As operações policiais nas favelas do Rio e os confrontos na Bahia
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🔸 Para moradores de favelas do Rio de Janeiro, uma guerra abriu a semana. Ontem, batalhões especiais da Polícia Civil e da Polícia Militar fizeram uma operação no Complexo da Maré, na Vila do Cruzeiro e na Cidade de Deus. Segundo o Maré de Notícias, embora tenha sido anunciada no mês passado como uma ação em conjunto com o governo federal, a operação foi comandada pelo governo do Rio, sem a participação das forças federais e sem motivação direta informada. Na Maré, pelo menos 13 das 16 favelas que abrangem o conjunto de comunidades sofreram os impactos dos confrontos: mais de 17 mil estudantes não puderam estudar, e unidades de saúde interromperam o atendimento. Desde junho de 2020, 77 operações policiais ocorreram em ao menos uma das favelas do complexo. Nesse período, não foi identificado o uso de câmeras em fardas e viaturas policiais em nenhuma ação.
🔸 “Ucrânia, Faixa de Gaza? Não… Só mais um dia normal no Rio de Janeiro! Cpx da Penha”, escreveu um morador da Vila Cruzeiro nas redes sociais. O Voz das Comunidades conta que, desde às 5h30, já havia relatos de tiros na favela. A ofensiva policial ocorre na sequência da execução de três médicos num quiosque na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio. Segundo a investigação, uma das vítimas foi confundida pelos assassinos, ligados ao Comando Vermelho, com um miliciano. O Nexo informa que a operação de ontem mirava justamente a facção criminosa. Na Vila Cruzeiro, dois helicópteros das polícias foram atingidos por tiros durante a ação.
🔸 Na Bahia, setembro foi o mais letal dos últimos 15 meses. De acordo com o Instituto Fogo Cruzado, foram registrados 195 mortos por intervenção federal entre julho e o mês passado. Trata-se de um aumento de quase 80% com relação ao mesmo período do ano passado, como mostra a Agência Pública. Só em setembro, 77 pessoas foram assassinadas por policiais. As mortes se concentram na segunda quinzena do mês, depois da morte de um policial em confronto com supostos criminosos em Salvador. A violência no estado também tem relação com os conflitos entre facções criminosas. Para Dudu Ribeiro, cofundador da Iniciativa Negra, “a justificativa das autoridades para o aumento da violência policial tem sido o combate ao tráfico de drogas, mas, ao mesmo tempo, existe uma demonstração completamente midiática de apreensões pífias, que quase não interferem de fato na dinâmica do tráfico de drogas local”.
📮 Outras histórias
“Tudo começou com um barraco de pau a pique em um chão de terra batido”, lembra Mãe Izolina Gruber, líder religiosa do Ilê Asé Ode, no bairro do Pinheirinho, na periferia de Curitiba (PR). Aos 79 anos, ela assumiu a liderança do terreiro que começou a frequentar ainda criança. O Nós, Mulheres da Periferia perfila Izolina e resgata sua história de resistência. Quase cinco décadas atrás, “a polícia entrava dentro dos terreiros com cavalos, porque as pessoas denunciavam”, conta a mãe de santo. Apesar de ser a capital mais negra do Sul do país, são poucos os dados sobre as religiões de matrizes africanas em Curitiba. Um estudo de 2008 da Universidade Federal do Paraná (UFPR) estimou que existem 83 terreiros de umbanda e candomblé na cidade.
📌 Investigação
No último ano, ao menos seis pessoas foram alvejadas ou tiveram suas casas destruídas nas comunidades tradicionais de São Marcelo, Arroz de Salú, Capão do Modesto e Cupim, no oeste da Bahia. No especial “Faroeste Baiano”, a Repórter Brasil retrata a rotina de ameaças, emboscadas e tentativas de expulsão promovidas por pistoleiros. Embora possuam o direito constitucional ao reconhecimento de suas terras, a demora dos processos tem permitido que grileiros se instalem na região e a violência avance sobre os moradores.
