O pacote de corte de gastos e os impasses de uma ferrovia na Amazônia
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🔸 Depois de ver a PEC que proíbe o aborto aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, a bancada governista planeja costurar uma conjuntura contrária na comissão especial. A Proposta de Emenda à Constituição inviabiliza trechos do Código Penal que autorizam as formas atualmente permitidas de aborto – em caso de gravidez decorrente de estupro ou em gestação que oferece risco à vida da mulher. O Congresso em Foco conta que o deputado Bacelar (PV-BA) pretende trabalhar para que “a composição da comissão não reflita a de extrema direita presente na CCJ”. O foco agora são os dois partidos que liberaram as bancadas na votação da PEC: União Brasil e PSD. “Por causa dessa liberação, acreditamos que é possível modificar a conjuntura. Isso mostrou que as bancadas têm divisão, que não é um assunto pacificado dentro delas”, diz o deputado. Segundo ele, o governo “não pode admitir um desrespeito de tal ordem à autonomia da mulher brasileira e à saúde da mulher brasileira”.
🔸 O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, detalhou ontem o pacote de corte de gastos, promessa do governo federal para garantir o cumprimento da meta fiscal. Entre as medidas, está a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil ao mês e a garantia de que os salários do funcionalismo respeitem o limite máximo definido no teto constitucional (atualmente, em cerca de R$ 44 mil). O Correio Sabiá detalha o pacote e traz a íntegra do discurso do ministro. O Portal Terra mostra como as medidas vão impactar no bolso dos brasileiros. O reajuste do salário mínimo, por exemplo, vai mudar: ainda será reajustado com base na inflação e no PIB, mas com variação dentro do estabelecido pelo arcabouço fiscal. Ou seja, poderá ter aumento máximo de 2,5% e, mínimo, de 0,6%, acima da inflação.
🔸 O Pacto Global da ONU enfrenta denúncias de racismo na operação brasileira, envolvendo o ex-CEO Carlo Linkevieius Pereira e o ex-diretor de estratégia Otávio Toledo, demitidos após apurações iniciadas em outubro. Documentos obtidos pela Alma Preta revelam que foram ao menos quatro casos de racismo, confirmados por testemunhas em conversas com a reportagem. Funcionários negros relatam ainda que sofreram retaliação ao denunciar o problema ao departamento de Recursos Humanos – contam que foram vítimas de isolamento, negligência e ainda classificados como “ativistas”. O Pacto Global - Rede Brasil informou que vai selecionar o próximo CEO a partir de uma vaga afirmativa “em linha com os propósitos de inclusão e diversidade” da entidade.
🔸 A cada dez negros das classes A e B, nove sofrem racismo em lojas de luxo. É o que aponta a pesquisa Racismo no Varejo de Beleza de Luxo, feita com 350 consumidores negros em todo o país. O Notícia Preta detalha o levantamento que identificou 21 formas de discriminação em ambientes de luxo, entre elas o tratamento invasivo e a perseguição dentro de lojas. Dos entrevistados, 74% contaram que se sentem excessivamente observados pelos funcionários, e 47% relataram que já foram confundidos com trabalhadores, em vez de clientes das lojas.
📮 Outras histórias
Em Dom Inocêncio, no Piauí, uma sanfona de 5,1 metros de altura e 3,8 metros de largura é o orgulho local. Inaugurada em 2019, a obra é de autoria de Salvador Nunes e de seu filho Sandrinho do Acordeon. O monumento virou símbolo da cidade, cujos moradores alardeiam a estatística (jamais confirmada) de que há um sanfoneiro para cada 35 habitantes. A sanfona gigante chamou tanta atenção que o autor foi convidado para fazer outra, desta vez em Senhor do Bonfim, cidade que se intitula “a capital do forró da Bahia”. E assim surgiu a guerra das sanfonas, como narra o Meus Sertões. O monumento baiano ficou maior: com 7,60 metros de altura e 7,5 metros na parte mais larga. “É bom que se diga, [a sanfona da Bahia] causou um certo ciúme no poder público daqui. É interessante que eles percebam que se você não dá valor, alguém vai dar. E eu espero que alguém nos chame pra fazer outra maior do que essa de Senhor do Bonfim”, diz o artista.
