O inquérito contra Eduardo Bolsonaro e o novo centro de línguas indígenas
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
🔸 O ministro Alexandre de Moraes abriu inquérito contra Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por sua atuação nos Estados Unidos contra autoridades e instituições brasileiras, como o Supremo Tribunal Federal (STF), a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República (PGR). Foi a pedido desta, aliás, que Moraes vai investigar se o deputado licenciado tenta atrapalhar as apurações sobre a tentativa de golpe de 2022, em benefício do pai, Jair Bolsonaro (PL), réu no caso. Eduardo teria atuado nos EUA com “tom intimidatório”, pedindo sanções contra Moraes e defendendo anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro. O Jota informa que Moraes determinou que pai e filho prestem depoimento em dez dias e autorizou que o deputado responda por escrito. Paulo Gonet, da PGR, quer que o ex-presidente explique como a estadia do parlamentar nos EUA é financiada e qual sua missão no exterior. Eduardo já reagiu: afirmou que o Brasil vive “num Estado de exceção” e classificou o inquérito como prova de perseguição política.
🔸 “Ele é deputado licenciado, mas ainda é deputado. Um fato como esse não pode passar sem que o Conselho de Ética se pronuncie”, disse o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), líder da bancada do PT na Câmara. O Congresso em Foco conta que ele vai apresentar uma representação contra Eduardo Bolsonaro no Conselho de Ética da Câmara, mesmo que o deputado esteja licenciado da Casa desde março passado. “[Eduardo] Está querendo coagir os ministros do Supremo com uma pressão como essa. Está querendo coagir todo mundo. Está querendo coagir delegados da Polícia Federal, Ministério Público Federal”, disse Lindbergh.
🔸 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) montou uma força-tarefa interministerial para formular um novo projeto de regulamentação das redes sociais, com foco inicial na proteção de crianças e no combate ao racismo. O plano é enviar a proposta ao Congresso ainda neste semestre. A Agência Nacional de Proteção de Dados teria poder de punir plataformas e até tirá-las do ar em caso de descumprimento de ordens. A CartaCapital destaca que a Casa Civil está analisando o PL 4.691 de 2024, de autoria do Centrão, que obriga a identificação de usuários e responsabiliza as big techs por crimes como desinformação e exploração infantil. No último sábado, Lula defendeu abertamente a regulação: “Não é possível que tudo tenha controle, menos as empresas de aplicativo”, disse.
🔸 A propósito: a Advocacia-Geral da União (AGU) pediu ontem ao STF uma decisão urgente que obrigue plataformas digitais a combater com mais eficácia a disseminação de fake news e violência digital. O pedido cita omissões das empresas e casos recentes, como os golpes com falsas indenizações do INSS e o “desafio do desodorante”, associado à morte de uma criança no DF. A TI Inside explica que o pedido está ligado ao julgamento da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que hoje só permite responsabilização após decisão judicial específica. O STF já começou a julgar o tema. O placar está em 2 a 1 a favor da responsabilização imediata das plataformas pela publicação de conteúdos ilícitos, mesmo sem decisão judicial prévia exigindo a remoção.
🔸 Sobre a regulação da inteligência artificial no país: a Câmara instalou na semana passada uma comissão especial para discutir o marco regulatório da IA (PL 2.338, de 2023), já aprovado pelo Senado. De autoria do senador Rodrigo Pacheco, o texto propõe regras baseadas em níveis de risco, cria um órgão para fiscalização e veda sistemas considerados de risco excessivo, que envolvem, por exemplo, manipulação comportamental e reconhecimento facial em tempo real em locais públicos. O Nexo mostra como caminha a discussão no Congresso brasileiro e em outros países. Inspirado em marcos como o da União Europeia, o PL brasileiro busca equilibrar inovação com proteção de direitos.
📮 Outras histórias
Francisco de Assis Ribeiro, conhecido como Chico Peba, mantém uma tradição no interior baiano: vaqueiro da comunidade Poço Grande, no município de Itaguaçu da Bahia, ele organiza a Pega da Novilha de Porteira. O Meus Sertões explica que, diferente da pega do boi na Caatinga, essa modalidade ocorre em espaço preparado, com segurança para vaqueiros e animais. Ganha quem consegue arrancar e devolver no menor tempo a fita amarrada no pescoço de uma novilha, que não pode ser derrubada pelo rabo. Ao lado do amigo Paulo César Santos Ferreira, da comunidade vizinha Nova Vereda, Chico Peba preparou 64 cabeças de gado para o evento deste ano, que atraiu 130 vaqueiros. Apaixonado pela tradição, Everaldo Carvalho, 50 anos, viajou 90 km para ver a pega. Ele ensina: “O vaqueiro tem que saber o lado de correr. Se ele quiser tirar o colar do gado com a mão direita, vai ter que correr do lado esquerdo. De mão trocada, ele não vai conseguir um colar daquele nunca na vida”.