🍂 Meio ambiente
O desmatamento na Amazônia caiu pelo sétimo mês consecutivo. O número de alertas registrados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em setembro deste ano foi 57% menor do que no mesmo período em 2022. Segundo O Eco, o desmatamento no bioma só apresentou alta no mês de fevereiro de 2023. Em nota, o governo federal informou que, de janeiro a setembro, a redução na destruição da floresta foi de 49,5%, em relação ao mesmo período do ano anterior. O mesmo não ocorreu no Cerrado, onde o desmatamento cresceu pelo terceiro mês seguido, com valores 149% maiores do que os de setembro de 2022.
O empresário Alan Cavalcante do Nascimento possui um conglomerado de 38 empresas, entre mineradoras, construtoras e imobiliárias. A maioria atua em Minas Gerais, onde ele já foi autuado 18 vezes por ações ilícitas de mineração apenas na Serra do Curral, patrimônio ambiental da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Ele é dono de quatro jazidas de minério, que totalizam 4,5 mil hectares, na área que é tida como um cartão-postal da capital de Minas. A revista piauí mostra que as atividades do empresário já resultaram em multas de R$ 2,6 milhões nos últimos cinco anos. O tombamento da Serra do Curral pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) é uma das principais demandas de ambientalistas da região para frear o avanço da mineração.
📙 Cultura
O Dia de Nossa Senhora de Nazaré, comemorado em 8 de outubro, movimenta a cena cultural de Belém (PA). As manifestações culturais, como o arrastão do Círio e o Auto do Círio que, em 2023, atraiu cerca de dois milhões de pessoas, são também tema de trabalhos, séries fotográficas, pinturas e espetáculos teatrais. O Nonada conta que a artista plástica Maria José Batista pinta o cotidiano paraense e as celebrações populares desde 1997. Atualmente o Círio, visto pelo olhar dela, está em exibição no Sesc Ver-O-Peso. A mostra “Cores de Maria” reúne pinturas inéditas realizadas em pratos de papelão revestidos com tinta e mostra todos os momentos que compõem a manifestação.
O cinema independente e periférico dificilmente consegue acesso à cota de tela prevista pelo Projeto de Lei (PL) 3696/2023, que busca garantir um espaço mínimo para a produção nacional em diferentes meios de exibição. Atualmente, a lei foi regulamentada apenas para os canais pagos de TV. O Desenrola e Não Me Enrola ouviu profissionais da área nas periferias de São Paulo para entender como o texto chega a essa população. “Eu tô há 20 anos dentro desse universo do audiovisual, e a primeira vez que eu consegui distribuir um filme meu foi ano passado”, conta Daniel Fagundes, cineasta e coordenador da escola de cinema IbiraLab. Na maioria dos casos, a justificativa dada pelos cinemas e streaming aos produtores é de que os filmes não têm um determinado “padrão de exibição” para ocupar os espaços.
🎧 Podcast
Em Ourizona, no interior do Paraná, o auxiliar de serviços gerais e motorista de aplicativo Matheus Azevedo decidiu mergulhar nos Portais da Transparência do município e começou a abrir as caixas-pretas das informações públicas. O “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, explica como isso foi possível por meio da Lei de Acesso à Informação e como Matheus acabou elaborando um dossiê de 17 páginas sobre irregularidades no uso do dinheiro e dos serviços públicos.
✊🏽 Direitos humanos
Contatar a Defensoria Pública e participar de audiências são alguns dos passos a serem tomados por famílias que têm um parente em privação de liberdade, situação comum em um país que tem uma das maiores populações carcerárias do mundo – são mais de 832 mil pessoas detidas. O quadro “E Agora, PEM?”, da Periferia em Movimento, destrincha os direitos garantidos no Código de Processo Penal e como a família deve proceder caso um familiar seja preso em flagrante. As denúncias de abuso policial na abordagem, por exemplo, devem ser compartilhadas com o advogado ou defensor público antes da audiência de custódia.