Especial: Uma conversa com Angela Davis e as condenações no caso Marielle
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
Olá,
bom dia!
Na edição especial de hoje, destacamos a cobertura de nossas associadas sobre o caso Marielle Franco. Em outubro de 2024, seis anos depois da brutal execução da vereadora carioca, os assassinos foram, enfim, condenados. A Brasis acompanhou desde o inquérito até as reações após o anúncio das condenações, sempre com a perspectiva de raça e a partir do rigor do jornalismo investigativo.
As edições regulares voltam no próximo dia 13.
Boa leitura!
🔸 “O capitalismo realmente ajudou a produzir a ideia de que o encarceramento poderia ser usado como punição. Mas se as prisões surgiram ao longo da história também podem deixar de existir. É por isso que pedimos a abolição.” A professora, filósofa, ativista e ex-Pantera Negra Angela Davis é uma das principais vozes na luta pelo abolicionismo penal no mundo, em busca de outras alternativas para a segurança pública. “Meu interesse pelo abolicionismo penal e as questões carcerárias vem da época em que eu mesma estive encarcerada.” A revista piauí conversa com Davis e destrincha o pensamento por trás da abolição carcerária, movimento que começou principalmente a partir de denúncias da violência policial.
🔸 Aprovados nas vagas para pretos, pardos e indígenas na Universidade de São Paulo (USP), dois alunos tiveram as matrículas canceladas no início de 2024. Eles não tiveram as autodeclarações (como pardos) aceitas pela instituição, que avalia a autenticidade do documento por meio de uma comissão de heteroclassificação racial. Para o sociólogo Luiz Augusto Campos, coordenador do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa (Gemaa), o funcionamento dessas comissões ainda é “opaco”. Em entrevista ao Nexo, ele conta que a avaliação dos estudantes a distância, via internet, é o formato mais comum, mas cada universidade tende a adotar um modelo próprio. “Costumo dizer que, mais do que identificar pretos, pardos e indígenas, o objetivo das comissões é identificar pessoas indubitavelmente brancas que estão tentando se valer daquela vaga de cotas que não é feita para elas. Essa tem que ser a conduta.”
🔸 Para ouvir: Mesmo representando a maioria da população brasileira, pessoas negras são sub representadas no campo jurídico. Dos mais de 635 mil profissionais registrados na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), desde 2011 – ano em que foi implementada a classificação –, apenas 170 mil se declaram pardos e 41 mil pretos, ou seja, 33% do total. O podcast “Direto no Plural”, produção do Plural, recebe os advogados Cassio Prudente Vieira Leite e Laola Marinho de Oliveira, ambos da Comissão de Igualdade Racial da OAB no Paraná, para debater como a desigualdade racial impacta o sistema judiciário no país.
🔸 Em março de 2024, a Polícia Federal prendeu três suspeitos de mandar matar Marielle Franco, numa execução brutal que também tirou a vida do motorista Anderson Gomes, em 2018. Domingos Brazão, político de carreira e conselheiro do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro, seu irmão Chiquinho Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa tiveram a prisão decretada após serem apontados como mandantes na delação de Ronnie Lessa, executor do assassinato. A CartaCapital detalha como se deu a encomenda do crime e a motivação, de acordo com Lessa. Os irmãos Brasão começaram a arquitetar a execução da vereadora ainda no segundo semestre de 2017. Chegaram a infiltrar um homem no PSOL, partido de Marielle, para obter informações. Segundo o “espião”, ela vinha pedindo à população que não aderisse a loteamentos situados em região de milícia na zona oeste. Esta teria sido a gota d’água para o clã Brasão – que, por sua vez, ofereceu a Lessa lotes de terra naquela área como recompensa pela morte da vereadora.
🔸 Entre as motivações para o crime apontadas pela Polícia Federal (PF), “a mais latente é uma disputa imobiliária: os Brazão tinham interesse em fazer loteamentos na zona oeste do Rio, e Marielle se opunha ao empreendimento”, escrevem Cecília Olliveira e Tatiana Dias, no Intercept Brasil. À época, Chiquinho era vereador municipal pelo Rio e propôs na Câmara um projeto para a regularização de loteamentos na zona oeste, área de atuação de milícias e de disputa de votos. A bancada do PSOL votou contra, mas o texto foi aprovado no dia da morte de Marielle, pela qual os irmãos Brazão tinham “repugnância”, segundo as investigações.
🔸 Enfim, em outubro… Os assassinos de Marielle Franco e Anderson Gomes foram condenados a mais de 137 anos de prisão. A sentença foi anunciada depois de dois dias de julgamento no Rio de Janeiro. Executor dos disparos que tiraram a vida da vereadora e de seu motorista em 2018, Ronnie Lessa foi condenado a 78 anos e nove meses de prisão. Motorista do carro que seguiu Marielle, Élcio de Queiroz teve pena de 59 anos e oito meses. A Alma Preta informa ainda que os dois ex-policiais terão de pagar R$ 706 mil de indenização de danos morais a cada uma das vítimas: Marinete da Silva, Luyara Franco e Monica Benicio, mãe, filha e viúva de Marielle, respectivamente, além de Ágatha Arnaus e Arthur, viúva e filho de Anderson.
🔸 “Nenhuma sentença é reparadora. Nenhuma condenação é restauradora da ausência. Não é felicidade o que sinto. O corpo e o coração permanecem tensos. Mas há a sensação de algum alívio em ver, pela primeira vez, alguma materialidade nisso tudo, uma explicação e uma responsabilização que tanto foi esperada”, escreveu Monica Benicio nas redes sociais após o anúncio da sentença. “Ainda falta a condenação dos mandantes e articuladores do crime, assim como dos demais comparsas, através do STF. Não descansaremos.” O Metrópoles lembra que os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, acusados de serem os mandantes do assassinato, estão presos e aguardam o processo que corre no Supremo Tribunal Federal (STF).
🔸 Em áudio: “Olha só, o carro que eu tava com a Marielle levou uma porção de tiro. A Marielle foi atingida. A gente já chamou a polícia e a ambulância. Eu tô bem, mas a Marielle tá desmaiada, o Anderson também. Reza por mim, amor, reza pela Marielle, reza pelo Anderson.” O áudio foi enviado por Fernanda Chaves ao marido na noite de 14 de março de 2018. Única sobrevivente da brutal execução de Marielle Franco, a amiga e assessora da vereadora contou repetidas vezes aquele momento. No episódio 72 do “Rádio Novelo Apresenta”, produção da Rádio Novelo, ela divide a memória com a jornalista Carol Pires e lembra de quando ouviu pela primeira vez o relato de outra pessoa sobre a cena do crime.
🔸 Citado em diversas letras de músicas, o Baile do Helipa é um símbolo cultural que atravessa gerações em Heliópolis, maior favela de São Paulo. Descentralizado e sem uma organização fixa, os fluxos acontecem de sexta-feira a domingo, em diversas ruas ao mesmo tempo. A Agência Mural mergulha na história do baile e sua marca na comunidade. Morador de Heliópolis há mais de 30 anos e coordenador do Observatório de Pesquisa de Heliópolis – De Olho na Quebrada, Reginaldo Gonçalves conta que antes das ruas, becos e vielas serem tomadas pelo público, as primeiras manifestações aconteciam em uma quadra, com DJs e MCs, até que os mais jovens passaram a usar carros com paredões de som para fazer as apresentações, que se espalharam pela favela.