A falta de rastreabilidade das bebidas e as violações em frigoríficos
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🔸 As notificações de intoxicação por metanol chegaram a 195 no último sábado, segundo o Ministério da Saúde. Desse total, 14 casos foram confirmados e 181 estão em investigação. Já são ao menos duas mortes em São Paulo. Os registros evidenciam a falta de rastreabilidade das bebidas alcoólicas desde que o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) foi desativado em 2016 pela Receita Federal. O Metrópoles explica que o órgão, criado em 2009, monitorava em tempo real a fabricação e origem de cada garrafa. Desde sua extinção, o país passou a depender apenas da autodeclaração das empresas, o que abre brechas para fraudes, sonegação e atuação do crime organizado. A Associação Brasileira de Combate à Falsificação (ABCF) afirma que isso favoreceu a entrada do crime organizado, como o PCC, no mercado de bebidas falsas.
🔸 Quais são os direitos do consumidor lesado por bebidas alcoólicas adulteradas? O advogado Guilherme Costa Leroy, doutor em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), defende vítimas de um caso de 2020: na época, as cervejas da marca Belorizontina contaminadas deixaram dez mortos e 19 com sequelas graves, vividas ainda hoje. Em entrevista à Agência Pública, ele critica o sistema judicial brasileiro por favorecer grandes empresas e dificultar o acesso à Justiça das vítimas de tragédias como a adulteração de bebidas. “Há um desequilíbrio muito grande nisso. Existe poder político, econômico, social, que impede um acesso rápido a esses direitos”, afirma. Para o advogado, a legislação brasileira é suficiente, mas a prática jurídica e a lentidão processual inviabilizam a reparação dos danos e alimentam a desconfiança no sistema judicial.
🔸 Um dos principais empreendimentos de hospedagem da COP30 está envolto em controvérsias. O governo federal cedeu ao estado do Pará um antigo prédio de Belém que será transformado em um hotel de luxo da rede portuguesa Tivoli. A Alma Preta revela que o contrato foi firmado com a empresa Roma Serviços de Restauração, Construção e Administração LTDA, a única inscrita na licitação. O governo não tornou público o contrato, tampouco o edital de cessão do prédio ou o valor oferecido pela empresa. Quem assinou o termo foi o vice-presidente da construtora, Giovanni Maiorana – condenado por atropelar e matar duas jovens em 2018, Gabriela Costa e Kinberly Guedes. Embora testemunhas tenham relatado que ele dirigia embriagado e em alta velocidade, o empresário não permaneceu preso por mais de 24 horas, e o processo nunca resultou em denúncia formal por parte do Ministério Público. Agora, ele reaparece como figura-chave da COP30, com uma concessão de 30 anos para administrar o hotel. O empreendimento, de R$ 120 milhões, oferece 176 acomodações e já tem 70% das reservas feitas para a conferência. A polêmica se estende aos valores cobrados: as diárias chegaram a ser orçadas em até R$ 238 mil para o período da Conferência do Clima em Belém.
🔸 O agronegócio brasileiro é, sozinho, o maior emissor de gases de efeito estufa da América do Sul. O setor lançou 725 milhões de toneladas de CO2 equivalente, volume 1,5 vez superior a todas as emissões da Argentina e maior do que o total de qualquer outro país do continente, exceto Estados Unidos, Canadá e México. Na série “COP em Mapas”, a InfoAmazonia lembra que o Brasil tem mais gado que gente: são 238 milhões de cabeças de gado e 214 milhões de pessoas. Além das emissões diretas, o setor está ligado ao desmatamento, especialmente na Amazônia Legal, onde a pecuária é responsável por 75% da perda de floresta em terras públicas.
📮 Outras histórias
Natural de Divinópolis (MG), a poeta Adélia Prado recebeu uma bênção do papa Leão XVI. Ela foi “entregue” pelo bispo da Diocese de Divinópolis, Dom Geovane Luis da Silva, em visita à casa da escritora. “Fomos portadores da bênção apostólica concedida pelo Santo Padre, o Papa Leão. Recebemos a correspondência expedida diretamente da secretaria papal, via nunciatura. A benção foi concedida a ela para celebrar a data do seu aniversário, no dia 13 de dezembro de 2025”, explica o bispo. A autora, uma das mais importantes do país, completará 90 anos. O Portal Gerais lembra que Adélia Prado acaba de lançar “O Jardim das Oliveiras”, depois de um hiato de dez anos sem publicações. Na nova obra, a poeta retoma temas centrais de sua trajetória literária, como o conflito entre fé e dúvida, poesia e silêncio, luz e sombra. “Era Deus quem doía em mim”, diz um dos versos da escritora.
