As mulheres no Novo Código Eleitoral e as novelas na era do streaming
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🔸 O Novo Código Eleitoral (NCE) ignora um dos maiores déficits da democracia brasileira: a sub-representação de mulheres e pessoas negras no poder. É o que afirma Tainah Pereira, coordenadora do Mulheres Negras Decidem, em artigo na Gênero e Número. Segundo ela, a proposta do NCE reúne um amplo conjunto de normas, que vão desde o funcionamento dos partidos até a organização das eleições, mas não olha para a paridade de gênero. “Em um país no qual mulheres são 52% da população, discutir a paridade como direito deveria ser ponto de partida, e não concessão. O texto do NCE mantém o mínimo legal de 30% de candidaturas de cada sexo, mas concede aos partidos um prazo de 20 anos sem sanções, caso não cumpram esse percentual – desde que as vagas fiquem em aberto”, escreve. Pereira lembra ainda que várias propostas legislativas para enfrentar essa desigualdade já passaram (ou estão paradas) no Congresso, como o PL 1984/2019, que propõe paridade nas listas de candidaturas; o PL 763/2021, que reserva cadeiras no parlamento para mulheres; e a PEC 116/2011, conhecida como “PEC das Cadeiras Negras”. Nenhuma delas avançou.
🔸 Pela primeira vez, crianças negras são maioria entre as matriculadas em creches no Brasil, segundo o Censo Escolar 2024. Elas representam 40,2% do total, enquanto as crianças brancas são 38,3%. Nas creches públicas, o percentual de crianças negras é ainda maior: 45%. Para a pesquisadora Mighian Danae, doutora em Educação, uma das hipóteses para a mudança é o aumento na autodeclaração racial, que pode ter influenciado a redução do grupo de crianças com raça “não declarada”. O Nós, Mulheres da Periferia mergulha nos dados sobre o acesso à creche no país – desigual e atravessado por questões sociais, raciais e regionais. Entre os mais pobres, só 27,8% das crianças frequentam creches; entre os mais ricos, esse índice é de 54,3%. Além disso, 75,6% das crianças em situação de pobreza estavam fora das creches entre 2018 e 2020. “O que precisamos fazer é tornar a creche a primeira etapa da educação obrigatória, para que ela se torne algo mais valorizado pelas políticas públicas. Essa é uma questão a ser enfrentada no próximo Plano Nacional de Educação”, defende Danae.
🔸 Em Brasília, a ministra Vera Lúcia Santana, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi alvo de racismo. O caso veio à tona após pronunciamento da ministra Cármen Lúcia, presidente do TSE, que classificou o caso como inadmissível. Em nota de repúdio, o Ministério da Igualdade Racial informou que Santana foi impedida de acessar um seminário no Palácio do Planalto – mesmo sendo palestrante do evento. O Congresso em Foco informa que a pasta comandada por Anielle Franco tratou o episódio como “uma manifestação clara e grave de racismo institucional” e afirmou que “barrar pessoas negras nos espaços, especialmente os de poder, é uma das manifestações mais comuns e perversas do racismo”.
🔸 Para ouvir: “Como a grande maioria das mulheres negras, não posso deixar de falar da minha mãe, que foi simplesmente extraordinária. Ela era empregada doméstica, saiu de Bocaiúva, onde nasci. Quando eu tinha 4 anos, ela foi para Belo Horizonte porque ela não queria que a filha tivesse o mesmo destino dela. E ela era analfabeta”, conta Diva Moreira. Símbolo de luta no movimento antimanicomial e por reparação histórica, a ativista e cientista política compartilha sua trajetória com Neca Setubal e Sueli Carneiro, no podcast “Escute as Mais Velhas”, da Rádio Novelo. Diva Moreira conta como se conscientizou sobre o racismo e de que forma isso impulsionou sua atuação em defesa do povo negro.
📮 Outras histórias
Na Praia da Costa, na Barra dos Coqueiros, em Sergipe, um barracão resiste à maresia, à omissão da prefeitura e à pressão da expansão imobiliária na região. Trata-se da sede da Associação de Artesãos da Barra dos Coqueiros. Há 17 anos na mesma estrutura improvisada, o espaço abriga 20 artesãs e também funciona como centro de formação artística, memória e apoio afetivo. Apesar de promessas da prefeitura para revitalização da área, o projeto segue paralisado desde 2022, e a ameaça de remoção do barracão persiste. A Mangue resgata a importância da associação, um espaço de formação artística, com oficinas para diferentes faixas etárias, tanto de residentes do município quanto de outros lugares. “Estou aqui lutando com as artesãs, as antigas e chamando as novas para a arte continuar aqui na Barra dos Coqueiros. Nós estamos capacitando os jovens para que acolham a nossa arte, para não deixar morrer”, diz a diretora da organização, Verônica Patrícia.
