As relações raciais na primeira infância e o afroturismo no país
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Oi, gente!
Na segunda-feira, Dia da Consciência Negra, feriado em algumas cidades do país, a Brasis não vai circular. A data é uma homenagem a Zumbi dos Palmares, um dos últimos líderes do Quilombo dos Palmares, assassinado por bandeirantes em 20 de novembro de 1695.
Pela importância do feriado, na edição de hoje, além de informações do dia, a Brasis reúne algumas notícias, reflexões e conteúdos produzidos pelas associadas à Ajor, de artigos e análises a podcasts sobre as origens do racismo e a luta antirracista.
Boa leitura e até terça-feira,
Audrey Furlaneto
🔸 O Ministério Público indiciou cinco homens pela execução de Mãe Bernadete, líder quilombola assassinada em agosto deste ano. Dos cinco suspeitos, dois já haviam sido presos em setembro, informa a CartaCapital. Segundo relato de Wellington Gabriel de Jesus dos Santos, neto de Mãe Bernadete que estava no local no momento do crime, os homens chegaram de moto à casa dela, no Quilombo Pitanga dos Palmares, na Bahia. Em depoimento, ele afirmou ainda que ela teria aberto a porta, pensando se tratar de um assalto.
🔸 De volta da Faixa de Gaza, o comerciante Hasan Rabee recebe ameaças no Brasil e pede proteção ao governo federal. O brasileiro naturalizado fazia vídeos do cotidiano de ataques de Israel aos palestinos. Agora, seu Instagram já recebeu mais de 200 mensagens de ódio, como afirma ao Metrópoles a advogada Talitha Camargo da Fonseca, que representa a família de Hasan. Ela entrou com pedido no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH), vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos.
🔸 Em meio à onda de calor no país, o governo estabeleceu um programa voltado para atender pessoas em situação de rua. O Programa Pontos de Apoio da Rua (PAR), da pasta dos Direitos Humanos, prevê a disponibilização de serviços em espaços públicos para para cuidado e higiene pessoal da população nas ruas do país. O Notícia Preta explica que a implementação do PAR será de forma progressiva nas cidades com mais de 500 mil habitantes e que tenham maior concentração de pessoas em situação de rua.
🔸 Às vésperas de mais um Dia da Consciência Negra, a educação antirracista está longe de se concretizar. Vinte anos depois de se tornar lei, o ensino de história afro-brasileira ainda enfrenta obstáculos, e o racismo em sala de aula é grave: 38% dos casos de racismo no Brasil acontecem em ambientes escolares. O Nexo trata do papel do antirracismo na educação, conversa com especialistas sobre o tema e reúne dados que reforçam quão importante é esta pauta num país cujas estruturas racistas promovem a desigualdade social. Quase 10% da população negra com mais de 15 anos é analfabeta.
🔸 Para ouvir: Ser uma criança negra ou indígena no Brasil é bem diferente de ser branca, seja pelas diferenças de termos usados, como “de menor”, ou pela forma como são cuidadas nas creches e escolas, como aponta Clélia Prestes, co-coordenadora do projeto Saúde, Infâncias e Relações Raciais do Amma Psique e Negritude. No primeiro episódio de uma série sobre primeira infância e relações raciais, o “Papo Preto”, produção da Alma Preta, recebe especialistas sobre o tema para explicar como o racismo permeia a infância e, também, para debater políticas públicas de equidade.
🔸 A propósito do racismo: o que é epistemicídio? Segundo a filósofa Sueli Carneiro, trata-se da destruição dos conhecimentos de determinado grupo ou sujeito, mas não só: implica na destruição do próprio sujeito. “Podemos considerar isso como uma das formas mais cruéis de tentativa de apagamento das populações negras, indígenas e de todos os corpos que não representam o dito ideal embranquecido, elitizado, cis, heteronormativo, seja em seus corpos como modos de ser e estar no mundo”, escreve a cienstita social Ana Paula Holanda, em artigo no Negrê. Ela explica que, entre as consequências do epistemicídio, está “crescer sem saber ao certo sobre as(os/es) muitas(os/es) que vieram antes de nós, crescer sob a deseducação hegemônica que ensina a não amar a si mesmo”.
