A volta do Fundo Amazônia e a luta da fundadora do Movimento Mães de Maio
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🔸 No aniversário de 43 anos do PT, ontem, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que recebeu o país em 2023 “muito pior que em 2003”, quando foi eleito pela primeira vez. Segundo ele, o Brasil de hoje tem a máquina pública “muito mais incivilizada” e “muito mais gente que não tem direitos”, como destaca o Congresso em Foco. “Nós vamos levar um tempo para fazer um processo de limpeza e fazer com que aquelas pessoas que pregam o ódio, que xingam as pessoas na rua, ofendem as pessoas na rua, que sejam isoladas da sociedade brasileira”, afirmou Lula.
🔸 O presidente tem pela frente uma sequência de agendas populares. O Nordeste é o ponto de partida dos eventos. Na Bahia, Lula vai relançar o Minha Casa, Minha Vida, programa de moradias populares criado por ele próprio e alterado nos últimos anos. O presidente também vai inaugurar obras, anunciar outras e receber no Planalto representantes da classe trabalhadora, como catadores de lixo. Segundo o Jota, a agenda é parte de uma estratégia para mostrar que o governo começou de fato e deixou para trás o 8 de janeiro
🔸 Por falar nos atos golpistas: a Advocacia-Geral da União (AGU) está cobrando R$ 20,7 milhões pelos danos materiais causados pelas invasões aos prédios dos Três Poderes. São processadas na ação 54 pessoas, três empresas, um sindicato e uma associação, que teriam financiado o transporte dos golpistas até Brasília. A Lupa informa que esta é a primeira ação judicial que pede ressarcimento aos cofres públicos em caráter definitivo. A grande maioria das pessoas citadas no processo vem de apenas três estados: São Paulo, Minas Gerais e Paraná.
🔸 Segue a tensão do governo com o Banco Central. No mesmo dia em que a cúpula do PT propôs convocar Roberto Campos Neto para explicar a política de juros no Congresso, o presidente do Banco Central deu entrevista ao “Roda Viva”, na TV Cultura. No programa, afirmou que mudar a meta de inflação agora teria “efeito contrário” e poderia causar “perda de flexibilidade”. O Portal Terra conta que Campos Neto chegou a defender um “aprimoramento” das metas para tentar conter a inflação, mas disse que não daria mais detalhes por ser um “tema sensível, que mexe com o mercado”.
🔸 Para entender: o Conselho Monetário Nacional se reúne nesta quinta e pode elevar a meta de inflação do país em 2023. O governo espera que passe de 3,25% para 3,5%. O presidente Lula reclama que as metas estão baixas demais, o que obriga o Banco Central a “arrochar mais a economia” para cumprir seus objetivos e, assim, manter os juros altos, o que prejudica o crescimento econômico. As metas foram adotadas no Brasil em 1999, como forma de trazer estabilidade e previsibilidade para a economia. O Nexo explica como funcionam, quem define e o que significa mudar as metas.
📮 Outras histórias
Assim começa a festa de São Gonçalo de Amarante no sertão pernambucano: “Quem tiver suas promessas, pague antes de morrer. Porque nós não somos Jesus, que morreu e voltou a viver”. Beato português, ele atende a todas as causas, mas já foi muito conhecido por ser casamenteiro e padroeiro dos violeiros e das prostitutas. O Marco Zero narra a festa na zona rural do município de Ibimirim, a 337 quilômetros de Recife. Lá, uma roda de música e dança foi organizada no quintal de dona Eunice Moura, agricultora que morreu antes de conseguir pagar uma promessa que tinha com o santo. A família garantiu o pagamento com a festa. “São Gonçalo é um santo muito bom, não tem pedido que ele não atenda. Mas o camarada também tem que pagar a promessa que fez, de organizar a dança. Se não fizer a festa, fica em agonia, sofrendo. Pode até perturbar os vivos. Por isso, é importante pagar direito”, ensina o mestre da roda, o agricultor Gerônimo de Oliveira, de 75 anos.
Aos 63 anos, Débora Maria da Silva subiu ao púlpito na Câmara Municipal de São Paulo com lágrimas nos olhos. A fundadora do Movimento Mães de Maio, que luta há 17 anos por justiça e reparação, foi homenageada com o título de Cidadã Paulistana. Ela perdeu o filho, o gari Edson Rogério Silva dos Santos, assassinado aos 29 anos durante os Crimes de Maio de 2006. A Ponte descreve a luta de Débora e lembra que o massacre foi o maior episódio de violência policial da história brasileira. Grupos de extermínio formados por policiais mataram 505 pessoas no estado de São Paulo, em retaliação contra pessoas negras e periféricas por conta de ataques da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC). “O Crimes de Maio não é passado. Nunca vai ser passado. Está presente dentro das favelas e das periferias porque não houve punição”, disse Debora.
📌 Investigação
Durante a pandemia, o governo Bolsonaro tinha como estratégia omitir dados negativos sobre a Covid-19 – e essa diretriz regia o modo de trabalho do Centro de Coordenação das Operações do Comitê de Crise da Covid-19 (CCOP). Em atas de reuniões sigilosas reveladas pela Agência Pública, ministros como Damares Alves e Braga Netto defendiam que era preciso “acalmar” a população, e o representante da Secretaria de Governo da Presidência da República, Samy Liberman, pediu que não fossem divulgados dados sobre a “letalidade do coronavírus”. Foi ele quem sugeriu que as informações sobre mortos fossem retiradas do Painel de Informações do governo federal. As reuniões ocorreram em março de 2020 e setembro de 2021, com a presença de 26 órgãos, entre ministérios, agências reguladoras, bancos públicos e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin). A reportagem integra o especial “Caixa-preta do Bolsonaro”.
