O julgamento dos atos golpistas e os crimes de policiais em podcasts
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🔸 A terceira operação policial em 15 dias marcou o início da semana no Complexo da Maré, conjunto que abrange 16 favelas na zona norte do Rio de Janeiro. Vídeos mostram que muitos moradores circulavam pelas ruas quando veículos blindados do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar tomaram as comunidades de Nova Holanda e Parque União. Segundo o Maré de Notícias, a ação foi iniciada por volta das 00h05 da madrugada de domingo para segunda, com o uso de gás de efeito moral. Duas pessoas foram mortas. Foi violada a ADPF 635, conhecida como ADPF das Favelas, uma ação julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que proíbe a realização de operações antes das 6h da manhã (a menos que seja em caráter emergencial) e no período de entrada e saída escolar, além da obrigatoriedade de ambulâncias para socorrer possíveis feridos.
🔸 Em áudio: o podcast “Durma com Essa”, produção do Nexo, traz os áudios dos momentos de pânico registrados pelos moradores e lembra que as aulas foram suspensas em 25 instituições de ensino, afetando quase 9 mil crianças e adolescentes. O episódio também traz uma análise de como a violência afeta o cotidiano e a saúde física e mental de moradores das comunidades.
🔸 Uma professora foi demitida por denunciar abordagem policial em escola. Dois agentes da Guarda Civil Metropolitana de Ribeirão Pires (SP) renderam um adolescente na saída da Escola Estadual Profª Leico Akaishi, sob a mira de uma arma. Os policiais teriam identificado um “volume” na cintura do jovem – que se tratava de um aparelho celular. A Alma Preta conta que a professora Larissa Alves, que assistiu toda a cena, foi afastada após abordar o caso em sala de aula para ensinar sobre violência policial e racismo aos alunos. Ela também prestou apoio à mãe do jovem. A Secretaria Estadual da Educação alega, no texto de demissão, que a profissional estaria incitando os adolescentes a protestar.
🔸 Plataforma popular entre os jovens, o Discord não modera conteúdo violento. O aplicativo de chat em texto e áudio, que é bastante utilizado entre os adolescentes e gamers, é palco de servidores com mensagens racistas, misóginas, LGBTfóbicas e neonazistas. A Agência Pública analisou um desses servidores, com cerca de cem usuários, em que são compartilhadas piadas com referência a temas como estupro, pedofilia e necrofilia, além de conteúdos que pedem a morte de pessoas não-brancas, vídeos de pessoas negras sendo mortas pela Ku Klux Klan e mulheres sendo agredidas. Embora o comportamento fira as políticas de uso do Discord, a moderação é precária – especialmente em português.
🔸 O governo tem até hoje para tentar impedir a CPMI dos atos golpistas. São necessárias 171 assinaturas de deputados e 27 de senadores para a abertura da comissão mista. Para o deputado André Fernandes (PL-CE), autor do requerimento, essa pode ser uma questão de sobrevivência para o seu mandato. Fernandes foi indiciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), por incitação e apologia às invasões de 8 de janeiro. Tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quanto o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), são contra a instauração do colegiado com a justificativa de que os ataques às sedes dos três poderes já estão sendo investigados pela Polícia Federal. O Congresso em Foco detalha que a CPMI deve ser instalada nesta tarde caso o governo não consiga dissuadir parlamentares a retirarem as assinaturas.
🔸 Em tempo: durante essa madrugada, o STF começou o julgamento de cem suspeitos de participar dos atos golpistas. O ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito, votou a favor de tornar os denunciados réus, como informa o Metrópoles. Em sua decisão, Moraes afirmou que os acusados tiveram o “intuito de modificar abruptamente o regime vigente e o Estado de Direito, a insuflar ‘as Forças Armadas à tomada do poder’”. Atualmente, são 294 detidos e as análises acontecerão até o dia 24 de abril.
🔸 “Lula não é celebrado como um grande aliado da Rússia.” A afirmação é do historiador brasileiro Rodrigo Ianhez, especialista no período soviético que vive em Moscou há mais de 11 anos. Em entrevista à CartaCapital, Ianhez explica que, apesar do repúdio público da Casa Branca, o presidente brasileiro não é visto como aliado de Vladimir Putin. Os discursos do petista também não são acessados pela maioria dos russos, que “veem ainda com certo receio essas iniciativas que o Brasil propõe para uma possível mediação com a Ucrânia, mas como possibilidade de alternativa. Porém, não há um imenso entusiasmo, porque está tudo em um plano de proposta pouco concreta”. O chanceler russo, Sergey Lavrov, chegou ao Brasil ontem. Ao longo da manhã, o representante do Kremlin participou de sua primeira reunião bilateral de uma extensa agenda com o governo brasileiro. Ele foi recebido pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, no Itamaraty.
📮 Outras histórias
Foram interditadas 107 casas em áreas de risco em Parelheiros, no extremo sul de São Paulo. Com uma ocupação que começou há quatro décadas, muitas residências ficam próximas de córregos, encostas e no traçado da linha de trem desativada que ia até a Serra do Mar. Apesar de estarem em um local de risco médio e alto, os moradores são também afetados pela incerteza da notificação recebida pela Subprefeitura. A Periferia em Movimento narra o receio da comunidade em não ter onde morar e a falta de informação por parte do poder público. “Eu não vou querer ver meus filhos na rua porque eu trabalhei muito tempo pra ver eles alocados, no mínimo”, diz José Pereira, o seu Zé, de 71 anos, que vive há mais de 40 anos no bairro.
