O PL das Fake News e as fazendas em terras indígenas
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🔸 Embora perceba avanços nos cem primeiros dias do governo Lula, movimentos negros indicam pontos urgentes que carecem de foco, como o combate à violência policial e a titulação de terras de comunidades quilombolas. Para a socióloga e ativista Vilma Reis, o genocídio da juventude negra é abordado de forma tímida pelo governo. “O Estado brasileiro precisa parar de matar o nosso povo”, afirma. A expectativa também era maior quanto aos territórios quilombolas. “Dos 35 que a gente esperava a titulação, apenas três foram reconhecidos”, diz Sandra Andrade, coordenadora executiva da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos. Entre as críticas, a Alma Preta aponta dez políticas já implementadas que impactam na população, como a diversidade na composição do governo federal, que tem oito ministros autodeclarados negros.
🔸 Para ouvir: no meio ambiente, um cenário do primeiro mandato de Lula se repete agora – os três primeiros meses da gestão foram marcados pelo aumento da destruição das áreas da Amazônia e do Cerrado. Em 2003, o desmatamento também estava em ritmo acelerado e atingiu um dos maiores índices da história em 2004. “Nossa meta é alcançar o desmatamento zero na Amazônia”, afirmou Lula no discurso de posse do mandato atual, como lembra o podcast “Durma com Essa”, do Nexo. O presidente assinou em seguida decretos para fortalecer o combate ao desmate, restabelecer o Fundo Amazônia e retomar o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Ainda assim, os índices de devastação seguiram em alta. Uma das principais causas é o acúmulo de medidas adotadas nos últimos quatro anos, ao longo do governo Bolsonaro.
🔸 A desinformação também foi marcante nos cem dias de governo. Lula proferiu informações falsas, em especial sobre economia e o legado do governo Bolsonaro. O Aos Fatos compila em tópicos e detalha algumas das checagens de falas do presidente feitas desde 1º de janeiro deste ano. É falsa, por exemplo, a afirmação de Lula segundo a qual o Brasil não cresceu em 2022. Segundo o IBGE, houve, no acumulado do ano, um aumento de 2,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em comparação com 2021.
🔸 Falando em desinformação: os três anos do PL das Fake News, como é chamado o projeto de lei 2.630, apresentado em 2020. De lá para cá, o texto sofreu muitas alterações, tornou-se mais longo e complexo do que o original. O foco, que era combater a desinformação, agora está na regulamentação das redes sociais no Brasil. A Lupa compara os principais pontos das quatro versões do projeto: o original, o texto aprovado no Senado, o substitutivo da Câmara e, por fim, a recente sugestão do governo. Esta, aliás, mira o compartilhamento de discursos de ódio e os ataques ao sistema democrático.
🔸 Uma pesquisadora brasileira para comandar o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC). O nome de Thelma Krug foi indicado pelo governo à presidência do órgão das Nações Unidas. O Headline conta que ela já ocupa, desde 2015, uma das três vice-presidências do IPCC. Formada em matemática pela Roosevelt University, nos Estados Unidos, mestre em Probabilidade e Estatística pela mesma universidade e doutora em Estatística Espacial pela University of Sheffield, na Inglaterra, ela fez carreira dentro Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Se eleita, será a primeira mulher à frente do órgão responsável por avaliar a ciência relacionada à mudança do clima.
📮 Outras histórias
Apenas um entre 43 rios nordestinos pertencentes a bacias hidrográficas de Mata Atlântica tem índice de qualidade da água considerado bom. Segundo o estudo “Observando os Rios 2023”, da SOS Mata Atlântica, só a Lagoa do Bonfim, localizada no Rio Grande do Norte, atingiu um patamar satisfatório. A Agência Tatu destaca que a maioria dos rios monitorados do Nordeste apresentou qualidade regular e que nenhum entrou na categoria ótima. De acordo com a SOS Mata Atlântica, os índices estão diretamente relacionados às condições insatisfatórias de saneamento básico no país.
📌 Investigação
Trinta fazendas foram certificadas dentro de terras indígenas no Brasil nos três primeiros meses deste ano. Levantamento da Agência Pública mostra que são cerca de 9 mil hectares de propriedades privadas dentro dessas áreas. A certificação em territórios indígenas ainda não homologados foi liberada no governo Bolsonaro, em 2020. O Grupo Técnico de Povos Indígenas recomendou a revogação imediata da medida ao gabinete de transição de Lula, no final do ano passado, o que ainda não ocorreu. Dessas 30 fazendas, 13 estão no Mato Grosso do Sul e ocupam juntas 7,8 mil hectares, passando por seis terras indígenas. Os povos mais afetados são os Guarani e Kaiowá, que já vivem com um histórico sangrento de conflitos com fazendeiros.
