O Google no caso Marielle e as fraudes nas cotas raciais
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🔸 O Google está impondo “dificuldades” às investigações da morte de Marielle Franco. É o que diz o Ministério Público do Rio de Janeiro em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) no final de semana. A CartaCapital teve acesso ao documento em que o órgão pede que a empresa forneça informações do histórico de pesquisas sobre a vereadora e seus compromissos nos dias anteriores ao crime, que ocorreu em 14 de março de 2018. Os dados de busca seriam essenciais para identificar o mandante do assassinato. “Impedir a atividade investigatória do Ministério Público no presente caso apenas insere nosso país na perspectiva cruel e indesejável de ser um local destinado a servir de suporte ao paraíso do crime”, defende o Ministério Público. A queda de braço com o Google se arrasta desde 2018 e, embora o Superior Tribunal de Justiça tenha autorizado a liberação dos dados, a empresa ainda questiona a decisão na Justiça.
🔸 “Autorregulação regulada”. Esta seria uma solução para o impasse sobre o órgão que deve fazer a fiscalização das plataformas digitais, segundo o deputado federal Orlando Silva (PC do B-SP), relator do PL das Fake News. Como exemplo, ele citou a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), associação privada que autorregula o setor de mercado de capitais. A Lupa explica o que significa o termo “autorregulação regulada” – trocando em miúdos, é um meio-termo entre organismos puramente estatais, como a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), e puramente privados, como o Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária (Conar).
🔸 A Anatel, por sua vez, tem conversado com parlamentares sobre outro modelo. Para definir o que é falso ou verdadeiro nas redes sociais, as postagens passariam por um pool de checagem, composto por veículos jornalísticos, agências de fact-checking, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), representantes das big techs e da sociedade civil. Todos teriam peso igual na decisão. O Jota apurou que a agência planeja desenvolver o projeto independentemente da aprovação do PL das Fake News. Para a Anatel, o modelo poderia eliminar as críticas (sobretudo dos parlamentares de direita) à possibilidade de o órgão ter o poder de definir o que é falso de forma isolada e subjetiva.
🔸 Em vídeo: os depósitos em dinheiro vivo feitos por Mauro Cid, que foi ajudante de ordens do ex-presidente, na conta de Michelle Bolsonaro formam uma nova suspeita de “rachadinha” no clã Bolsonaro. No “Segunda Chamada”, do Canal MyNews, ao lado de André Borges e Aguirre Talento, a repórter Juliana Dal Piva lembra dos casos nos gabinetes de Flávio Bolsonaro, como deputado estadual no Rio de Janeiro, e de Carlos Bolsonaro, como vereador na capital carioca: “Foram muitos depósitos sem origem, em dinheiro em espécie, em volumes grandes. Na conta do Carlos, foram R$ 91 mil. Na conta da segunda mulher de Bolsonaro, mais R$ 385 mil em dez anos. No caso do Flávio, descobrem pagamentos de despesas pessoais, boletos da escola da filha dele, de plano de saúde, IPTU. É tudo muito parecido. Agora o que a Polícia Federal precisa trazer como resposta é se conseguiu mapear a origem desses recursos depositados por Mauro Cid”.
🔸 O STF, enfim, liberou a implementação do piso da enfermagem. Tanto os sistemas de saúde pública quanto as entidades de saúde privadas devem pagar salários a partir de R$ 4,75 mil aos seus enfermeiros. O piso vinha sendo articulado desde 2020, mas foi suspenso neste ano após uma ação de prefeitos, governadores e entidades no próprio STF. Agora, informa o Congresso em Foco, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou uma lei que repassa R$ 7,3 bilhões a estados e municípios para que possam arcar com o custo. O ministro Luís Roberto Barro, então, derrubou a suspensão.
📮 Outras histórias
“O motoboy também faz parte da empresa.” Augusto Juvenal Xavier da Silva, morador do Jardim Gaivotas, no Grajaú, no extremo sul de São Paulo, abandonou as plataformas para trabalhar como entregador particular devido à falta de amparo e à baixa remuneração dos aplicativos. Apesar das exaustivas horas nas ruas e dos riscos, Augusto relata também os pontos positivos que vê na profissão, como a flexibilidade de horários que permite que ele busque a filha na escola e a possibilidade de transitar por diversos territórios. O motoboy é o primeiro personagem da série “Diário do Corre”, da Periferia em Movimento, que traz relatos de pessoas periféricas que estão no trabalho autônomo.
