A pauta do aborto de volta ao STF e as mulheres caciques nas aldeias
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🔸 A ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal, liberou para julgamento a ação sobre a descriminalização do aborto em gestantes com até 12 semanas de gravidez. A magistrada quer dar seu voto antes de se aposentar, no final do mês. O que a ação discute, na prática, é se a mulher grávida deve responder na Justiça e, eventualmente, ser punida pelo procedimento. “É certo que não haverá conclusão desse julgamento no curto prazo. Este é um assunto polêmico, que divide a sociedade e também o tribunal”, avalia Felipe Recondo no Jota. Segundo ele, “ouvindo os ministros em caráter reservado, a expectativa é de que a Corte não deve descriminalizar o aborto, já que há uma corrente, majoritária, que defende que cabe ao Congresso legislar sobre o tema”.
🔸 Apenas 3,5% dos juízes que tomaram posse após 2016 entraram por cotas raciais. É o que mostra o último Diagnóstico Étnico-Racial do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os dados mostram que a Lei de Cotas não tem se mostrado suficiente para reduzir a desigualdade racial na contratação de magistrados para o Judiciário brasileiro. A Alma Preta revela que, quanto mais alto o cargo, mais o percentual de brancos aumenta. Entre os cargos de chefia, as servidoras brancas estão melhor colocadas. Elas representam 74,5% desses cargos, enquanto 18,6% são mulheres negras.
🔸 Quatro deputadas e duas vereadoras de Minas Gerais andam sob escolta 24 horas por dia. Elas receberam ameaças de tortura, estupro corretivo e morte por e-mail. Em comum, todas têm a defesa de causas ligadas à população LGBTQIA+, ao movimento negro e feminista. A revista piauí acompanhou a rotina delas e conversou com as parlamentares. “A PM ali atrás é uma lembrança permanente de que nossa segurança está em risco. Eu ainda estou aqui, dentro do meu carro, com escolta. Mas e a minha equipe? Eles também foram ameaçados”, diz Lohanna França (PV), uma das deputadas ameaçadas.
🔸 A Câmara dos Deputados pautou urgência para o projeto da minirreforma eleitoral. O texto acendeu o alerta de organizações de defesa dos direitos das mulheres e de combate à corrupção. Isso porque, como explica o Congresso em Foco, as mudanças propostas podem comprometer a participação de mulheres, pessoas LGBTQIA+ e outros grupos sociais no processo eleitoral. Não bastasse, a proposta ainda reduz a pena para a compra de votos – a atual cassação do diploma do candidato eleito seria substituída por uma multa. “Isso é muito sério. O projeto trata como se tivéssemos, da década de 90 para cá, resolvido a questão da compra de votos no Brasil, mas não é assim. Comprar votos ainda é um problema gravíssimo, e que ainda piorou de alguns anos para cá”, afirma o jurista Márlon Reis, cofundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
📮 Outras histórias
Pelo menos quatro policiais militares investigados por mortes de civis voltaram ao trabalho em Curitiba. No ano passado, depois de 12 mortes sem indícios de confrontos (entre elas, a de um adolescente), o Ministério Público do Paraná pediu o afastamento de 23 agentes por suposto envolvimento nos casos. O Plural apurou que, além dos quatro oficiais já autorizados a voltar ao trabalho, outros oito também foram liberados. O documento da Justiça ao qual a reportagem teve acesso proíbe os agentes de “manter qualquer contato com testemunhas e familiares destas e das vítimas”, para garantir que possam contribuir com o inquérito “livres de receios”.
📌 Investigação
Pela primeira vez, os povos Pankará e Tuxá Campos, no Sertão de Pernambuco, são comandados por mulheres. A cacique Lucélia Pankará lidera uma população que pode ser afetada caso seja aprovada a tese do marco temporal. Em 1988, os Pankarás foram removidos do território onde viviam para a construção da Barragem Luíz Gonzaga e só conseguiram a reintegração em 1997. Já os Tuxá Campos, atualmente sob comando da cacique Evani Tuxá, estavam em seu território tradicional à época da Constituição, mas também esperam a demarcação. A Gênero e Número destrincha a história dos Pankará e Tuxá Campos e atuação de suas líderes, que se dividem entre conquistar a titularidade das terras e combater crimes ambientais.
