A entrega do Prêmio Camões a Chico Buarque e a saúde nas prisões
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🔸 “Onde está o general Heleno? Alguém sabe? Cadê o general Heleno? Ele desapareceu. Um homem público, ministro de Estado, que sai das eleições e desaparece. Quem explica o sumiço dele? Acho que o desaparecimento dele fala por si. (...) Acho que quem se esconde teme a verdade.” O ministro interino do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Ricardo Cappelli, afirma ainda que “muito possivelmente” as investigações da Polícia Federal vão indicar o vínculo de Heleno, que chefiou o GSI no governo Bolsonaro, aos atos golpistas de 8 de janeiro. Em entrevista exclusiva ao Congresso em Foco, ele diz não ver “muito sentido” na instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) pelo Congresso e defende a importância do órgão que acaba de assumir.
🔸 Uma das primeiras ações do interino do GSI foi liberar todas as imagens das câmeras do Palácio do Planalto em 8 de janeiro, quando o prédio, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) foram alvos de ataques criminosos. Cappelli respondeu a uma determinação do ministro Alexandre de Moraes. Segundo o Nexo, são 4.400 horas de gravação, cujo acesso à imprensa e a membros do próprio governo vinha sendo negado pelo general da reserva Gonçalves Dias, que deixou o comando do GSI na semana passada.
🔸 Começa amanhã o julgamento de mais de 200 denúncias contra acusados pelos atos golpistas de janeiro em Brasília. O Supremo Tribunal Federal (STF) já transformou em réus os cem primeiros acusados julgados na última semana, como lembra o Metrópoles. O quadro pode se repetir agora caso a maioria dos ministros (seis dos 11) vote a favor. Ao todo, foram denunciadas 1.390 pessoas em investigações divididas em cinco inquéritos. Elas respondem por crimes que vão desde associação criminosa armada e golpe de Estado a grave ameaça contra o patrimônio da União.
🔸 Aliados do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), têm a expectativa de votar ainda nesta semana o PL das Fake News. Enquanto isso, pressionado por agir em meio à escalada de conteúdos sobre violência escolar nas redes sociais, o governo adotou uma medida controversa: por meio de portaria, enquadrou novas responsabilidades de moderação das plataformas dentro de regras do direito do consumidor. Especialistas ouvidos pelo Núcleo veem na ação uma “manobra” de ocasião. “O ideal era que uma lei estabelecesse o mesmo dispositivo em outro ecossistema [proposta do PL das Fake News] ou uma lei dizendo que se deve usar como está no Código de Defesa do Consumidor, fazendo referência expressa”, explica o advogado André Fernandes, diretor do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife (ipRec).
🔸 Enfim, o Prêmio Camões chega às mãos de Chico Buarque. Quase três anos se passaram desde que a data foi marcada, e o então presidente Jair Bolsonaro (PL) se recusou a assinar o diploma de entrega ao escritor brasileiro. A maior distinção literária atribuída em Portugal tornou-se um símbolo da guerra da extrema direita contra a cultura, como destaca o Headline. À época, Chico Buarque afirmou: “A não assinatura do Bolsonaro no diploma é para mim um segundo prêmio Camões”. Segundo a reportagem, a cerimônia hoje em Portugal “simboliza uma espécie de retorno do Brasil aos círculos democráticos internacionais”.
📮 Outras histórias
A vida de travestis e mulheres trans com mais de 50 anos no Recife. Elas não são muitas – precisamente, 36 pessoas. É o que revela a pesquisa “Travestis Também Envelhecem”, da ONG Gestos - Soropositividade, Comunicação e Gênero, feita em parceria com o Conselho Municipal de Direitos da Pessoa Idosa (Comdir). Durante um ano, a organização entrevistou e coletou dados sobre essa população residente na capital pernambucana. O pequeno número de pessoas identificadas tem raiz na baixa expectativa de vida da população trans: cerca de 35 anos, menos da metade da média da população em geral, que é de 77 anos, segundo o IBGE. O Marco Zero detalha a pesquisa, que ainda traz dados sobre saúde e renda.
📌 Investigação
Crianças também são vítimas de intolerância religiosa. O Disque 100, canal do governo para receber denúncias de violações de direitos humanos, registrou que, em 2020, pessoas entre 0 e 14 anos representavam 2,52% das vítimas. A proporção passou para 8,28% em 2022. A Agência Mural ouviu crianças de sete religiões institucionalizadas no Brasil – candomblé, islamismo, catolicismo, budismo, espiritismo, umbanda e protestantismo (evangélica) – para entender como elas se relacionam com a espiritualidade e como são influenciadas pelo aumento da intolerância religiosa. “Se pudesse, diria para outras crianças que elas [entidades] nunca fazem e nunca vão fazer mal a ninguém”, afirma Janaina Alves de Sousa, de 9 anos, moradora de Diadema (SP), e praticante da umbanda.
