O novo comandante do Bope no RJ e o São João no Nordeste
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🔸 O conflito entre Irã, Israel e Estados Unidos pode ter impactos econômicos e políticos no Brasil. Em comunicado no domingo, o Itamaraty repudiou os ataques conjuntos de Israel e Estados Unidos contra instalações do Irã, classificando-os como violação da soberania iraniana. A CartaCapital explica que a principal consequência para o Brasil pode vir da alta nos preços do petróleo – o barril do Brent, referência internacional do petróleo, subiu 5,7% no domingo – e de um possível bloqueio do Estreito de Ormuz, por onde passa 20% do petróleo transportado no mundo. Isso afetaria também fertilizantes e insumos agrícolas importados. No campo político, cresce na América Latina a pressão para rotular grupos como Hezbollah e Hamas como terroristas, medida tomada pelo Paraguai e que já ganha eco na Argentina de Javier Milei, apoiador de Donald Trump. No Brasil, um projeto de lei liderado por bolsonaristas está em fase inicial de tramitação no Congresso.
🔸 A propósito: a entrada dos EUA na guerra entre Israel e Irã reacendeu temores sobre proliferação nuclear e colocou em xeque o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP), criado em 1968 e assinado por 191 países. Em coluna na Agência Pública, Natalia Viana conta a origem do tratado, concebido como um passo rumo ao desarmamento total – objetivo que nunca se concretizou. Israel, por exemplo, nunca reconheceu possuir armas nucleares, mas estima-se que o país tenha plutônio suficiente para construir 150 ogivas. O Irã, por sua vez, nunca admitiu ter bombas e, agora, alvo de bombardeios, ameaça abandonar o TNP.
🔸 Quando mísseis iranianos atingiram Tel Aviv, prefeitos brasileiros de direita estavam em Israel em viagem paga pelo governo local, com foco em segurança pública e propaganda. O Intercept Brasil revela que eles viajaram a convite da agência Mashav e do Instituto Internacional de Liderança para uma operação de propaganda que combina lobby e venda de tecnologias de vigilância. O passeio incluiu visitas a áreas próximas à Faixa de Gaza e encontros com vítimas de ataques, além de participação na Muni Expo, feira que promove soluções de armamento e tecnologias “testadas em campo”, como softwares espiões e reconhecimento facial. Entre os participantes estavam prefeitos de cidades como Belo Horizonte, João Pessoa, Nova Friburgo e Goiânia. “A ida de prefeitos para conhecer como Israel usa suas tecnologias para lidar com os palestinos tanto na Cisjordânia quanto na Faixa de Gaza é muito sintomático de um movimento já muito bem conhecido em que políticos brasileiros visitam Israel para conhecer essas tecnologias”, afirma Pablo Nunes, coordenador adjunto do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania.
🔸 No Rio de Janeiro, o governador Cláudio Castro (PL) trocou o comando do Bope, o Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar fluminense. A mudança ocorreu depois da morte de um jovem numa operação policial realizada durante uma festa junina no Morro Santo Amaro, na zona sul da capital. A Ponte mostra quem é o novo comandante da tropa de elite da PM, o tenente-coronel Marcelo Corbage. Em 2015, ele chegou a ser afastado do Bope sob investigação pelo desvio de dinheiro de traficantes. Cinco anos depois, em 2020, teve sua empresa de segurança envolvida em um caso de racismo num shopping do Rio. Na ocasião, funcionários da Moura Corbage, empresa ligada a Corbage, agiram armados e sem autorização da Polícia Federal. Embora o inquérito militar por corrupção tenha sido arquivado, sua nomeação gerou críticas de movimentos sociais. “É alguém que nem deveria estar ali, mas é como o Estado funciona. Troca-se um violador por outro violador e a máquina de produzir morte continua. Essa é a lógica”, diz Fransérgio Goulart, coordenador da Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial.
📮 Outras histórias
Turistas que visitaram Ponta Negra, em Natal (RN), pela primeira vez no fim de semana, saíram decepcionados. Embora o Morro do Careca seja um atrativo pela beleza, a estrutura da praia concentra problemas. Segundo a Saiba Mais, a obra de engorda da faixa de areia foi feita pela Prefeitura de Natal sem licenciamento ambiental, contrariando recomendações técnicas. Agora, as chuvas recentes abrem voçorocas (espécie de vala) ao pé do morro. As cercas que isolavam o cartão-postal da cidade não ficaram de pé. A areia se misturou com pedras, as escadas ficaram alagadas, e os banheiros, sujos ou fechados. “O turista reclama do banho. A frequência de pessoas caiu mais da metade, em pleno feriado não vendi nenhuma mesa”, lamenta o comerciante Kel Fernandes.