📌 Investigação
“A grávida voltou, eu peguei, enrolei pelo cabelo e ‘pá!’, tomou! Voou longe!”, afirmou o sargento Henrique Brito, do Bope do Rio de Janeiro, entre risadas em um videocast. Semelhante a Brito, outros policiais confessam crimes impunemente em podcasts com milhões de visualizações, de agressões contra mulheres e crianças a assassinatos. Segundo a Ponte, os relatos com apologia à violência não sofrem nenhum tipo de regulação, são aplaudidos por internautas e narrados com deboche. Em uma das entrevistas, o policial civil Thiago Raça compartilhou com a audiência do programa um episódio em que decidiu se iria executar ou não adolescente que agonizava no chão após levar cinco tiros.
🍂 Meio ambiente
Apenas 0,16% do orçamento da União foi destinado ao Meio Ambiente no governo Bolsonaro. O número se refere à média de execução das despesas obrigatórias do Executivo nos últimos quatro anos. O Eco revela o levantamento inédito feito pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). A área ambiental passou de R$ 3,3 bilhões em 2019 para R$ 2,7 bilhões em 2022. Durante toda a gestão do ex-presidente, o Ministério do Meio Ambiente e suas autarquias, como o Ibama e o ICMBio, executaram cerca de R$ 11,2 bilhões. Em termos comparativos, o Ministério da Defesa utilizou R$ 515,7 bilhões no período.
A propósito: com pouco orçamento dedicado à pasta, a revista piauí recorda que as multas ambientais na Amazônia diminuíram 35% na gestão Bolsonaro, em comparação com a média do segundo mandato de Dilma e do governo Temer. Em contrapartida, houve um aumento do desmatamento.
A produção de algodão orgânico tem aumentado a renda das famílias no Semiárido. Os agricultores familiares da Paraíba e do Rio Grande do Norte estão em processo de aprendizado e incorporação de técnicas para plantar algodão sem usar agrotóxicos, como descreve a Eco Nordeste. Outras culturas como milho e feijão também são plantadas no roçado para que as famílias possam vender os produtos agroecológicos em feiras, além de utilizá-los para a própria alimentação. O projeto coordenado pelo Instituto Casaca de Couro, com apoio dos governos municipais e estaduais, também reativou a planta de uma antiga usina em Pirpirituba, município do Brejo paraibano, onde o algodão orgânico será descaroçado livre de contaminação por organismos geneticamente modificados.
📙 Cultura
“Quando você coloca a maternidade no pacote, todas as questões de classe e raça se tornam ainda mais díspares.” A historiadora e curadora Carolina Rodrigues estuda as maternidades negras no campo das artes visuais. Sua pesquisa começou quando foi convidada para montar uma exposição sobre maternidade e percebeu que encontrava apenas artistas brancas. “Tanto na cultura popular, quanto nas religiões afro, as figuras da mãe e da tia são figuras de poder intelectual, enquanto na cultura ocidental e colonial, a maternidade significa a perda de poder sobre o próprio corpo e direito de ir e vir”, afirma. O Nonada lista trabalhos e artistas – do audiovisual ao teatro – que tensionam expectativas sociais sobre a maternidade.
“O Pequeno Príncipe” completou 80 anos de sua primeira publicação neste mês. O livro do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry é o segundo mais lido do Brasil, ficando atrás apenas da Bíblia, de acordo com a última pesquisa Retratos de Leitura, divulgada em 2020. Embora faça parte da literatura infantil, a narrativa é atemporal e dialoga com os mais diversos públicos e idades. O Lunetas conta que a obra marca gerações de brasileiros e se tornou uma leitura passada dos pais aos filhos. “Tivemos muitas conversas em família sobre a persistência do príncipe, a amizade com a rosa e a necessidade de sair do seu planeta para reconhecer o amor. Hoje a história é muito querida por aqui”, diz Elis Alves Silva, mãe de duas crianças.
🎧 Podcast
O aumento de atentados em escolas nos últimos meses tem gerado um clima de tensão no dia a dia de estudantes e professores. O “Guia Prático”, produção do Manual do Usuário, conversa com a professora e escritora Marcella Abboud e a repórter Sofia Schurig, que cobre as plataformas digitais no Núcleo, sobre o pânico no ambiente escolar somado à disseminação de conteúdos online. Ao mesmo tempo que as redes sociais têm sido espaços de comunidades de culto a autores de massacres, também nelas se prolifera o medo entre pais, alunos e docentes. Abboud relata o estado sensível nas escolas e a necessidade de equilíbrio. “É muito difícil achar um meio do caminho entre entender que é uma situação que não pode gerar um alarde porque isso alimenta a própria violência e saber quais as medidas de segurança que podemos tomar.”
✊🏽 Direitos humanos
Após 20 anos de luta, a comunidade quilombola Lagoa dos Campinhos foi titulada. Localizado entre os municípios Amparo do São Francisco e Telha, em Sergipe, às margens do rio São Francisco, o território iniciou o processo de titulação em 2003. Foi apenas no dia 21 de março deste ano, porém, que os moradores puderam comemorar o feito, quando o presidente Lula assinou a titulação de três comunidades remanescentes de quilombos. Ao Nós, Mulheres da Periferia a liderança quilombola Silvana Moura explica que agora eles podem continuar seu modo de vida de forma independente: “Com o reconhecimento da área, as famílias passam a traçar planos para o futuro, como ampliar as relações comunitárias, infraestrutura local, saneamento básico e oficinas de geração de renda”.