A PEC da Segurança na Câmara e a adesão às cotas trans nas universidades
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🔸 O ministro Alexandre de Moraes, determinou a preservação integral de todos os materiais que possam servir como provas da operação policial que resultou em ao menos 121 mortes no Rio de Janeiro, nos complexos do Alemão e da Penha. A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) segue os preceitos da ADPF das favelas, que, desde 2020, aplicou uma série de normas para o uso da força policial em comunidades do Rio. A CartaCapital destaca que Moraes confirmou para esta quarta-feira uma audiência conjunta com representantes de dezenas de entidades de defesa dos direitos humanos, na sede do Supremo, em Brasília. Em outra decisão, o ministro convocou o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), para uma reunião sobre o tema, e afirmou que também vai conversar com o governador do estado, Cláudio Castro (PL).
🔸 Nenhum dos mortos no massacre da semana passada estava entre os alvos oficiais da denúncia do Grupo de Atuação Especializada de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) que embasou a ação policial. O Notícia Preta explica que a informação foi confirmada a partir da lista parcial divulgada pela Polícia Civil na última sexta-feira, com os nomes de 99 suspeitos já identificados. Segundo o levantamento, nenhuma das vítimas fatais tinha mandado ligado ao processo da operação; 42 possuíam mandados por outros crimes e 78 tinham histórico criminal, mas não necessariamente respondiam por algum crime no momento.
🔸 “Na operação do Rio, o Estado se comportou como facção, em uma estratégia que despreza o modelo de sustentação do Comando Vermelho.” A afirmação é de Bruno Paes Manso, jornalista, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP e autor de livros como “A República das Milícias”. Em artigo na piauí, ele destrincha o modelo de negócio do Comando Vermelho e mostra que a operação policial funciona como uma ofensiva “localizada” contra um crime “pulverizado”. Segundo ele, a ação serviu para “expor a fragilidade das instituições políticas e policiais do Rio”. “A barbárie dos corpos abandonados na mata para serem retirados por seus familiares escandalizaram o Brasil e o mundo. Uma tragédia que não atingiu em nada essa estrutura horizontal e capilarizada do crime”, explica. “Em vez de produzir a ordem desejada, a política do governador, mais parecida com a forma improvisada de criminosos, promove o caos.”
🔸 Em meio à crise aberta pela operação no Rio, a Câmara dos Deputados faz hoje uma nova audiência sobre a PEC da Segurança Pública. O foco da comissão especial que analisa a Proposta de Emenda à Constituição é a integração entre os órgãos e instituições que compõem o sistema de segurança brasileiro. O Congresso em Foco informa que entre os convidados estão representantes das polícias, do sistema de Justiça e das guardas municipais, além de especialistas em segurança pública. Enviada pelo governo à Câmara em abril, a proposta cria o Sistema Único de Segurança Pública na Constituição e amplia as competências da União na área.
🔸 Falando em governo federal… na sexta, Lula enviou ao Congresso o PL Antifacção, projeto de lei de combate às organizações criminosas. O presidente disse que o texto enviado tem caráter de “urgência urgentíssima”. Segundo o Canal MyNews, a proposta elaborada pelo Ministério da Justiça cria um novo tipo penal e prevê pena de 30 anos de prisão para quem participar dessas facções. “Nós vamos mostrar como se enfrenta as facções criminosas nesse país, como se enfrenta o crime organizado, como se enfrenta aquele que vive da exploração do povo mais humilde desse país”, afirmou Lula
🔸 A violência policial não se restringe ao Rio: em 2025, operações mataram 85 pessoas em Salvador – todas negras. As vítimas das chacinas na capital do estado e na região metropolitana são 98% homens e 5% adolescentes, mostra a Revista Afirmativa, a partir de levantamento do Instituto Fogo Cruzado. O número de mortos em chacinas cresceu no ano: foram 109 vítimas entre janeiro e 17 de outubro de 2025, ante 69 no mesmo período de 2024. Só em setembro, foram registrados 105 tiroteios, mais da metade durante operações policiais, com dezenas de mortos e feridos. O monitor já somou 5 mil tiroteios na capital e na região, com milhares de baleados, sobretudo em áreas periféricas de maioria negra.
📮 Outras histórias
Embora as pessoas negras sejam 63% da população do Rio Grande do Norte, apenas dez dos 167 municípios do estado têm uma secretaria específica para a promoção da igualdade racial. A informação foi divulgada pelo IBGE na semana passada, na Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic). O Saiba Mais detalha os números do estado e conversa com a analista responsável pela pesquisa, Rosane Siqueira e Oliveira. Ela explica que uma estrutura organizacional bem definida impulsiona a implementação de políticas públicas: “Não apenas facilita a comunicação interna e a coordenação entre diferentes níveis e setores da administração, como garante que os objetivos estabelecidos nesse âmbito sejam alinhados com as práticas cotidianas da gestão municipal”. A reportagem lembra que o cenário nacional também preocupa: no país, só 24% das prefeituras possuem estrutura para tratar da Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial.
