O Brasil fora da aliança de países antiaborto e a carta branca ao STF
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
🔸 “O campo democrático enfrenta um dilema. Devemos aceitar as medidas duras – quiçá excepcionais – do Supremo Tribunal Federal no combate aos golpistas ou devemos justamente reforçar nosso compromisso com a estrita legalidade e um devido processo legal rigoroso?” Em artigo na revista piauí, Cláudio Couto e Rubens Glezer, integrantes do grupo Professores da FGV pela Democracia, defendem que “há melhores razões para dar amplo respaldo ao STF nesse contexto de tentativas reais de golpe de Estado”. Os dois relembram ações dos magistrados durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), destacam que Alexandre de Moraes tornou-se alvo predileto dos bolsonaristas e concluem: “Enquanto prevalecer a disfuncionalidade na PGR, nas Forças Armadas e nas demais forças de segurança, sobram-nos poucas alternativas à escolha de endossar uma carta branca (ou quase) ao Xandão”.
🔸 O ministro, aliás, manteve a prisão de 140 pessoas acusadas de participar dos atos golpistas no dia 8 de janeiro em Brasília e liberou 60 suspeitos. As prisões em flagrante foram convertidas em preventiva (sem tempo para acabar). Para Alexandre de Moraes, há provas de que participaram efetivamente em “organização criminosa que atuou para tentar desestabilizar as instituições republicanas”. O Congresso em Foco lista os nomes dos presos.
🔸 O ataque aos Três Poderes era o “início de um golpe de Estado” e Jair Bolsonaro estaria “esperando voltar ao Brasil na glória desse golpe”. As palavras são do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que, em entrevista ontem, disse ainda ser contrário à abertura de uma CPI na Câmara dos Deputados ou no Senado para investigar os responsáveis pelos atos: “O que nós podemos investigar em uma CPI que a gente não possa investigar aqui e agora? Nós estamos investigando, já têm mais de 1,3 mil pessoas presas. Estamos ouvindo depoimentos, pegando telefones celulares, (…) já sabemos quem foi negligente, quem não foi negligente”. O Portal Terra destaca os principais pontos da entrevista.
🔸 Já está em território Yanomami, em Roraima, a equipe do Ministério da Saúde que fará um diagnóstico da situação dos 30,4 mil indígenas que lá vivem. Segundo o Notícia Preta, trata-se do primeiro passo para estabelecer uma estratégia para superar a crise sanitária que se abate sobre a população. Há, por exemplo, casos de desnutrição e insegurança alimentar, principalmente entre as mais de 5 mil crianças da região. Profissionais de saúde relatam “falta de segurança e vulnerabilidade” para os atendimentos.
🔸 O quadro de desigualdade de gênero na diplomacia brasileira: no corpo diplomático do país, apenas 23% são mulheres. Havia uma expectativa de que Lula indicasse uma mulher para o Ministério das Relações Exteriores, mas ele nomeou Mauro Vieira para o cargo. Nesta semana, foi lançada a Associação das Mulheres Diplomatas Brasileiras para tentar combater a desigualdade na carreira. O Nexo traça o cenário nacional, traz dados de outros países e conversa com Carolina Pavese, professora de relações internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Ela resume: “A diplomacia de alto escalão em Brasília e no Itamaraty é elitista, exclusivista e restrita, conduzida e apropriada pelos homens brancos, muitas vezes de famílias tradicionais ou de classes altas da sociedade brasileira. Não é uma esfera de representação democrática e não reflete essa diversidade da sociedade”.
📮 Outras histórias
Uma mulher de 82 anos em luta para seguir onde sempre viveu. Dona Liu, como é conhecida Maria José da Silva, nasceu, cresceu e criou nove filhos na mesma casa, na Comunidade Mangueira da Torre, no bairro da Madalena, Zona Oeste do Recife. Pois é de lá que querem lhe tirar: dona Liu recebeu uma ordem judicial no dia 11 de janeiro referente a um mandado de reintegração de posse expedido pelo casal José Arraes de Alencar Ximenes e Ana Maria de Albuquerque Lima Ximenes, reconhecidos como donos do local. O Marco Zero retrata a saga dela e de sua família na Justiça contra a especulação imobiliária na região. “É muito ruim quando a pessoa nasce e se cria em um lugar e de repente ver alguém querendo tirar o que é seu”, diz dona Liu.
Porto Alegre foi a capital com a maior taxa de mortalidade de negros por Covid em 2020. Foram 312,3 mortos por 100 mil habitantes. Já entre os brancos, a taxa de óbitos foi muito menor: de 169,6 mortes por 100 mil habitantes. Os dados são de um estudo feito por pesquisadores do Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde (PPGCS) da Universidade Federal de Rio Grande (FURG). O Sul21 ressalta que os números revelam um cenário de grande disparidade étnico-racial nas mortes por Covid tanto na capital, quanto no estado e no país. “No caso de Porto Alegre, que não tem uma população tão grande de pretos e pardos, os resultados mostram que essa população está ainda mais vulnerável”, afirma Flavio Rodrigues, coordenador da Pós-Graduação em Ciências da Saúde da FURG.
