O orçamento para as mulheres e um parque eólico sem licença em PE
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
Oi, pessoal, bom dia!
Aqui é a Audrey, editora da Brasis. Estamos no ar desde setembro de 2022, todos os dias. De lá para cá, nossa curadoria cresceu junto com a Ajor: hoje, buscamos histórias em mais de 150 organizações de jornalismo em todas as regiões do país.
Para aprimorar nosso trabalho – das decisões operacionais às escolhas editoriais – e conhecer mais nossos leitores, lançamos agora nossa pesquisa anual. É um questionário simples, com duração de cerca de quatro minutos, e muito importante pra gente.
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Obrigada e boa leitura!
🔸 O aumento do acesso a armas agravou a violência de gênero no país. É o que mostra levantamento do Instituto Sou da Paz com base em dados do Sistema de Informações de Agravos de Notificação (Sinan). A Ponte detalha o estudo divulgado no sábado, Dia Internacional da Mulher. Segundo a pesquisa, o número de registros de violência armada não letal contra mulheres no Brasil subiu 23% em 2023 na comparação com o ano anterior. Em 2023, 3.946 mulheres foram assassinadas, e 49,4% dessas mortes envolveram armas de fogo. “A violência doméstica, familiar e baseada em razões de gênero é um problema estrutural, que vai para além da violência armada, mas que se agrava na medida em que a arma de fogo é utilizada como um instrumento para perpetuar isso”, afirma a coordenadora de projetos do Sou da Paz, Cristina Neme. As armas são usadas não só para agressões físicas, mas também como instrumentos de coerção em ameaças e violências psicológicas. O estudo lembra que a política de flexibilização do acesso a armas entre 2019 e 2022 aumentou os riscos.
🔸 “Para nós, acusar um homem negro é uma decisão muito difícil. A gente falou muito sobre isso. A mulher negra parece que fica sob constante tutela do homem negro. E, quando eles erram, a gente não pode expor esses erros porque a gente tem que cuidar deles. Somos ensinadas a ser assim, a tolerar o que o homem negro faz, a cuidar. Tudo em nome da causa.” O depoimento é de uma amiga de Anielle Franco que dividiu com a ministra da Igualdade Racial as angústias antes de ela decidir pela denúncia de Silvio Almeida, no ano passado. O ex-ministro dos Direitos Humanos é acusado de assédio e importunação sexual não só por Anielle, mas por outras mulheres. A partir de 39 entrevistas realizadas durante quatro meses, a revista piauí faz uma anatomia do escândalo sexual que derrubou Almeida do cargo. A reportagem revela que, até agora, a Polícia Federal tem depoimentos de cinco vítimas, e a expectativa é que a investigação resulte em indiciamento.
🔸 O orçamento federal destinado às mulheres ainda é pouco transparente e depende fortemente das emendas parlamentares, o que compromete a continuidade das políticas públicas. A Agência Pública apurou que, para 2025, o governo prevê R$ 277 milhões em ações exclusivas para mulheres, mas mais de 70% desse valor vêm de emendas. Isso significa que a destinação dos recursos pode mudar conforme os interesses políticos. Embora o orçamento para mulheres tenha aumentado 36% em relação ao ano passado, a deputada federal Luciene Cavalcante (PSOL-SP) alerta que a dependência das emendas dificulta políticas de longo prazo. Soma-se a isso a falta de clareza no orçamento para mulheres, um problema que se arrasta há mais de uma década. Foi só em 2020 que a bancada feminina do Congresso conseguiu aprovar uma emenda obrigando o governo a publicar um orçamento específico para mulheres.
🔸 Em tempo: Lélia Gonzalez foi pioneira do feminismo negro no país – denunciou o racismo dentro do movimento feminista tradicional e destacou a identidade e a resistência das mulheres negras na diáspora africana. Como ela, intelectuais negras ajudaram a aprofundar o feminismo no Brasil a partir de uma perspectiva racial e interseccional no Brasil. A Alma Preta lista cinco personalidades negras que contribuíram para o movimento feminista e que são referência internacional sobre o assunto.
📮 Outras histórias
A chegada da luz elétrica, o churrasquinho de tripa de porco e a corrida de rolimã. A partir de acontecimentos da vida na Rocinha, Ocimar Santos fez seu repertório. Começou a compor aos 15 anos. Hoje, aos 58, tem mais de mil letras e 200 músicas gravadas. O Fala Roça narra a história do compositor que firmou parceria com Renato da Rocinha, um dos principais intérpretes de seus versos. Duas músicas gravadas por ele, aliás, tornaram-se hinos afetivos da favela na zona sul do Rio de Janeiro. Em “Existe um Lugar”, Ocimar descreve a alegria de “morar no alto do morro com vista pro mar”. Já em “Meandros da Ladeira”, resgata memórias da infância, ainda presentes no cotidiano da favela, como as brincadeiras de soltar pipa e o pique-esconde.
