O cartão de vacina de Bolsonaro e os 'alimentos do futuro'
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🔸 O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sabia da fraude em seu cartão de vacinação e no de sua filha, Laura Bolsonaro, de 12 anos. É o que afirma a Polícia Federal em documento enviado ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Como informa o Metrópoles, o principal indício de que ele tinha “plena ciência da inserção fraudulenta dos dados” é que a emissão dos comprovantes de vacinação foi feita a partir do Palácio do Planalto, em 22 e 27 de dezembro do ano passado. Preso da operação deflagrada ontem, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, ficou em silêncio no depoimento à PF.
🔸 Cid teve participação ativa na alteração do cartão de vacina do ex-presidente. Primeiro, o ex-ajudante de ordens teria falsificado os dados para sua companheira, Gabriela Cid. O Congresso em Foco detalha cada um de seus passos e conta que ele recorreu à Secretaria de Saúde de Duque de Caxias (RJ), onde o major reformado Ailton Gonçalves já havia estabelecido um esquema de falsificação de documentos. No cartão de Bolsonaro, consta que ele recebeu as vacinas no município, com apenas um minuto de diferença entre a aplicação da primeira e da segunda dose do imunizante contra a Covid-19. Corrobora a tese de que o ex-presidente não recebeu a vacina o fato de que ele não esteve em Duque de Caxias em 13 de agosto de 2022, data em que teria tomado a primeira dose da Pfizer. Bolsonaro, por sua vez, nega que tenha recebido a vacina e falsificado o registro.
🔸 Em tempo: em mensagens trocadas com Mauro Cid, o major reformado Ailton Gonçalves, que foi candidato a deputado estadual pelo PL, disse saber quem mandou matar Marielle Franco, vereadora carioca executada brutalmente em março de 2018. O Sul21 lembra que os áudios foram transcritos por agentes da PF e incluídos no ofício enviado ao ministro Alexandre de Moraes. “Eu sei dessa história da Marielle toda, irmão, sei quem mandou. Sei a porra toda. Entendeu?”, disse o major.
🔸 “A trama vai se revelando a cada passo das investigações, mostrando uma teia de crimes, mentiras e acobertamento cujos nexos vão surgindo. (...) Esta perigosa conexão com o submundo da política e das milícias do Rio de Janeiro pode complicar seriamente a vida de Bolsonaro e destampar vasos comunicantes que levem a novas investigações.” Em artigo no Headline, o cientista político e sociólogo Sérgio Abranches lembra que o ex-presidente “ usou a mentira como método” e afirma que “é pouco provável que a carreira política dele sobreviva a todos os inquéritos que o envolvem”.
🔸 “A Câmara vai agir”, disse o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), sobre a pressão “desumana e mentirosa” das big techs contra o PL das Fake News, que teve a votação adiada nesta semana. A CartaCapital conta que Lira prometeu levar à Justiça as gigantes da comunicação, como o Google e a Meta, responsável pela manutenção do Facebook e Instagram. “Defender o seu pleito, tranquilo, mas usar seus instrumentos para impulsionar ou atrapalhar ou cercear que a outra parte se movimente e se mobilize [não é aceitável]”, afirmou o deputado.
🔸 A propósito: ontem foi Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Segundo o Atlas da Notícia de 2022, cerca de 50% das cidades brasileiras não têm uma organização jornalística e podem ser, portanto, consideradas “desertos de notícias”. Sem um ecossistema de informação local, é mais difícil combater a corrupção ou garantir direitos básicos aos cidadãos. O Nós, Mulheres da Periferia conecta essa reflexão ao PL das Fake News para lembrar que, ao combater a disseminação de conteúdos ilícitos, a regulação das plataformas digitais também contribui para defender crianças e mulheres de violência e crimes.
🔸 Ministro interino do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Ricardo Cappelli soube ontem, pela imprensa, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciaria como novo ministro o general Marcos Antônio Amaro dos Santos. “O que eu faço?”, ele perguntou à assessora de imprensa que segurava o telefone com a informação. A cena foi presenciada pela reportagem da Pública, que o aguardava para uma entrevista. Depois de decidir que só lhe cabia esperar, Capelli fez um balanço (positivo) de sua gestão no GSI, defendeu uma nova estrutura para o órgão e disse que o ex-ministro Anderson Torres é o principal responsável pelos atos golpistas de 8 de janeiro.
📮 Outras histórias
“As ameaças sempre estão ligadas a minha condição de mulher e de preta. É comum em todas as situações, por exemplo, que me chamem de ‘macaca’. Até o momento, não encontrou-se relação específica com algum projeto [de lei], mas com pautas e com assuntos que reflitam socialmente, como o racismo.” Alvo de ameaças de morte e ofensas racistas, a deputada do Pará Lívia Duarte (PSOL) conta à Alma Preta que precisou mudar a rotina, agora atravessada pelo medo da morte. “Tenho crianças pequenas, mas não posso me paralisar. Não tenho a opção de voltar. Sigo em nome de que essa situação não ocorra nunca mais”, afirma.