📌 Investigação
Com a fragilidade da proteção de dados pessoais no Brasil, as informações vazadas alimentam uma indústria de golpes financeiros cada vez mais sofisticados e difíceis de detectar. A Agência Lupa identificou 14 sites fraudulentos que usam informações reais de brasileiros, combinadas com a identidade visual de páginas governamentais e de instituições para aplicar golpes. A partir de um design semelhante ao do portal gov.br, um site promete liberar uma suposta “indenização”. Além do uso indevido da marca do governo, ao digitar o CPF, a vítima recebe automaticamente informações pessoais como nome completo, data de nascimento e nome da mãe – dados que deveriam estar disponíveis somente em plataformas oficiais ou quando fornecidos pelo próprio usuário. Com um mercado paralelo de compra e venda de informações pessoais vazadas, desde 2021, os casos de estelionato pela internet têm crescido, superando os de roubo.
🍂 Meio ambiente
Com a medida do governo de Donald Trump de proibir que a Universidade de Harvard matricule estudantes estrangeiros, estudos sobre a Amazônia feitos por pesquisadores brasileiros serão paralisados. O Amazonas Atual conta o caso de Silvana Nascimento, da Universidade Estadual do Amazonas, que faz doutorado em Clima e Ambiente na instituição estadunidense e pesquisa o nível de mercúrio nos rios amazônicos. “A nossa pesquisa é muito importante para a saúde, para o estudo dos peixes nos rios, para a alimentação das pessoas. É uma cadeia de alimentos. Então, abandonar toda a pesquisa de monitoramento é uma perda para a sociedade e uma frustração para mim. Não significa somente marcar e desmarcar passagens para voltar para Manaus”, lamenta. A decisão da gestão de Trump está suspensa judicialmente até a audiência preliminar prevista para esta quinta-feira.
📙 Cultura
“As nossas línguas indígenas guardam dentro de si florestas inteiras, rios, estrelas e espíritos. Cada uma delas é uma biblioteca viva, uma cosmovisão, um universo em movimento. Cada vez que uma língua indígena desaparece, o mundo perde uma forma de ser”, afirmou a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, durante o lançamento do Centro de Documentação de Línguas e Culturas Indígenas na semana passada. O Porvir destaca que o objetivo do projeto é desenvolver pesquisas inéditas sobre as mais de 270 línguas indígenas faladas no Brasil e criar coleções digitais de conhecimentos intangíveis. “O Brasil é um país que tem uma riqueza linguística imensa e essa diversidade é um patrimônio cultural brasileiro que tem que ser melhor entendido e documentado”, ressalta Eduardo Goes Neves, diretor do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP), que coordena o centro em parceria com o Museu da Língua Portuguesa, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
🎧 Podcast
“O que a gente vê na internet, no nosso YouTube, no nosso feed, é uma tampinha de refrigerante dentro de um oceano que existe de conteúdo nessas plataformas”, afirma o advogado e professor de direito Rafael Mafei, que estuda como o debate público está se transformando e até mesmo se deteriorando devido à mediação da circulação de ideias pelas redes sociais, reféns de algoritmos “obscuros” controlados por grandes empresas de tecnologia. Ele é o convidado do “Fio da Meada”, produção da Rádio Novelo. “As redes sociais são uma forma particular, economicamente muito potente, que se mostraram um negócio absolutamente fabuloso, e que ocuparam com uma lógica própria de um negócio que funciona como elas funcionam. Elas concorrem com outras formas tradicionais através de uma lógica de funcionamento que é mais eficiente para o que elas são como negócio, mas não necessariamente melhor para aquilo que a gente esperaria que fosse uma esfera pública que funcione bem.”
✊🏾 Direitos humanos
O direito de crianças e adolescentes LGBTQIA+, como uso de banheiro de acordo com o gênero de identificação, restrição a debates sobre gênero nas escolas e veto ao uso do nome social: estes temas estão na mira de parlamentares brasileiros. Segundo levantamento da Agência Diadorim, entre 2019 e 2024, foram apresentados 109 projetos de lei nas esferas estadual e federal. “Há uma ideia de que proteger a infância é impedir que crianças conheçam a diversidade. Quando, na verdade, proteger deveria ser garantir que todas possam viver com dignidade – inclusive as crianças trans”, diz a advogada Bruna Andrade, CEO da plataforma Bicha da Justiça. Já o advogado Marcel Jeronymo, especialista em direitos LGBTQIA+, explica que essas propostas ignoram a autonomia e os direitos básicos: “O que esses projetos propõem não é proteção, é silenciamento. Transformam diversidade em ameaça e crianças LGBTQIA+ em alvos políticos”.