O 'ogronegócio' na Amazônia e o sincretismo religioso no ES
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🔸 A participação da polícia nas mortes violentas de crianças nunca foi tão grande. No ano passado, respondeu por 18,6% do total, o equivalente a dizer que praticamente uma a cada cinco crianças e adolescentes assassinados em 2023 foi vítima de ações policiais. Os dados integram um estudo do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) publicado ontem. A Ponte destrincha o documento e mostra que as mortes de crianças e adolescentes provocadas por policiais vêm crescendo nos últimos anos: eram 14% do total de mortes violentas em 2021 e 17,1% em 2022. A violência tem cor: a chance de um menino negro de até 19 anos ser vítima de homicídio é 21 vezes maior do que uma menina branca na mesma faixa etária.
🔸 O “ogronegócio” na Amazônia: num posto de gasolina da BR-163, porretes com as inscrições “Direitos humanos” ou “Diálogo” estão à venda. A via é uma das mais importantes para o agronegócio na Amazônia. Outdoors em apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e propagandas de clubes de tiro completam a paisagem. A Repórter Brasil percorreu mais de 6.000 km de estrada para investigar a conexão do braço violento do agro ao bolsonarismo. A primeira reportagem da série segue o rastro de Luiz Antonio Nabhan Garcia, que foi secretário de Assuntos Fundiários na gestão Bolsonaro. Um dos principais expoentes da União Democrática Ruralista (UDR), ele usou o cargo para abrir as portas do governo a políticos e produtores rurais acusados de crimes graves, como desmatamento e trabalho escravo. Com uma postura hostil contra indígenas e quilombolas, Garcia contribuiu para a paralisação da reforma agrária, redirecionando as políticas fundiárias para favorecer os grandes produtores.
🔸 Falando em agro: a cada quatro horas e 48 minutos um representante da indústria de agrotóxicos é recebido pelo Poder Executivo. Entre outubro de 2022 e agosto de 2024, 752 compromissos no Executivo tiveram presença de ao menos um lobista ou empresa do agronegócio e indústria química. A informação é um dos sete destaques do levantamento “Lobby na Comida”, parceria entre O Joio e O Trigo e a Fiquem Sabendo. As reuniões se tornam mais frequentes nos períodos de tramitação de leis sobre o tema, e as principais “visitas” que o governo recebe são Bayer, Basf e Syngenta, gigantes do mercado de agrotóxicos.
🔸 Manaus está encoberta por fumaça desde o fim de semana. Especialista em Percepção Ambiental da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Amélia Batista explica que a causa são focos de incêndios criminosos registrados em diversos municípios. Ao Amazonas Atual ela lembra que, vinte anos atrás, a capital não sofria com o problema, que agora se tornou “uma rotina de verão”: “Essa fumaça começou a se intensificar nos últimos cinco ou seis anos, o que coincide com o desmatamento, mais criação de gado, a soja, a mineração”. Embora existam focos em municípios próximos de Manaus, os registros de queimadas estão concentrados no Sul do Amazonas e são transportados por correntes de vento até a capital.
🔸 Em ano de eleição, o PT criou uma cartilha para lidar com os evangélicos. O objetivo é se aproximar do grupo que, em pesquisas, demonstra alto índice de desaprovação ao governo Lula. A população evangélica está estimada em 40 milhões de brasileiros. O Metrópoles detalha o material que pede para que os evangélicos não sejam tratados como “fundamentalistas”. O texto recomenda ainda que a religião não seja associada a pastores específicos: “Todas as pessoas cometem pecados. É inócuo – e pode soar como perseguição religiosa – tentar associar e generalizar erros ou crimes de evangélicos”.
📮 Outras histórias
Um projeto do Grajaú, zona sul de São Paulo, foi levado às Olimpíadas de Paris. Batizada de Navegando nas Artes, a iniciativa usa a Vela, modalidade náutica, tanto para formação das crianças quanto para conscientizar sobre a preservação do meio ambiente, conduzindo mutirões de limpeza nas margens. Realizado na represa Billings, o projeto integra o documentário “Guarapiranga”, exibido na capital francesa durante os jogos. A Agência Mural conta como funciona o Navegando nas Artes e seu impacto na vida das crianças que dele participam. “O barco a vela pode ter esse olhar esportivo, mas o nosso diferencial é olhar para a comunidade e entender a luta por melhorias”, diz Lucas Araújo, educador e velejador.