📌 Investigação
“Eu passei tanta humilhação, sentindo dores. Achei que ia morrer. Quando eu lembro que perdi meu bebê naquele banheiro podre, sem nenhum socorro, eu sofro muito, até hoje”, relata Ivete (nome fictício). Era junho de 2024, ela estava grávida e trabalhava na FriGol, o quinto maior frigorífico do país, em São Félix do Xingu (PA), quando sentiu um líquido escorrer. Foi no banheiro do trabalho que viu o sangue, além de sentir dores. Apesar de mostrar uma foto da situação ao líder do seu setor e pedir para ir a um hospital, ela ouviu que “não tinha como”. Só foi liberada, sem qualquer tipo de ajuda ou assistência, próximo ao fim de seu turno. O Joio e O Trigo revela as condições de trabalho de gestantes na indústria da carne e mostra que ocorreram 14.342 afastamentos previdenciários no setor relacionados à gestação entre 2012 e 2024. Hemorragias no início da gravidez e parto prematuro foram os casos mais comuns – 4.701 e 1.502, respectivamente.
🍂 Meio ambiente
Em preparação para a COP30, a Caatinga Climate Week, em Pernambuco, colocou o bioma semiárido brasileiro no centro do debate. Atualmente, 9% da área da Caatinga já está desertificada, segundo o Instituto Nacional do Semiárido, e as populações locais estão na linha de frente das adaptações à crise climática. “Aqui podemos mostrar ao mundo que é possível se adaptar com soluções simples, criadas pelas próprias comunidades” afirmou o Coordenador do Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá, Carlos Magno. A Cajueira acompanhou o evento e destaca que os representantes das comunidades participaram da construção de uma carta com propostas e demandas do Semiárido para ser levado diretamente às negociações da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, em Belém (PA), no próximo mês.
📙 Cultura
“Nós temos a criatividade, o conhecimento e a vontade, mas os projetos dependem de dinheiro para sair do papel. Fazemos malabarismos para trabalhar com cultura na periferia”, afirma o cineasta Breno Andreata, cofundador do Grupo Okán, coletivo de audiovisual que democratiza o acesso à produção cinematográfica nos bairros Jaraguá e Perus, na zona norte de São Paulo. Os mecanismos de financiamento cultural são realizados por meio de incentivos diretos, via orçamento, e indiretos, via renúncia fiscal, como a Lei Rouanet. Os recursos desta última, no entanto, são captados por iniciativas das regiões mais ricas. A Emerge Mag mostra como a justiça tributária, incluindo taxação dos mais ricos, pode ser feita para direcionar o fomento ao setor cultural para as periferias. “Com criações de leis específicas, que prevejam benefícios ao segmento criativo, recursos provenientes da taxação de grandes fortunas podem se tornar incentivo à cultura”, explica Cecília Rabêlo, mestre em Direito Constitucional e especialista em Gestão de Políticas Culturais.
🎧 Podcast
O Massacre do Carandiru completou 33 anos na semana passada. Poucos meses antes, o “Programa Livre”, apresentado por Serginho Groisman no SBT, foi transmitido ao vivo de dentro da Casa de Detenção. O “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, conversa com o apresentador e com Marcia Galpern, então produtora do programa, para reconstruir como foi o processo de produção. O episódio narra também o pós-massacre, a partir da pesquisa de duas professoras da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, Bianca Tavolari e Maíra Rocha Machado, sobre “como morre” um presídio, analisando o caso da penitenciária.
👩🏾⚕️ Saúde
Até o fim do ano, o Sistema Único de Saúde (SUS) deve oferecer o transplante de membrana amniótica – uma camada fina da placenta que envolve o bebê e o líquido amniótico, normalmente descartada após o parto – para o tratamento de queimaduras. Atualmente, só há dois procedimentos com placenta e cordão umbilical que podem ser realizados e pagos pelo sistema público de saúde. O Nós, Mulheres da Periferia explica que a placenta tem um grande valor para a ciência por ser um tecido rico em células-tronco, hormônios, colágeno e fatores de crescimento, propriedades que explicam seu uso em terapias de regeneração. A placenta também é usada em rituais tradicionais ligados à fertilidade e à continuidade da vida.