O garimpo na terra Yanomami e os técnicos da cultura em luta por direitos
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🔸 “A atuação da criminalidade que assola os Yanomami demonstra requintes de crueldade. O atendimento médico foi interrompido nas 371 aldeias, entre as quais o acesso é difícil. Segundo declarou à ‘Deutsch Welle’ o presidente do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Yek’wana, Junior Hekurari Yanomami, ‘os garimpeiros tomaram bases de saúde, botaram fogo em uma delas e tomaram as pistas de pouso. Eles estão lá armados com metralhadora controlando sete pistas de pouso dentro do território’.” Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental, descreve a relação entre o garimpo ilegal, o crime organizado, a saúde dos indígenas e a sobrevivência da floresta, em artigo para O Eco. Ele traça um panorama da crise atual e lembra que a “febre do ouro” arrasa territórios no Brasil desde as grandes extrações coloniais passando pelos anos 1980, com a exploração da Serra Pelada, no Pará.
🔸 Para lidar com a situação emergencial, o governo instalou um Comitê de Coordenação Nacional, e a ministra da Saúde, Nísia Trindade, criou um Centro de Operações de Emergências (COE) em Saúde Pública. Diversos ministérios estão envolvidos em ações para dar assistência aos mais de 30 mil indígenas na reserva em Roraima. Estimativas das próprias lideranças locais apontam que existem cerca de 20 mil garimpeiros atuando na região. O Nexo traz uma síntese das principais ações em andamento, resgata os anos de abandono dos Yanomami no governo Bolsonaro e conversa com especialistas sobre a situação.
🔸 Em apenas um ano, a área de garimpo dentro da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, cresceu 275%. Os dados do Mapeamento Anual de Mineração e Garimpo no Brasil, realizado pelo MapBiomas, foram apresentados no ano passado e explorados em extensa reportagem do Projeto Colabora. O avanço do garimpo ilegal sobre terras indígenas foi de 632% entre 2010 e 2021. Na Terra Yanomami, a violência explodiu no governo Bolsonaro. Em maio de 2022, uma adolescente de 12 anos foi estuprada e morta. Em outubro de 2021, duas crianças morreram após serem engolidas por uma draga do garimpo e, no mês seguinte, houve denúncia de assassinato de três indígenas.
🔸 Em meio à crise humanitária, 11 chefes de postos de saúde indígena foram exonerados ontem. Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, somente no ano passado, quase cem crianças yanomami morreram, a maioria por quadros de desnutrição, pneumonia e diarreia. Sabe-se que o governo de Jair Bolsonaro (PL) ignorou ao menos 21 pedidos formais de ajuda ao povo Yanomami. A CartaCapital destaca que o caso será denunciado ao Tribunal Penal Internacional de Haia. Vai se somar a uma ação já enviada à Corte pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) que, em 2021, denunciou Bolsonaro por genocídio e crimes contra a humanidade.
🔸 Outra tragédia brasileira, a fome, foi lembrada por Marina Silva no Fórum Econômico de Davos, na semana passada. A ministra afirmou que “120 milhões de brasileiros passam fome no país”. Como o número é impreciso, ela própria se corrigiu e, no dia seguinte, usou outro dado: o de que 33,1 milhões de pessoas passavam fome no Brasil entre novembro de 2021 e abril de 2022. A Lupa reúne as pesquisas mais recentes sobre fome no país.
🔸 “A importância de se ter uma comunicação na mão da esquerda seria, nesse momento, investir na mídia comunitária, popular, na comunicação pública, no audiovisual público. Que seja do povo, colocando a diversidade que o nosso país tem, uma linguagem acessível para todos e todas e tentando fazer um governo que dialogue com a população a partir dessas mídias.” Gizele Martins é cria da Maré, conjunto de favelas na zona norte do Rio de Janeiro e mestre em Educação, Cultura, Comunicação e Periferias Urbanas pela Faculdade de Educação da Baixada Fluminense (FEBF). Em entrevista ao Nós, Mulheres da Periferia, ela critica a nomeação de Juscelino Filho, do União Brasil, como ministro das Comunicações, defende a ampliação do acesso à internet e afirma que o governo ainda “não prioriza a comunicação, muito menos a comunitária”.
📮 Outras histórias
Uma história de resistência feminina: o movimento das crecheiras, mulheres que lutaram para criar creches comunitárias e aplacar a ausência de creches públicas em suas regiões. Na Rocinha, favela da zona sul do Rio de Janeiro, são 14 unidades que atendem mais de 500 crianças e tem contratos de R$ 12 milhões firmados com a prefeitura para suprir o déficit educacional na comunidade. O Fala Roça conta a história de algumas das creches e das mulheres fundadoras e coordenadoras das instituições.
