O indicado de Lula ao STF e o papel de influenciadores em golpes
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🔸 O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) confirmou seu indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF) ontem: é Cristiano Zanin, seu amigo pessoal e advogado há dez anos, conhecido por defender o petista nos processos da Operação Lava Jato. Se aprovado pelo Senado, ele irá ocupar a vaga decorrente da aposentadoria do ministro Ricardo Lewandowski. Em análise no Jota, Felipe Recondo conta que, na prisão, “Lula formou a convicção de ter ficado nas mãos de juízes que privilegiaram a conjuntura em detrimento da lei”. Zanin, por outro lado, é visto pelo presidente como um legalista e, sobretudo, alguém em que pode confiar: “Sem qualquer sinal de pacificação do país e com dificuldades na sua articulação com o Congresso, Lula não pode prescindir do Supremo. E para isso precisa de gente de sua confiança. Isso não começa com Lula, nem com Bolsonaro. Guardadas as devidas diferenças, Michel Temer indicou Alexandre de Moraes, que era da sua estrita confiança; Itamar Franco indicou o amigo Maurício Corrêa; Fernando Henrique Cardoso indicou Nelson Jobim; Sarney indicou Paulo Brossard”.
🔸 A Constituição impõe requisitos para a indicação ao STF. Um deles é o “notável saber jurídico”, que remete ao reconhecimento público formado a partir de um histórico profissional de processos e julgamentos. Para Rafael Mafei, essa notabilidade “é particularmente difícil de se enxergar em Zanin”. Professor de direito da USP e da ESPM, ele escreve na revista piauí sobre o indicado de Lula ao Supremo. Afirma que, até pouco tempo, Zanin era “um ilustre desconhecido, mesmo para a advocacia criminal paulistana” e defende que ele só ganhou algum destaque por atuar em defesa de quem agora o indica para a Corte. Mafei completa: “Bolsonaro indicar ao STF cupinchas seus, de saber jurídico pouco notável, não espantava: era a caquistocracia eleita indicando a caquistocracia togada. Mas quando Lula, que se pretende seu oposto, executa receita semelhante, privilegiando lealdade e fidelidade pessoais acima de quaisquer outros critérios, devemos nos perguntar se não há uma mudança mais profunda em curso”.
🔸 Em tempo: a indicação de Zanin só faz reforçar o perfil do STF – branco e masculino. Até o ano 2000, nenhuma mulher havia ocupado uma cadeira no tribunal, e Lula perdeu agora a primeira oportunidade deste ano de indicar uma mulher negra para a Corte. A segunda será em outubro, quando deve se aposentar a ministra Rosa Weber. Como já expôs a Gênero e Número, “seria o primeiro passo para corrigir a distorção criada pelo racismo e pelo machismo na mais alta corte do Brasil”, já que “o maior grupo demográfico do país – mulheres negras – nunca foi representado no debate constitucional”.
🔸 O Senado aprovou a medida provisória dos ministérios ontem, último dia antes de a MP caducar. Não chega a ser uma grande vitória para o governo. Além de expor a dificuldade de articulação na Câmara, a aprovação do texto, alterado pelo deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL), desidratou os ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. O Metrópoles lembra ainda que, para tentar garantir a votação da MP, Lula autorizou a liberação R$ 1,7 bilhão em emendas – maior valor liberado pelo Planalto em apenas um dia desde o início do novo mandato. Outra MP aprovada pelo Senado ontem foi a do Bolsa Família, cuja proposta incluía a manutenção do Auxílio-Gás que, não fosse aprovado nesta semana, iria expirar.
🔸 Protagonista das votações na Câmara nesta semana, o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), viu aliados serem alvo de operação da Polícia Federal ontem. Os agentes encontraram um cofre cheio de dinheiro na casa de Luciano Ferreira Cavalcante. Segundo o Congresso em Foco, ele é funcionário da Câmara dos Deputados e foi nomeado para a liderança do PP na Câmara ainda quando o cargo era exercido por Lira. A operação tem como alvo um grupo suspeito de fraude em licitação e lavagem de dinheiro em Alagoas por meio da compra de equipamentos de robótica. A reportagem detalha o caso.
🔸 Apenas quatro em cada dez crianças brasileiras estão alfabetizadas na idade certa. Foi o que revelou a pesquisa Alfabetiza Brasil, realizada pelo Ministério da Educação. Os dados foram obtidos a partir de consultas com professoras de alfabetização e especialistas da área a fim de definir as habilidades necessárias para que as crianças sejam capazes de escrever e ler um texto, como explica a CartaCapital. A pesquisa vai ajudar a balizar o pacto nacional pela alfabetização do governo, que, segundo o ministro Camilo Santana, deve ser anunciado em breve.
📮 Outras histórias
O preconceito em torno do povoado Cruz da Donzela, em Sergipe, sempre foi motivo de incômodo para Ana Luiza Santos. Hoje advogada e historiadora, ela própria ouvia piadas, quando universitária, sobre a grande quantidade de prostíbulos que funcionavam no lugarejo desde a abertura da BR 101, no final dos anos 1960. Fez da história do povoado o tema de sua monografia, “Grandezas e Misérias da Prostituição Feminina no Povoado Cruz da Donzela”. Em entrevista ao Meus Sertões, ela conta que visitou bordéis, encontrou condições precárias e ouviu diversas histórias das mulheres. “Em comum, posso dizer que a vida de todas não era fácil. Elas se prostituíam por necessidade e tinham que aprender a se submeter ao que os homens, as cafetinas e os cafetões impusessem.”