🍂 Meio ambiente
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu a “presunção de boa fé” na compra de ouro. O dispositivo legal facilitava a ampliação do garimpo ilegal no país: os compradores do metal podiam aceitar apenas a palavra do vendedor sobre sua origem legal, sem o risco de serem responsabilizados em descobertas posteriores de ilegalidade. O Colabora informa que a liminar, assinada pelo ministro Gilmar Mendes, tem validade imediata e dá prazo de 90 dias para que o governo federal adote um novo marco regulatório para a fiscalização do comércio do ouro no país. Gerente do Instituto Escolhas, que estuda o comércio ilegal do minério nos últimos anos, Larissa Rodrigues, afirma que a decisão é fundamental: “Não é aceitável, não é cabível, que tenhamos um comércio bilionário com base na boa-fé dos envolvidos”.
A reconstrução da agenda ambiental marcou os primeiros cem dias do governo Lula. O período foi dedicado à reorganização do agora Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, depois do desmonte deixado pela gestão anterior. O Eco detalha as principais ações da pasta, como a criação da Secretaria Nacional de Bioeconomia, da secretaria extraordinária de Controle do Desmatamento e Ordenamento Territorial e do Departamento de Oceano e Gestão Costeira. Especialistas e ativistas ouvidos pela reportagem, porém, lembram que os desafios são muitos, sobretudo em relação às pautas anti-ambientais presentes no Congresso e ao número de servidores necessários para ir a campo em ações de fiscalização, prevenção e combate a crimes ambientais.
📙 Cultura
Ilustradores negros buscam trazer representatividade para o mundo geek. A falta de diversidade nas histórias em quadrinhos e filmes de super heróis é a ponta de um problema mais amplo: a maioria dos criadores, escritores e diretores são brancos e ocidentais. À Emerge Mag as quadrinistas independentes Mity Dias e Marília Marz contam que trabalham em obras autorais para dar referências de personagens negros para as novas gerações. “As crianças de hoje terão figuras que não tivemos como parte de seus imaginários, como princesas e super heróis negros e cuja história não gira em torno da cor da pele”, afirma Mity. A artista também destaca a importância de eventos que tragam esses ideais, como o PerifaCon, feira que reúne diversos fãs da cultura geek na periferia.
A fotógrafa Fernanda Souza, conhecida como Correrua, registra bailes funks nas periferias de São Paulo e busca manter o trabalho em seu próprio território. Cria do Grajaú, na zona sul da capital paulista, a artista inaugurou a exposição “Sobrevivendo no Inferno” em um escadão de seu bairro. Segundo a Agência Mural, embora já tenha tido seu trabalho exposto no Centro Cultural São Paulo (CCSP), região central da cidade, ela busca agora inverter o fluxo cultural, fazendo com que as pessoas se desloquem para a periferia para ver sua produção: “Estou tentando democratizar. É aqui, não é na Vergueiro ou em Pinheiros. Essa é a Correrua na sua essência, na rua, essa sou eu”. A mostra leva o mesmo nome do álbum lançado em 1997 pelos Racionais MC’s, uma referência para a obra da fotógrafa.
🎧 Podcast
A fusão nuclear é a energia do futuro – há aproximadamente 70 anos, desde quando cientistas vêm trabalhando por seu uso comercial. Foi só em dezembro passado que, pela primeira vez, um reator em laboratório dos Estados Unidos produziu mais energia do que a que foi consumida para gerá-la. Esse novo fôlego nas pesquisas atraiu investimentos bilionários da iniciativa privada para o setor. O podcast “Economia do Futuro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, conversa com Vinícius Njaim Duarte, pesquisador brasileiro envolvido com os estudos sobre o tema na Universidade de Princeton. Ele descreve de forma didática como a tecnologia funciona, imitando o funcionamento das estrelas, seus principais desafios e a estabilidade energética que traria ao mundo.
🧑🏽⚕️ Saúde
Casos de desnutrição infantil no país cresceram e chegaram ao patamar de dez anos atrás. Entre 2012 e 2022, em média, dez crianças menores de 5 anos foram internadas com esse quadro. Somente no ano passado foram 4.315 internações, segundo dados do Ministério da Saúde. Embora a insegurança alimentar atinja várias camadas da população, ela é mais severa entre crianças negras e indígenas, e os casos estão mais concentrados na região Nordeste. O Lunetas conversa com especialistas e explica como a falta de nutrientes em quantidades adequadas afeta o desenvolvimento infantil e como combater esse cenário, que se soma à expansão do consumo de fast foods e ultraprocessados.