🍂 Meio ambiente
Filhote da ditadura, o Projeto Calha Norte (PCN) leva impactos ambientais a terras indígenas. Durante o governo Bolsonaro, dois pelotões militares instalados nas regiões Surucucu e Aurais, pontos críticos da crise sanitária na Terra Indígena Yanomami, recusaram-se a dar suporte à Polícia Federal no combate ao garimpo ilegal, de acordo com denúncias de organizações indígenas e indigenistas. O InfoAmazonia conta que o PCN é uma iniciativa da ditadura civil-militar que foi levada a cabo sigilosamente a partir de 1985 durante o governo de José Sarney. Desde a redemocratização, ele tem servido para colonizar a Amazônia e facilitar a entrada de empresas na região, principalmente do setor da mineração.
As interações entre abelhas e plantas para áreas degradadas. Estudo realizado na Floresta Nacional de Carajás, no Pará, um espaço protegido cercado por áreas degradadas na Amazônia, analisou 51 espécies de abelhas e 43 espécies de plantas que elas visitam. Segundo a Agência Bori, o mapeamento faz parte da dissertação de mestrado da engenheira florestal Luiza Romeiro, do Instituto Tecnológico Vale, e pode ajudar a criar iniciativas de restauração da floresta. “Um dos fatores a serem considerados na recuperação dessas áreas seria priorizar a reintrodução de espécies que fornecem recursos alimentares para as abelhas, porque isso vai atraí-las de volta ao local, naturalmente”, afirma a pesquisadora.
📙 Cultura
“Eu sinto falta da minha cidade ter uma memória sobre a população favelada.” Hugo Oliveira é artista, pesquisador e criador da Galeria Providência, projeto de murais de arte urbana no Morro da Providência, no Rio de Janeiro (RJ). O Nonada explica que, embora existam bens imateriais ligados às favelas que já foram registrados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), como Matrizes do Samba no Rio de Janeiro, a Roda de Capoeira e o Ofício dos Mestres de Capoeira, o poder público ainda está longe de enxergar as comunidades como um lugar de potência e criação ao invés de um lugar de falta. É nessa ausência que atuam também iniciativas que buscam preservar a memória das periferias brasileiras e valorizam seus saberes.
A formação de facções no Acre é o arco principal de “Noites Alienígenas”, primeiro longa-metragem acreano contemporâneo, dirigido por Sérgio de Carvalho, que afirma: “Está provado que essa política atual de combate às drogas está completamente falida”. Ambientado na capital, Rio Branco, o enredo narra a entrada de jovens para o tráfico de drogas e o crescimento da violência urbana. A Ponte esmiúça a obra, que tem o ator Chico Diaz e o rapper Gabriel Knoxx no elenco. Com seis premiações no Festival de Gramado, a produção ainda aborda de modo natural temas atuais como machismo, a questão LGBTQIA+ e a ancestralidade indígena.
🎧 Podcast
A mercantilização da cidade de São Paulo. As propagandas estão por toda parte e a linha entre o público e privado já quase não existe. O episódio bônus do “Prato Cheio”, produção d’O Joio e O Trigo, analisa o avanço das privatizações e das corporações sobre o espaço urbano. O podcast conversa com a relatora da ONU pelo Direito à Moradia Adequada (2008-14) e professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Raquel Rolnik, sobre os naming rights – a prática de comprar o direito de colocar o nome de sua marca em um espaço ou estabelecimento – que têm tomado as estações de metrô, os parques e as ruas paulistanas.
✊🏽 Direitos humanos
Pessoas encarceradas sofrem sem acesso à saúde. Privado de liberdade por 26 anos, Marco Antônio, de 56 anos, morador da Pavuna, na zona norte do Rio de Janeiro, perdeu completamente a visão do olho esquerdo no período em que esteve detido. Sem atendimento médico digno, passou anos com fortes dores na cabeça, ardência nos olhos, alta sensibilidade à luz do sol e chegou a perder as forças para se alimentar. O Maré de Notícias lembra que tuberculose, diabetes, aids e Covid-19 – a última foi responsável por 20% das mortes nos presídios em 2020 e 2021 – estão no topo da lista de doenças mais letais no sistema prisional. A dificuldade de atendimento, porém, continua após a liberdade, uma vez que os egressos convivem com preconceito, inclusive de profissionais de saúde, e falta de documentos, como comprovante de residência fixa.