A fome na cidade mais rica do país e a erosão na Ilha do Marajó
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🔸 A ONU precisa de “mudanças estruturais”. Foi o que defendeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na sede da Organização das Nações Unidas, em Nova York, ontem. Segundo ele, a pandemia, as guerras e a crise climática expuseram as limitações do órgão, informa a CartaCapital. “A Assembleia Geral perdeu sua vitalidade, o Conselho Econômico-Social foi esvaziado e a legitimidade do Conselho de Segurança encolhe a cada vez que ele aplica duplos padrões diante de atrocidades”, criticou. Lula afirmou ainda que a reestruturação da ONU e de seus colegiados precisa refletir a importância atual do Sul Global. O tempo de cada discurso era de cinco minutos e, como o ultrapassou, o presidente teve o microfone cortado, mas leu o pronunciamento até o final.
🔸 Enquanto proliferam como candidatas ao posto de vice, as mulheres representam só 21% das candidaturas às prefeituras nas capitais do país. Das 26, oito não têm nenhuma candidata ao cargo de prefeita. Há, no entanto, uma “proliferação de vices”, segundo a cientista política Hannah Maruci, diretora e cofundadora da organização A Tenda das Candidatas. “Não em todos, mas em muitos casos é uma estratégia do partido de direcionar recurso para uma chapa que tem como cabeça um homem, mas que esse recurso entre pela conta da vice, por exemplo, e possa contar como recurso feminino”, explica. O Congresso em Foco lembra que a cota feminina foi incluída na Constituição em 2022 e prevê que no mínimo 30% dos recursos de financiamento de campanhas e de tempo de propaganda eleitoral devem ser reservados para mulheres e pessoas negras. A cota, porém, não especifica se o percentual é para candidaturas proporcionais ou majoritárias.
🔸 Falando em eleições: 66 candidaturas no país são ligadas a programas policialescos, segundo levantamento feito pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. O PL e o Republicanos são os partidos com mais candidatos desse tipo. São apresentadores, repórteres ou até mesmo entrevistados corriqueiros de programas que exploram a violência urbana e se valem da visibilidade midiática como trampolim eleitoral. O Le Monde Diplomatique Brasil detalha o relatório e mostra que, entre os identificados, 51 são comunicadores e oito são agentes de segurança pública que aparecem regularmente nesses programas. O trabalho mostra ainda como uma concessão pública de rádio e TV acaba por promover narrativas em prol de políticas de encarceramento em massa, racismo e violação de direitos humanos.
🔸 Dois milhões de paulistanos passam fome, e mais da metade da população enfrenta algum nível de insegurança alimentar. Os dados inéditos são parte do 1º Inquérito sobre a Situação Alimentar no Município de São Paulo, lançado na última sexta-feira. Os números contradizem o discurso de sucesso alardeado pelo candidato à reeleição Ricardo Nunes (MDB). O Joio e O Trigo mostra que, na cidade mais rica do país, o alto custo de vida agrava a insegurança alimentar e afeta sobretudo famílias chefiadas por mulheres e pessoas negras. Nesse cenário, a capital não tem políticas públicas eficazes. A começar pela distância dos serviços de assistência social das pessoas que necessitam de ajuda para comer: entre os domicílios que enfrentam a fome, 76,3% não têm acesso a um restaurante popular ou cozinha solidária, uma das principais bandeiras da Prefeitura de São Paulo no combate à fome.
📮 Outras histórias
“A periferia em geral é formada por mães solteiras. A maior dificuldade é onde deixar os filhos”, afirma Rosalia Fraga, que coordena o jornal comunitário Fala Cohab, no Rubem Berta, bairro mais populoso de Porto Alegre. Faltam vagas nas creches, além de saneamento básico, coleta de lixo e segurança para os quase 90 mil habitantes, segundo o Censo de 2010. É por lá que o Sul21 inicia a série especial sobre as periferias da capital gaúcha, com foco nas demandas dos moradores às vésperas das eleições municipais. No Rubem Berta, o acesso à cultura também é escasso e se soma à violência – o ano de 2023 foi marcado por toques de recolher em consequência de conflitos envolvendo o tráfico de drogas na região. “Onde não tem cultura, o crime vira espetáculo”, diz o artista e ativista Leandro Seré, coordenador da Casa do Hip Hop Rubem Berta.
