As marcas dos cinco anos da pandemia e os escritos de Fernanda Torres
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
Oi, pessoal!
A terceira edição da pesquisa da Brasis está no ar. Queremos conhecer melhor vocês, leitores, e aprimorar nossa curadoria de notícias. Para participar, é só clicar aqui.
Obrigada e boa leitura!
🔸 O Supremo Tribunal Federal (STF) julgará em 25 de março a denúncia contra Jair Bolsonaro (PL) e sete aliados por tentativa de golpe nas eleições de 2022. A decisão pode torná-los réus em ação penal. A data foi definida ontem pelo presidente da 1ª Turma do STF, Cristiano Zanin. O Jota explica que o julgamento vai focar no chamado “núcleo 1” da trama golpista, composto por Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Braga Netto. De acordo com a denúncia da Procuradoria Geral da República, o grupo tomou as principais decisões na tentativa de ruptura democrática. A tendência, segundo interlocutores do STF, é que a denúncia seja aceita. Se isso ocorrer, o processo entrará na fase de coleta de provas e depoimentos. Mesmo que haja condenação, Bolsonaro não deve ser preso de imediato, a menos que represente risco de fuga ou tente obstruir a Justiça.
🔸 Enquanto isso… bolsonaristas têm reciclado desinformações sobre as eleições de 2022, o 8 de Janeiro e a ditadura militar em meio às convocações para um ato pró-anistia marcado para 16 de março, no Rio de Janeiro. Em organização desde o mês passado, o evento, que pede o perdão aos golpistas presos e o impeachment de Lula, contará com a presença de Jair Bolsonaro, Silas Malafaia e outros opositores. O Aos Fatos lista e desmente as principais desinformações em circulação, como a de fraude eleitoral e a ideia de que o 8 de Janeiro foi um protesto pacífico, ignorando provas da violência e do planejamento golpista. A estratégia de disseminar conteúdos falsos acompanha a mobilização para o ato bolsonarista, e as postagens com informações falsas já acumulam mais de 215 mil visualizações em redes como Facebook, Instagram e X.
🔸 Cinco anos depois do início da pandemia, os efeitos da crise ainda estão aqui. De lá para cá, aumentou o número de famílias vivendo em ocupações e favelas na cidade de São Paulo. Dados da Secretaria Municipal de Habitação indicam que, até agosto de 2023, mais de 115 mil famílias estavam em ocupações. O número de domicílios em favelas subiu de 391 mil para 400 mil entre 2020 e 2023. A Agência Pública detalha como a crise econômica da Covid-19 reverbera na moradia dos brasileiros e lembra que o preço médio do aluguel no país saltou de R$ 29 por m² no início da pandemia para R$ 47 em janeiro deste ano. “Durante a Covid-19, as pessoas começaram a construir um barraco aqui e ali e foi pegando força aos poucos. Muita gente chegou aqui dizendo que não conseguia mais pagar o aluguel. Alguns não conseguiam pagar nem água”, lembra Rafael Mascarenhas, 39 anos, que vive na ocupação Vila da Mata, na zona noroeste, onde 3 mil pessoas moram desde 2022.
🔸 Em áudio: “Se você não se lembra onde estava em março de 2020… eu refresco a tua memória. No dia 11 de março, uma quarta-feira, a Organização Mundial da Saúde declarou que o mundo estava vivendo uma pandemia. O Brasil tinha, na época, 52 casos confirmados da doença. E nenhuma morte. Sim, houve um tempo em que nenhuma pessoa no Brasil tinha morrido de Covid-19. E aí, tudo aconteceu”, diz Branca Vianna na abertura do episódio “Uma Eterna Quarta-Feira”, do “Rádio Novelo Apresenta”, podcast da Rádio Novelo. A produção explora, em três atos, o olhar de duas pesquisadoras que lançaram um podcast sobre zika no início da pandemia, as marcas que a doença deixou no tecido social e até nos sonhos das pessoas.
🔸 A propósito: as crianças ainda enfrentam atraso no aprendizado, dificuldades de socialização e impactos emocionais da pandemia. Dados da Unicef mostram que, em 2023, 30% das crianças de até 8 anos não estavam alfabetizadas, mais que o dobro de 2019 (14%). Cerca de 4 milhões de crianças ainda têm defasagem escolar. O Lunetas destaca que os efeitos foram mais severos para crianças da periferia, como Maicon, de 11 anos, que ainda não está alfabetizado. “Se não tivesse acontecido a pandemia, eu já saberia ler e escrever, e já estaria mais avançado”, diz ele, que começava o primeiro ano do ensino fundamental em 2020, quando a pandemia começou. A reportagem mostra ainda que o isolamento aumentou o uso excessivo de telas, enquanto a falta de interação afetou o desenvolvimento da linguagem e socialização.
