A obstrução do Congresso pela oposição e os ultraprocessados em hospitais
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🔸 A oposição do governo anunciou ontem a obstrução total do Congresso, em resposta à prisão domiciliar de Jair Bolsonaro (PL), determinada nesta segunda-feira pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Senadores e deputados bolsonaristas ocuparam as Mesas Diretoras dos plenários das duas Casas Legislativas. O Congresso em Foco informa que, antes, o grupo fez um ato em protesto e defendeu pautas como o fim do foro privilegiado e a anistia aos condenados pelos atos de 8 de janeiro de 2023. No Senado, Magno Malta (PL-ES) sentou-se na cadeira do presidente Davi Alcolumbre. “A mobilização é uma resposta à escalada de abusos e perseguições políticas. Não vamos nos calar”, escreveu o senador nas redes sociais. Ele apresentou os pedidos da oposição: a suspensão das sanções contra o senador Marcos do Val (Podemos-ES) e o impeachment de Moraes. Na Câmara, o deputado Paulo Bilynskyj (PL-SP) afirmou que nenhuma votação ocorrerá até que a anistia seja pautada. O requerimento de urgência para o projeto já tem assinaturas suficientes desde abril, mas depende da decisão do presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB).
🔸 Mas qual é a força do PL no Congresso neste momento? Maior partido da Câmara e segunda maior bancada do Senado, a legenda prioriza a aprovação da anistia aos condenados pelos atos golpistas e pautas anti-STF. A agenda, porém, não tem apoio popular: 55% dos brasileiros rejeitam a anistia, segundo o Datafolha, pauta que também enfrenta resistência dos presidentes da Câmara e do Senado. O Nexo detalha as prioridades do PL nas Casas Legislativas e ouve cientistas políticos sobre o partido, que tem 87 deputados e 14 senadores. Apesar do apoio interno à sanção contra Moraes, o tarifaço de Trump dividiu a legenda, e um deputado que criticou a medida foi expulso. Para Leonardo Avritzer, da UFMG, e Carlos Pereira, da FGV, o Centrão tende a se afastar da agenda bolsonarista. “O que vai determinar se a liderança do Congresso e do Centrão vão aderir às prioridades do PL é a popularidade do presidente Lula e a capacidade dele de remontar uma coalizão política ampla – algo que parecia muito difícil há seis semanas, mas que hoje tem viabilidade de continuar”, avalia Avritzer.
🔸 Em tempo: Moraes decidiu não levar ao referendo da 1ª Turma do STF a ordem de prisão domiciliar de Bolsonaro, embora tenha apoio dos colegas de toga. O Jota apurou que, em caso de recurso, a medida deve ser referendada pelo colegiado, composto pelos ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia, Cristiano Zanin e Luiz Fux, além do próprio Moraes. Motivada pela participação do ex-presidente em manifestação no Rio, a prisão domiciliar é vista como reação direta às recentes ações bolsonaristas e à escalada do confronto político-institucional – ampliado após as sanções de Donald Trump contra Moraes via Lei Magnitsky. Nos bastidores da Corte, os magistrados dizem que, diante da postura de Bolsonaro, não havia alternativa para Moraes. Para os colegas, não dá para o STF ser “agredido” e, se não determinasse a prisão de Bolsonaro, Moraes mostraria fraqueza em um momento decisivo.
🔸 “Juridicamente, não há muitas polêmicas na última decisão de Moraes. (...) Em um esforço incomum de evitar a decretação de uma prisão preventiva de Bolsonaro, Moraes vem há tempos buscando medidas menos gravosas do que a prisão para tentar garantir o bom andamento do processo e evitar que Jair se coloque à margem do alcance da Justiça.” A análise é de Rafael Mafei, em artigo na revista piauí. Para o advogado e professor de Direito na USP e na ESPM, Bolsonaro tem adotado o confronto com o STF como estratégia política: em vez de cumprir as medidas cautelares, opta por fingir não compreendê-las, desafiando-as abertamente. O ex-presidente aposta em ser protagonista nas ruas e nas redes, para gerar ganhos políticos ao mobilizar sua base e pressionar o STF. “Para Moraes, o risco é que essas ameaças latentes, tanto na frente da política interna quanto da política externa, enfraqueçam o cordão de isolamento que o protege dentro do STF, fazendo-o perder apoio entre seus próprios colegas de toga.”