📌 Investigação
Os “alimentos do futuro” não passam dos ultraprocessados de sempre. Empresas que participaram do Anufood, um dos maiores eventos da indústria de alimentos e bebidas, defendem que é possível substituir uma refeição completa por apenas um shake. Segundo O Joio e O Trigo, a indústria tenta há décadas trazer um apelo saudável a produtos ultraprocessados, reduzindo a alimentação ao consumo de nutrientes, além da composição baseada em proteínas isoladas e aditivos alimentares. Por trás das vitaminas adicionadas no rótulo – em quantidades muito pequenas para evitar toxicidade –, estão açúcares, gorduras e sódio que sustentam os produtos.
🍂 Meio ambiente
A tragédia em Brumadinho (MG) abriu espaço para a grilagem. Desde que a barragem da Vale se rompeu em 2019, os quilombolas da comunidade de Pontinha relatam que o rio Paraopeba ficou impróprio para a pesca, atividade que era fonte de renda para vários moradores. Além dos que estão sendo obrigados a migrar, a revista piauí revela que a população local está em grau ainda maior de vulnerabilidade diante de grileiros. As terras estão em disputa desde a década de 1980. José Eunício Moreira, de 78 anos, conta que, no ano passado, um fazendeiro chegou a Pontinha, abriu um mapa no meio da rua e mostrou a um grupo de quilombolas aquilo que alegava ser seu.
Se o Brasil pretende cumprir a meta de reflorestamento que assumiu no Acordo de Paris, precisa plantar 8 bilhões de árvores. Diretor executivo do Instituto Escolhas, Sérgio Leitão afirma que, para dar conta do compromisso, seria necessário um esforço conjunto de vários órgãos estatais na estruturação de um “sistema de recuperação florestal” no país. A organização vem trabalhando para calcular o custo financeiro dessa tarefa. O Eco destaca que, em 2015, quando a meta foi anunciada, a cifra estava em R$ 52 bilhões.
📙 Cultura
A ministra Margareth Menezes apresentou ontem os primeiros resultados de sua gestão. Em sabatina na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, a chefe do Ministério da Cultura (MinC) defendeu a Lei Rouanet, levou dados sobre a contribuição do setor para o PIB brasileiro e argumentou pela própria existência da pasta. “Estamos falando de um ministério que não pode ser temporal, a cultura deve ser tratada como política de Estado. E nós estamos ouvindo a todos, sem discriminação”. O Nonada descreve a sessão, que, apesar de um tom brando, teve momentos de tumulto da direita com relação às ações afirmativas para pessoas LGBTQIA+.
Em meio à desvalorização da cultura popular, uma comunidade pernambucana resiste. Em Afogados da Ingazeira, no Sertão do Pajeú, o Grupo de Coco Negras e Negros do Leitão da Carapuça mantém viva a brincadeira do coco de roda. Reconhecida como quilombola pelo governo federal, a comunidade ainda enfrenta dificuldades para manter a tradição. À revista O Grito! Sebastião José da Silva, responsável pelo grupo, conta que a falta de investimento é o principal problema: “Os jovens não se interessam em participar porque falta microfone e equipamentos. Eles queriam que fosse uma profissão, mas é tudo por nossa conta. Até a participação dos atuais integrantes enfraquece”.
🎧 Podcast
Entre os povos indígenas, as tradições e as práticas espirituais são com frequência usadas como ferramentas para lidar com desafios psicológicos. A saúde mental indígena, no entanto, ainda é um tabu, e são altas as taxas de transtornos nessa população, com muitos casos de ansiedade, depressão e até suicídio. O “LatitudeCast”, produção da Amazônia Latitude, entrevista psicólogos indígenas para refletir sobre, por exemplo, como o processo colonial cruel e desastroso deixou sintomas nos povos originários.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Depois de anos de valorização dos cabelos crespos e cacheados, cresce um movimento contrário: o alisamento vem ganhando outra vez a adesão de mulheres. A revista AzMina aponta que, segundo o Google Trends, entre 2020 e 2022, houve um aumento de 119% de pesquisas na plataforma por “cabelos lisos”. Já a busca por “alisamento de cabelo” subiu 176% no mesmo período. O retorno à estética dos anos 2000 pode explicar a crescente onda do alisamento, mas os efeitos disso são vistos como prejudiciais, em especial para as mulheres negras. Além de reforçar um padrão estético cujas raízes estão fincadas na colonização e na escravidão, há um retorno da ideia (duvidosa) de que cabelo alisado dá menos trabalho.