As palavras de Nego Bispo e o dia de Santa Bárbara e Iansã na Bahia
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🔸 Filósofo e líder quilombola, Antonio Bispo dos Santos, conhecido como Nego Bispo, se autodenomina um “lavrador de palavras”. Nascido no Piauí em 1959, ele ganhou notoriedade apenas nos anos 1990 a partir da atuação em organizações como a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) e em movimentos sociais de seu estado. Foi, segundo a própria Conaq, “uma voz singular e significativa no âmbito da literatura e do pensamento quilombola”. Quando lançou o livro “A Terra Dá, a Terra Quer”, em junho deste ano, afirmou: “Quem foi colonizado precisa realmente se decolonizar. Mas nós, quilombolas, não fomos, e não precisamos disso. Precisamos contracolonizar para não sermos colonizados”. Nego Bispo morreu ontem, aos 63 anos. O Nexo perfilou o pensador, narrou seus primeiros contatos com a escrita, sua passagem pelo Rio de Janeiro, seu ingresso na vida política e a contribuição de seu pensamento para o país.
🔸 A COP28 expôs uma contradição do Brasil: se lidera o chamado aos países para o cumprimento do Acordo de Paris, não puxa os esforços por um acordo global pelo abandono do uso de combustíveis fósseis. A Agência Pública analisa a atuação do Brasil na Conferência do Clima das Nações Unidas, mostra os bastidores e destaca a mudança de postura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) do ano passado, quando voltou à COP recém-eleito, para este ano. Agora, como presidente, teve mais encontros bilaterais com mandatários de outros países e se distanciou dos movimento sociais. Também tinha um trunfo de que não dispunha em 2022: Lula levou à COP os números da queda do desmatamento da Amazônia sob seu primeiro ano de mandato.
🔸 A menos de 300 km de Belém, sede da COP no Brasil em 2025, está o campeão de queimadas na Amazônia: Portel. A Repórter Brasil informa que o município, localizado ao norte do estado, perto da ilha de Marajó, foi o que mais registrou incêndios nos meses de outubro e novembro: foram 1.313 pontos de queimadas. Embora uma portaria do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) tenha classificado Portel como uma das áreas prioritárias de preservação na Amazônia Legal, a destruição na cidade se acentuou nos últimos três anos. Cerca de 3.500 famílias, muitos indígenas e quilombolas, no entorno do município sofrem os impactos do fogo, originado sobretudo por grileiros de terra.
🔸 A Amazon e a Amazônia. Depois de o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil), questionar a gigante global do comércio online pelo uso do nome Amazon, o bilionário Jeff Bezos, dono da empresa, afirmou que seu fundo filantrópico doará cerca de R$ 80 milhões para o combate ao desmatamento na Amazônia Legal. A revista Cenarium conta que o assunto ficou entre os mais comentados da internet no fim de semana, e o governador deve se reunir amanhã com representantes da multinacional, em Dubai, onde participa da COP28. “A Amazon usa o nome do Amazonas, usa o nome da Amazônia. Quanto é que a gente ganha por isso? A gente quer saber”, questionou Wilson Lima.
🔸 Vítimas da mineração da Braskem, moradores de Maceió (AL) têm sido alvo de remoções forçadas e violência policial. A Mídia Caeté apurou que, enquanto alardeiam agilidade e organização, as autoridades têm agido com truculência e sem informações, por exemplo, sobre o local de destino das famílias removidas de suas casas. Moradora do bairro do Pinheiro, Priscila Barros conta que acordou com fortes batidas na porta e o grito: “É a polícia”. Em seguida, os policiais ordenaram que deixassem a casa em apenas cinco minutos: “Como eu estava com roupa de dormir, só pedi para trocar de roupa e retornar para abrir a porta. A polícia arrombou a porta da casa, e eram mais de 30 pessoas”.
📮 Outras histórias
Começa hoje a Semana dos Direitos Humanos, no Complexo da Maré. São seis dias de atividades que incluem desde caminhadas pelo conjunto de favelas na zona norte do Rio de Janeiro até uma feira de mobilização e engajamento comunitário. O Maré de Notícias detalha a programação e destaca o 2º Congresso Falando sobre Segurança Pública na Maré, que vai de quarta a sexta. Estão previstas conversas com temas como a violência armada e a morte de homens, jovens e negros, o direito à memória e estratégias para a construção de políticas de segurança pautadas na preservação da vida nas favelas.
