O recorde de feminicídios no país e as ameaças ao primo de Chico Mendes
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🔸 O Brasil registrou recorde de feminicídios em 2024. Segundo o Mapa da Segurança Pública 2025, foram 1.459 casos – o equivalente a quatro mulheres assassinadas por dia em crimes motivados por violência de gênero, informa a Alma Preta. A maior taxa do país foi registrada na região Centro-Oeste: foram 1,87 casos por 100 mil mulheres. Já a média nacional foi de 1,34 feminicídios por 100 mil mulheres. De acordo com o relatório, também houve crescimento expressivo nos registros de estupro: no ano passado, o país contabilizou 83.114 vítimas, 86% delas mulheres, o maior número dos últimos cinco anos. Rondônia, Roraima e Amapá são os estados com a maior taxa por habitante.
🔸 O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu neste ano a aplicação da Lei Maria da Penha a mulheres trans e travestis em casos de violência doméstica. “A decisão rompe com um olhar biologizante e cisgênero, dando ênfase à compreensão de gênero como uma construção social”, escreve a pedagoga Ana Flor, em coluna na revista AzMina. Com isso, completa, “o STF amplia a discussão e constitui uma lente que possibilita um respaldo de cidadania para as mulheres trans e travestis”. Segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), o Brasil lidera há 16 anos o ranking mundial de assassinatos de pessoas trans. As principais vítimas são mulheres trans e travestis negras, jovens e nordestinas, muitas vezes atacadas dentro de casa por familiares. “No Brasil, mesmo com a precarização dos dados sobre a população de mulheres trans e travestis, não é difícil perceber que uma das instituições que mais submete essa população a situações de violência é a família.”
🔸 Falando em STF… Por seis votos a um, a Corte formou maioria para que as big techs possam ser responsabilizadas se não retirarem publicações criminosas de usuários nas plataformas, mesmo sem decisão judicial prévia para remover o conteúdo. Agora, as empresas devem retirar conteúdos ilícitos com base em notificação extrajudicial da vítima – adotando como regra geral o artigo 21 do Marco Civil da Internet. O Jota explica que a proposta reduz o alcance do artigo 19, que exige ordem judicial para remoção e, até então, era a norma predominante. A mudança foi impulsionada pelo entendimento de que o atual modelo jurídico se tornou ineficaz diante da proliferação de conteúdos violentos, desinformação e discursos de ódio. Ministros como Flávio Dino, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes defenderam que a responsabilização mais ágil das plataformas é essencial para garantir segurança no ambiente digital.
🔸 Na Câmara dos Deputados, a Comissão Especial de Inteligência Artificial fez sua primeira audiência pública na terça, para discutir a proposta de regulação do uso de IA, já aprovada pelo Senado. Segundo o Mobile Time, houve consenso entre parlamentares e especialistas sobre a urgência da regulamentação. Para o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, a futura lei sobre IA será parte da “terceira geração” das normas digitais brasileiras, depois do Marco Civil da Internet e da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). “Não regular significaria deixar o cidadão à mercê de sistemas discriminatórios e o lucro prevalecer sobre a justiça e segurança”, afirmou.
📮 Outras histórias
Em sete anos, só 15 matérias relacionadas à população LGBTQIA+ tramitaram na Câmara Municipal de Vitória da Conquista. Destas, apenas uma foi um projeto de lei: a criação do Conselho Municipal da Diversidade Sexual e de Gênero. O restante se dividiu entre requerimentos, moções e indicações, muitas delas não implementadas, como a proposta de uma casa de acolhimento LGBTQIA+ ou a reserva de vagas para pessoas trans em concursos públicos. O Conquista Repórter ressalta que a baixa produção legislativa com foco na população LGBTQIA+ revela a falta de representatividade no Legislativo local. “Quantos vereadores ou vereadoras conquistenses se identificam como lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais ou intersexuais?”, questiona o pesquisador do direito à cidade e advogado, Gilson Santiago.
