O esvaziamento do ato de Bolsonaro e as favelas da Amazônia
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🔸 A manifestação convocada por Jair Bolsonaro (PL) em defesa da anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro reuniu um público muito menor do que o esperado. Segundo O Antagonista, o ex-presidente previa um milhão de apoiadores na orla de Copacabana, no Rio de Janeiro, mas o Datafolha estimou 30 mil pessoas e um levantamento da USP e da ONG More in Common calculou 18,3 mil no horário de pico. Já a Polícia Militar do Rio estimou 400 mil presentes, sem explicar a metodologia. Bolsonaro reconheceu, em discurso, que o público era menor do que o da manifestação bolsonarista de 7 de setembro de 2022, quando, segundo a mesma metodologia da USP, a estimativa foi de 64,6 mil participantes.
🔸 A propósito: o bolsonarismo usou diferentes estratégias para comunicar o ato. Inicialmente, o evento foi divulgado como um protesto contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas a pauta mudou para a anistia após a denúncia da Procuradoria-Geral da República contra Bolsonaro – sob o argumento de que pedir a saída de Lula fortaleceria a esquerda, enquanto defender os condenados desmontaria a “narrativa de golpe” e ajudaria Bolsonaro para 2026. O Nexo conversa com cientistas políticos sobre as mensagens de convocação para a manifestação de ontem. Nos grupos bolsonaristas, houve receio de um público esvaziado, o que levou a uma mobilização intensa. Uma das principais táticas foi focar em mulheres condenadas, apresentadas como mães e idosas injustamente punidas, estratégia que, segundo especialistas, busca gerar empatia e minimizar a gravidade dos atos.
🔸 Em áudio: está marcado para o dia 25 o julgamento que vai decidir se Bolsonaro e mais sete aliados se tornam réus em ação penal sobre a tentativa de golpe nas eleições de 2022. No “Sem Precedentes”, podcast do Jota, Felipe Recondo conversa sobre a pauta com Luiz Fernando Esteves, professor do Insper e doutor em Direito do Estado, e Thomaz Pereira, especialista em Direito Constitucional. Eles debatem ainda a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de rever o entendimento sobre o foro por prerrogativa de função, uma mudança que impacta diretamente o caso de Bolsonaro.
🔸 Organizações do movimento negro criticam o presidente da COP30, André Corrêa do Lago, por ter ignorado o racismo ambiental. O tema não foi citado pelo embaixador na carta em que convoca um “mutirão global” contra a mudança do clima. A Alma Preta mostra a reação do Geledés - Instituto da Mulher Negra e do Centro de Estudo e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa), uma das principais referências do movimento negro em Belém, sede da COP30, marcada para novembro. Mariana Belmont, assessora do Geledés, destaca que a população negra, mais vulnerável à crise climática, vive em “zonas de sacrifício”. “As zonas de sacrifício racial incluem territórios indígenas e quilombolas. Elas estão diretamente relacionadas à extração e exploração econômica racista que ocorreu durante a era colonial pela qual as potências coloniais não foram responsabilizadas”, afirma.
📮 Outras histórias
“Fiquei sabendo do passeio pela internet, pelo TikTok, e achei surreal, amei muito, faria mil vezes de novo. Os pontos turísticos são ótimos, conseguimos ter uma noção real de como é uma favela. É uma experiência que não sei nem como explicar, sem palavras, outra realidade, parece outro planeta.” A gaúcha Tamara Stromm Vieira, 24 anos, se refere ao Favela Tour, turismo sobre duas rodas no Vidigal. O Voz das Comunidades lembra que o morro da zona sul do Rio de Janeiro tem 400 mototaxistas rodando todos os dias na favela. Os roteiros turísticos incluem pontos como o Cantão da Rua 3 e o Alto do Vidigal. Washington, 30 anos, conhecido como Neném, trabalha como mototaxista há três anos e viu no turismo uma oportunidade de renda. “Sou carismático, humilde e engraçado, a diversão é certa no meu passeio”, diz ele.
