O impacto do PL do aborto e uma reserva particular no Pantanal
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🔸 Todos os dias o Disque 100 recebe duas ou mais denúncias de crimes sexuais envolvendo a internet. São 12 mil denúncias desse tipo desde 2011, de acordo com dados obtidos pelo Núcleo via Lei de Acesso à Informação. A central do governo federal para ocorrências de violações aos direitos humanos inclui nos crimes sexuais envolvendo a internet o compartilhamento de material de exploração infantil, por exemplo, além de abuso, estupro, importunação e assédio. De 2022 para 2023, houve queda nas denúncias de crimes de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes envolvendo a internet – com exceção dos casos registrados em dois locais específicos: onde residem a vítima e o suspeito e onde reside exclusivamente a criança.
🔸 “Criança não é mãe”, diziam cartazes nos protestos contra o Projeto de Lei 1.904/2024, que equipara o aborto ao crime de homicídio. As manifestações ocorreram em diversas capitais brasileiras na última semana. A Ponte percorreu o ato na avenida Paulista, em São Paulo, e conversou com manifestantes sobre o projeto de lei que teve a tramitação em regime de urgência aprovada na Câmara e, agora, pode ir direto à votação em Plenário. Vítima de violência sexual por mais de cinco vezes dentro da própria casa, Nicole Elias, de 23 anos, empunhava um cartaz com o texto: “Eu fui vítima. Não criminosa”.
🔸 A propósito: mais de 20 organizações feministas denunciaram o PL à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e ao Grupo de Trabalho das Nações Unidas sobre Discriminação Contra as Mulheres. Segundo o texto, o projeto coloca em risco principalmente meninas “porque elas demoram mais para identicar que estão grávidas em casos de violência sexual e procuram serviços de aborto em níveis mais avançados de gravidez”. A Agência Pública detalha a carta conjunta que faz um apelo para que seja revogada “qualquer iniciativa legislativa que vise impor limites e criminalizar o aborto”.
🔸 Apoiadores do PL usam informações falsas para defendê-lo. Dizem, por exemplo, que órgãos como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Ministério da Saúde limitam o processo de interrupção da gravidez até 22 semanas. O Aos Fatos mostra que isso não é verdade. A mentira foi extraída de uma norma de 1977, já atualizada. A OMS atualmente descreve o aborto como a “expulsão ou extração completa de uma mulher de um embrião ou feto, independentemente da duração da gravidez”. A reportagem desmente outras informações sem embasamento usadas na defesa do projeto.
🔸 “O aborto vem sendo utilizado como um nicho de operação de populismo penal pela extrema direita.” A afirmação é da antropóloga Debora Diniz, professora da Universidade de Brasília e pesquisadora referência no tema. Para ela, “estamos menos discutindo o aborto e muito mais uma quebra de braço entre os poderes”. Em entrevista ao Nexo, ela reitera que meninas vítimas de estupro já sofrem com a escassez de serviços e lembra que “a descriminalização faz com que as mulheres tenham menor taxa de aborto, acesso à informação, e o realizem logo nas primeiras semanas”. Diniz afirma ainda que o PL, mesmo antes da aprovação, já tem impacto: “Quando se gera esse clima de intimidação, esse clima de perseguição, os médicos sentem mais medo, eles acabam criando mais barreiras às mulheres, As implicações são de amplificar, não só as dificuldades de acesso”.
📮 Outras histórias
O conselho do plano de reconstrução do Rio Grande do Sul não inclui ambientalistas do estado. E pior: os membros que trabalham com a temática ambiental representam 2,2% do total de integrantes. O Sul21 informa que, dos 178 integrantes, apenas quatro têm relação direta com o meio ambiente. O agronegócio, por sua vez, tem cinco cadeiras no conselho. Fora do grupo que deve propor e analisar propostas de reconstrução do estado, a Assembleia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (Apedema) é pioneira em alertar para as mudanças climáticas e seus efeitos. Para a entidade, o Plano Rio Grande “corre sérios riscos de seguir o modelo que, apesar de membros que configuram exceções, foi o responsável, diretamente ou por omissão, por criar as vulnerabilidades no RS aos eventos climáticos extremos”.
