O massacre no litoral de SP e os mercenários digitais
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🔸 Ao menos dez pessoas já foram mortas por intervenção policial em Guarujá, no litoral paulista, onde a PM age com o aval do Estado desde sexta-feira. A informação é da Ouvidoria das Polícias, que também apura outras mortes sem registro oficial. O número diverge daquele apresentado pelo governo estadual, que indica oito vítimas fatais até o momento. A ação policial teve início depois da morte de Patrick Bastos Reis, de 30 anos, soldado da Rota, força especial da PM paulista. “Não houve hostilidade, não houve excesso, houve uma atuação profissional e que resultou em prisões”, disse o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). A Ponte explica o caso e conversa com especialistas e com o ouvidor das Polícias, Claudio Aparecido da Silva. Segundo ele, familiares de mortos e moradores relatam que as vítimas não tinham envolvimento com crimes: “A gente não acha comum morrer dez pessoas em três dias, especialmente em uma cidade onde esse tipo de morte decorrente de intervenção policial não passa historicamente de 30 por ano”. Para a socióloga e coordenadora de pesquisa do Instituto Fogo Cruzado, Terine Husek, a ação é uma clássica operação por vingança.
🔸 O governador terá de explicar a chacina, que classificou ontem como “exemplo de profissionalismo”. Deputados estaduais formaram uma comissão para cobrar Tarcísio de Freitas e irão até a Baixada Santista nesta semana para acompanhar a situação na cidade do litoral, informa a Alma Preta. “O governador e o secretário de Segurança Pública afirmaram que essa operação vai prosseguir por mais 30 dias. Isso é um grande absurdo. É um política que busca causar um completo terrorismo nas comunidades”, afirma Paula Nunes, que preside a Frente Parlamentar da Juventude Negra e Periférica da Assembleia Legislativa de São Paulo.
🔸 Para o ministro da Justiça, Flávio Dino, a reação da PM “não parece ser proporcional em relação ao crime que foi cometido”. Segundo ele, as imagens registradas pelas câmeras dos policiais serão cruciais para esclarecer as mortes em Guarujá. A CartaCapital conta que o governo federal não deve intervir nas investigações do caso, mas que a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos e o Ministério Público de São Paulo acompanham a apuração.
🔸 O Brasil vive um conflito por terra a cada quatro horas. A publicação “Conflitos no Campo Brasil”, da Comissão Pastoral da Terra, revelou ainda que, em 2022, o número de camponeses assassinados foi 30,55% maior do que no ano anterior. Já as tentativas de assassinato cresceram 273% em comparação a 2021 e atingiram 123 pessoas, o maior número registrado pela comissão desde o início da realização do levantamento, em 1985. O Marco Zero detalha a pesquisa e conta que os povos indígenas foram os principais afetados pelos conflitos por terra no país, seguidos dos posseiros e dos quilombolas.
📮 Outras histórias
Em Curitiba, a Guarda Municipal (GM) matou 15 pessoas em casos que não eram da alçada da corporação. Criada para proteger bens, serviços e instalações do município, a GM da capital paranaense é tema de uma série de reportagens do Plural. A primeira delas se debruça sobre dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) e mostram que a guarda, em 17 anos, fez 15 vítimas em casos de roubo, dano, disparo, agressão, tentativa de homicídio, lesão corporal, tentativa de roubo a veículo, assalto, tumulto, abordagem a veículo e abordagem à pessoa – nenhum relacionado à função de proteção patrimonial do município. Segundo especialistas, o desvirtuamento da GM é uma questão nacional, fruto da tentativa de “solucionar” o problema da segurança pública no país.
📌 Investigação
Empresas que atuam em marketing político para a extrema direita criam laços com figuras para desestabilizar eleições em diversos países. Uma dessas relações é a do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) com o consultor político Fernando Cerimedo, argentino que, em menos de quatro anos, passou de um desconhecido a criador de um grupo empresarial sediado em Buenos Aires. A Agência Pública revela que Cerimedo vinculou ao seu canal no Youtube, após a derrota de Bolsonaro, a live intitulada “O Brasil Foi Roubado”, na qual espalhou mensagens com informações falsas sobre o sistema eleitoral brasileiro. Essas descobertas estão na série de reportagens “Mercenários Digitais”, uma colaboração transnacional que reúne veículos da América Latina liderados pelo Centro Latinoamericano de Investigación Periodística (CLIP).
