O 'mutirão' contra combustíveis fósseis e o racismo obstétrico no país
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🔸 Em movimento inédito na história das COPs, cerca de 80 países apoiaram a criação de uma coalizão global pelo fim dos combustíveis fósseis, anunciada em Belém durante a COP30, com presença de nações como Alemanha, Colômbia, Reino Unido e Quênia. O Eco explica que o objetivo é construir um Mapa do Caminho para a descarbonização, retomando a decisão de “transicionar para longe dos combustíveis fósseis” aprovada em Dubai, mas que não avançou na COP seguinte, no Azerbaijão. O “mutirão”, como vem chamando a COP30, fortalece a posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já defendeu publicamente o Mapa do Caminho em quatro discursos. “Se no primeiro dia da conferência Lula estava lá sozinho falando no palco, hoje ele está com mais 80 países pedindo o mesmo Mapa do Caminho. Hoje, sabemos que os países não apenas ouviram, mas apoiaram a ideia”, afirma Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.
🔸 A propósito: a Colômbia anunciou que será o primeiro país amazônico a proibir exploração de combustíveis fósseis e mineração em toda a sua porção do bioma, agora declarado reserva de recursos naturais renováveis, informa o Conexão Planeta. “Esta declaração é um compromisso ético e científico. Ela busca prevenir a degradação florestal, a poluição dos rios e a perda de biodiversidade que ameaçam o equilíbrio climático do continente. É uma decisão de vida ou morte”, disse Irene Vélez Torres, ministra interina do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Colômbia. A medida protege mais de 483 mil km² de floresta – 42% do território colombiano e 7% da Amazônia sul-americana – e reforça o constrangimento para o Brasil, que liberou a exploração de petróleo na Foz do Amazonas.
🔸 O governo federal oficializou na segunda-feira a demarcação de dez terras indígenas. A medida eleva para 21 o total de territórios declarados no terceiro mandato de Lula. Segundo a Alma Preta, as portarias assinadas pelo ministro Ricardo Lewandowski incluem a demarcação do território Tupinambá de Olivença (BA) – prometida na devolução do Manto dos Tupinambá, em julho do ano passado –, além de áreas nos estados do Amazonas, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Paraná e São Paulo, ocupadas por povos como Mura, Tupinambá, Pataxó, Guarani-Kaiowá, Munduruku, Pankará e Guarani-Mbya. Estudos da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia e do Comitê Indígena de Mudanças Climáticas indicam que ampliar as demarcações pode evitar 20% do desmatamento adicional e reduzir em 26% as emissões de carbono até 2030.
🔸 O churrasco do agro na COP30 teve chope gelado, pagode e defesa da pecuária como “solução para o clima”. A Repórter Brasil narra como foi o evento privado dentro da Agrizone, espaço da Embrapa na conferência. O evento restrito, com carne controlada por pulseiras e presença do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, e de figuras ligadas a conflitos fundiários, serviu de vitrine para a narrativa da “carne sustentável”. No Brasil, a expansão da agricultura e da pecuária foi responsável por 97% da perda de vegetação nativa nos últimos seis anos, segundo o Relatório Anual de Desmatamento do MapBiomas. A pecuária sozinha figura como o sétimo maior emissor de metano do mundo.
🔸 Falando em metano… As emissões globais do gás devem seguir aumentando até 2030, contrariando o Compromisso Global do Metano firmado na COP26, que prevê uma redução de 30% em relação a 2020. A perspectiva integra o relatório “Global Methane Status”, publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). A Eixos detalha o documento, segundo o qual 72% do potencial global de mitigação está no G20+, onde cortes de 36% seriam possíveis até 2030. O relatório destaca que a mitigação precisa ocorrer nos setores da agricultura, resíduos e combustíveis fósseis.
🔸 Em meio à COP30, teses negacionistas voltam a circular nas redes para desacreditar a ciência do clima e minimizar o papel humano no aquecimento global, apesar do consenso robusto em sentido oposto. O Aos Fatos identificou um núcleo recorrente de alegações falsas que se repetem há anos, mas que ganharam impulso com a conferência. A reportagem desmonta três eixos centrais da desinformação: a ideia de que o aquecimento seria apenas resultado de variações naturais; a narrativa de que o CO2 não causa, mas apenas responde ao aumento de temperatura; e a falsa premissa de que o desmatamento da Amazônia não afeta o clima global.
