O início do leilão do petróleo e a tradução literária na era da IA
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🔸 A cinco meses da COP30, o governo realiza hoje o leilão de 172 blocos de petróleo – muitos deles em áreas de alta sensibilidade ambiental, como a Foz do Amazonas, a cadeia de montes de Fernando de Noronha e territórios indígenas no Mato Grosso. A concessão do bloco 59 à Petrobras, aprovada pelo Ibama, aumentou o apetite das empresas: 12 comunicaram que farão ofertas e mais 31 estão aptas a participar, informa a Sumaúma. O ataque de Israel ao Irã na última semana deve ampliar o interesse, já que o preço internacional do petróleo voltou a subir. Além de lideranças indígenas, ambientalistas e cientistas, a oposição ao leilão inclui a Federação Única dos Petroleiros, que entrou com uma ação popular pedindo a suspensão do leilão. O Ministério Público Federal também acionou a Justiça. Mas, por ora, o leilão está mantido, e o governo Lula pretende arrecadar R$ 444 milhões com os chamados “bônus de assinatura” pagos pelas empresas que arrematam blocos.
🔸 A propósito: a exploração pode gerar até 11 bilhões de toneladas de CO2, volume superior às emissões do agronegócio brasileiro nos últimos seis anos e equivalente a 5% do teto global para limitar o aquecimento a 1,5°C. É o que indicam estimativas do Instituto ClimaInfo. O Vocativo detalha os dados sobre emissão por área. Só na Foz do Amazonas, por exemplo, os combustíveis fósseis dos 47 blocos disponíveis poderiam emitir 4,7 bilhões de toneladas de CO2, caso explorados. “A crise é também de valores e liderança. Com a COP30, o governo Lula precisa escolher: apoiar os povos da Amazônia ou seguir apostando no petróleo?”, afirma Toya Manchineri, coordenador geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Mais de 60 caciques da região do Oiapoque já se manifestaram contra a atuação da Petrobras na Foz do Amazonas.
🔸 O momento é de contradição: enquanto realiza o leilão do petróleo, o Brasil tenta levantar os ânimos para a COP30 na Conferência do Clima de Bonn, a rodada técnica que antecede a COP de fato. O Eco conta que o encontro na Alemanha, crucial para destravar impasses nas negociações, teve início fraco, segundo especialistas. Em discurso, o secretário da Organização das Nações Unidas (ONU), Simon Stiell, cobrou “ações concretas e unidade de propósito”. O presidente da COP30, o embaixador André Corrêa do Lago, afirmou: “O objetivo é claro: transformar a COP30 na COP da implementação, da inclusão e de práticas reais, do mutirão”.
🔸 Na esteira de contradições do país sede da COP30, o “PL da devastação” pode acelerar o licenciamento de projetos de mineração ligados à transição energética, favorecendo empresas que extraem lítio, níquel, cobalto e terras raras. Usados em carros elétricos e torres eólicas, esses minerais têm demanda crescente e são vistos como estratégicos pela indústria, explica a Repórter Brasil. O projeto de lei aprovado no Senado permite que empreendimentos de médio impacto sejam liberados por autodeclaração, sem análise prévia do Ibama. Por exemplo: se estivesse em vigor o texto da proposta atual, a barragem da Vale em Brumadinho, cujo rompimento matou 272 pessoas, poderia ser objeto de licenciamento automático.
📮 Outras histórias
Um cinturão de abelhas sem ferrão se tornou ferramenta de conservação ambiental e geração de renda nas ilhas de Belém (PA). A estratégia – mote do projeto “Amigo da Abelha”, liderado pelo Instituto Peabiru – consiste em espalhar colmeias de abelhas nativas em diversas áreas, formando uma espécie de rede viva ao redor da cidade. A Amazônia Vox narra a história do projeto, que teve início há dez anos, quando pesquisadores notaram o papel dos meliponíneos, as abelhas sem ferrão, nativas da Amazônia brasileira. Para criá-las, Marcleidi Teles mantém em seu quintal, no município de Acará (PA), espécies como açaí, andiroba e ingá. Só no primeiro ano de produção, já foram mais de 30 quilos de mel extraídos. A nova fase do projeto, “Mulheres Amigas das Abelhas”, deve distribuir 400 caixas em Cotijuba e Combu, aliando o empreendedorismo à conservação.
