Os enredos afro na Sapucaí e a origem do posto de rainha de bateria
Uma curadoria do melhor do jornalismo digital, produzido pelas associadas à Ajor. Novos ângulos para assuntos do dia
🔸 “Deixamos de ser colônia em 7 de setembro de 1822 e, com coragem, estamos construindo uma república independente e cada vez melhor.” A afirmação é do ministro Alexandre de Moraes, em resposta às críticas do governo Trump sobre decisões da Justiça brasileira. A CartaCapital explica o contexto da reação do magistrado: uma comissão da Câmara dos Estados Unidos aprovou um projeto para barrar a presença do ministro do STF no país, alegando que ele seria um “agente estrangeiro que infringe o direito de liberdade de expressão”. Na quarta-feira, a plataforma de vídeos Rumble e a Trump Media, grupo de comunicação de Donald Trump, pediram à Justiça americana uma ação contra Moraes acusando o magistrado de censura. A liminar foi negada.
🔸 A propósito: advogados da Rumble e da Trump Media anexaram cinco decisões sigilosas do ministro Alexandre de Moraes a um processo contra ele na Justiça dos EUA. O objetivo é usá-las como supostas provas de censura no Brasil, informa o Aos Fatos. A ação é uma resposta às ordens de Moraes para suspender contas ligadas ao influenciador Allan dos Santos, investigado no Brasil. O CEO do Rumble, Chris Pavlovski, desafiou publicamente o Judiciário brasileiro, levando Moraes a determinar a suspensão da plataforma no país. Em retaliação, Rumble e Trump Media pediram na Justiça dos EUA que sejam desobrigadas de cumprir decisões do STF.
🔸 A maioria das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro terá enredos com raízes africanas no Carnaval 2025. Sete das 12 escolas desfilarão temas ligados à cultura e à religiosidade do povo negro, e outras duas homenageiam personalidades negras: Milton Nascimento (Portela) e Laíla (Beija-Flor). O Colabora detalha os enredos: a Unidos de Padre Miguel contará a história de Iyá Nassô, fundadora do primeiro terreiro de candomblé do Brasil; a Imperatriz Leopoldinense retratará a peregrinação de Oxalá; e a Mangueira abordará a resistência dos povos bantu no Rio. Outras escolas vão destacar Logun-Edé (Unidos da Tijuca), Xica Manicongo (Paraíso do Tuiuti) e Malunguinho (Viradouro).
🔸 Em São Paulo, mais de 80 blocos de Carnaval e coletivos criaram o movimento As Águas Vão Rolar. Eles enviaram uma carta à prefeitura reivindicando medidas para mitigar os impactos do calor extremo nos dias de folia. O Nonada conta que as principais demandas são a distribuição gratuita de água, a redução do preço da água vendida, a flexibilização de horários dos blocos e a criação de um gabinete de crise para monitorar emergências climáticas. “É muito surreal que em tempos de emergência climática não se tenha uma política para diminuir o preço da água que vai ser vendida”, diz Lira Alli, da organização Arrastão dos Blocos. “O Carnaval é um direito cultural, de expressão, à cidade. Tornar o Carnaval possível nesse cenário que a gente tá vivendo, das emergências climáticas, é fundamental”, completa. A prefeitura informou que os horários dos blocos não serão alterados e diz que negocia com a Sabesp a distribuição de água.
📮 Outras histórias
“Amor e respeito. Se você não tiver esses dois itens, não vai fazer um bom Carnaval.” O ensinamento é do mestre Walter França, 74 anos, o coração do Maracatu Raízes de África. A agremiação surgiu nos anos 1990 a partir de projetos sociais na comunidade do Córrego do Bombeirense, em Recife. É também esta a origem do Boi Mimoso. Os dois grupos mobilizam cerca de 200 pessoas no bairro, agora em trabalho intenso para os dias de Carnaval. A Marco Zero mostra o trabalho das agremiações que resistiram a períodos de pausa e foram retomadas pela comunidade. Hoje, jovens como o batuqueiro Joalison Batista, 22 anos, assumem papéis de liderança, garantindo a continuidade das tradições. “A gente brinca o boi e o maracatu, mas, na verdade, isso é uma brincadeira muito séria. Porque a cultura também tem esse movimento. É um movimento que também pode salvar a vida”, ensina Joalison.