📌 Investigação
Parlamentares apresentaram 35 propostas que restringem o direito ao aborto legal ou endurecem penas para procedimentos clandestinos, entre fevereiro e outubro deste ano. Ao todo, foram 22 projetos de lei (18 na Câmara e quatro no Senado) e 12 projetos de decreto legislativo (11 na Câmara e um no Senado), além da PEC 49/2023, de autoria do senador Magno Malta (PL-ES), que busca alterar o artigo 5º da Constituição para ampliar o direito à vida aos nascituros. O Aos Fatos identificou que uma em cada quatro propostas usa argumentos desinformativos em suas justificativas – entre elas, a de que o aborto aumentaria a chance de problemas de saúde mental e que os procedimentos envolveriam técnicas de tortura contra o feto. Ambas as alegações já foram desmentidas.
🍂 Meio ambiente
“Quando desenvolvendo minhas pesquisas, o fogo foi entrando nas minhas áreas de estudo e em outras áreas que não eram, mas que eu conhecia intimamente, e foi matando tudo. E o que sobrou depois foi a floresta arrasada.” Erika Berenguer é uma das maiores referências sobre fogo em florestas tropicais do mundo e já estuda há 15 anos o impacto das queimadas na Amazônia. O Eco narra a trajetória da bióloga cujo foco de trabalho é o fogo resultante da atividade humana, que altera a dinâmica da floresta. Para ela, os últimos oito anos de pesquisa trazem uma sensação de luto. “Percebi que estava em luto, mas não sabia que podia estar em luto pela floresta. Por um bioma. Não conseguia entender isso. E este ano tenho sentido isso de novo”, diz.
📙 Cultura
Patrimônio Imaterial da Bahia, a Festa de Santa Bárbara acontece hoje nas ruas do Centro Histórico de Salvador. O evento religioso que marca o sincretismo religioso afro-católico começa na alvorada com o repique dos sinos da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e segue com a missa realizada ao ar livre, no Largo do Pelourinho, e, em seguida, com a procissão levando a imagem da santa. A revista O Grito! detalha as raízes do culto à Santa Bárbara no dia 4 de dezembro, quando também é celebrada Iansã, uma das principais iabás (orixás femininos) e senhora dos ventos.
Com uma longa trajetória na dança afro-brasileira, a baiana Aldelice Batista Braga, 59 anos, foi uma das fundadoras do Bloco Africatarina quando se mudou para Florianópolis (SC). Desde 2009, precisou parar de dançar por condições médicas, mas não abandonou a economia criativa. A artista se dedicou à profissão de estilista, com roupas que valorizam a estética negra e a produção sustentável. Ao Catarinas ela fala sobre os fundamentos da modelagem que usa e a relação com a dança. “Aqui na minha roupa eu estou solta, estou leve. Tenho um movimento fluido como se fosse na dança. E é isso, a minha questão com a dança faz com que a roupa também acabe dançando comigo, e é uma brincadeira que vou fazendo até hoje.”
🎧 Podcast
“O rap foi inserido em mim desde criança”, afirma o DJ John, ao lado do DJ Androide, duas referências musicais da zona sul de São Paulo, que influenciam em novos estilos e criam experiências a partir de sons e beats. A atividade de discotecagem é uma das principais para o desenvolvimento do hip hop e da cena da black music como um todo. O Manda Notícias conversa com John e Androide para falar sobre a democratização da discotecagem e suas trajetórias na música.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
O psicanalista Cleubecyr Barbosa diz que a construção de uma masculinidade idealizada em que “o homem precisa ser sempre forte, viril e potente” é nociva para a saúde mental principalmente de homens negros. “O homem negro vai interagir constantemente com essa estrutura do não pertencimento. Isso que diferencia o homem negro dos outros homens”, afirma Barbosa, em entrevista ao Desenrola E Não Me Enrola. Desde 2021, ele lidera o projeto Racismo na Subjetividade. A iniciativa é conduzida em parceria com o Terapretas, que promove saúde mental acessível para pessoas negras.