O indiciamento de Bolsonaro e um quilombo liderado por mulheres
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🔸 A Polícia Federal indiciou Jair Bolsonaro (PL) ontem, depois de concluir que o ex-presidente participou da tentativa de golpe em 2022 cujo objetivo era impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Bolsonaro é suspeito de cometer os crimes de abolição violenta do estado democrático de direito, golpe de Estado e organização criminosa. As penas máximas para cada crime vão de oito a 12 anos de prisão. Além dele, outras 36 pessoas foram indiciadas. A lista inclui os generais Walter Braga Netto e Augusto Heleno (ambos ex-ministros de Bolsonaro), o delegado Alexandre Ramagem, ex-chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), e Valdemar Costa Neto, presidente nacional do PL. O Nexo explica o que é indiciamento (quando a polícia vê indícios suficientes para imputar crimes a alguém) e detalha a possibilidade de prisão do ex-presidente. Agora, o relatório da PF segue para o Ministério Público, que vai decidir se denuncia os indiciados. Só depois de uma eventual denúncia, a Justiça avalia se abre processos criminais – estes, sim, podem levar a condenações ou absolvições.
🔸 De Bolsonaro sobre o indiciamento: “O ministro Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei”, disse o ex-presidente a Paulo Cappelli, colunista do Metrópoles. Além das críticas a Moraes, ele afirmou que precisa avaliar o que tem no indiciamento da PF. “Vou esperar o advogado.” Esta é a terceira vez que Bolsonaro é indiciado neste ano: a primeira foi no inquérito das joias sauditas, e a segundo, na investigação de fraude em cartões de vacinação contra a Covid-19.
🔸 Quem é quem na lista de indiciados: a maioria são militares – além do ex-presidente, que é capitão, há outros 24, dos quais sete são generais. Todos tiveram influência e presença na alta cúpula do governo Bolsonaro. O Intercept Brasil mostra quem são e conta que, em comum, eles têm a passagem pela Academia Militar das Agulhas Negras, onde também estudou Bolsonaro. Vários dos militares indiciados, aliás, aparecem em outros escândalos relacionados ao ex-presidente, como o roubo das joias sauditas.
🔸 “A retomada da ideia de que o bolsonarismo representa uma ameaça à democracia, peça crucial para a montagem da frente ampla em 2022, ocorre em um momento em que o Planalto discute formas de atrair siglas de centro para o palanque na próxima eleição. E nesse sentido, a trama golpista dos últimos dias pode facilitar o caminho”, escrevem os analistas políticos Iago Bolivar, Bárbara Baião e Felipe Recondo, em artigo no Jota. Eles afirmam que o procurador-geral da República, Paulo Gonet, deve receber o relatório final da PF nos próximos dias e “apresentará a denúncia contra Bolsonaro e os outros envolvidos possivelmente em fevereiro de 2025” – “esse tempo será necessário para alinhar todas as investigações conduzidas pela PF e pela Abin”, completam.
📮 Outras histórias
“Foi uma luta pra gente conseguir se aceitar como quilombolas, muita gente não entendia, só sabiam o que era ser descendente de escravo e isso ninguém queria ser. Só depois é que as pessoas foram entendendo melhor”, conta Marlene de Araújo. Ela e Maria Helena Menezes lideram a Associação das Mulheres Artesãs e Quilombolas do Quilombo da Serra das Viúvas, no Alto Sertão de Alagoas. A Marco Zero narra a trajetória de resistência e conquistas da comunidade, liderada por mulheres – e, graças a elas, reconhecida como quilombo em 2009. A associação funciona como motor de transformação, principalmente por meio do artesanato feito com materiais como palha e fibras. “Os homens podem até contribuir, mas o trabalho pesado mesmo é das mulheres e são elas que fazem tudo isso acontecer, com muito esforço”, diz Maria Helena.
📌 Investigação
Sobrecarga e condições de trabalho precárias têm levado professores ao esgotamento psicológico. Os dados do Departamento de Perícia Médica da Secretaria de Estado da Administração de Sergipe mostram que 2.445 professores da rede pública estadual protocolaram requerimento de licença nos últimos meses. O número chega a ser mais de 25% de todos os profissionais de ensino efetivos do estado. A Mangue mergulha na realidade dos educadores: “Além da falta de concurso para efetivo, que poderia trazer gente nova para dividir com a gente essa dura jornada, existem outros graves problemas, como as más condições de trabalho, péssimas estruturas físicas, falta de material pedagógico. Você planeja uma coisa, chega na escola e não tem como realizar porque falta o básico. Isso dá um desânimo, uma desesperança”, conta o professor José Valdson de Santana.
🍂 Meio ambiente
Só até o final de outubro, 120 animais morreram atropelados em um trecho da BR-469, conhecida como Rodovia das Cataratas, próximo ao Parque Nacional do Iguaçu, em Foz do Iguaçu, no Paraná. O registro é um recorde – entre 2019 e 2023, 425 animais foram vítimas de atropelamento, uma média de 85 mortes por ano. O Conexão Planeta lembra que o local é Patrimônio Natural da Humanidade pela Unesco e uma unidade de conservação que abriga um dos maiores trechos da vegetação original da Mata Atlântica do estado. O Ministério Público Federal emitiu nesta semana uma recomendação ao ICMBio para implementar medidas urgentes para reduzir esse índice, como a padronização da velocidade máxima permitida para 40 km/h em todo o trecho da rodovia que atravessa o parque.
📙 Cultura
O grupo Congo de Oeiras mantém viva uma tradição de mais de 200 anos, a Dança dos Congos. Passada de geração em geração, essa manifestação cultural foi levada a Oeiras, no Piauí, por pessoas negras que chegaram do Pará acompanhando o primeiro governador da Província, João Pereira Caldas. Na série “Tamborim”, a Cajueira resgata a história da Dança dos Congos, que inclui uma encenação com quatro personagens e é realizada em louvor para Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, santos padroeiros dos negros. Por sua importância na preservação da herança cultural afro-brasileira, o grupo foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial de Oeiras e Patrimônio Vivo do Estado do Piauí.
🎧 Podcast
O empresário Samuel Klein, fundador das Casas Bahia, saía distribuindo dinheiro em frente ao apartamento onde morava, no litoral paulista. Entre uma nota de R$ 50 e outra, convidava as meninas que encontrava para tomar café na residência. O “Caso K, A História Oculta do Fundador da Casas Bahia”, produção da Agência Pública, revela as estratégias que o empresário empregava para ampliar sua rede de exploração sexual de meninas e adolescentes. Ao mesmo tempo em que os jornais celebravam o crescimento dos negócios, a empresa era parte fundamental da engrenagem de exploração. O ano de 1994 foi um grande marco: o faturamento subiu de 393 milhões de dólares para mais de 840 milhões. Em novembro daquele ano, Klein comemorou o aniversário de 71 anos em uma festa com mais de cem meninas.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
“Os nossos antepassados abriram o caminho e a gente vai alargar ainda mais, para que as futuras gerações possam percorrer e dizer: ‘Olhe, eu sou importante, eu posso estar aqui e vou fazer com que esse legado continue’”, afirma a atriz e “arteira” Aíça Alcântara, a Cicinha, de 11 anos. O Lunetas conta como meninas e mulheres pretas usam o afrofuturismo para ligar passado e futuro, traçando caminhos que vão da música à ciência. Este é também um dos objetivos do Mancala LAB, um projeto da professora Zaika dos Santos, multiartista, cientista de dados e especialista em inteligência artificial para aproximar crianças da física, química, biologia e matemática por meio de símbolos da ancestralidade africana.