A proposta de coalizão do Brasil na COP30 e os 35 anos do SUS
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🔸 Em meio a disputas políticas, o debate sobre minerais estratégicos voltou à Câmara – e em regime de urgência. Na semana passada, deputados aprovaram a tramitação acelerada do PL 2.780/2024, de Zé Silva (Solidariedade-MG), que cria a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos. Chamado de PL das Terras Raras, o projeto de lei pode ser votado diretamente no Plenário, mas enfrenta divergências políticas. O tema é atualmente uma das apostas de política climática do mundo e motivo de uma corrida global. Isso porque os minerais estratégicos, como lítio, nióbio e terras raras, são fundamentais para a transição energética e digital, usados em baterias e painéis solares. O Brasil discute se será apenas fornecedor de matéria-prima ou também produtor industrializado. O Eco explica a disputa. De um lado, a bancada ligada ao setor mineral pressiona por regras ágeis para garantir competitividade global. De outro, setores industriais argumentam que exportar apenas a matéria-prima é abrir mão de empregos e soberania produtiva. Por fim, ambientalistas e comunidades tradicionais alertam para os riscos socioambientais, sobretudo na Amazônia.
🔸 Outra pauta que volta ao jogo é a inclusão do gás natural nas políticas de data centers. Senadores e deputados querem inserir oito emendas na medida provisória sobre o tema, assinada neste mês via medida provisória pelo presidente Lula. Segundo o texto original, os data centers terão isenção de tributos federais na compra de equipamentos de tecnologia. Para acessar o benefício, precisam cumprir algumas exigências – entre elas, garantir que 100% do consumo de energia elétrica seja suprido a partir de fontes limpas ou renováveis. A Eixos mostra que parlamentares querem classificar o gás como “baixo carbono” e elegível para os benefícios. Ambientalistas e o Ministério do Desenvolvimento Industrial rejeitam a inclusão. Já defensores do setor alegam que o gás é essencial para garantir confiabilidade e sistemas de backup em projetos de grande porte.
🔸 O Brasil tem um plano ambicioso para a COP30: um plano para integrar os mercados de carbono globais. A proposta é criar uma coalizão internacional que estabeleça um preço comum para setores de alto impacto – aço, alumínio, cimento e fertilizantes –, responsáveis por cerca de 20% das emissões globais. O Reset detalha o plano, cujo objetivo é oferecer uma alternativa às taxações unilaterais de fronteira, como o CBAM europeu, sistema que confirma que um preço foi pago pelas emissões de carbono geradas na produção de determinados bens importados para a União Europeia. Países fora do “clube do carbono” teriam de pagar tarifas adicionais para exportar aos membros. O governo já dialoga com UE, China, Reino Unido e Noruega, mas a adesão será voluntária. Para Rafael Dubeux, secretário-executivo da Fazenda, a ideia é avançar com um “núcleo suficiente” de países.
🔸 Uma foto guarda a brutalidade com que Davi foi tratado na carvoaria onde trabalhava, no Maranhão: na imagem, ele é visto sentado e com as mãos amarradas às costas depois de ser espancado pelo gerente. Este, por sua vez, usou a foto em outras carvoarias da região, para intimidar outros trabalhadores com a mostra de sua “autoridade”. A Repórter Brasil reconstrói o caso de Davi, resgatado numa operação em 2021 que retirou 11 trabalhadores de condições análogas à escravidão. O responsável pelo negócio, segundo o Ministério do Trabalho, é Sirlei Martins Amaral, o “Ferinha”, reincidente na Lista Suja do Trabalho Escravo. A reportagem revela que a violência não é fato isolado: integra a cadeia do carvão vegetal que abastece a Viena Siderúrgica, em Açailândia (MA) e Sete Lagoas (MG). Dados alfandegários mostram que a Viena exportou ferro-gusa para a fábrica Toyota nos Estados Unidos: foram ao menos quatro embarques em 2022, um ano após a violência sofrida por Davi. “Ferinha” acumula operações desde 2015, e empresas ligadas a ele somam R$ 37,7 milhões em multas do Ibama.
📮 Outras histórias
A narrativa falsa de um curso “exclusivo para o MST” acompanha a primeira turma de medicina do país pelo Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), no Centro Acadêmico do Agreste, em Caruaru. “Quer fazer medicina na UFPE? Agora ficou muito fácil. Mas só se você for do MST”, diz o vereador do Recife Thiago Medina (PL-PE) num vídeo que viralizou. Ele tenta derrubar a medida que criou a turma pelo Pronera na Justiça. A Marco Zero explica que a iniciativa é voltada a diversas populações do campo, como assentados, quilombolas e acampados, e que a seleção, conduzida pela universidade, inclui prova e análise de histórico escolar. A reportagem lembra que o Pronera foi criado durante o governo de Fernando Henrique Cardoso em 1998, fruto da mobilização por educação no campo e consequência direta das ações de violência, como os massacres de Corumbiara e de Eldorado dos Carajás. Em quase três décadas, o programa já formou quase 200 mil estudantes em 545 cursos em todos os estados brasileiros.