📌 Investigação
Sem contrato algum, a Secretaria de Educação de Alagoas (Seduc) oferece uma plataforma de aprendizagem com material didático para os estudantes que vão prestar o Enem em 2024. Os dados de alunos e professores são cedidos sem nenhum tipo de transparência ou controle público. O Intercept Brasil teve acesso a uma gravação de uma reunião virtual realizada pela Seduc com instruções sobre a plataforma Solis. A ferramenta foi desenvolvida, segundo dados do domínio do site e da identificação de desenvolvedor nas lojas de aplicativos, por uma empresa chamada Inca Tecnologia, proibida de fechar contratos com o poder público. O motivo: foi condenada pela Controladoria-Geral da União por prestar informações falsas e fraudar uma proposta comercial.
🍂 Meio ambiente
Embora o desmatamento da Mata Atlântica tenha desacelerado de 1986 a 2020, 97% do que resta do bioma está em frações com menos de 50 hectares. A fragmentação ambiental é uma das principais causas da extinção de espécies animais e vegetais. No Rio de Janeiro, no entanto, é possível amenizar esse quadro e facilitar a conservação da biodiversidade. Segundo O Eco, o engenheiro florestal Caio Alves da Costa Silva em seu mestrado junto ao Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do estado elaborou uma projeção para implantação de um mega corredor ecológico entre 156 parques e outro tipos de unidades de conservação para restaurar e preservar as espécies.
📙 Cultura
A partir do sincretismo religioso, indígenas e africanos escravizados preservaram suas tradições ancestrais no Brasil colonial. É o caso do congo, uma manifestação cultural e religiosa no Espírito Santo, que mistura elementos da religiões de matriz africana e indígena com o catolicismo. O Nonada narra como o congo se desenvolveu no estado, mas hoje corre o risco de apagamento pela falta de valorização da cultura popular. A ausência de políticas públicas eficazes dificulta a continuidade da prática pelas novas gerações. “Se a criança ou o jovem não tiver inserido numa escola, numa comunidade do congo, dificilmente vai se interessar pela cultura. Lá na comunidade de São Sebastião (Barra do Jucu), a gente começou plantando a sementinha na garotada, e isso vem crescendo”, conta Leonardo Osório Nunes dos Santos, o mestre Naio.
🎧 Podcast
Em meio ao conflito do marco temporal para terras indígenas, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), convocou uma reunião de conciliação entre indígenas, ruralistas, integrantes do governo e do Legislativo. O magistrado é relator de cinco ações que questionam a constitucionalidade da Lei do Marco Temporal (Lei 14.701/2023). Em setembro de 2023, o próprio STF negou a tese. O “Sem Precedentes”, produção do Jota, analisa a convocação da audiência de conciliação, as decisões da Corte sobre o tema e o conflito entre os poderes em torno da pauta.
🧑🏽🏫 Educação
“Todos nós temos responsabilidade quando o assunto é a educação e a oferta de dignidade para uma criança”, afirma a pedagoga e conselheira tutelar Mickelle Xavier. Moradora de Vitória da Conquista (BA), ela criou a Biblioteca Comunitária Miro Cairo, conseguiu a doação de 300 livros e iniciou atividades como reforço escolar e clubes de leitura no bairro do Miro Cairo. O Conquista Repórter mostra como bibliotecas comunitárias do município, sobretudo geridas por mulheres em áreas rurais e periféricas, têm dado acesso a livros que celebram a cultura afro-brasileira e promovido a educação antirracista desde a primeira infância. A matéria é resultado das Bolsas de Reportagem “A Primeira Infância como Pauta Prioritária”, promovidas pela Associação de Jornalismo Digital (Ajor) e pela Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal.