, mãe solo de gêmeas.