🍂 Meio ambiente
As engrenagens do Fundo Amazônia voltam a trabalhar. Pela primeira vez em quase quatro anos, o Comitê Orientador do Fundo Amazônia (Cofa) se reúne amanhã. O Reset explica que o Cofa é formado pelos governos federal e estaduais e pela sociedade civil. É o responsável por estabelecer as diretrizes de financiamento de projetos para que o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) consiga fazer a captação e a gestão dos recursos. São R$ 3,4 bilhões que ficaram parados nos últimos anos. Para a diretora do Instituto Socioambiental (ISA) e representante da sociedade civil no comitê, Adriana Ramos, a recente doação de US$ 50 milhões dos Estados Unidos é vista como simbólica para a retomada do fundo.
A Amazônia e o Tibete estão a 20 mil quilômetros de distância, mas estão muito mais próximos do que parece. A Amazônia Latitude conta que, pela primeira vez, pesquisadores conseguiram identificar e quantificar a interferência das chamadas teleconexões – visão geral da circulação atmosférica, em que ações locais influenciam regiões remotas. A pesquisa publicada na revista científica “Nature Climate Change” mostra que, quando a temperatura aumenta na Floresta Amazônica, o mesmo acontece no planalto tibetano. “O efeito cascata no clima é um risco a ser levado a sério: elementos interligados no sistema terrestre podem desencadear uns aos outros”, afirma o coautor do estudo, Hans Joachim Schellnhuber, do Potsdam Institute for Climate Impact Research (PIK), na Alemanha.
📙 Cultura
A exposição “Brasil Futuro: as Formas da Democracia”, montada no Museu Nacional da República, em Brasília, reúne obras de mais de cem artistas brasileiros e foi aberta como parte da programação da posse de Lula. O Nonada lista 11 dos nomes presentes na mostra, que se divide em três eixos: “Retomar Símbolos”, que celebra a democracia do país; “Decolonialidade”, sobre questões do feminismo, da negritude, dos povos originários e do movimento LGBTQIA+; e “Somos Nós”, que aborda a riqueza étnica, de gênero, regional e de linguagens presentes na cultura brasileira. O prédio do museu foi um dos únicos que saiu ileso dos atos criminosos de 8 de janeiro, graças à atuação rápida da equipe para fechar as portas após a entrada de grupos bolsonaristas no local.
A arquitetura fala. E é a partir dela que se constrói o romance “Solitária”, da jornalista e escritora Eliana Alves Cruz. O livro parte do elemento arquitetônico, comum em casas antigas e em extinção nas modernas: o “quarto da empregada”. A Escotilha resenha a obra que passa do concreto das paredes para os símbolos da desigualdade social e da herança escravocrata no país. O foco narrativo está nas três personagens principais, "invisíveis" para as famílias abastadas para as quais trabalham e que acreditam fazer um favor ao oferecer uma “oportunidade” de trabalho.
🎧 Podcast
Fonte inesgotável de discussão, Machado de Assis é mais uma vez tema do “451 MHz”, da revista Quatro Cinco Um. Com a presença do crítico literário e um dos maiores especialistas no autor, Hélio de Seixas Guimarães, e do escritor, jornalista e crítico literário Sérgio Rodrigues, a conversa reflete sobre sua obra a partir da vivência de Machado de Assis em um Rio de Janeiro que à época era extremamente português, mas também muito negro. Além da racialidade, diversas vezes apagada, suas narrativas possuem muitas interpretações. A grande polêmica do autor brasilerio foi posta por mulheres, quando a crítica estadunidense Helen Caldwell, em 1960, levantou a hipótese de que Capitu não traiu Bentinho em “Dom Casmurro”.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Mulheres negras são o perfil mais comum nas igrejas evangélicas, segundo pesquisa do Datafolha, de 2019. Elas, porém, não são representadas pela bancada evangélica do Congresso Nacional. Em entrevista ao Nós, Mulheres da Periferia, a antropóloga e pesquisadora da relação entre negritude, igreja evangélica e feminismo, Simony dos Anjos, afirma que esses parlamentares fazem parte de uma “agenda anti-povo”, que não as representam: “Nossa incidência tende a se aproximar dos movimentos sociais populares, porque o que a gente enxerga dentro das nossas igrejas é a falta de moradia, o genocídio preto nas periferias, o racismo exacerbado”.
Primeira travesti a ter um cargo no segundo escalão do governo federal, Symmy Larrat está há quase um mês na inédita Secretaria da Promoção e Defesa das Pessoas LGBTQIA+ do Ministério dos Direitos Humanos. À Gênero e Número, ela afirma que dar forma ao Disque 100, serviço de denúncias sobre violação de direitos humanos, é uma das prioridades do governo. “Nós já conversamos com a ouvidoria e estamos com o formulário do Disque 100 na pauta, na qual já consta identidade de gênero e orientação sexual, e não mais denúncias de ‘ideologia de gênero’”. Políticas públicas de emprego para a população trans, de modo similar ao Transcidadania, coordenado por ela no governo Haddad em São Paulo, também estão entre as principais tarefas da pasta.