O racismo na Operação Verão no Rio e a desinformação de gênero
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🔸 Jovens negros e periféricos, muitos rumo à praia nos dias de calor intenso, são os principais alvos da Operação Verão, no Rio de Janeiro. Eles são abordados por policiais sem flagrante de delito ou mandado judicial. Apenas entre novembro e dezembro do ano passado, num intervalo de cinco dias, 89 jovens foram levados para a delegacia – “praticamente todos eram negros”, diz o texto da Ação Civil Pública do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) que questiona as violações de direitos de crianças e adolescentes desde o início da operação. No especial “Verão do Apartheid”, o Projeto Colabora mostra como a falta de dados impede o mapeamento do trabalho policial e detalha a ação de cunho higienista. “Essas ações arbitrárias vão muito além do veto ao direito de ir e vir. Causa traumas nesses jovens a partir da humilhação e da violência psicológica. A sociedade civil classista acha que pelo fato de morar no Leblon e pagar oito, nove mil de IPTU, pode impedir quem usa o coletivo de chegar à praia”, afirma a advogada Patrícia Felix de Lima.
🔸 No ano passado, o país registrou mais de 6,3 mil mortes por ação de policiais – em dia, 17 casos por dia. Segundo dados do Ministério da Justiça, o número é menor do que o observado em 2022, mas o ritmo da queda é muito inferior ao das demais formas de violência. O Congresso em Foco apresenta o mapa da violência policial no país. Em números absolutos, a Bahia foi o estado com maior letalidade policial em 2023. Em São Paulo, a taxa de homicídios por intervenção policial subiu 19,71%, com pico nos meses de julho e setembro, período da primeira etapa da Operação Escudo, na Baixada Santista, operação policial mais sangrenta em São Paulo desde a chacina de Carandiru, em 1992.
🔸 A propósito: 88% dos moradores de São Paulo são a favor do uso de câmeras nos uniformes policiais. O Metrópoles informa que, na pesquisa do Datafolha, o apoio ao dispositivo é disseminado em todos os segmentos da amostra: brancos, pardos e pretos, ricos e pobres, homens e mulheres, bolsonaristas e petistas.
🔸 Um grupo de trabalho para discutir a renda básica tem reunião nesta semana. É formado por 104 especialistas e, claro, pelo deputado Eduardo Suplicy (PT-SP), defensor da ideia há mais de 20 anos. O projeto virou lei em 2004, ainda no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas “não pegou”, como lembra o Le Monde Diplomatique Brasil. Hoje, apenas o município de Maricá, no Rio de Janeiro, segue a lei, beneficiando residentes com renda de até três salários mínimos. A expectativa de Suplicy é de que a reunião do grupo, marcada para quinta-feira, marque um passo significativo para a universalização da renda básica no Brasil, seguindo a decisão do STF de 2021 que determinou a implementação do programa a partir de 2022.
📮 Outras histórias
Em Ponta Grossa, uma família questiona o hospital pela morte da jovem Estefany Nayara Wachileski, de 21 anos. Internada por ter crises convulsivas sete meses atrás, ela teria sofrido com descaso no Hospital Universitário Regional dos Campos Gerais. Os pais contam ao portal Boca no Trombone que ela teve perfurações pelo corpo, inclusive no pulmão, além de ter sido contaminada por uma bactéria na unidade. O aviso sobre a morte dela também teria sido cruel, segundo Bruno Batista Wachileski, pai da jovem. “Eu só consegui entrar no necrotério acompanhado de um Policial Militar, achei muito descaso isso”, lamenta.
📌 Investigação
Ação proibida por lei, empresas de cigarros de palha fazem parcerias para distribuir produtos – que causam dependência – gratuitamente em busca de novos consumidores, sobretudo jovens. Exemplos de ações de “degustação” de cigarros de palha puderam ser identificados em cerca de 130 festas universitárias envolvendo seis fabricantes de palheiros. A Agência Pública revela que houve distribuição de produtos da Palheiros Paulistinha em 108 eventos, realizados em 26 municípios, em cinco estados. Há ainda indícios de que a empresa enviou produtos de graça aos organizadores das festas universitárias em pelo menos 82% dos eventos levantados pela reportagem.
🍂 Meio ambiente
“Todo mundo gosta de falar de sustentabilidade, mas como se faz para que isso não fique apenas no discurso?”, questiona João Paulo Sanfins, vice-presidente da Associação Nacional dos Aparistas de Papel (Anap). O setor de reciclagem vive uma queda histórica de preços devido ao alto estoque de materiais e à preferência da indústria por celulose virgem, proveniente de grandes corporações, como a Klabin. Segundo O Eco, o papel e o papelão ainda são alguns dos materiais recicláveis mais coletados no Brasil. Mas, com o preço baixo, os catadores ficam desestimulados – e muitos desses materiais acabam em aterros sanitários e lixões do país. “ESG [Governança socioambiental, na sigla em inglês], sustentabilidade e pensar verde. A toda hora se cria uma nova expressão. Praticamos tudo isso há 20 anos e não temos nenhum incentivo”, afirma Anice Torres, diretora do Centro de Reciclagem Rio (CRR).
📙 Cultura
Chico Science (1966-1997) completaria 58 anos na semana passada. Integrante do grupo Nação Zumbi, ele é um ícone do movimento manguebeat, que reconfigurou a música em Recife (PE) e no Brasil. A Emerge Mag revisita o nascimento do estilo musical, as letras de Chico e o contexto pernambucano, com a destruição dos manguezais e o aumento da desigualdade social. “O ambiente é o mesmo: o mangue, berçário da vida marinha. Um ecossistema que pode ser entendido como um sinônimo de vida e diversidade, ao mesmo tempo, que demonstra a miséria, a animalização dos homens, a fome. Mas é no mangue, este ambiente tão rico, que o levante pode começar, não apenas um levante social, mas artístico e estético, de uma cidade que precisa de um choque rápido, um choque que veio através da música”, escreve o jornalista Antônio Moraes.
🎧 Podcast
O coração de Santos Dumont, pai da aviação, vive rodeado de aviões de guerra e separado do resto do corpo. O órgão do cientista está, desde 1989, guardado no Museu Aeroespacial do Rio de Janeiro. Na Europa, há diversos casos de heróis nacionais que tiveram os corações conservados – com o aval do próprio indíviduo antes de morrer ou de sua família. Não foi o caso de Santos Dumont: o médico austríaco Walter Haberfeld retirou o órgão durante o embalsamento sem permissão. O “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, conversa com a pesquisadora Daniele Nunes Negrão, autora de uma dissertação sobre o assunto.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Ferramenta da violência de gênero, a “desinformação generificada” é a disseminação de informações falsas ou manipuladas com o objetivo de fortalecer narrativas que se opõem às pautas feministas e de gênero. Em parceria com o Laboratório de Estudos de Gênero e História, da Universidade Federal de Santa Catarina (LEGH-UFSC), o Portal Catarinas destaca a face da violência de gênero na internet e mostra como as principais vítimas são mulheres e meninas. A discriminação é ainda maior quando se trata de mulheres negras e pessoas LGBTQIA+.