📌 Investigação
Empresário do agronegócio e dono de uma fábrica de asfalto, Zé Lopes é um dos interessados na flexibilização de leis ambientais e no avanço da pavimentação da BR-319, rodovia que liga Manaus a Porto Velho. Embora já tenha sido investigado por crimes que incluem desmatamento de vegetação nativa e uso de trabalho análogo à escravidão, tenha sido preso em investigação sobre lavagem de dinheiro, além de ter sido alvo com suas empresas de multas ambientais que somam mais de R$ 61,4 milhões, Zé Lopes garante influência política que vai governo do Amazonas ao Senado. A Sumaúma revela que o empresário foi financiador das campanhas dos últimos governadores do estado. Entre eles, Omar Aziz (PSD), atualmente senador. Foi na gestão de Aziz que a estatal Companhia de Desenvolvimento do Estado do Amazonas (Ciama) desembolsou R$ 9,9 milhões para se tornar sócia do Frizam, frigorífico de Zé Lopes flagrado despejando sangue e água contaminada na Amazônia.
🍂 Meio ambiente
A exploração crescente no Arquipélago do Marajó, no Pará, por embarcações industriais, somada à construção de portos e ferrovias, aos grandes projetos de petróleo e à especulação imobiliária, tem impactado a comunidade pesqueira de Jubim. Os moradores dependem diretamente da pesca artesanal para sua subsistência, mas a pressão sobre o território reduz os estoques pesqueiros e ameaça os modos de vida tradicionais. A Agência Bori detalha uma pesquisa do Projeto Maretórios Amazônicos, publicada na revista científica “Marine Policy”, que mapeou fortalezas, fraquezas, oportunidades e ameaças à gestão costeira local. O estudo apresenta oportunidades econômicas e sociais, como o desenvolvimento do ecoturismo comunitário, e propõe princípios que orientam a revisão da Política Nacional de Gerenciamento Costeiro para garantir a participação real das comunidades e justiça social e ambiental.
📙 Cultura
“O sionismo é um projeto da Europa, que não sabia lidar com sua população judaica”, afirma o historiador israelense Ilan Pappe. Nascido em Haifa, em 1954, seis anos depois da criação do Estado de Israel, ele chegou a ser professor sênior da Universidade de Haifa, mas teve que se exilar na Inglaterra por seu posicionamento antissionista. Autor de dois dos livros recém-lançados – “Brevíssima História do Conflito Israel-Palestina” e “A Maior Prisão do Mundo: Uma História dos Territórios Ocupados por Israel na Palestina” –, Pappe esteve no Brasil para participar da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) e da Festa Literária Pirata das Editoras Independentes (Flipei). À Quatro Cinco Um o historiador fala sobre sionismo, genocídio palestino e a máquina de propaganda do governo de Israel, fincada no apoio dos países ocidentais. “Há o judaísmo, que é uma religião, e o sionismo, que é uma ideologia. Não são a mesma coisa. O sionismo se desenvolveu como uma ideologia centrada no racismo, no colonialismo e na ocupação. Não foi sempre assim, mas foi o que se tornou.”
🎧 Podcast
“Tem uma discussão antiga que ‘o Brasil não gasta pouco, gasta mal’. É uma mistura das duas coisas. O Brasil gasta menos do que deveria comparado a países muito mais ricos, mas realmente gasta muito mal em várias coisas. Educação é uma delas. O que é importante na educação são os professores. Se tiver computador, isso importa na margem. Se tiver ar condicionado e as crianças não estiverem de calor, isso importa. Mas muito menos do que a qualidade dos professores.” Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e da Universidade de British Columbia, no Canadá, o economista Claudio Ferraz é o convidado da semana do “Fio da Meada”, produção da Rádio Novelo. Ele pesquisa a sociedade brasileira do ponto de vista político, econômico e comportamental como se fossem “ensaios clínicos” de economia política e se tornou referência mundial em pesquisas empíricas na área.
👩🏾⚕️ Saúde
Criado há 35 anos, o Sistema Único de Saúde (SUS) vive com os riscos de terceirização, precarização e privatização. Segundo a Agência Mural, no município de São Paulo, das 479 unidades básicas de saúde existentes, 469 (ou 98%) são administradas por organizações sociais (OSs), entidades privadas que recebem dinheiro público para gerir os equipamentos de saúde. “Há a entrega da autonomia dos serviços para as OSs, com pouca regulamentação. Uma grande fatia do orçamento público vai para estas instituições sem a devida fiscalização. A experiência de São Paulo mostra que a privatização gera precarização do trabalho, que repercute no funcionário e no usuário da saúde”, afirma Tatiana Vasconcellos Anéas, coordenadora da Associação Paulista de Saúde Pública.