📌 Investigação
O Cerrado tem perdido ao menos 30 piscinas olímpicas de água a cada minuto – 1.303 m³/s. Em 24 horas, esse volume seria capaz de abastecer o país por três dias e meio. O especial “Cerrado – O Elo Sagrado das Águas do Brasil”, levantamento inédito da Ambiental Media, analisou 50 anos de dados de vazão, chuva e evapotranspiração nas seis bacias do bioma – Araguaia, Paraná, Parnaíba, São Francisco, Taquari e Tocantins – e as mudanças do uso do solo nos últimos 35 anos. A reportagem revela que a expansão do agronegócio exportador de commodities, que já ocupa quase metade de sua extensão, está diretamente ligada ao processo de perda de água: enquanto o aumento das áreas destinadas à soja foi de 1.834% nessas bacias, a redução hídrica foi de 21% ao comparar os períodos de 1970 a 1979 e de 2012 a 2021.
🍂 Meio ambiente
A partir de seus conhecimentos ancestrais ligados ao comportamento o pirarucu, os ribeirinhos da Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã, na região do Médio Solimões, na Amazônia, caminham em direção à adaptação climática para manter a subsistência da comunidade. Segundo a Sumaúma, a técnica de observação para a contagem de pirarucus pelos pescadores determina a cota de pesca permitida anualmente. A percepção de sua presença é também um forte indicador ambiental. Diante da seca histórica do rio Tefé, afluente do Solimões, de 2023 e 2024, a espécie se antecipou ao colapso que atingiu diversos peixes e migrou para as partes mais profundas do rio. Nesses anos, os pirarucus também mudaram o período de desova. Antes, os ovos eram chocados entre outubro e novembro. “Eles sentiram que ia secar demais. Se tivessem chocado antes, os filhotes iam morrer. Eles esperaram a água subir. Só desovaram em janeiro”, conta o pescador Theibson da Silva, da comunidade de Amanã.
📙 Cultura
Celebrado hoje, o São João no Nordeste reúne quadrilhas juninas que misturam dança, música e artes cênicas, com capacidade para gerar identidade e pertencimento e incorporar temas políticos e sociais. A Cajueira traz exemplos dos nove estados nordestinos de espetáculos juninos que carregam esses elementos. Em Alagoas, a quadrilha Amanhecer no Sertão apresentou o tema “Até que a morte nos separe”, como um alerta sobre a violência de gênero. A história de Maria das Dores, encarnada pelo grupo, surgiu de relatos reais colhidos desde a pandemia. Já no Piauí, a Luar do São João exibiu “A Invenção do Matuto”, desconstruindo estigmas e preconceitos sobre nordestinos.
🎧 Podcast
“Independente dos caminhos que a tecnologia está tomando ou quem está direcionando elas nesse primeiro momento, eu tenho um posicionamento de que nós precisamos olhar para os padrões que existem e tentar recriar alternativas ou pensar alternativas para que eles sejam cada vez mais inclusivos”, afirma Nina da Hora, cientista da computação, desenvolvedora e hacker antirracista. No “Fio da Meada”, produção da Rádio Novelo, detalha sua pesquisa sobre vieses raciais no aprendizado de máquinas, como reconhecimento facial e inteligência artificial, e explica como os dados pessoais são usados por organizações públicas e privadas.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
“Ser negra, trans e nordestina aguçou ainda mais o estigma, o preconceito, o abandono”, afirma Jovanna Cardoso da Silva, conhecida como Jovanna Baby, uma das figuras mais emblemáticas do movimento trans e travesti no Brasil. Nascida em Mucuri (BA), em 1963, ela esteve na fundação de organizações como o Damas da Noite, primeira instituição no país que concentrava trabalhadoras do sexo, a Associação de Travestis e Liberados (Astral) e a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Em entrevista ao Colabora, a ativista revisita sua trajetória pelos direitos da população trans e travesti, que resistiu à ditadura, e lamenta o apagamento histórico dessas articulações: “Fundamos esse movimento tão importante, tão grandioso que impactou muitas vidas. Hoje existe um apagamento desse passado, e me entristece muito, como uma das fundadoras do movimento de travestis e trans no Brasil, saber que não temos o reconhecimento”.