O 'efeito Felca' na Câmara e as apreensões nos trens de SP
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🔸 Pelo menos 35 novos projetos de lei ilustram o “efeito Felca” na Câmara dos Deputados. Depois do vídeo sobre “adultização” publicado pelo influenciador Felca – conteúdo que denunciou casos de exploração sexual de crianças nas redes e ultrapassa 31 milhões de visualizações –, parlamentares correram para apresentar propostas. Dos 35 novos projetos, 25 foram protocolados só nesta segunda-feira. Levantamento do Núcleo mostra que, apesar do interesse repentino, já havia cerca de 75 projetos sobre o tema parados em tramitação na Câmara desde 2015. Entre as propostas, o PL 2.628/2022 é o mais abrangente: trata sobre a proteção de crianças e adolescentes em ambientes digitais. Foi aprovado no Senado e recebido na Câmara em dezembro de 2024. Ontem, deputados pediram que o texto fosse incluído na ordem do dia.
🔸 Já o governo prometeu enviar ao Congresso um projeto para regular e punir big techs por divulgar e impulsionar conteúdos criminosos, como exploração infantil, crimes contra vulneráveis e fraudes. O Congresso em Foco informa que o ministro da Casa Civil, Rui Costa, acusou as plataformas digitais de resistirem à fiscalização porque lucram com atividades ilícitas. “Essas empresas faturam bilhões no mundo inteiro e não querem ser fiscalizadas porque, infelizmente, muitas delas ganham muito dinheiro patrocinando, estimulando e viabilizando crimes hediondos, como pedofilia, tráfico de crianças, prostituição, tráfico de drogas e fraude bancária”, afirmou o ministro.
🔸 Não é novidade: em março de 2025, dez vídeos de cinco jovens vítimas de sexualização estavam no ar no Facebook e no Instagram. Após a denúncia, a Meta removeu apenas um dos conteúdos, mas manteve o perfil no ar. Nele, um link levava para uma comunidade do Telegram que prometia fotos de uma das adolescentes. O Aos Fatos reúne cinco vezes em que denunciou abuso infantil nas redes. Em fevereiro de 2024, por exemplo, a apuração identificou 35 grupos no Telegram com anúncios de venda de conteúdo criminoso com abusos a crianças e adolescentes. Juntos, os grupos somavam 2 milhões de membros.
🔸 Falando em big techs… a chegada da IA mudou a rotina de escolas rurais na Colômbia – e derrubou o aprendizado, segundo os professores. Em julho do ano passado, a Meta incorporou chatbots a aplicativos como WhatsApp, Facebook e Instagram, e a inteligência artificial adentrou toda a América Latina. A Agência Pública conta que os alunos da Escola de Ensino Médio Rural José Gregorio Salas passaram a usá-los para fazer a lição de casa. “Eu peço tudo para ele. Quando me dão um trabalho, eu só pesquiso e copio. Não leio nem nada. Às vezes eu me pergunto se o que o bot está dizendo é verdade, mas a verdade é que ele me ajuda a economizar tempo”, diz Sergio, um estudante de 16 anos. Os professores, por sua vez, afirmam que a prática está prejudicando o raciocínio crítico e forçando mudanças nas avaliações, com mais provas orais, manuscritas e atividades presenciais.
📮 Outras histórias
O município de Piúma, no litoral sul do Espírito Santo, tornou-se a “Cidade das Conchas” oficialmente em dezembro de 2024, por uma lei do governo do estado. A origem da fama, porém, vem de muito antes e tem como responsável uma mulher: Carmen Muniz Guimarães, a dona Carmen. O Aqui Notícias conversa com a filha dela, Josephina Guimarães, sobre o artesanato com conchas do qual sua mãe foi pioneira. “Como temos um conjunto de ilhas muito interessante por aqui, Piúma sempre teve uma grande variedade de conchas. Quando a mamãe começou, ela fornecia conchas para umas amigas de Guarapari e outros lugares. Logo depois, ela iniciou o trabalho de forma independente”, conta Josephina. Ela lembra que a população local, até então devotada apenas à pesca, passou a ver no artesanato uma forma de sustento. “Vou citar o exemplo da nossa família: com a concha, nós estudamos e nos formamos. Foi uma evolução do artesanato na cidade.”