📮 Outras histórias
A Prefeitura de Porto Alegre declarou de utilidade pública a área da antiga Galeria XV de Novembro, o Esqueletão, no centro histórico da capital. O decreto abre caminho para a desapropriação e transformação do terreno em equipamento de uso coletivo e comunitário. O terreno de 872 m² agora está cercado e totalmente desocupado. O Sul21 lembra que o Esqueletão era um prédio inacabado desde 1959, cuja estrutura apresentava risco de colapso, segundo laudo da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. A demolição, autorizada pela Justiça em 2022, retirou mais de 6,3 mil toneladas de entulho e custou R$ 4,9 milhões, numa obra iniciada em janeiro de 2024 e concluída apenas em outubro passado.
📌 Investigação
Do pré-natal ao parto, mulheres negras são vítimas de violência obstétrica, com cesáreas forçadas, negligência médica e mortes evitáveis. “Me fecharam e deixaram o tecido [compressa cirúrgica] dentro. Eu fui para o quarto sentindo muitas dores, até achei que era um outro bebê que eu tinha. Fui para o banheiro fazer xixi com muitas dores e contrações, e nasceu o pano”, relata Ângela Santos, de 50 anos, quilombola da comunidade Pau de Leite, em Pernambuco. Em reportagem da série “Juntas pelo Bem Viver”, a revista AzMina destrincha o conceito de “racismo obstétrico”, reúne relatos que mostram um padrão de negligência contra mulheres negras e resgata o alto índice de mortalidade materna entre essa população.
🍂 Meio ambiente
“Precisamos questionar como o Semiárido vem sendo visto e vendido: um território ‘rico’ em vento, sol e agora carbono. A economia verde não pode aprofundar injustiças. A energia gerada aqui deve retornar às comunidades, às mulheres, aos jovens, não apenas ‘salvar o mundo’, mas melhorar a vida de quem vive nele. Não podemos transformar o Semiárido em uma imensa usina eólica e solar que produz energia ‘limpa’ às custas de novas desigualdades”, afirma Ivi Aliana Dantas, da Coordenação Executiva da Articulação Semiárido Brasileiro (ASA) pelo Rio Grande do Norte. Em entrevista à Eco Nordeste, ela fala sobre as tecnologias e políticas integradas ao Semiárido brasileiro, como as cisternas, e os desafios de proteção do meio ambiente e das comunidades na região. “O Semiárido brasileiro mostra ao mundo como é possível viver em equilíbrio com o bioma, suas limitações, suas forças e sua resiliência. A ASA tem repetido, nesta COP, uma frase que sintetiza esse caminho: ‘convivência é o nosso jeito de mudar o mundo’.”
📙 Cultura
“Eu fotografava no meio das pausas para beber água, das pausas que eu pedia para fumar um cigarro.” Enquanto trabalhava como ajudante de pedreiro, o jovem Luiz Buscapé carregava uma câmera Cybershot para registrar a vida na cidade. Nascido na zona noroeste de Santos, região historicamente marcada por enchentes e desafios estruturais, Buscapé traz uma visão única sobre as desigualdades urbanas. “Meu olhar é bastante assim, de contraste, desse encontro, dessa dança de estéticas que a gente acha no dia a dia”, relata. O Juicy Santos narra a trajetória do fotógrafo e artista visual, que registra desde moradores da sua região até autoridades municipais. Suas obras já foram expostas e vendidas para além da Baixada Santista. “Eu já vendi quadro para a Suíça, tô com um embrulhado aqui do lado que tem que enviar para fora do Brasil.”
🎧 Podcast
Repensar o relacionamento amoroso e perceber as possibilidades para além do modelo tradicional foi um alívio para a maquiadora e apresentadora Vanessa Rozan. As expectativas sociais, a busca pela independência financeira e a maternidade moldam as relações entre mulheres. Para Rozan, sua mãe é a maior referência de família e de luta para conciliar diferentes esferas por ser uma mulher que reconstruiu sua vida profissional depois de ter um casamento precoce. O “Isso Não É Uma Sessão de Análise”, produção da Trovão Mídia, recebe a apresentadora para mergulhar nas influências familiares que ainda reverberam no presente, incluindo os desafios para criar uma filha adolescente.
✊🏾 Direitos humanos
A proibição do uso de linguagem neutra na administração pública, sancionada por Lula, aproxima o governo de projetos anti-LGBTQIA+, liderados pela extrema direita. O texto, publicado no Diário Oficial da União, integra a Política Nacional de Linguagem Simples e veda “novas formas de flexão de gênero e de número” em documentos e eventos oficiais. A proibição alcança todos os Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios. A Agência Diadorim lembra que há uma ofensiva legislativa anti-LGBQIA+ em expansão desde 2020 e a linguagem neutra se consolidou como o principal eixo dessas propostas. Na Câmara dos Deputados, ao menos 28 projetos apresentados entre 2020 e 2025 tentam proibi-la em escolas, concursos, materiais didáticos, comunicações oficiais e documentos públicos.