🍂 Meio ambiente
Entre os estados de Pernambuco e Alagoas, está localizada a maior Área de Proteção Ambiental de ambiente marinho, a Costa dos Corais. Na Eco Nordeste, o repórter Victor Moura descreve como foi visitar o local e apresenta o trabalho de projetos que atuam na conservação de recifes de corais. Um deles é o Projeto Coralizar, pioneiro no Brasil, realizado pela Biofábrica de Corais em parceria com organizações da sociedade civil, empresas, setor acadêmico e comunidade local. A iniciativa recolhe corais doentes – cujos sintomas se manifestam na aparência esbranquiçada – do fundo do mar para reabilitá-los e devolvê-los à natureza.
Em risco de extinção, a arara-azul-de-lear está na mira do tráfico. Presentes na Caatinga, pouco mais de 2,2 mil delas vivem livres no Raso da Catarina, território distribuído em municípios como Canudos e Paulo Afonso, no interior da Bahia. Há duas semanas, 29 delas foram apreendidas no Suriname, que informou que os animais foram traficados do Brasil e seriam vendidos na Europa. Segundo O Eco, a Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (RENCTAS) defende ações urgentes e sugeriu ao Ministério Público Federal (MPF) uma força-tarefa nacional para proteger a espécie.
📙 Cultura
“É importante conhecer a tradição, mas também transcender ela. Eu faço uma arte inspirada na tradição nagô, iorubá, na minha ancestralidade, mas eu não estou aqui para repetir os padrões”, diz Inaicyra Falcão, cantora lírica, educadora e pesquisadora. Nascida em Salvador (BA), ela mescla dança, voz e pesquisa acadêmica, o que lhe abriu a porta para um mestrado em Artes Teatrais na Universidade de Ibadan, na Nigéria. O Nonada perfila a multiartista, que entoa versos na língua iorubá e transpõe diversos universos.
Em vídeo: inspiradas por cantoras como Elza Soares, Dona Ivone Lara e Leci Brandão, mulheres negras de diversas idades e localidades buscam na música o resgate da ancestralidade e de suas potências. Entre elas, estão as artistas Luana Bayô, de 35 anos, e Susi Nascimento, de 54 anos. Ao Desenrola e Não Me Enrola elas contam como criaram conexões com a arte e como lidam com o sonho de viver da música. “Tem um monte de cantora preta maravilhosa, mas o sistema quer que só suba uma para representar todo mundo”, afirma Luana.
🎧 Podcast
Herói da democracia para alguns, vilão para outros, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes é nome recorrente nas manchetes de jornais. Dividido em seis partes, o novo podcast “Alexandre”, produção da Trovão Mídia e da revista piauí, reúne o que se sabe sobre o protagonista inesperado da eleição mais acirrada da História do Brasil. No primeiro episódio, a repórter Thais Bilenky revela os bastidores da atuação do magistrado como presidente do Tribunal Superior Eleitoral no dia 30 de outubro de 2022, data do segundo turno do pleito.
✊🏽 Direitos humanos
Em Pernambuco, o estado mais evangélico do Nordeste, adeptos de religiões afrobrasileiras sofrem intimidações de grupos neopentecostais, inclusive dentro de quilombos, onde a conversão de quilombolas tem se intensificado. A Revista Afirmativa expõe o panorama do assédio que religiões de matriz africana vêm sofrendo nos últimos anos no estado e no país como um todo. Pesquisa realizada pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM) da USP mostra que igrejas evangélicas abriram cerca de 17 novos templos por dia no Brasil em 2019. O país passou de cerca de cem igrejas nos anos 1960 para mais de 60 mil em 2015.