📌 Investigação
A cada três horas, um vendedor ambulante tem seus produtos apreendidos por agentes da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) ou da ViaMobilidade nos trens de São Paulo. Muitas pessoas encontram nesse tipo de comércio uma forma de sobrevivência, enquanto o “rapa” tenta inibir a atividade. Levantamento da Agência Mural revela que, apesar da trégua recente, a média ainda é alta: em 2024, foram 3.290 apreensões – quase dez por dia. Afonso Oliveira, que vende há 17 anos nos vagões, descreve a tensão: “Não tem como falar se é certo ou errado as vendas no trem. Mesmo eu fazendo um serviço correto, com cartão e garantia, sempre vai ter essa briga”. O decreto federal que regulamenta o transporte ferroviário no Brasil estabelece que a violação do artigo 40, que proíbe o comércio nos trens, deve ser punida inicialmente com uma advertência por escrito e, em caso de reincidência, está prevista a aplicação de multa. Mas… a prática adotada pelas empresas de transporte ferroviário é a apreensão das mercadorias.
🍂 Meio ambiente
Com riscos de explosões e contaminações, a petroleira Origem Energia planeja implantar, no subsolo de Pilar (AL), o primeiro sistema de estocagem subterrânea de gás natural do Brasil. Especialistas e moradores ouvidos pela Agência Tatu e pelo Intercept Brasil alertam para riscos graves, como vazamentos, explosões, contaminação de lagoas e adoecimento da população. “É uma bomba-relógio”, afirma o líder comunitário Luís Augusto Peixoto, sobre a ameaça de impactos ambientais, como o afundamento causado pela mineradora Braskem, em decorrência da exploração de sal-gema do solo de Maceió. O Instituto Arayara destaca ainda a ausência de estudos geológicos de estabilidade e de planos de emergência robustos no relatório ambiental. A licença prévia foi concedida pelo Instituto do Meio Ambiente de Alagoas (IMA), mas ainda depende da autorização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que analisa a solicitação da empresa.
📙 Cultura
Uma obra sobre as enchentes de 2024 no Rio Grande do Sul marca a nova sede do Museu de Arte Contemporânea do estado (MACRS), em Porto Alegre. Há 33 anos sediado na Casa de Cultura Mario Quintana (CCMQ), a instituição agora passa a ter um local próprio no bairro Floresta. A Matinal conta que o novo espaço será aberto para visitação nesta sexta-feira, apresentando uma instalação do artista Nuno Ramos. Recriadas com o uso de materiais como mármore, granito e areia, as “Três Casas” (título da obra) aparecem submersas em lama. O projeto arquitetônico do museu inclui áreas expositivas, um jardim de esculturas, café e espaços educativos. “O papel social do museu tem sido um debate crucial na contemporaneidade, especialmente desde os anos 1970, quando a transição de um modelo focado no objeto para uma abordagem que prioriza a interação com a comunidade ganhou força”, afirma Adriana Boff, diretora do museu.
🎧 Podcast
Acender um baseado na mesa é um gesto cotidiano no Manga Rosa Café, na Vila da Penha, zona norte do Rio de Janeiro. Conhecido por apoiar a legalização da maconha, o café tem música ao vivo, serve almoço e também oferece produtos de tabacaria e drinks com terpenos. O “Conversa de Portão”, produção do Nós, Mulheres da Periferia, narra a trajetória de mulheres periféricas que atuam no mercado canábico e enfrentam desafios como a insegurança de trabalhar na ilegalidade, o estigma em torno da planta e o medo constante das abordagens policiais. “Pra fumar, a gente tinha que ir pra zona sul ou pro centro. E aqui na zona norte é periferia. (...) Então a gente até tem um certo receio às vezes de falar pra todo mundo tão abertamente. Pelas repressões que a gente sofre”, conta Camila Rosa, dona do empreendimento canábico na Vila da Penha.
🧑🏽🏫 Educação
Para refletir sobre identidade e território, a professora de geografia Laiane Michele Silva Souza incentivou a turma de alunos do Centro Educacional de Ibiassucê, na Bahia, a entrevistar familiares. A ideia era compreender o fenômeno das migrações e entender as origens da própria comunidade – a cidade, no sudoeste baiano, tem pouco mais de 10 mil habitantes, e a maioria da população vive na zona rural. Ao longo de 2023 e 2024, os alunos atuaram como pesquisadores, entrevistadores e autores, mapeando trajetórias migratórias de familiares e vizinhos. O Porvir detalha o projeto, que ganhou o nome de “Entre Chegadas e Partidas” e resultou na publicação de um livro assinado pelos alunos. “O principal objetivo era promover o protagonismo estudantil e o reconhecimento das migrações como parte da realidade local”, diz a professora. As metodologias aplicadas – rodas de conversa, mapeamento de roteiros, entrevistas e escrita colaborativa – fortalecem o vínculo entre escola e comunidade, além de permitir que os alunos compreendam as migrações como histórias vivas e significativas de sua própria rede social.