📌 Investigação
Desde novembro de 2021, o padre Bernardino Batista dos Santos está afastado da Arquidiocese de Belo Horizonte, quando se iniciou a primeira investigação de denúncias de estupro. A Agência Pública ouviu sete denunciantes: elas afirmam que foram vítimas do sacerdote quando crianças. A reportagem teve acesso exclusivo aos detalhes da investigação policial realizada em Tiros (MG). Segundo os documentos, o sacerdote teria feito pelo menos 50 vítimas entre os anos de 1975 e 2016 – o que levou à prescrição da maioria dos casos. As vítimas eram meninas entre 3 e 11 anos, e Bernardino se valia da função de líder religioso e diretor de escola infantil para garantir o respeito dos pais e da comunidade. “Teve uma vez que ele fez uma festa na casa paroquial em que só participaram as coroinhas beges e vermelhas – preferidas dele! E todas elas, inclusive eu, fomos abusadas”, disse a advogada Carine Diniz, que acusa o padre de abuso quando era criança.
🍂 Meio ambiente
O Brasil enviou à Organização das Nações Unidas (ONU) uma proposta para que as convenções da entidade sobre Biodiversidade, Clima e Desertificação trabalhem de forma mais integrada para enfrentar as crises socioambientais globais. Segundo O Eco, o documento era uma das responsabilidades na 16ª COP da Biodiversidade, iniciada em novembro passado, na Colômbia, e encerrada em fevereiro deste ano, na Itália. No entanto, apenas o Brasil e outros oito países entregaram suas contribuições ao secretariado da Convenção sobre Diversidade Biológica. “O trabalho de sinergia é de extrema importância e é uma grande tendência, porque a gente não tem recurso financeiro para tudo, por exemplo. A soma é gigantesca. Precisamos otimizar esse direcionamento de esforços”, afirma Simone Tenório, coordenadora de projetos do Instituto de Pesquisas Ecológicas.
📙 Cultura
“Algumas pessoas estão no lugar de arrogância tão grande que elas podem julgar que o desconforto que elas estão sentindo significa que aquela leitura não tem valor estético. Mas pode ser apenas que elas não tenham um letramento para entender aquilo”, afirma a escritora baiana Luciany Aparecida, autora de “Mata Doce”, obra vencedora do Prêmio São Paulo de Literatura, na categoria de Melhor Romance de 2023. Em entrevista ao Nonada, a escritora fala sobre a produção de seu novo livro, as nuances da literatura e como se enxerga como escritora. “Existe uma expectativa de que uma pessoa negra escritora não saiba escrever. As pessoas esperam que nós não saibamos escrever, que o nosso texto recaia só no que elas apontam como panfletário. Então, elas vão listar vários nomes para isso: identitarismo, panfletário, relato de vida. Só que nenhuma dessas coisas, no texto de uma pessoa branca, é nominado como tal, e se for, essa nominação não é negativada.”
🎧 Podcast
“‘Beleza Fatal’ foi feita para o streaming, jamais foi pensada para a TV aberta, mas no momento em que a Band compra essa novela ela mostra para a Warner como nós somos viáveis economicamente. Essa venda foi importantíssima para mostrar que esse produto tão popular que é a novela brasileira tem uma movimentação econômica”, afirma a diretora de teledramaturgia Maria de Médicis. No “Diálogos com a Inteligência”, produção do Meio, ela fala sobre seu projeto mais recente, “Beleza Fatal”, primeira novela feita para uma plataforma de streaming, e aborda as transformações do projeto nos últimos anos com o crescimento das redes sociais e a mudança das novas gerações na forma de consumir entretenimento.
🏃🏾♀️ Esporte
A brasileira Marta foi reconhecida como a melhor jogadora da história do futebol feminino pela Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol, sendo a única brasileira na lista com as dez maiores atletas da modalidade. A Alma Preta resgata os prêmios da futebolista: maior artilheira da história das Copas do Mundo, maior artilheira da seleção brasileira, eleita seis vezes a melhor jogadora do mundo pela Federação Internacional de Futebol (Fifa), cinco deles de forma consecutiva – feito inédito tanto no futebol feminino quanto no masculino. Pela seleção, Marta conquistou três títulos da Copa América Feminina, um vice-campeonato mundial e duas medalhas de ouro nos Jogos Pan-Americanos. Atualmente, a jogadora atua pelo Orlando Pride, dos Estados Unidos, e foi convocada para defender o Brasil em dois amistosos contra o Japão, que serão disputados nos dias 30 de maio e 2 de junho, em São Paulo.