🍂 Meio ambiente
Diante da crise climática, as escolas precisam se abrir para os saberes ancestrais dos povos originários. O Porvir narra como o diálogo entre gerações é essencial para desenvolver uma educação ambiental baseada no contato com a natureza e com o futuro do planeta. “Os conhecimentos dos povos indígenas precisam ir para os currículos. Os professores deveriam tentar se aproximar disso. É preciso mobilizar a opinião pública. É um conhecimento presente nas aldeias e organizações indígenas, mas que não está organizado para que as escolas o acessem”, diz Almir Suruí, líder indígena que já foi reconhecido pelas Nações Unidas como Herói da Floresta. A matéria é resultado das Bolsas de Reportagem de Justiça Climática, promovidas pela Ajor e pelo iCS (Instituto Clima e Sociedade).
Em áudio: o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado por Lula em agosto, além dos programas sociais e de infraestrutura, foca na transição ecológica da economia. No “Economia do Futuro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, a especialista sênior do Instituto Talanoa, Marta Salomon, analisa o quão “verde” é o novo PAC e explica as contradições do programa. No eixo chamado “transição e segurança energética”, por exemplo, 60% dos recursos serão destinados ao setor de óleo e gás – com um valor 13 vezes maior do que os investimentos previstos para combustíveis de baixo carbono.
📙 Cultura
“Retratos Fantasmas”, de Kleber Mendonça Filho, vai representar o Brasil na disputa por uma vaga de melhor filme internacional na próxima edição do Oscar, que acontecerá em março de 2024. A decisão foi anunciada ontem pela Academia Brasileira de Cinema e Artes Audiovisuais. Poucos dias antes, o diretor explicou a relação entre as ruínas do cinema e a lógica mercadológica que traz no longa em entrevista ao Headline: “Toda vez que você vê uma sala fechada, uma ruína, um cinema do passado abandonado, você está vendo um produto que foi abandonado. Ocorre que esse ponto de venda vendia sonhos e imaginação e imagens e lembranças e músicas. O cinema vendia ideias”.
Em áudio: “O etnocídio não é a morte do corpo, mas a morte do processo de identidade”, afirma Eva Potiguara. Indígena do povo Potiguara, ela é escritora, doutora em Educação e coordenadora do Mulherio das Letras Indígenas. A série “Pensando a Amazônia pela Literatura”, do “LatitudeCast”, podcast da Amazônia Latitude, conversa com Eva e também com Jama Wapichana, escritora, roteirista e mestre em Letras e Literatura, do povo Wapichana. Elas contam como o coletivo Mulherio trabalha para dar visibilidade a artistas indígenas mulheres de todo o Brasil e busca descolonizar e aldear as múltiplas linguagens dos povos originários.
🎧 Podcast
Negócio lucrativo para empresas, a privatização do transporte público em São Paulo significou mais precariedade para os trabalhadores e passageiros, como ocorre hoje com a linha nove, que passou do poder público para a empresa ViaMobilidade. O “Cena Rápida”, produção do Desenrola e Não Me Enrola, recebe Lucas Dametto, do Comitê de Luta contra a Privatização da CPTM, e Sandro Oliveira, cientista social e pesquisador do Centro de Estudos Periféricos. O episódio retrata a atual situação do transporte na capital paulista e como a mobilidade urbana é um fator também de segregação social.
✊🏾 Direitos Humanos
A ONG Conectas e o Movimento Mães de Maio vão às Nações Unidas para denunciar a Operação Escudo, que deixou 28 mortos na Baixada Santista, em São Paulo, entre 28 de julho e 5 de setembro. A ação ocorreu depois do assassinato de um soldado da Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), da Polícia Militar. A Ponte teve acesso ao discurso que será lido hoje na reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, na Suíça. O documento destaca os relatos de “execuções sumárias, tortura, invasão de domicílios, destruição de moradias e outros abusos e excessos praticados pelas forças de segurança”.