📮 Outras histórias
Héloa e Danielle Hinch são as diretoras da primeira série indígena de Sergipe, “Originários”. Financiada pela Lei Paulo Gustavo, a produção terá seis episódios e contará histórias, lutas e tradições dos povos Xocó, Kariri-Xocó e Fullkaxó, que vivem às margens do rio São Francisco. Em entrevista à Mangue, elas contam que a série surgiu do desejo de ampliar a representação indígena no audiovisual. Héloa, multiartista afroindígena, e Danielle, produtora executiva, começaram a desenvolver o projeto em 2020, durante a pandemia, com entrevistas online com indígenas de diferentes etnias. “Tive a oportunidade de conhecer diversas etnias no Brasil e parentes de vários lugares, e perceber o quão rica a história do nosso país é a partir da ótica indígena. A aldeia, assim como eu, mantém a chama, a força viva de se reconhecer povos indígenas no Brasil”, afirma Héloa.
📌 Investigação
Mesmo submetidas a um menor número de confrontos proporcionalmente, as polícias de São Paulo mataram mais durante 2024 do que em anos anteriores. A partir de um ofício enviado pelo secretário de Segurança Pública estadual, Guilherme Derrite (PL), ao Supremo Tribunal Federal, a Ponte identificou que, ao comparar os indicadores de ação da PM, as forças de segurança de São Paulo se tornaram mais letais no ano passado: para cada morte que cometeram, as polícias do estado precisaram de um menor número de intervenções, de prisões, de apreensões de armas de fogo e confrontos armados. Em 2024, a PM paulista fez 36.928 intervenções para cada morte cometida. Nos três anos anteriores, foi necessário que atuasse mais vezes para que policiais cometessem um assassinato.
🍂 Meio ambiente
Um decreto do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), autoriza a Companhia Siderúrgica Nacional a desapropriar 261 hectares de terra, perto dos bairros Santa Quitéria e Plataforma, em Congonhas, para depositar pilhas de rejeitos de minério de ferro. A Repórter Brasil conta que Santa Quitéria tenta ser reconhecida como quilombola, mas tem medo de “desaparecer” por causa do depósito, a menos de cem metros da comunidade. Já Plataforma é uma “área fantasma” anteriormente afetada pela expansão da mineradora na região, e os moradores se queixam dos baixos valores das propostas de indenização oferecidas. Apesar de serem consideradas mais seguras que as barragens, as pilhas de rejeito estão sujeitas a deslizamentos. Em dezembro, uma pilha do tipo desmoronou em Conceição do Pará, no oeste de Minas, desalojando moradores próximos.
📙 Cultura
“Se queremos equidade étnico-racial na literatura, que ainda é um espaço branco e elitizado, precisaremos de políticas mais ousadas”, afirma a professora e escritora quilombola Gessiane Nazario. Em sua pesquisa e no cotidiano, ela defende o conceito de “aquilombamento da literatura infantil”, em que reivindica uma mudança na forma como as histórias são contadas, preservando suas raízes na oralidade, elemento fundamental da identidade quilombola. “O meu posicionamento enquanto escritora de literatura infantil é político, pois o trabalho que eu produzo é para dar visibilidade às histórias de meus avós que ficaram silenciadas por décadas.” O Nonada narra os desafios de escritoras quilombolas para conseguir espaço na cena literária do país diante da falta de incentivo e da exclusão histórica dessas comunidades.
🎧 Podcast
O acesso ao saneamento básico e à água potável segue desigual no país, sobretudo em áreas periféricas das regiões Norte e Nordeste. A série “Bem Viver nas Cidades: Lutas por Direitos e Movimentos Populares Urbanos”, do “Guilhotina”, produção do Le Monde Diplomatique Brasil, mostra como a luta pelo direito à cidade também passa pelo direito à água. “O Brasil é um país muito rico hidrologicamente. Temos regiões que passam por grandes períodos de secas e outras que sofrem com problemas no abastecimento de água. São problemas que seriam tecnicamente facilmente resolvidos, mas existem questões socioeconômicas, existe o racismo ambiental, que faz com que não tenham prioridade na agenda institucional. Existem soluções tecnológicas, as universidades do país têm essas soluções”, afirma Joice Paixão, cofundadora e presidente da Associação Gris, que atua no bairro da Várzea, em Recife.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“Qualquer ator se pergunta antes de entrar em cena: ‘Mas, afinal, por que fui inventar isso pra mim? Por que não sou engenheiro ou médico? Que sentido há em fingir que sou outro?’”, escreveu a atriz Fernanda Torres em seu primeiro texto para a revista piauí, publicado em dezembro de 2006. Ao todo, foram nove textos da artista, protagonista de “Ainda Estou Aqui” – primeiro longa brasileiro a levar o Oscar de Melhor Filme Internacional. Na revista, falou sobre as delícias e as agruras de sua profissão, perfilou Bráulio Mantovani, roteirista do filme “Cidade de Deus” (2002), indicado ao Oscar na categoria de Melhor Roteiro Adaptado em 2004, e mergulhou nas cartas do ator britânico John Gielgud, especialista na interpretação de personagens de William Shakespeare.