📌 Investigação
Unidades de conservação na Amazônia Legal perderam 87.591 km² – equivalente a 57 cidades de São Paulo – de áreas protegidas entre 2000 e 2024. Levantamento da InfoAmazonia revela que as legislações do Brasil destinadas à proteção desses territórios sofreram 60 alterações por meio de projetos de lei e judicialização nos últimos 24 anos. A reclassificação de um Parque Nacional para uma Área de Proteção Ambiental (APA), por exemplo, representa um enfraquecimento na proteção ambiental, uma vez que amplia as possibilidades de uso e ocupação humana, comprometendo a integridade dos ecossistemas antes protegidos de forma mais restritiva. Atualmente, sete propostas de redução na proteção das unidades na região ainda tramitam no Congresso Nacional e na Justiça. Caso aprovadas, poderão impactar mais 13.448 km².
🍂 Meio ambiente
Quando se deslocam para centros urbanos em busca de melhores condições, os indígenas ficam mais expostos às inundações. No dia 9 de março, sete famílias do povo Huni Kuĩ – totalizando 32 pessoas – foram retiradas de suas casas na Base, bairro na região central de Rio Branco (AC), pela Defesa Civil, quando o rio Acre subiu de nível e atingiu o bairro. Segundo o Varadouro, um levantamento preliminar da Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas, do governo estadual, constatou que atualmente existem 50 famílias morando em cinco diferentes bairros da capital acriana, a maioria expostos a enchentes, como Base, 6 de Agosto e os que formam a Baixada da Sobral. De acordo com a secretária Francisca Arara, há uma proposta para criar uma estrutura na secretaria destinada a cuidar apenas da questão dos indígenas em contexto urbano. “Eu até já pedi para que eles se reúnam para escolher um nome, de um indígena que mora na cidade, para ocupar essa função.”
📙 Cultura
Espaços culturais das periferias de São Paulo são frequentemente alagados pelas enchentes. Os agentes culturais além de fazer mutirões para ajudar os moradores que perdem suas casas e recuperar os materiais artísticos, denunciam o descaso do poder público por meio da arte, conta a Periferia em Movimento. “De novo, o bairro sofreu com as enchentes, impactando o centro cultural e a vida dos moradores”, afirma Ana Carolina Marinho, diretora, produtora e integrante do Coletivo Estopô Balaio, do Jardim Romano, zona leste da capital paulista. A iniciativa tem vários projetos influenciados pelos desastres. “Essa memória traumática de enfrentamento das enchentes foi material para desenvolver diversos trabalhos sobre essa travessia nas enchentes, sobre a vida nesse território ameaçado constantemente.” Um dos espetáculos produzidos pelo coletivo, “A Cidade dos Rios Invisíveis”, aborda, por exemplo, a cimentação dos córregos.
🎧 Podcast
Oito das 20 favelas mais populosas do Brasil estão em Belém (PA) e Manaus (AM), e os igarapés poluídos se misturam com habitações e vias de estrutura precária. O “Afluente”, produção da Rádio Guarda-Chuva, analisa o cruzamento da população pobre e periférica amazônica e a urbanização desordenada em áreas de igarapés. Diante do abandono do estado, os moradores dessas regiões sofrem com o estigma da marginalização em diferentes níveis. “Esses espaços podem e precisam ser modificados para melhor. Não faz sentido as pessoas, por exemplo, não terem água na torneira em cima da maior bacia hidrográfica do mundo”, afirma Luiz Antônio, professor de Sociologia da Universidade Federal do Amazonas.
🙋🏾♀️ Raça e gênero
“É um modo mais fácil da gente sobreviver, entende? Estar nas esquinas, vendendo nossos corpos para homens que durante o dia nos veem como bichos”, afirma a trabalhadora sexual Rhiane Fendi. A falta de oportunidades de trabalho no mercado formal empurra mulheres trans e travestis para a prostituição. Em 2022, o Projeto Garupa, da Secretaria Municipal de Governo e Integridade Pública do Rio de Janeiro, identificou que 71% das pessoas trans e travestis cadastradas na primeira etapa da iniciativa, realizada entre junho e outubro de 2021, já sofreram preconceito durante entrevistas de emprego. O levantamento ainda mostrou que 60% das entrevistadas têm renda mensal incerta ou insuficiente, e 27% nunca tiveram vínculo de trabalho. Em parceria com a Fiquem Sabendo, a Agência Diadorim destaca que a ausência de dados governamentais sobre o trabalho sexual e a identidade de gênero no país dificulta ainda mais a criação de políticas públicas eficazes para essa população.