📌 Investigação
A Prefeitura de Vitória da Conquista (BA) pagou quase R$ 1,5 milhão, entre 2019 e 2020, para a elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico. A proposta traçou um roteiro de R$1,68 bilhão para universalizar o acesso à água, esgoto, drenagem e coleta de lixo no município até 2040. Cinco anos depois do documento ser apresentado, o plano nunca saiu do papel. O Conquista Repórter mostra que a omissão política, mesmo com gasto milionário, aprofundou o abismo social entre as zonas rural e urbana do município. Ao comparar o Censo de 2010 e de 2022, o acesso ao esgoto tratado teve uma estagnação crítica: em Dantilândia, permaneceu em 0,9% e, em Veredinha, subiu de 0,5% para apenas 1,1%. O número absoluto de casas sem acesso à rede de esgoto aumentou em todos os 11 distritos rurais. Já no abastecimento de água, alguns distritos regrediram em termos percentuais.
🍂 Meio ambiente
Invasor no litoral brasileiro, o coral-sol tem sua dispersão em Arraial do Cabo (RJ) estagnada. A espécie compete por espaço com as nativas, mas seu impacto na biodiversidade ainda divide os pesquisadores. Para Carlos Eduardo Leite Ferreira, professor do Departamento de Biologia Marinha da Universidade Federal Fluminense (UFF) e coordenador do Laboratório de Ecologia e Conservação em Ambientes Recifais, outros fatores, como os diferentes tipos de poluição marinha e a sobrepesca, são muito mais determinantes que a espécie invasora. O Correio Sabiá detalha o histórico de ocorrência do coral-sol na região e indica que sua estagnação se deve principalmente às águas mais frias de Arraial do Cabo.
📙 Cultura
“A arte é mais complexa do que se pode pensar. Temos que pedir licença às divindades, pedir licença à natureza. Às vezes forçamos o caminho, mas o caminho não é por ali”, afirma o artista indígena kaqchikel-maia Edgar Calel, da Guatemala. Sua exposição “Ru Jub’ulik Achik’ – Aromas de um sonho” no Instituto Inhotim, em Minas Gerais, oferece um percurso pela produção de Calel através da conexão entre o sagrado, a ancestralidade e os territórios. O Nonada acompanhou a abertura da mostra, na companhia do artista e de sua família. A partir do desenho, da instalação, da fotografia e da performance, Calel aborda as complexidades das experiências indígenas, por meio da produção de imagens da cosmovisão e da vida comunitária kaqchikel-maia. Todos os processos acontecem de forma compartilhada com a família. “Não quero ser o único a experienciar tudo”, diz.
🎧 Podcast
“As mulheres negras jovens precisam de um outro futuro. E, se a gente não se levantar, elas não terão outro futuro”, afirma Valdecir Nascimento, fundadora do Odara – Instituto da Mulher Negra. Nascida e criada no bairro de Alagados, periferia de Salvador (BA), vivendo em palafitas, ela iniciou sua trajetória como ativista do movimento negro aos 20 anos. Hoje, aos 65, ela avalia que a organização do movimento de mulheres negras evoluiu significativamente na última década. O “Conversas de Portão”, produção do Nós, Mulheres da Periferia, resgata a história de Valdecir e sua percepção sobre a luta das mulheres negras. “Nós somos um dos movimentos sociais, que eu considero, mais múltiplo, mais diverso e melhor organizado.”
👩🏽🏫 Educação
Apesar das cotas destinadas a pessoas trans, travestis e não binárias nas universidades serem um avanço, as políticas de permanência, como bolsas de apoio e estrutura acolhedora, ainda são insuficientes para essa população se manter nas instituições. “São microagressões, como não respeitar meu pronome, tentar me diminuir, me colocar em espaços em que preciso estar com homens gays porque não sou mulher suficiente para determinadas coisas”, afirma Elis Rodrigues, que ingressou no curso de direito da Universidade Federal Fluminense (UFF). A Agência Diadorim destaca que o número de ingressantes está aquém da projeção inicial feita: a UFF esperava cerca de 360 estudantes de graduação e pós-graduação em 2025, mas apenas 66 ingressaram pela ação afirmativa nos cursos de graduação – a instituição não informou os dados sobre a pós-graduação. Um dos motivos para essa discrepância pode estar antes do vestibular, uma vez que a maioria das pessoas trans sequer conclui a educação básica.