📌 Investigação
Policiais militares da Bahia divulgam rifas e sorteios ilegais no Instagram. É o caso do soldado Diego Santana Correa de Oliveira, que publica esse tipo de conteúdo para mais de 1,4 milhão de seguidores e já admitiu que as rifas que realiza não estão regularizadas. Já o soldado Luan Ribeiro de Almeida Matos compartilha sorteios de prêmios que variam entre carros de luxo, motos, iPhone ou pagamento em dinheiro para seus mais de 314 mil seguidores. O Núcleo monitorou os perfis dos PMs e mostra que, além de a atividade ser ilegal, é comum que eles usem fotos fardados ou de equipamentos policiais para jogos, ao contrário do que determina uma portaria da corporação – soldados são proibidos de “expor qualquer fardamento, equipamento, instalações, veículo, armamento, símbolo ou imagem de identificação visual da Polícia Militar da Bahia de forma indevida e/ou sem autorização”.
🍂 Meio ambiente
Depois de dez anos, o governo do Rio Grande do Sul reconheceu uma decisão judicial que tratava da proteção dos campos nativos do Pampa. Em 2015, o governador José Ivo Sartori (MDB), por meio de um decreto, definiu os campos de pastagem como área rural consolidada, livrando os proprietários rurais de garantir a existência de reserva legal de 20% da área e da necessidade de recuperação ambiental. Segundo ambientalistas e pesquisadores que entraram com uma ação judicial no mesmo ano, a atividade pastoril favorece a proteção dos campos nativos e, portanto, não pode ser considerada área rural consolidada. O Sul21 destaca que o decreto foi revogado pelo atual governador Eduardo Leite (PSD), mas ainda existem brechas que desprotegem os campos nativos invadidos por plantas exóticas. “A gente já tem alertado que tem que tomar muito cuidado porque, mesmo com a invasão, as espécies nativas continuam ali compondo aquela comunidade de vegetação”, afirma Rodrigo Dutra, representante da Associação dos Servidores do Ibama (Asibama) na Coalizão pelo Pampa.
📙 Cultura
Sob Ricardo Nunes (MDB), a Prefeitura de São Paulo tem desocupado e expulsado espaços culturais de seus lugares de atividade. Além do Teatro de Contêiner Mungunzá, no centro da cidade, que recebeu no mês passado uma ordem de desocupação, a sede do grupo teatral Ventoforte, na zona oeste, que resistiu com sua arte à ditadura militar, foi demolida pela atual gestão. Já na zona leste, o Grupo XIX de Teatro, que há 20 anos tenta a regularização de seu espaço em um complexo industrial desativado, também está ameaçado. A Agência Pública mostra como a prefeitura tem avançado sobre grupos culturais em um momento em que pressões imobiliárias e urbanísticas estão cada vez maiores. A sede da tradicional escola de samba Vai Vai foi demolida em 2020 para obras de uma nova linha de metrô e está com dificuldades para obter um novo terreno na mesma região.
🎧 Podcast
“Vai ter um dia que uma máquina vai poder traduzir Henry James razoavelmente bem. Mas você vai ter que realmente igualar a capacidade humana de fazer milhões de ajustes, de observações de caráter crítico, avaliativo. Acho que ainda não chega amanhã”, afirma o tradutor Paulo Henriques Britto, sobre a tradução automática feita por inteligência artificial, que vem se desenvolvendo rapidamente. No “451 MHz”, produção da Quatro Cinco Um, Britto e a também tradutora Anna Vianna conversam sobre o ofício de tradução e seu universo: tradução literária, interpretação, técnicas de tradução. “O intérprete vai traduzir a personalidade do autor, o tradutor literário vai traduzir a personalidade da obra. Eu tenho certeza que se o cara é chato, na minha voz de tradução vai sair um cara chato, se o cara é divertido, eu também vou passar essa emoção”, diz Vianna.
📲 Tecnologia
Emojis que parecem inofensivos circulam entre adolescentes como símbolos para drogas, distúrbios alimentares, vida sexual, misoginia e até grupos ligados à cultura incel. A Lupa traz uma tabela de significados elaborada por Amit Singh Kalley, especialista em segurança digital para famílias e ex-policial especializado em crimes cibernéticos. Emojis como flocos de neve e diamantes são frequentemente utilizados para representar cocaína. Já ícones de lâminas, fogo e corpos magros se tornam códigos para automutilação, anorexia e outros tipos de sofrimento emocional. Para Kalley, se os pais não dominam a linguagem que os filhos usam na internet, não estão realmente monitorando de fato. “A crise que estamos vivendo é global. Nenhum país, nenhum pai ou escola estão preparados o suficiente para lidar com o que acontece online com crianças e adolescentes”, afirma.