📮 Outras histórias
Em tempos de digitalização da leitura, os sebos resistem. Em Natal e na região metropolitana, eles se espalham pelo centro velho e pelas feiras culturais. São como redutos que vão além do comércio de livros usados e revelam um trabalho movido por paixão e resistência. A Saiba Mais percorre diversos sebos da Grande Natal para contar histórias como a do Sebo do Irmãozinho, em Parnamirim, a 17km da capital. Há 25 anos no mesmo endereço, o comércio surgiu do sonho de um homem que começou a vida vendendo hortaliças em uma bicicleta. Encantado com um sebo que conheceu no bairro Alecrim, ele mudou o rumo da própria história e passou a se dedicar exclusivamente ao universo literário. Num ambiente repleto de prateleiras de livro e com música nordestina ao fundo, o Sebo do Irmãozinho virou ponto de encontro de estudantes depois da escola.
📌 Investigação
As terras indígenas (TIs) são vítimas do PL 2159/2021, conhecido como “PL da Devastação”, que o presidente Lula tem até sexta para sancionar ou vetar. A proposta permite que obras de infraestruturas, projetos minerários, empreendimentos de energia e linhas de transmissão sejam instaladas no entorno de TIs não homologadas do país sem consulta à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Levantamento da InfoAmazonia mostra que, dos 792 territórios reconhecidos pela Funai, 289 ainda não foram homologados, sendo 121 deles na Amazônia Legal – o equivalente a 26% das TIs da região. O PL atinge também terras já homologadas na Amazônia, diminuindo a faixa de amortecimento entre a TI e o empreendimento. No caso das rodovias, por exemplo, o raio de proteção passa de 40 km para 15 km.
🍂 Meio ambiente
Buscando garantir renda para a população local e a preservação ambiental no Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, principal turístico do estado do Maranhão e um dos mais visitados do Brasil, o projeto “Na Rota do TamanduAÍ” pretende capacitar moradores, sobretudo mães solos, para receber turistas em modelo de base comunitária. Segundo o Conexão Planeta, além de gerar renda para a comunidade, a iniciativa, promovida pelo Instituto Tamanduá, também busca engajar acadêmicos dos municípios próximos aos Lençóis Maranhenses para monitorar e estudar a fauna da região e promover atividades de educação ambiental para professores e estudantes de escolas públicas.
📙 Cultura
“Não escrevo para ser famosa; escrevo como forma de desabafo, como maneira de trazer à tona histórias reais da minha negritude para uma sociedade que muitas vezes não me enxerga. Crio também histórias que poderiam ser reais, se essa mesma sociedade pensasse de forma mais inclusiva”, afirma a poeta e multiartista curitibana Jô Macário, fundadora do coletivo Pretas com Poesia, que reúne mulheres negras de diversos lugares do Paraná para compartilhar suas “escrevivências”. O grupo lançou sua segunda coletânea no fim de julho. Em entrevista ao Catarinas, a escritora destaca a importância de formar novas gerações de autoras negras. “Ocupamos espaços onde a branquitude ainda impera. Não é fácil estar onde, historicamente, nunca estivemos. Ainda falta muito para alcançarmos o lugar que nos é de direito. Nossa escrita segue invisibilizada e, muitas vezes, desqualificada como ‘mimimi’ ou entendida apenas como violência. A branquitude, em geral, não conhece a nossa escrita e muitas vezes também não quer conhecer.”
🎧 Podcast
Espaços relacionados à saúde, farmácias e hospitais vivem uma expansão de produtos ultraprocessados, borrando a fronteira entre saúde e comércio. O “Prato Cheio”, produção d’O Joio e O Trigo, mergulha na venda dos ultraprocessados em drogarias e na pressão para que mercados passem a vender medicamentos. O episódio também examina a qualidade da alimentação nos hospitais, com oferecimento de uma nutrição inadequada e dos alimentos industrializados, mesmo diante das evidências científicas que mostram os danos desses produtos à saúde.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
A baixa escolaridade é 14% maior entre mães negras em relação a mães brancas no Nordeste. De acordo com dados do Censo 2022, 45% das mães que se declaram como pardas ou pretas não concluíram o Ensino Fundamental. Entre as brancas, a falta de educação formal atinge 39% das mães. A Agência Tatu analisou as informações e ressalta que, em comparação com o Censo de 2010, o número de mães com baixa escolaridade caiu 17% no Nordeste, mas de forma desigual, a queda foi de 25% entre brancas e de 18% entre pardas. Já entre as mulheres que se autodeclaram pretas, o número de mães com baixa instrução cresceu 13%. Há também uma desigualdade expressiva no acesso à educação no nível superior: 18% das mães brancas tinham curso superior completo, enquanto apenas 9,8% das mães negras atingiram esse grau de escolaridade, o menor percentual entre as regiões do país junto com a região Sul.