📌 Investigação
Jornadas exaustivas, riscos à saúde e baixa remuneração são o legado da decadência do mercado do fumo de rolo, que teve seu boom nos anos 1970 e hoje se restringe apenas a agricultores familiares no Nordeste. Enquanto alguns deles se orgulham de ao menos manter a cultura viva, outros lembram dos danos, dívidas e dificuldades de mudar de atividade. Ao fim, muitos são reféns das regras de seus poucos compradores. “Os donos das fábricas é que botam o preço. Eles avaliam o tanto de fumo que deu na região e ditam quanto vão pagar. A gente é obrigado a vender. Os atravessadores e os empresários ganham muito dinheiro em cima da gente”, afirma José Marques, que planta fumo há 35 anos. O Joio e O Trigo mergulha na realidade dos pequenos agricultores desse cultivo em Alagoas.
🍂 Meio ambiente
O Ministério do Meio Ambiente terá R$ 550 milhões a mais em 2023 do que o proposto por Bolsonaro, graças ao Projeto de Lei Orçamentária Anual, aprovado pelo Legislativo e sancionado por Lula anteontem. Segundo O Eco, a expansão no orçamento da pasta garantiu recursos para a retomada de programas como o Bolsa Verde – que ajuda famílias em situação de extrema pobreza ao incentivar práticas de proteção ambiental – e os investimentos extras em ações de fiscalização e combate ao desmatamento e às queimadas.
Território tradicional, a Reserva Extrativista Jacy-Paraná, em Rondônia, sofre com invasões, grilagem de terras e expulsão de seus moradores. A área foi a sexta mais desmatada entre as unidades de conservação na Amazônia entre agosto de 2021 e julho de 2022, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Desde março de 2021, o governo de Rondônia e o Ministério Público do estado têm um acordo para combater a pecuária – atividade proibida nesse tipo de território. A Agência Pública revela, porém, que o número de cabeças de gado em Jacy-Paraná cresceu 18% entre abril de 2021 e setembro de 2022, enquanto apenas duas multas foram aplicadas.
📙 Cultura
Após anos de dificuldades, o setor de livro e leitura vê uma luz no fim do túnel. A recriação do Ministério da Cultura veio com a criação da Secretaria de Formação e de Livro e Leitura. “Cobrar do governo a regulamentação da Política Nacional de Leitura e Escrita, que passa pela implementação do Plano Nacional do Livro e da Leitura, que ficou paralisada durante o governo de Bolsonaro . (...) É preciso exigir que essa importante política pública saia do papel e vire uma diretriz de Estado e não de governo”, aponta a deputada federal Fernanda Melchionna, presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Livro, da Leitura e da Escrita. O Nonada apresenta as principais demandas de políticas para o setor.
“Andando por um caminho. Essas pedras retratam os meus ancestrais. Angústia já esteve aqui impedindo. Nós negros de poder sorrir.” Esses são os versos da canção “O Caminho das Pedras”, da Banda Toró Açu, formada por quilombolas da comunidade Abacatal, em Ananindeua, município que integra a região metropolitana de Belém, no Pará. Por meio da música e das pinturas, povos tradicionais resgatam sua ancestralidade, denunciam ao mundo as violações de seus territórios e buscam justiça climática. Os repórteres Ana Clara Santos, Cecilia Alves Amorim e Lucas Duarte, do programa Diversidade nas Redações, da Énois Conteúdo, narram a arte da resistência em reportagem para a Amazônia Real.
🎧 Podcast
A partir das margens do Reno, um dos rios mais importantes da Europa, na fronteira entre França e Alemanha, o podcast “A Terceira Margem do Reno”, produção da Quatro Cinco Um, aprofunda-se em temas essenciais para o mundo e para a literatura. O sexto episódio esquadrinha a memória a partir de narrativas de silêncios da vida familiar, do luto e de um genocídio. Entre as obras trazidas para a discussão, está o romance “Os Anos”, da escritora francesa Annie Ernaux, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura no ano passado.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
Criado em 2020 por iniciativa do então presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e por Bolsonaro, o Consenso de Genebra é uma declaração internacional que une países antiaborto. Embora não tivesse a força de um tratado, passava uma clara mensagem de como o país estava lidando com os direitos reprodutivos, os direitos das mulheres e de pessoas LGBTQIA+. Em nota conjunta, publicada anteontem, os Ministérios das Relações Exteriores, da Saúde, das Mulheres e dos Direitos Humanos e da Cidadania anunciaram a retirada do Brasil da aliança. O Portal Catarinas lembra que essa era uma demanda progressista expressa no período de transição do governo e que o mesmo ocorreu nos EUA no primeiro mês da gestão de Joe Biden.