📌 Investigação
Quatro das 69 universidades federais brasileiras ainda não possuem banca de heteroidentificação racial para detectar possíveis fraudes nas cotas para cursos de graduação. Levantamento da Alma Preta revela que as instituições sem essa estrutura são a Universidade Federal de Rondônia, a Universidade Federal do Oeste do Pará, a Universidade de Brasília e a Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Esses mecanismos são uma conquista histórica do movimento negro e, mesmo nas universidades onde estão estabelecidos, as denúncias de fraude são frequentes. A reportagem ainda reflete sobre a possibilidade de substituir os termos “preto e pardo” por “negro”, uma vez que a leitura racial de “pardo” é um dos principais motivos de conflito entre a identificação de pessoas negras de pele clara e pessoas brancas que podem se declarar como pardas no processo.
🍂 Meio ambiente
Em protesto aos mais de 10 mil acidentes contra animais silvestres nas rodovias de Mato Grosso do Sul, organizações ambientalistas levaram as carcaças de animais mortos até a sede do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), em Campo Grande, para cobrar soluções. O Eco lembra que pelo menos 17 onças-pintadas morreram atropeladas na BR-162, que corta o Pantanal sul-mato-grossense, entre 2016 e janeiro de 2023, segundo o Instituto Homem Pantaneiro. A espécie está entre as ameaçadas de extinção. Diretor de Comunicação e Engajamento do Instituto SOS Pantanal, o biólogo Gustavo Figueirôa, afirma que o problema não é exclusivo da BR-162: “Diversas outras estradas federais e estaduais pelo Mato Grosso do Sul acumulam acidentes envolvendo a fauna silvestre”.
Foram bloqueadas 19 fazendas da elite do agronegócio sob suspeita de grilagem. As propriedades estão localizadas na região de Correntina, extremo oeste da Bahia, onde pequenos agricultores e comunidades tradicionais de fecho de pasto resistem à invasão de suas terras desde a década de 1980. Segundo a Agência Pública, a decisão da Procuradoria-Geral do Estado atinge diretamente a Agrícola Xingu, controlada pela gigante japonesa Mitsui & Co, que exporta sua produção rural na área para algumas das maiores multinacionais do setor de commodities no mundo. Considerada pela Justiça “um dos casos mais graves de grilagem registrado na Bahia”, a medida impede principalmente o desmatamento nas fazendas bloqueadas.
📙 Cultura
“A maioria dos artistas vivem na incerteza em relação ao futuro, à renda, e até à garantia de que terão como viver do próprio trabalho”, aponta trecho de estudo publicado pela Unesco no ano passado. O Nonada conta que as condições de trabalho dos profissionais do setor cultural vêm sendo debatidas internacionalmente, mas ainda estão muito aquém no Brasil. Autora do livro “Trabalhadores da Cultura” (2020), a pesquisadora Amanda Coutinho aponta que as três características principais do trabalho artístico são a descontinuidade, a incerteza e a variação de remuneração, além do acúmulo de funções e do desamparo social como consequências do neoliberalismo.
Após anunciar a gravidez, a cantora Indy Naíse viu as portas da indústria artística se fecharem. Com um trabalho recém-lançado, milhões de visualizações em seus clipes e uma carreira ascendente, Indy deixou de ser contratada para shows e campanhas publicitárias. “A gente estava na negociação com uma marca, e ela simplesmente não deu mais resposta. A gente foi cobrar, e ela [a marca] falou: ‘Desculpa, infelizmente a Indy não tem mais o perfil’. Quando eu vi a peça de divulgação, era uma artista do mesmo perfil que eu. A única coisa [diferente] era que ela não estava grávida”, diz. Em entrevista à Agência Mural, a cantora relata as mudanças que a maternidade trouxe, o processo de depressão pós-parto e as negativas do mercado musical. Indy voltou a procurar um emprego CLT, longe dos palcos, mas afirma que não quer desistir da música.
🎧 Podcast
Para mulheres que amam mulheres. Ícone da literatura LGBTQIA+, a escritora Cassandra Rios foi a mais censurada do Brasil durante a ditadura: 36 dos seus 50 livros foram barrados. Por apenas um de seus romances, “Eudemonia”, ela se tornou alvo de 16 processos judiciais, segundo relatório da Comissão da Verdade, colegiado instituído no governo de Dilma Rousseff (PT) para investigar as violações de direitos humanos no período. A volta do “Dissidentes”, produção da Rádio Guarda-Chuva, mergulha na obra da autora, que descreve as relações entre mulheres de modo erótico e profuso nas formas de pensar a diversidade sexual.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
“Quem dependia do companheiro passou a ter a própria renda e, com isso, muitas também saíram da violência doméstica.” A afirmação é de Tainara Nascimento Vidal, uma das mulheres impactadas pela Rede Solidária de Mulheres de Sergipe, que atuam como catadoras de mangaba – fruto da mangabeira, espécie típica da Restinga. A Eco Nordeste visitou três comunidades, nos municípios de Estância e Indiaroba, e narra as histórias de transformação que vieram da organização conjunta dessas mulheres, reconhecidas pelo estado como um grupo culturalmente diferenciado e que devem ter suas formas próprias de organização social, seus territórios e recursos naturais protegidos.