📌 Investigação
A Prefeitura de Maceió (AL) deixa os cidadãos no “escuro” quanto aos dados sobre cemitérios públicos. Falta local de sepultamento e há pouca manutenção desses espaços na capital alagoana. A Agência Tatu visitou neste mês o Cemitério São Luiz e encontrou alguns tijolos empilhados na entrada e gavetas precariamente construídas. Já no Cemitério São José, o maior de Maceió, há muitas covas rasas ocupando o que antes eram ruas de passeio. Em março deste ano, o Instituto Médico Legal (IML) da cidade alertou para a superlotação de 120 corpos por falta de local para sepultamento. Em junho, a assessoria informou que aos poucos estão conseguindo algumas vagas, mas restam mais de 90 cadáveres. Apesar da urgência sobre o tema, a prefeitura negou os recursos pedidos pela reportagem via Lei de Acesso à Informação (LAI) sem qualquer justificativa.
🍂 Meio ambiente
Abrigando espécies ameaçadas de extinção, como o tatu-canastra, a arara-azul-grande, o lobo-guará, o tamanduá-bandeira e a onça-pintada, a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Howard Quigley foi criada no início deste mês, com cerca de 643 hectares de área pantaneira protegida localizada em Corumbá (MS). Segundo o Fauna News, a organização Panthera Brasil já registrou 477 espécies de animais silvestres: 365 de aves, 53 de mamíferos, 37 de anfíbios e 75 de répteis dentro dos limites da RPPN. A reserva, na confluência do rio Piquiri com o rio São Lourenço, protege também uma das áreas mais florestadas do Pantanal.
📙 Cultura
Essenciais para a execução dos editais de cultura e da Lei Paulo Gustavo, os pareceristas são trabalhadores qualificados, com expertise em determinadas linguagens ou áreas do específicas da cultura, contratados via chamadas públicas, para emitir pareceres sobre cada projeto que chega nos processos de seleção. Eles lidam com a precarização, desde pagamentos atrasados até carga de trabalho desproporcional. O Nonada obteve acesso exclusivo ao documento elaborado por mais de cem pareceristas brasileiros que se reuniram virtualmente no Seminário Ocupação Parecerista. No encontro, apresentaram propostas para a categoria, como regras de contratação, banco de dados, remuneração de acordo com o número de projetos, responsabilidades e direitos trabalhistas.
🎧 Podcast
Na luta por justiça racial e bem viver, a cantora e ativista afrouruguaya Chabela Ramírez criou o Afrogama, um grupo que trabalha gênero e etnia em canto e dança antirracista no Uruguai. Ela também fundou, há 12 anos, a Casa Afrouruguaya, referência da cultura afrodescendente e espaço de denúncia contra o racismo em Montevidéu. O “Cirandeiras”, produção da Rádio Guarda-Chuva, conversa com Ramírez para falar sobre o candombe. Trata-se de um ritmo que resiste ao tempo e ao racismo e é celebrado por famílias negras que, por meio da oralidade, preservam sua cultura nas ruas do centro da capital uruguaia.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
“A primeira pessoa trans que eu conheci na minha vida foi a minha filha”, conta Thamirys Nunes, fundadora da ONG Minha Criança Trans, a primeira do Brasil a tratar exclusivamente de questões que envolvem saúde, qualidade de vida, políticas públicas e direitos de crianças e adolescentes trans. A revista AzMina reúne histórias de mães que passaram pelo processo de descoberta e reencontro com seus filhes. “Nunca havia pensado nesta possibilidade e nem mesmo entendia direito o que era”, afirma Flávia Ferreira Almeida, mãe de uma pessoa não binária que foi acolhida e apoiada pela organização.