📌 Investigação
Em apenas cinco anos, o número de feminicídios contra mulheres quilombolas superou o registro de toda a década anterior. Foram nove casos entre 2018 e 2022 – e oito entre 2008 e 2017, segundo a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). A revista AzMina revela como as quilombolas não conseguem acesso aos órgãos de denúncia devido à falta de infraestrutura e ao isolamento territorial das comunidades. “É tudo mato, os caminhos cheios de lama, se tentar entrar o carro atola, como uma viatura vai chegar?”, questiona Rose Santos Silva, da comunidade de Rio dos Macacos, em Simões Filho, na região metropolitana de Salvador (BA).
🍂 Meio ambiente
Dez anos depois de ser oficialmente apresentado, o projeto do Ferrogrão, malha a ferroviária de 933 km, prevista para ligar o berço nacional da soja, em Sinop (MT), até as margens do rio Tapajós, em Itaituba (PA), segue sem futuro definido. O Eco mergulha nos impasses da ferrovia que pode afetar 20 terras indígenas – juntas, elas somam 16 milhões de hectares. “Causa preocupação o fato de a Ferrogrão seguir em pauta considerando, de partida, que o projeto se situa em uma região com sérios problemas de governança territorial e se insere em um corredor logístico que já impacta gravemente a população do interflúvio Tapajós-Xingu. E isso não está sendo encarado pela centralidade do governo”, explica Luísa Molina, antropóloga do Instituto Socioambiental (ISA).
📙 Cultura
“O corpo negro e gordo é lindo e merece ser visto com toda a sua beleza”, afirma a cabeleireira, trancista e artista Mariana Rosa, que pinta mulheres negras e gordas das periferias de São Paulo para romper os estereótipos. A Agência Mural conta que neste ano a artista fez a primeira exposição, intitulada “Partes”. Os desenhos apresentam cores quentes e marcantes e mostram as mulheres de maneira delicada, afetuosa e confortáveis na própria pele. “Primeiro eu pensei em como gostaria do início, meio e fim da exposição. Geralmente os artistas primeiro criam as artes, para depois pensar nisso. Eu fiz o caminho contrário, e foi bom. Consegui desenvolver com muita fluidez e com muito carinho. Teve noite que pintei cinco telas de uma vez só”, diz.
🎧 Podcast
A obra do premiado escritor Victor Heringer, morto em 2018, continua a ser descoberta e reconhecida. O “451 MHz”, produção da Quatro Cinco Um, conversa com a poeta e editora Alice Sant’Anna e o poeta Ricardo Domeneck sobre os trabalhos de Heringer e seu legado. “Victor me parece ser um escritor muito completo. Ele fazia romance, crônica, poesia, vídeo, desenho, coisas só para a internet”, afirma Sant’Anna. “Ele viveu pouco, morreu antes de completar 30 anos, e ainda assim conseguiu construir uma obra sobre a qual a gente ainda vai ter muito o que falar.”
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“Uma equipe de remadoras unidas pela adversidade do câncer.” Assim Rejane Carneiro define a SobreViver, instituição que fundou em 2022 para acolher mulheres que enfrentam o câncer de mama. Diagnosticada com a doença há 18 anos, ela transformou sua experiência pessoal em uma rede de apoio coletiva. A Eufêmea narra a trajetória de Rejane e mostra o impacto do grupo para o bem-estar de pacientes oncológicas. Atualmente, a SobreViver reúne mais de 50 mulheres, das quais 30 participam ativamente das atividades de remo. A instituição oferece também suporte psicológico e ampara mulheres em situação de vulnerabilidade econômica, ajudando com medicamentos e cestas básicas.