📌 Investigação
Dois servidores da Prefeitura de São Paulo pagaram por anúncios no Instagram a favor da reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB). O subprefeito de Itaquera, Rafael Limonta, e o chefe de gabinete da Subprefeitura de Santo Amaro, Almir Mendes, impulsionaram 41 publicações em seus perfis pessoais desde o início da campanha eleitoral, como apurou o Aos Fatos. Os anúncios contrariam a Lei Eleitoral, que só permite que impulsionamentos sejam feitos pelos próprios candidatos ou pelos partidos. Cinco publicações foram feitas durante o expediente das subprefeituras, e 16 vinculam a atuação dos servidores à campanha. Os posts atingiram entre 200 mil e 300 mil visualizações e custaram até R$ 4.000.
🍂 Meio ambiente
Na Ilha do Marajó, no Pará, a erosão costeira tem causado destruição para as famílias que vivem na região. No início deste ano, durante a temporada de chuvas, casas da vila do Pesqueiro foram destruídas. “Quando me deparei, a casa já estava entortando”, lembra Ivanil Brito, que, em três dias, perdeu não apenas sua residência de palafitas, mas também galinhas, porcos, plantas, móveis, documentos e material universitário dos filhos. Segundo O Eco, a erosão é um fenômeno natural, mas agravado por fatores externos, como a retenção de sedimentos e o aumento do nível do mar. Há quase dez anos, o Serviço Geológico Brasileiro alertou sobre os riscos na região e informou que as famílias deveriam ser realocadas até 2023. Pouco foi feito desde o alerta, e, na cidade vizinha, uma escola quilombola segue em área de risco.
📙 Cultura
Entre soul, reggae, narrativa oral, berimbaus e freestyle, o ativista cultural, capoeirista e pesquisador Mestre Negoativo e o rapper Douglas Din apresentam o show Diaspora’S para representar a música afromineira. O espetáculo foi criado pelos dois mineiros para o projeto Sonora Brasil e tem percorrido diversos estados do país. Em entrevista à Mangue, a dupla fala sobre os elementos que permeiam o repertório das apresentações e suas trajetórias como artistas. “Essa cultura preta, belorizontina, mineira, ela é mais para dentro. E toda a nossa coisa que vem dos vissungos, do congado, dos candombes, enfim, dos catopês, é uma coisa mais para dentro”, afirma o Mestre Negoativo. “Não é uma cultura que outras pessoas, principalmente pessoas que vêm de outras regiões, vão encontrar assim facilmente. Você tem que se aquilombar para encontrar esses elementos diaspóricos no estado de Minas Gerais.”
🎧 Podcast
Na vila de Dois Rios, em Angra dos Reis (RJ), onde há um presídio desativado, os moradores e a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) travaram um conflito. A minissérie “Dois Rios”, da “Rádio Escafandro”, produção da Rádio Guarda-Chuva, mergulha na origem do ódio que a comunidade nutre pela instituição. Embora a população local afirme que a UERJ é inflexível enquanto gestora da vila, a reportagem passou a identificar mal entendidos na história, inclusive com fontes que decidiram voltar atrás em suas versões.
✊🏽 Direitos humanos
Em quadrinhos: a contribuição de Paulo Freire ultrapassa o campo da pedagogia. Para a professora do Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Rita Diana, o fato de Freire ver a educação como ferramenta de transformação torna sua obra política – e isso pode estar na origem da desinformação em torno do autor de “Pedagogia do Oprimido”. No especial “Quer Que Eu Desenhe?”, série de reportagens em quadrinhos de combate à desinformação na cultura, arte e sociedade, da revista O Grito!, a jornalista e quadrinista Gabriela Güllich explica como Freire, reconhecido mundialmente por seu trabalho, foi de educador a “doutrinador” nas correntes de redes sociais e se tornou alvo de conteúdos desinformativos.