📌 Investigação
De formas de brigadeiro a desodorante, é vasta a lista de itens que aparecem nas faturas do cartão corporativo da Presidência da República. Após revelar os gastos do benefício de todos os ex-presidentes desde 2003, a Fiquem Sabendo obteve a liberação das notas fiscais das compras, com a descrição, como qual serviço ou produto foi adquirido, em cada uma. Como só existem cópias físicas, a equipe da agência conseguiu escanear cerca de 2,6 mil páginas – 20% do total –, com foco no último mandato.
🍂 Meio ambiente
Em mais de 30 anos de democracia, esta é a primeira vez que indígenas ocupam cargos relacionados a seus interesses. Para o advogado cearense e titular da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), Weibe Tapeba, uma política aliada aos direitos dos povos originários significa um aceno à comunidade internacional em relação à pauta ambiental e à própria sociedade brasileira, como forma de reestruturação das instituições. “Com a ministra Marina Silva, acho que há mais um aceno de restabelecimento da ordem pública na área ambiental. Infelizmente, nos últimos quatro anos, o discurso do ex-ministro Ricardo Salles prejudicou nossos territórios. Houve um estímulo, vindo do alto escalão do governo, para que esses territórios indígenas fossem usados pelo agronegócio, a mineração foi estimulada”, afirma Tapeba em entrevista ao Eco Nordeste.
Dois vídeos entre os mais vistos no Brasil em canais de extrema direita na última semana de dezembro continham desinformação sobre as mudanças climáticas. Valem-se de uma técnica para negar a crise climática: apontar eventos extremos de frio para desacreditar o aquecimento global. “O nome disse é pseudociência intencional, e veio para ficar”, afirma o cientista Ricardo Galvão, agora presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). O InfoAmazonia detalha a narrativa desses conteúdos e conversa com especialistas sobre essa prática de desinformação.
📙 Cultura
Desprotegidos durante a pandemia, técnicos da cultura pedem à ministra Margareth Menezes ações para garantir direitos trabalhistas e proteção à categoria, como um salário mínimo e fim do trabalho informal. A informalidade atinge 37% dos trabalhadores da economia criativa, segundo boletim do Observatório Itaú Cultural, e a disparidade de remuneração é agravada quando são feitos os recortes de raça e gênero. O Nonada lista as reivindicações do grupo.
Envolto em polêmicas, o ensaio biográfico no Brasil já foi atacado por celebridades e chegou até em julgamento no Supremo Tribunal Federal. É nesse emaranhado que Lira Neto e Ruy Castro, escritores, jornalistas e biógrafos, preenchem a lacuna teórica para o gênero. O primeiro com o livro “A Arte da Biografia”, e o segundo com “A Vida por Escrito: Ciência e Arte da BGiografia”. Os autores buscam responder a perguntas como “o que é uma biografia?” ou “como escolher o biografado?”. A Quatro Cinco Um resenha os dois livros em conjunto, construindo um perfil do ensaio biográfico.
🎧 Podcast
A lei que inclui história e cultura afro-brasileira e africana no currículo da educação básica completa 20 anos, mas ainda há muitos desafios para que o tema seja de fato aplicado no dia a dia das escolas. No episódio “O que é a Lei 10.639?”, o Papo Preto, produção da Alma Preta, conversa com Graça Gonçalves, professora da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense para fazer o balanço da legislação. “Desde a abolição, a bandeira da educação foi uma das principais lutas do movimento negro. Ela vai sendo alcançada aos poucos com o ingresso das pessoas na escola, mas rapidamente se percebeu que apenas o ingresso em sala de aula não favorecia a emancipação da população negra, porque a escola tem em seu histórico a impermeabilidade às questões e anseios do povo negro”, analisa Gonçalves.
👩🏽💻 Tecnologia
Aprovada em abril de 2022 pela União Europeia, a Digital Services Act (DSA) é o primeiro marco regulatório para redes sociais e plataformas digitais. O texto, acompanhado por acadêmicos, pesquisadores, parlamentares e jornalistas ao redor do mundo, pode servir de inspiração para o governo Lula, que já deu indícios de que fará a regulação neste mandato. O Núcleo explica todo o processo de aprovação da DSA e suas diretrizes. Para a pesquisadora Bruna Santos, a mensagem da legislação europeia é de criar instâncias capazes de supervisionar os serviços.