A espionagem ilegal na 'Abin paralela' e a aposentadoria para mulheres
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🔸 Uma “Abin paralela” servia para monitorar desafetos do governo Jair Bolsonaro (PL). A investigação sobre a organização criminosa derrubou ontem um membro da atual cúpula da Polícia Federal (PF), como apurou a Agência Pública. O policial federal Carlos Afonso Coelho foi suspenso imediatamente. Ao lado do ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência, o atual deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), ele usava um programa israelense contra autoridades públicas para a “criação de relatórios apócrifos que seriam divulgados com o fim de criar narrativas falsas”. O Jota informa ainda que, sob o comando de Ramagem, a Abin foi usada para monitorar a promotora Simone Sibilio, que investigava o assassinato de Marielle Franco, além de interferir em diversas investigações da PF. Um exemplo foi a tentativa de criar prova a favor de Renan Bolsonaro, filho do então presidente Bolsonaro.
🔸 Desde o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, cinco anos atrás, a médica Luana Prata, moradora da zona rural da cidade mineira, acompanha os efeitos da tragédia na vida dos moradores. Em entrevista ao Projeto Colabora, ela detalha os impactos do desastre para além de lesões físicas e das perdas materiais. “Há crescimento do alcoolismo, do uso de drogas, de diversos tipos de violência – em especial a doméstica –, suicídios, surtos psicóticos, novos casos de hipertensão e crises alérgicas, entre outros distúrbios funcionais. O sofrimento humano é evidente ao longo da calha do rio Paraopeba, de Brumadinho a Três Marias, com gradações distintas”, afirma.
🔸 A mineração no país só se desenvolveu com “sacrifícios humanos”. É o que afirma o professor Rafael de Freitas e Souza, doutor em história social que estuda acidentes na mineração. As tragédias remontam aos séculos 18 e 19. Em 1884, por exemplo, o desabamento de uma pedra no poço das minas da Brazilian Company Limited em Itabira do Campo (MG) fechou as galerias subterrâneas onde trabalhavam mais de cem pessoas. A história se repete em casos como o de Mariana e Brumadinho, conta ele ao Nexo. “O resquício que vejo entre os problemas do passado e o atual pode ser resumido na expressão ‘auri sacra fames’ – a maldita fome do ouro. Para os casos recentes, podemos traduzir para a ‘maldita fome do lucro’”, afirma.
🔸 A propósito: o caso de Mariana completou oito anos, e as mineradoras Vale, BHP e Samarco foram condenadas a pagar R$ 47,6 bilhões de reais em indenização por danos morais coletivos causados pelo rompimento da barragem de Fundão. O valor corrigido pode chegar a R$ 73 bilhões, mostra a CartaCapital. O despacho foi assinado por um juiz ontem e determina que os recursos sejam destinados a um fundo administrado pelo governo federal e revertido para ações socioambientais nas áreas impactadas.
🔸 Os impactos da seca persistem na Amazônia, mesmo depois do período de estiagem do ano passado, entre agosto e novembro. Comunidades ribeirinhas ainda sofrem com a escassez de água potável, e a diminuição dos níveis dos rios afeta a economia da região. “Por conta da seca extrema que estamos passando, moradores contam que as doenças infecciosas, que estavam de certa maneira sob controle, ressurgiram com muita rapidez nessas comunidades vulnerabilizadas. Falta de medicamento e, em alguns momentos, deve-se dividir entre comprar o remédio ou o alimento”, afirma ao Le Monde Diplomatique Brasil Wilson Sabino, professor do Instituto de Saúde Coletiva (Isco) da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), em Santarém. A previsão para 2024 é de mais seca e reforça a necessidade de medidas preventivas.
📮 Outras histórias
Das 60 redações que tiveram nota máxima no Enem, 25 foram escritas por estudantes da região Nordeste. A Cajueira lembra que Rio Grande do Norte e Piauí concentraram a maior parte dessas notas, com uma média de 1,8 notas mil para cada milhão de habitantes. A edição destaca: “A gente sabe que em um país desigual como o Brasil, o acesso à educação ainda não é universal. Mas também sabemos que o preconceito regional é uma realidade ainda muito presente, e ver nordestines sendo considerados menos inteligentes ou qualificados não é novidade”.
📌 Investigação
O trabalho não remunerado com afazeres domésticos e cuidado de pessoas faz com que mulheres não estejam no mercado de trabalho formal – o que tem impacto direto na renda e na dignidade quando elas chegam à velhice. Levantamento da Gênero e Número revela que duas em cada três pessoas que se aposentaram por idade são mulheres, enquanto duas em cada três que recebem aposentadoria por tempo de contribuição são homens. Mulheres negras representam também duas em cada três pessoas que não têm trabalho remunerado porque precisam se dedicar a afazeres domésticos ou tarefas de cuidado. “O número de mulheres pobres tem aumentado ao longo dos anos e a pobreza na velhice é duplamente terrível”, afirma a economista Brena Paula Magno Fernandez, do Núcleo de Estudos em Economia Feminista da Universidade Federal de Santa Catarina.
🍂 Meio ambiente
Obra contra a estiagem de 2023 no Rio Grande do Sul facilitou a caça de cervos-do-pantanal em áreas protegidas estaduais na vizinhança de Porto Alegre. A população regional da espécie ameaçada de extinção estaria encolhendo. Segundo O Eco, o movimento de caçadores cresceu com a abertura do canal na região, mas também pela suposta falta de fiscalização, pessoas, armas e munição para proteger as reservas. “Muitos se aproveitam do nível alto do rio Gravataí para chegar a lugares ermos e antes isolados. Hoje só não caça quem não quer.”
📙 Cultura
“Eu insisto na tese de que a cultura é o meio pelo qual é possível a emancipação, a construção de identidade, força e poderosa singularidade, promotora de humanidade e comunidade. E para isso é necessária a relação com o outro; não existe cultura sem o coletivo”, afirma a presidente da Fundação Nacional das Artes (Funarte), Maria Marighella. À revista O Grito! ela discorre sobre o papel da cultura no cotidiano, descreve como encontrou o órgão depois do governo Bolsonaro, detalha as principais políticas públicas implementadas ao longo do último ano e compartilha quais os próximos passos na gestão. “Em 2024, iremos atuar como uma instituição articuladora com os convênios, levantando dados e informações para o aperfeiçoamento das políticas.”
🎧 Podcast
Qual a origem da consciência humana? A questão move cientistas e filósofos há séculos, e um grupo de pesquisadores se deparou com ela quase que acidentalmente. Em 2015, no laboratório, eles estavam buscando uma forma melhor de fazer organoides cerebrais para estudar doenças neurológicas, até que essas células passaram inesperadamente a se comunicar umas com as outras sozinhas em um movimento de sincronização ao acender e apagar. O “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, narra como os pesquisadores foram surpreendidos pela descoberta e até que ponto células de laboratório podem se assimilar à consciência humana.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Mães que precisam ou querem usar cannabis por diversas razões sofrem preconceito e chegam a perder a guarda dos filhos. A artesã Lauryane Leão sofria de ansiedade, fibromialgia e fortes enxaquecas desde a infância. Por meio do uso da maconha, descobriu uma forma de viver melhor com essas patologias e passou a compartilhar nas redes sociais seu conhecimento – algo que foi usado por seu ex-parceiro para tentar tirar a guarda da filha de Lauryane. A revista AzMina explica como o proibicionismo, o machismo e o racismo negam a maternidade às “mãeconheiras”.