📌 Investigação
Milicianos que dispararam contra policiais em uma operação em Itaguaí, no Rio de Janeiro, em 2020, usaram munições que haviam sido comprados originalmente pelas polícias Militar e Civil do Rio de Janeiro, pelo Exército, Marinha, Aeronáutica e até mesmo da Acadepol do Ceará e da Força Nacional de Segurança Pública. O Intercept Brasil teve acesso à investigação sobre a operação, que terminou em confronto entre as forças de segurança e milicianos. De todas as cápsulas recuperadas na cena do tiroteio, ao menos 22 eram de lotes que foram perdidos, roubados ou extraviados. Apesar das evidências, as instituições não confirmam a origem e se recusam a oferecer informações.
🍂 Meio ambiente
Após uma operação de apreensão de gado dentro da Reserva Extrativista (Resex) Chico Mendes, realizada pelo pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), iniciou-se um clima de conflito nas comunidades da unidade de conservação e nas cidades da região do Alto Acre. Segundo O Varadouro, uma das principais consequências tem sido as ameaças a Raimundo Mendes de Barros, o Raimundão, primo de Chico Mendes e uma das mais importantes lideranças seringueiras da região, devido a suas críticas ao atual processo de devastação pela qual passa a resex – com a expansão desenfreada da agropecuária e a venda de lotes de terra por alguns dos moradores. “Estão sempre atacando a imagem do meu pai, das pessoas que trabalham com a floresta. Começaram a atacar a história do pai, a história do Chico Mendes. Dizem que o pai tá procurando pegar chumbo, assim como Chico Mendes pegou”, conta Raiara Barros, filha de Raimundão.
📙 Cultura
“Toda vez que a gente produz alguma coisa, a gente leva o dinheiro capitalizado também para as nossas origens, o nosso bairro. Nossas produções envolvem a economia criativa com fornecedores locais. A comunidade está sempre participando”, afirma Renata Freire, roteirista, diretora e produtora executiva do Mulheres em Série, coletivo que atua no formato de transmídia – mesclando audiovisual, literatura, teatro, rádio e novela – com o objetivo de criar obras de protagonismo feminino. O Jornal Empoderado conta que a websérie “Chapa, Pode Pá”, produzida pela iniciativa, acumula quatro prêmios internacionais. O Mulheres em Série é uma das 129 produtoras de São Paulo classificadas pela Agência Nacional de Cinema (Ancine) como nível dois e a única do extremo sul da cidade, o que permite que o coletivo acesse novos editais e maiores oportunidades de financiamento.
🎧 Podcast
Embora as comunidades quilombolas sejam fundamentais para a preservação ambiental, a presidência da COP30 não cita esses povos em sua carta sobre o evento, retratando mais uma face do racismo ambiental. O “Guilhotina”, produção do Le Monde Diplomatique Brasil, conversa com lideranças quilombolas e especialistas para entender como a luta contra a crise climática deve ser também antirracista. “Racismo ambiental não é só falar sobre o impacto das mudanças climáticas promovem e como isso recai sobre os povos negros, indígenas e quilombola no país, é também invisibilizar e silenciar essas vozes de uma discussão tão importante para o planeta”, afirma a quilombola Fran Paula e integrante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).
👩🏾⚕️ Saúde
Melhorias na estrutura das Unidades Básicas de Saúde (UBS) estão associadas a maiores coberturas vacinais no país. Um estudo publicado por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais na “Revista de Saúde Pública” analisou dados de 3.977 municípios e mostrou a relação entre o nível de vacinação da população e a estrutura das unidades – como existência de sala de vacinação, geladeira exclusiva, caixas térmicas, cartão de vacinação e serviço de vacinação. A Agência Bori destaca que, diante de uma disponibilidade de imunizantes considerada satisfatória, os municípios com UBS bem estruturadas têm 86% mais chance de alcançar cobertura vacinal adequada em comparação aos que têm estrutura ruim.