O pacote anticlima de Trump e a intolerância religiosa no Brasil
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🔸 No primeiro dia de mandato, Donald Trump retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris, principal esforço global para conter as consequências das mudanças climáticas. É a segunda vez que o republicano deixa o Acordo e, como explica o Reset, a medida só o desobriga a apresentar um plano de corte de emissões de carbono, já que não há mecanismos que forcem o cumprimento das promessas dos países. A saída dos EUA da aliança também encerra as contribuições financeiras do governo americano para os esforços de financiamento climático.
🔸 “Vamos perfurar e perfurar”, disse Trump, referindo-se à exploração das reservas de petróleo e gás do país. Um relatório da organização Global Witness mostra o que esperar das ações do presidente no meio ambiente. O Eco traz a lista, que inclui o financiamento recorde para combustíveis fósseis, o crescimento da mineração e o aumento da desinformação sobre o clima. Trump afirmou ainda que vai investir maciçamente na indústria automobilística do país. Em tempo: a emissão de gases de efeito estufa pela queima dos combustíveis fósseis é a maior causadora do aquecimento global – e os EUA são, em termos absolutos, o segundo maior emissor do mundo, atrás da China.
🔸 O Brasil, aliás, ocupa a sexta posição no ranking, e 74% das emissões do país estão relacionadas ao setor agropecuário. Embora no discurso de posse Lula tenha se comprometido a “retomar o protagonismo na luta contra a crise climática”, o governo não enfrenta a questão de forma mais incisiva. A Repórter Brasil lista cinco ações prioritárias para o país endereçar o problema. A primeira delas é controlar o desmatamento que, sozinho, responde por 46% das emissões de gases de efeito estufa no Brasil. Reduzir o uso de agrotóxicos e garantir a rastreabilidade bovina também são prioridades.
🔸 Diante do recuo de empresas em programas de diversidade e inclusão, o reverendo Al Sharpton, líder dos direitos civis nos EUA, propôs um boicote às marcas que estão abandonando tais iniciativas. O Mundo Negro conta que Sharpton é fundador da National Action Network e anunciou que a organização vai investigar as empresas que estão reduzindo ou eliminando ações de diversidade, equidade e inclusão. “Em 90 dias, anunciaremos as duas empresas que iremos perseguir e pediremos a todas as pessoas desta nação – negros, brancos, pardos, homossexuais, mulheres héteros, trans – que não comprem onde não são respeitados”, disse.
🔸 Frases como “os brancos são os melhores” e “eu odeio negros” estão autorizadas a circular no Instagram e no Facebook. A liberação de conteúdos criminosos é resultado da mudança da política de moderação da Meta. O Aos Fatos teve acesso ao novo manual da big tech que, de forma explícita, autoriza postagens que reforçam estereótipos e preconceitos – raciais, étnicos, religiosos e contra pessoas com deficiência, entre outros grupos. A versão mais antiga da política da Meta vetava o uso de expressões de ódio, como “eu desprezo” ou “eu não respeito”. A Advocacia-Geral da União (AGU) avalia que a nova política desrespeita a legislação brasileira e realiza hoje uma audiência pública sobre o assunto.
📮 Outras histórias
No ano em que recebe a Conferência do Clima das Nações Unidas, a COP30, o Pará enfrenta desafios significativos na educação. Em dezembro passado, os deputados estaduais aprovaram o PL do Magistério, que não só revogou leis anteriores, como também aumentou a carga horária dos professores para 160 horas mensais e reduziu gratificações de diversas modalidades de docentes. A Amazônia Latitude detalha as mudanças que acabaram por centralizar poderes nas mãos do secretário de educação, Rossieli Soares. Em reação às medidas, centenas de indígenas ocuparam a sede da Secretaria de Estado de Educação, preocupados com a educação dos povos originários do estado, e os professores planejam entrar em greve nesta semana.