📌 Investigação
Sem políticas públicas e suporte familiar, a gravidez na adolescência está entre as principais causas do abandono escolar. Entre meninas e mulheres de 15 a 29 anos que abandonaram os estudos, a gravidez (23%) e os afazeres domésticos (9,5%) juntas superam a necessidade de trabalhar (25,5%) como principal razão para a evasão. Já entre as mulheres negras nessa faixa etária, 25% deixaram de estudar devido à gestação. Em parceria com a Fiquem Sabendo, a Gênero e Número destaca que, embora a lei garanta direitos às adolescentes grávidas, as escolas não estão preparadas para implementar as medidas necessárias. O grau de orientação escolar sobre prevenção da gravidez e de infecções sexualmente transmissíveis também é baixo: enquanto 35% dos alunos e alunas de 13 a 17 anos já tiveram alguma relação sexual – percentual que chega a 39% entre alunos da rede pública –, apenas 75,5% afirmam terem sido orientados sobre o tema.
🍂 Meio ambiente
Contrariando a decisão da CPRH, órgão ambiental de Pernambuco, o desembargador Antenor Cardoso Soares Júnior, do Tribunal de Justiça do estado, garantiu uma liminar na última semana para que o complexo eólico Ventos de São Clemente, da Echoenergia, no Agreste do estado, volte a funcionar. O parque eólico, no entanto, está com a licença operacional vencida. A CPRH afirmou que a empresa não cumpriu os aspectos legais e, por isso, a autorização não foi renovada. Segundo a Marco Zero, a paralisação das atividades só aconteceu depois que cerca de cem agricultores e agricultoras de Caetés e Venturosa e indígenas Kapinawá ocuparam o prédio da Agência de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco. Após a decisão do desembargador, os 126 aerogeradores dos oitos parques do complexo foram religados.
📙 Cultura
“Nós viemos de um lugar muito rico de cultura, mas que as pessoas insistem em invisibilizar. Por isso nós pensamos todo nosso som, nossa estética, nosso nome como forma de mostrar que é possível ser livre”, afirma o cantor e compositor Fah Lyma, parte da dupla Yori, ao lado de Nego Lias. Vencedores do reality show “Toca Revela”, projeto da Uol, eles conquistaram espaço no festival musical Carnauol deste ano. A Agência Mural narra a trajetória da dupla, criada nas periferias de São Paulo e atravessada pela LGBTQIAfobia e pelo racismo. “Sofri muito por ser muito afeminado, espalhafatoso, expansivo e nada disso é sexual, eu tinha 4 anos de idade. A sociedade cria um monstro em torno da homoafetividade”, conta Nego Lias.
🎧 Podcast
“A língua de uma comunidade diz muito sobre como ela vive. A própria língua tenta impor um certo tipo de pensamento. Em guarani, em vez de dizer ‘isso é meu’, dizemos ‘isso está em minha companhia’. É uma relação que não se estabelece por via da posse”, conta a psicóloga, poeta e ativista indígena guarani Geni Núñez. No “451 MHz”, produção da Quatro Cinco Um, Núñez e a psicanalista e escritora Vera Iaconelli conversam com a atriz e escritora Martha Nowill sobre as formas de afeto, entre a maternidade, o trabalho de cuidado atribuído às mulheres, os papéis de gênero e também as possibilidade do amor para além da monogamia imposta pelos colonizadores europeus.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Em 2024, foram mapeadas 241 entidades criadas por mulheres indígenas no Brasil, número 160% maior do que as registradas em 2020 (92). O reconhecimento de seus saberes tradicionais, a preservação do meio ambiente, a demarcação de territórios e o combate à violência de gênero estão entre as principais razões pelas quais as mulheres indígenas se articulam. A revista AzMina destricha as informações da pesquisa, feita pelo Instituto Socioambiental e pela Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade. “Na aldeia nós temos nossos costumes. Nós temos nossas danças, nós temos nossa língua, na cidade a gente não tem esse espaço para continuar nossa cultura indígena”, afirma Suiyãne Txukarramãe, da Associação das Mulheres Indígenas do Centro-Oeste Paulista, em Bauru (SP), que foi criada sobretudo para a preservação da cultura dos povos locais.