📌 Investigação
Embora seja contra as políticas do Twitter, a moderação de conteúdo gore é escassa. De origem inglesa, o termo gore significa “sangue derramado”, especialmente como resultado de violência. O Núcleo acompanhou 40 perfis dessa comunidade na plataforma entre abril e maio deste ano. Foram publicadas mais de três horas de filmagens de vídeos curtos e centenas de imagens com conteúdo violento no período, entre cenas de soldados mortos na guerra na Ucrânia, abuso contra animais, abuso sexual, necrofilia, autópsias, assassinatos e brutalidade policial. Ao pesquisar por uma hashtag da comunidade, a reportagem encontrou vídeos de extrema violência na aba “Em destaque”, com pessoas incendiadas, agredidas e torturadas.
🍂 Meio ambiente
Sem incentivo à agricultura familiar, os quilombolas de Curiaú, no Amapá, encontraram como solução a prática ancestral do “pixurum”, um modo de organização comunitária. Os moradores descobriram que podem renovar suas técnicas e produzir alimentos saudáveis, sem insumos externos, aumentando a segurança alimentar. Eles se uniram para fazer mutirões de trabalho, aliando a agroecologia ao coletivismo. A InfoAmazonia narra como já implantaram 12 agroflorestas. “Meus avós e minha mãe trabalhavam com agricultura, sempre com o roçado de mandioca. Agora, já temos outra diversidade, temos banana, taperebá, maracujá, abiu, goiaba araçá, graviola, produtos da horta, cebolinha, coentro, alface, feijão de corda, maxixe, quiabo”, diz Marinaldo Pereira, 52 anos, morador do quilombo do Curiaú.
“Todas as crianças participam do processo de plantação, adubar a terra, conhecer a textura dos alimentos e verduras por meio da contação de história de maneira bem lúdica.” A afirmação é da professora Janete Gonçalves, do Centro de Educação Infantil (CEI) Jardim Lapena I, na zona leste de São Paulo. Com reciclagem, caminhadas ecológicas, aulas ao ar livre e uma horta, a escola tem trabalhado a educação ambiental com crianças periféricas e se tornou um polo de ações como a coleta seletiva de óleo de cozinha, compostagem e plano alimentar. A Agência Mural detalha que a unidade tem servido de inspiração para a vizinhança. Quem termina o ensino infantil no CEI tem como colégio mais próximo para seguir os estudos, a escola estadual Pedro Moreira, a 250 metros, onde os educadores têm buscado mais informações em oficinas, workshops e encontros para sistematizar o programa de sustentabilidade.
📙 Cultura
O antropólogo franco-marroquino Bruce Albert fez um pacto etnográfico com o xamã yanomami Davi Kopenawa e um pacto ativista com a fotógrafa Claudia Andujar, conhecida por denunciar a situação do povo Yanomami durante a ditadura. Esses encontros resultaram em uma série de exposições realizadas entre 2003 e 2022 na Fundação Cartier, em Paris. As obras criam diálogos entre o pensamento ocidental e o pensamento xamânico yanomami. A Quatro Cinco Um destaca que há um outro resultado – o livro “O Espírito da Floresta”, ilustrado por fotos de Andujar e desenhos de Kopenawa e artistas yanomami, além de um prefácio do filósofo e pesquisador francês Emanuele Coccia. Os 16 capítulos e três anexos, que alternam vozes de Kopenawa e Albert, acabam de chegar ao Brasil.
A exposição fotográfica “Performance LGBTQIAP+ Favelada” aparece como um manifesto para exaltar corpos de pessoas LGBTQIA+ do Complexo da Maré, formado por 16 favelas na zona norte do Rio de Janeiro. A autoria é do artista multilinguagem, Affonso Dalua, cria da Nova Holanda, e a mostra fica exposta a partir de hoje no Museu da Maré até o fim deste mês. O Maré de Notícias conta que a obra mergulha no cotidiano com fotoperformances nas ruas, becos, vielas e lajes. “Hoje a fotografia para mim representa um espaço de resgate de narrativas e memórias, um lugar onde construo a minha arte, a partir do meu território, o lugar onde me afirmo quanto um fotógrafo LGBTQIAP+ que pauta não só esses corpos, mas outras narrativas que me atravessam e me fazem mergulhar nas memórias da Maré enquanto um favelado que pulsa arte e respira resistência”, afirma Dalua.
🎧 Podcast
Há um legado de Nenê da Brasilândia? Floripes Souza de Oliveira era assim conhecida quando comandou o maior esquema de tráfico de drogas na cidade de São Paulo entre as décadas de 1970 e 1980. Já que sua história se mistura com a do Brasil, o podcast “Nenê da Brasilândia”, produção da Rádio Novelo, chega a 2023, trinta e cinco anos após a líder ser executada com oito tiros. O último episódio da série reconstrói sua morte, as linhas de investigação e o que aconteceu no bairro da zona norte da capital paulista após a partida da rainha.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Bet, robô do pix, Money Looks, Instamoney… as redes sociais estão inundadas de golpes muitas vezes promovidos por influenciadores digitais com milhões de seguidores. Em sites como o Reclame Aqui, perfis como o da ex-BBB Gabi Martins são citados em centenas de denúncias de pessoas que caíram em uma propaganda enganosa e perderam dinheiro nas fraudes. Os famosos, porém, não parecem preocupados com punição. Isso porque a lei brasileira ainda patina em atribuir a responsabilidade desses casos, como explica o Terra. Especialistas afirmam que há um entendimento segundo o qual os influenciadores são responsáveis por danos causados por uma divulgação, mas o Judiciário também pode compreender as fintechs que processam pagamentos como parte da cadeia.