As novas inundações em Porto Alegre e a 'dama do teatro' da Rocinha
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🔸 Com chuva forte ontem, Porto Alegre voltou a ter bairros alagados rapidamente. Até mesmo áreas que haviam passado incólumes no desastre climático foram agora inundadas. Em 15 horas, o volume de precipitação ultrapassou os 100 milímetros na capital gaúcha. Segundo o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), as redes de drenagem estão assoreadas, o que explica a dificuldade em escoar a água da chuva. Segundo o Sul21, o diretor-presidente do órgão, Maurício Loss, alegou que choveu “além do que os modelos previam”. A capital suspendeu as aulas nas redes pública e particular de ensino nesta sexta-feira.
🔸 Crianças e adolescentes são os grupos mais afetados por desastres climáticos, segundo a Unicef. O estresse prolongado pode afetar o desenvolvimento infantil. Nos abrigos do Rio Grande do Sul, passa de 15 mil o número de crianças e adolescentes. O Nexo explica como ajudá-los a lidar com o trauma. Um aspecto importante é observar os sinais de sofrimento, já que os pequenos nem sempre verbalizam ou falam diretamente sobre o que a tragédia pode ter causado a eles. Mudanças no sono, pausa nas brincadeiras e irritação estão entre os sintomas comuns. Conversar, tentar retomar a rotina, na medida do possível, e acolher o choro são orientações da Unicef para apoiar mães, pais e cuidadores.
🔸 As vítimas de crimes sexuais não precisam responder sobre sua vida íntima pregressa durante o julgamento da violência que sofreram. Parece óbvio, mas isso só foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ontem. A Corte fixou a tese de que é inconstitucional a prática de desqualificar a mulher vítima de violência durante a instrução e o julgamento de crimes contra sua dignidade sexual, informa o Jota. Na leitura do voto, a ministra Cármen Lúcia fez uma análise histórica da mulher na sociedade brasileira e destacou que, apesar de avanços legais, o Estado e a população ainda aceitam a discriminação e a violência de gênero.
🔸 A propósito: a subnotificação ronda a exploração sexual no Brasil. Isso porque o crime é muitas vezes confundido com abuso sexual. Os dois são diferentes: o abuso (isoladamente) não implica em pagamento para o ato sexual criminoso, já a exploração tem uma contrapartida (que não necessariamente é dinheiro). O Brasil ocupa o segundo lugar no ranking mundial em número de casos de exploração sexual de crianças e adolescentes, mas os dados oficiais nem sempre separam abuso e exploração. A revista AzMina mostra as implicações da confusão entre os crimes. Para a assistente social Adriana Duarte, o registro de exploração como abuso incentiva a impunidade. “O abuso é um problema interpessoal, envolvendo a vítima e o agressor que, quase sempre, é da família. Já no tráfico e exploração há um comércio ilegal”, explica.
🔸 O Senado aprovou o projeto de lei que cria cotas para pessoas negras, indígenas e quilombolas nos concursos públicos federais. Segundo a proposta, 30% de todas as vagas oferecidas, inclusive em contratos por tempo determinado, devem ser reservadas. O texto segue agora para a Câmara. O Congresso em Foco conta que o processo de tramitação teria sido diferente não fosse um recurso de Flávio Bolsonaro (PL-RJ). O projeto iria direto para a Câmara, depois de passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Mas o senador recorreu para que a proposta passasse antes pelo plenário do Senado, numa tentativa de protelar a votação. A bancada do PT, porém, pressionou para que fosse ainda hoje. O motivo: no dia 1º de junho, vencem as regras atuais de cotas em concursos públicos (de 20% das vagas). Os parlamentares querem aprovar o texto com agilidade para que as novas regras prevaleçam no Concurso Nacional Unificado.