📌 Investigação
Multinacional de energia italiana com subsidiárias no Brasil, a Enel e a empresa Maestro Holding de Energia são acusadas por comunidades rurais da Bahia e do Piauí de apropriação de suas terras para a instalação de turbinas eólicas. O Intercept Brasil apurou as denúncias dos moradores, que resultam em possíveis casos de grilagem por empresas que prestam serviço para a Enel. Um ex-funcionário da Casa dos Ventos diz que o georreferenciamento tem sido utilizado para adquirir terras. Quando os moradores se recusam a arrendar suas propriedades, a empresa recorre a um processo de “regularização forçada”. O método consiste em encontrar uma matrícula antiga da área e fazer um georreferenciamento ampliando seu perímetro para absorver áreas vizinhas. “Assim, uma propriedade que há 60 anos era registrada como tendo cerca de 20 hectares passa a ter 200 graças ao novo georreferenciamento.”
🍂 Meio ambiente
Fundamentais para a manutenção da biodiversidade, a regulação dos ecossistemas e a redução dos impactos das mudanças climáticas, as unidades de conservação são alvo de projetos de leis que propõem redução, rebaixamento ou extinção do status de proteção dessas áreas. Segundo a Agência Bori, um estudo publicado a revista científica “Perspectives in Ecology and Conservation” alerta para os riscos dessas propostas e destaca o caso do Parque Estadual Cristalino II, criado em 2000 no estado do Mato Grosso, na parte sul da Amazônia – região conhecida como “arco do desmatamento”. Os autores da pesquisa afirmam também que o Congresso tem apoiado políticas que enfraquecem as leis ambientais e as agências de fiscalização.
📙 Cultura
Com 9 anos, Pietra já toca tambor pelas ruas do Pelourinho, no Centro Histórico de Salvador, em exaltação à ancestralidade. Ela faz parte da banda Didá, primeira banda afro-percussiva feminina da capital baiana. Enquanto Pietra batuca ao lado de outras meninas e mulheres da banda, sua mãe, a vocalista Madah Gomes, dá letra ao som da avenida. “Como criança ativa, me sinto feliz e honrada em fazer parte desse grupo que é tão especial para o mundo”, detalha. O Lunetas narra a história de crianças e adolescentes que fazem o Carnaval soteropolitano acontecer e resistir como herança da família, da cultura local e da ancestralidade africana.
🎧 Podcast
Com um desfile organizado em 1858, o Carnaval de Santos (SP) tem mais de 160 anos de história e já chegou a ser considerado o segundo maior do Brasil. No final da década de 1990, porém, uma ação civil proibiu os desfiles na Avenida da Praia. Eles só foram retomados em 2006, com a inauguração do Sambódromo Passarela do Samba Dráusio da Cruz. O “Juicysantos Podcast”, produção do Juicy Santos, resgata a história do Carnaval santista e de nomes como J. Muniz Jr., Waldemar Esteves da Cunha e Dráuzio da Cruz, que ajudaram a construir uma trajetória de resistência e de paixão pelo samba.
💆🏽♀️ Para ler no fim de semana
Quando as escolas de samba e o desfile de Carnaval nasceram oficialmente, em 1932, não existia o posto de rainha da bateria, apenas várias mulheres, das comunidades locais, que dançavam juntas enquanto o samba acontecia. Alguns anos depois, começaram os concursos para eleger a melhor passista, que teria uma posição de destaque à frente da ala. Para ser coroada como rainha da bateria, era necessário ser a melhor passista. A revista AzMina destrincha como esse papel que nasceu com mulheres negras da comunidade virou lugar disputado por celebridades. “Isso retira alguns símbolos e significados do que é a nossa cultura, mas é um projeto de poder, porque retira as pessoas [pretas] desses lugares”, afirma Lyllian Bragança, sambista, pesquisadora e jornalista falando da Escola de Samba Vai-Vai, de São Paulo.