📮 Outras histórias
A recém-lançada “Carta para a Educação da Maré” prevê a inclusão das “temáticas de gênero e raça no planejamento das ações pedagógicas das unidades escolares, estimulando discussões regulares sobre racismo, machismo e descriminação de pessoas LGBTQIAP+”. O Maré de Notícias reúne casos de escolas no complexo de favelas na zona norte do Rio de Janeiro onde ações antirracistas foram incorporadas aos currículos. Um exemplo é a Escola Municipal Professor Josué de Castro, na Vila do João, que já tem um projeto político-pedagógico para 2024 levando em conta raça e gênero.
📌 Investigação
Gigante do setor de bebidas alcoólicas, a Ambev tem investido em anúncios segmentados de cerveja no Facebook e no Instagram para os grupos mais vulneráveis aos danos da bebida, especificamente mulheres e jovens entre 18 e 34 anos, como apurou o Núcleo. Muitas das peças analisadas ainda receberam na plataforma da Meta um rótulo destinado a anúncios com “temas sociais, eleições ou política”, que automaticamente são expostos com detalhes sobre público-alvo. Apenas em quatro campanhas que circularam com 87 versões diferentes de segmentação de audiência ao longo de agosto a empresa de bebidas gastou cerca de R$70 mil para influenciar mulheres jovens a baixar o app do Zé Delivery.
🍂 Meio ambiente
Dos 772 municípios da Amazônia Legal, apenas 12 concentraram mais da metade das multas aplicadas pelo Ibama por infrações relacionadas a fogo e desmatamento entre agosto de 2019 e julho de 2022. A “Capivara Post”, newsletter da Ambiental Media, traz uma análise de dados sobre os mais de 35 mil km² de florestas desmatadas e mais de 260 mil focos de calor detectados no período pelos satélites utilizados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em seus sistemas de monitoramento.
📙 Cultura
“A negritude sempre falou do mundo negro, não diz respeito somente à África. E, quando vejo a maneira como no Brasil, na Colômbia e em Cuba as comunidades negras se organizam e como tentam preservar o saber e os rituais, dos quais se encontram traços no Haiti ou no Benin, me parece ser uma herança de tudo o que a negritude tentou dizer.” A afirmação é do escritor senegalês Mohamed Mbougar Sarr, que conquistou em 2021 o Goncourt, principal prêmio literário francês. Na Quatro Cinco Um, o autor analisa as relações entre política, poder e literatura, além da forte ligação entre África e América Latina. “Há uma certa unidade que foi rompida no mundo pela escravidão. E esse rompimento não pode nos fazer esquecer que há laços possíveis.”
Iniciativas de turismo lideradas por pessoas negras buscam pensar as viagens de modo afrocentrado, com roteiros que privilegiam as contribuições de populações negras em diferentes destinos turísticos, além de criar espaço de segurança e acolhimento para os viajantes. O Nós, Mulheres da Periferia lista cinco projetos que promovem o “afroturismo” em diversas viagens pelo Brasil. A Brafika Viagens, por exemplo, inclui no trajeto de Maceió (AL), conhecida por suas praias com águas azuis e cristalinas, um passeio ao município de União dos Palmares, onde existiu o Quilombo dos Palmares, símbolo de resistência contra a escravização.
🎧 Podcast
As raízes da violência contra a população negra estão na formação do Brasil, nação que mais importou escravizados no mundo e foi a último das Américas a abolir a escravidão. Narrado pelo jornalista Tiago Rogero, o “Projeto Querino”, produção da Rádio Novelo, retoma a História do Brasil a partir de um olhar afrocentrado e mostra que, embora tente parecer diferente, sua origem escravocrata segue presente em todas as esferas da sociedade brasileira.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Com baixa regulamentação e mediação dos responsáveis, crianças e adolescentes estão expostos a propagandas e conteúdos inadequados na internet – que já conta 95% das pessoas entre 9 e 17 anos. Os dados são da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023, que também mostrou, pela primeira vez, que o YouTube é a plataforma mais usada por quem tem de 9 a 12 anos (88%). O Lunetas explica que o excesso de publicidades e marcas presentes nos vídeos que as crianças assistem refletem diretamente no comportamento delas. “Até viajar para algum lugar onde o youtuber iria se apresentar ou comprar dinheiro virtual para um jogo eles já pediram”, conta a enfermeira Nil Prates, mãe de Antônio Gabriel, 11, e João Victor, 9.