📮 Outras histórias
Nascida e criada na Rocinha, a atriz Alitta já foi chamada de “dama do teatro” de sua geração. Foi a primeira mulher trans negra indicada ao Prêmio Shell e, desde o ano passado, está em turnê pela Europa com o espetáculo “A Noiva e o Boa Noite Cinderela”. A peça já lhe rendeu o prêmio de melhor performance no Radikal Jung Festival, na Alemanha. Em entrevista ao Fala Roça, ela relembra a própria trajetória, as dificuldades que ainda enfrenta como mulher trans e ressalta o poder transformador do teatro. “Ser uma mulher trans não só na Rocinha, mas como em qualquer outro lugar e ambiente é uma experiência complexa e que também tem seus desafios, suas dificuldades. Também há um lugar de resiliência e que, ainda que exista um preconceito, vale ressaltar que eu não vou apanhar na minha favela só por ser uma mulher trans, diferentemente de outros bairros da cidade.”
📌 Investigação
Mais de 600 cabeças de gado foram apreendidas em Rondônia e, até abril, pastavam dentro do Parque Estadual de Guajará Mirim, uma unidade de conservação de proteção integral da Amazônia, onde a pecuária é proibida. O pecuarista responsável foi preso, mas seus cúmplices rondam a área, o que levou o governo estadual a prover um esquema de vigilância armada de 24 horas por dia para que os animais não sejam vendidos ilegalmente. A Repórter Brasil obteve documentos que revelam conexões do caso para além dos crimes ambientais, com envolvimento de lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, falsidade ideológica, extorsão e estelionato. Os acusados já fizeram negócios com grandes frigoríficos do país, como JBS, Marfrig e Frigon.
🍂 Meio ambiente
A Justiça do Mato Grosso deu ganho de causa à empresa Sociedade Comercial e Agropecuária Triângulo para a extinção do Parque Cristalino II, uma área de 118 mil hectares de floresta preservada. Na última semana, porém, o caso teve uma reviravolta, com o pedido da Advocacia Geral da União (AGU) para anular a decisão. Segundo o Eco, a AGU alega que a empresa não tem legitimidade para pedir a extinção do parque e que as terras, que pertenciam à União, foram transferidas para o Mato Grosso sob a condição de que o estado criasse no local uma unidade de conservação.
📙 Cultura
Com influência de musicalidades africanas e europeias, o choro se desenvolveu na Pequena África, região central do Rio de Janeiro e reduto dos negros vindos da Bahia, por volta dos anos 1870. No dia 29 de fevereiro de 2024, o choro foi registrado como Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O Nonada mostra, no entanto, como esse ritmo pulsante de origem popular passou por um processo de embranquecimento e distanciamento de sua origem, desde as pessoas que costumam frequentar rodas e eventos de choro até a mudança nos instrumentos utilizados.
🎧 Podcast
Nascida em 1985, Luara de Souza Ferreira conhecia seu avô paterno como um senhor aposentado, com problemas de saúde, que passava a maior parte do tempo sentado assistindo à TV. Foi só no enterro dele, em 2000, que ela soube que, para os amigos policiais, ele era conhecido como Delegado Pudim, que atuou no Departamento de Ordem Política e Social (Dops) durante a ditadura, entre os anos 1960 e 1970. Luara descobriu que o avô fazia parte da equipe de um dos nomes mais conhecidos do Dops de São Paulo na época, a do delegado Sérgio Paranhos Fleury. No “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, Luara fala sobre a “herança” indesejada que tem nas mãos e as histórias que descobriu sobre a participação do avô nos anos de chumbo.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“Tem gente que se surpreende ao saber que a Dona Tati é uma baixinha, gordinha e preta”, afirma a empresária Sebastiana Alves Martins, a Dona Tati, de 68 anos, que comanda, ao lado do filho Thiago, o Boteco da Dona Tati, na Barra Funda, na área central de São Paulo. O estabelecimento é conhecido por suas rodas de samba frequentemente lotadas. O Nós, Mulheres da Periferia perfila Dona Tati, que se mudou para a capital paulista aos 13 anos para trabalhar como doméstica. Para a empresária, seu boteco é um lugar sagrado, onde passa a maior parte do tempo. “Vem tanta gente, de lugares e personalidades diferentes, aí você olha e parece uma grande família, é uma energia pairada no ar”, conta.