📌 Investigação
Os palestinos e seus apoiadores no Brasil foram monitorados pelo governo federal até pelo menos 1986, um ano após o fim da ditadura militar. Levantamento da Alma Preta revela o temor do regime militar de “ataques terroristas” e o monitoramento dos protestos palestinos no Brasil. Nos relatórios, classificados como confidenciais, há listas com os nomes de pessoas e organizações que participaram das manifestações pró-Palestina da época, incluindo lideranças palestinas e de outros movimentos sociais, políticos e professores. O representante da Organização para Libertação da Palestina (OLP) no Brasil, Farid Sawan, era figura recorrente nos registros dos militares.
🍂 Meio ambiente
O bairro da Redenção, em Manaus (AM), onde um desabamento matou duas pessoas no último domingo, já havia sido classificado como área de alto risco pelo Serviço Geológico do Brasil em 2019. A prefeitura, porém, só elaborou um plano de contingência em 2024. Ao menos 52.571 imóveis estão em áreas de risco na capital amazonense. Segundo o Vocativo, os moradores afirmam que o desabamento foi precedido por fortes chuvas, com o acúmulo de mais de 70 mm em poucas horas – volume considerado suficiente para causar deslizamentos em regiões vulneráveis, de acordo com o Mapeamento de Áreas de Risco Geológico da Zona Urbana de Manaus. Os taludes naturais estavam comprometidos pela erosão e pela falta de vegetação protetora.
📙 Cultura
Dos povos Apurinã e Kamadeni do Amazonas, a artista Sãnipã retratou a entidade Sãnyky, protetora da floresta, em uma pintura que conecta a seca na Amazônia com as enchentes no Rio Grande do Sul, dois eventos climáticos extremos que marcaram o último ano. “Ficamos muito sensibilizados, porque enquanto algumas pessoas morriam afogadas, outras morriam de fome. No caso de Lábrea, não tínhamos como ir em outro município porque não havia transporte, nem por terra, nem por água”, afirma. O Nonada conta que a obra integra o ciclo “Amazônias: no tremor das vidas”, de curadoria da pesquisadora Vânia Leal. “Quando não tem mais nada na floresta, é preciso reflorestar. E como se faz isso? Precisamos dos animais, como o Echua (tamanduá). Ele vai buscar as sementes e fazer as coisas acontecerem.”
🎧 Podcast
A comida ocupa um papel central nas religiões afro-brasileiras. Por meio do alimento, os adeptos dessas religiões se conectam com os orixás. “Como Exu é o grande mensageiro dos orixás, você sempre oferece a primeira comida a ele”, afirma o historiador e escritor Luiz Antônio Simas. “Uma vez alimentado, Exu é aquele que estabelece a conexão entre o mundo material e o mundo invisível”. O “Prato Cheio”, produção d’O Joio e O Trigo, mergulha na centralidade que a comida ocupa nas religiões de matriz africana e explica como os alimentos sacralizados saíram dos terreiros e ganharam as ruas brasileiras.
✊🏽 Direitos humanos
“Apesar de toda a violência, os povos de matriz africana continuam contribuindo de maneira significativa para a cultura, espiritualidade, memória e ciência brasileiras”, escreve a historiadora Carolina Rocha. Em artigo na Ponte para o Dia do Combate à Intolerância Religiosa, celebrado ontem, a pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião reflete sobre a importância das crenças afro-brasileiras para a construção do país e lembra que elas são alvo de violência dentro da estrutura racista da sociedade. No primeiro semestre de 2024, houve um aumento de 80% nas denúncias de racismo e intolerância religiosa em comparação ao mesmo período de 2023. “Os terreiros, espaços de educação libertadora e fortalecimento comunitário, têm papel central na formação de pessoas, na preservação de saberes tradicionais e na criação de alternativas sustentáveis e inclusivas. São lugares de resistência, na contramão de um projeto de morte, seja dos corpos ou dos saberes.”
Sempre trazendo assuntos relevantes e atuais!